Não. Ele Não Está
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Sobre este e-book
O percurso da pesquisa tem início no trabalho de campo, desenvolvido na cidade do Rio de Janeiro. Na sequência, o leitor conhecerá a trajetória dessas mães, com informações sobre a família, a vida profissional, os afetos e a vida após a morte dos seus filhos. Por fim, surgem as impressões sobre racismo, preconceito de classe e branquitude.
A obra também chama a atenção pelo texto fluido, que propõe um diálogo entre a fala das entrevistadas e o que vem sendo produzido academicamente; e pelas referências formadas, majoritariamente, por autoras e autores negros – privilegiando o pensamento negro desenvolvido no Brasil e no exterior.
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Não. Ele Não Está - Maíra de Deus Brito
COMITÊ CIENTÍFICO DA COLEÇÃO EDUCAÇÃO E DIREITOS HUMANOS:DIVERSIDADE DE GÊNERO, SEXUAL, ÉTNICO-RACIAL E INCLUSÃO SOCIAL
Em memória de Luiz Leonardo de Souza.
AGRADECIMENTOS
Laroyê, Exu! Salve o Senhor dos caminhos e da comunicação. Gratidão por ter me trazido até aqui. Também agradeço:
À minha mãe. Sem Dona Angela eu não teria voado tão longe.
À minha família, por ser fonte de inspiração e de esperança.
Às mães que gentilmente aceitaram compartilhar suas histórias comigo.
À minha orientadora, Prof.ª Dr.ª Vanessa Maria de Castro, por todo carinho e por toda compreensão ao longo da minha trajetória acadêmica.
Ao Prof. Dr. Joaze Bernardino Costa e ao Prof. Dr. Wanderson Flor do Nascimento, e à Prof.ª Dr.ª Magda de Lima Lúcio, por aceitarem participar da banca de mestrado.
Às professoras, aos professores, às alunas e aos alunos do Programa de Pós-Graduação em Direitos Humanos e Cidadania da Universidade de Brasília (PPGDH/UnB), pela força e coragem em lutar por direitos humanos em tempos tão temerosos.
Ao Prof. Dr. Evandro Piza Duarte e a todas e todos integrantes do Maré – Núcleo de Estudos em Cultura Jurídica e Atlântico Negro. Obrigada por toda revolução e resistência.
À Yalorixá Dora de Oyá e à mãe pequena Fernanda de Oxum, pelo suporte espiritual.
À Gabriela de Almeida, Mara Karina e Patrícia Nóbrega Barbosa. O axé de vocês evitou o meu fim.
Aos meus afro-afetos, Ana Luiza Flauzina, Ana Flávia Magalhães, Cris Pereira, Felipe Freitas e Lia Maria. Obrigada por tanta inspiração.
Aos meus queridos Tao Burity e Morena Marques, pelo suporte e acolhimento em terras cariocas.
A todas aquelas e a todos aqueles que enviaram artigos, emprestaram publicações e sugeriram autores que poderiam colaborar com este livro.
Saravá a banda de cada um de vocês!
Chapa, desde que cê sumiu
Todo dia alguém pergunta de você
Onde ele foi? Mudou? Morreu? Casou?
Tá preso, se internou, é memo? Por que?
Chapa, onde o sol nem surgiu, sua mãe chora
Não dá pra esquecer que a dor vem sem boi
Sentiu, lutou, ei djow, ilesa, nada,
Ela ainda tá presa na de que ainda vai te ver
Chapa, de Emicida e Xuxa Levy
APRESENTAÇÃO
Este livro nasce da angústia e da indignação. Em 2015, 31.264 jovens entre 15 e 29 anos foram vítimas de homicídios no Brasil. Se contabilizarmos o número de mortos entre 2005 e 2015, encontramos o assustador dado de 318 mil jovens assassinados. Os números ficam ainda mais preocupantes quando aplicado o recorte de gênero e raça. Em 2015, 47,8% dos mortos foram homens jovens e, em um intervalo de 10 anos, a taxa de homicídio de negros (pretos e pardos) cresceu 18,2%, enquanto a taxa de não negros caiu 12,2%.
São dados alarmantes que denunciam o extermínio da juventude negra do País. Diante de um tema tão urgente, decidi falar sobre uma das principais frentes do genocídio da população negra brasileira, a partir da história de vida de mães que perderam os filhos assassinados. Interessa saber quem são as mães que estão vendo as vidas de seus filhos abreviadas precocemente e de maneira tão violenta, e quais são as percepções delas sobre a influência da raça, do gênero e da classe nessas mortes.
Em março de 2017, saí de Brasília, cidade onde nasci e moro, rumo ao Rio de Janeiro. Lá, encontrei Aparecida, Ana Paula e as histórias desta obra, cujo título é uma nítida referência à ausência desses jovens em casa, em suas famílias, em suas redes de amigos, no mercado de trabalho e na produção de cultura e de conhecimento.
Não. Ele não está surge de um trabalho apresentado no Programa de Pós-Graduação em Direitos Humanos e Cidadania da Universidade de Brasília (UnB) e da necessidade de debater e de denunciar o genocídio da população negra e o extermínio da juventude negra.
A autora
PREFÁCIO
Em busca da cicatrização
[A] vida moderna começa com a escravidão [...] A escravidão partiu o mundo ao meio, ela o quebrou em todos os sentidos. Ela quebrou a Europa. Ela fez deles alguma outra coisa, ela fez deles senhores de escravos, ela os enlouqueceu. Não se pode fazer isso durante centenas de anos sem se pague um preço. Eles tiveram de desumanizar, não apenas os escravos, mas a si mesmos. Eles tiveram de reconstruir tudo a fim de fazer este sistema parecer verdadeiro [...] Racismo é a palavra que empregamos para abranger tudo isso.¹
Alardeamos que uma das grandes conquistas de nossos dias é a existência e defesa dos Direitos Humanos. Paradoxalmente, junto à existência desses direitos, um recrudescimento e sofisticação de formas de violência que apesar de espraiadas pelo mundo social, atacam de modo bastante incisivo e cruel às pessoas negras e indígenas em nosso país.
Não obstante os muitos dados que explicitamente mostram essa cruel realidade, poucas são as reflexões acadêmicas que têm se dedicado a pensar a existência, os modos e sentidos dessa violência que atinge majoritariamente a população negra de nosso país. Esses estudos estão, na maioria absoluta dos casos, vinculados com a militância, que ainda ocupa, por força do racismo, parcos espaços nos lugares de produção de conhecimento reconhecido e utilizado para a produção das políticas públicas.
O ultracomplexo problema da violência, quando tratado pelos estudos acadêmicos, na maior parte das vezes, é lido de modo a não perceber como o racismo informa as práticas e sentidos dos fenômenos violentos que nos cercam. Com isso, esses estudos perdem sua força explicativa, não sendo totalmente eficazes para servirem como subsídios aos processos de enfrentamento desse (in)tenso problema.
O trabalho de Maíra de Deus Brito aparece nesse cenário oferecendo outras e interessantes ferramentas para pensar o problema, somando-se a esses estudos que já vêm sendo realizados pela militância (na academia e fora dela), com uma pontuação fundamental para fortalecer os olhares que buscam outras maneiras de enfrentar os impactos do racismo nas práticas de violência.
A pesquisa aqui registrada nos faz um convite para pensar (e buscar estratégias de ação) o fenômeno de extermínio da juventude negra inserido no contexto de um genocídio da população negra. Essa última categoria, que tem sido pouco utilizada nas análises sociais sobre o trato desumanizante destinado às pessoas negras em nosso país, tem se mostrado certeira em descortinar um problema que nossa sociedade insiste em ignorar, esforça-se por encobrir.
E a escolha de tratar esse tema desde a perspectiva das mães negras cujos filhos foram assassinados, aquelas pessoas que, após as tragédias, seguem experimentando uma morte em vida, ao mesmo tempo em que buscam estratégias de sobrevivência e resistência, traz importantes elementos para o enfrentamento da violência contra a população negra e, também, da violência em geral.
Essa abordagem, lúcida, apresenta-nos um importante exercício de percepção sobre os modos como pobreza, relações de gênero e racismo entrecruzam-se na experiência da população negra, proporcionando uma análise interessante para complexificar o problema da violência, que nos conclama a construirmos ferramentas mais eficazes e precisas no