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As Mulheres na Política Local: Entre as Esferas Pública e Privada
As Mulheres na Política Local: Entre as Esferas Pública e Privada
As Mulheres na Política Local: Entre as Esferas Pública e Privada
E-book399 páginas8 horas

As Mulheres na Política Local: Entre as Esferas Pública e Privada

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Sobre este e-book

Ao enveredar sobre a questão das mulheres na política local, Claudia Barbosa investiga os múltiplos dilemas vividos diante da realidade formada por intricadas tessituras sobre o lugar das mulheres na esfera pública. Em sua abordagem, reflete sobre as reminiscências e superações de situações experenciadas pelas prefeitas, chama atenção para a invisibilidade delas no "campo político" e evidencia aspectos de lutas pessoais e coletivas na busca de ações para a promoção da dignidade e da cidadania. A originalidade da investigação está no ineditismo de como trata as questões postas com referência ao campo empírico, à ciência política, à epistemologia feminista e às hierarquias sociais. Portanto, pelo seu conteúdo, esta leitura é excelente fonte para refletir sobre as relações de gênero na política.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento5 de dez. de 2019
ISBN9788547336486
As Mulheres na Política Local: Entre as Esferas Pública e Privada

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    Pré-visualização do livro

    As Mulheres na Política Local - Claudia de Faria Barbosa

    Editora Appris Ltda.

    1ª Edição - Copyright© 2019 dos autores

    Direitos de Edição Reservados à Editora Appris Ltda.

    Nenhuma parte desta obra poderá ser utilizada indevidamente, sem estar de acordo com a Lei nº 9.610/98.

    Se incorreções forem encontradas, serão de exclusiva responsabilidade de seus organizadores.

    Foi feito o Depósito Legal na Fundação Biblioteca Nacional, de acordo com as Leis nºs 10.994, de 14/12/2004 e 12.192, de 14/01/2010.

    COMITÊ CIENTÍFICO DA COLEÇÃO CIÊNCIAS SOCIAIS

    Dedico este livro ao meu pai, Afonso Barbosa, por mostrar-me que a política deve existir para promover o bem coletivo, e à minha mãe, Corina Faria, por suas atitudes que demonstram a cada dia as diferentes maneiras de ser uma mulher empoderada, embora na invisibilidade.

    AGRADECIMENTOS

    Um trabalho nunca é feito sozinho. Sei o quanto recebi contribuições de instituições e pessoas no desafio de fazer uma investigação e publicá-la. Por isso, a gratidão nunca é o suficiente, frente às inúmeras colaborações recebidas, tornando impossível mencioná-las aqui, mas agradeço de forma especial:

    À minha orientadora do curso de doutorado, professora Vanessa Cavalcanti, a quem tenho imenso carinho, simpatia, reconhecimento e respeito, acrescidos de uma eterna gratidão. Aos professores doutores que participaram dos exames acadêmicos: Esther Quinteiro, Eustáquio Alves, Márcia Calazans, Mary Castro, Marta Zabaleta e Ana Alice Costa (in memoriam). E aos colegas da Ucsal, em nome de Fátima Di Gregório.

    Agradeço pela oportunidade a mim concedida às instituições: Programa de Pós-Graduação em Família na Sociedade Católica do Salvador; Núcleo de Pesquisa e Estudos sobre Juventudes e Identidades ; União dos Municípios da Bahia; Fundação de Amparo e Pesquisa do Estado da Bahia e ao povo brasileiro, que contribui com impostos revestidos no fomento à pesquisa.

    Aos colegas da União dos Municípios da Bahia, especialmente a Lúcia Carvalho, Marcelo Neves, Geraldo Santana, Gutemberg Cruz, Fabiano Chaves e Wilde Barreto. Ademais, agradeço aos prefeitos dos municípios do estado da Bahia, sobretudo, às prefeitas, que colaboraram com esta investigação: Maria Maia, Irismá Santos, Sandra Baldoino, Domingas Paixão, Tânia Yoshida, Valdice Castro, Iracy Araújo, Benvinda Silva, Sidélia Lemos, Norma Suely, Maria Quitéria, Tânia Portugal, Josefina Castro, Yhonara Freire, Rita de Cássia, Luciana Leão, Mariângela Borges, Ângela Cardoso, Chica Ribeiro, Ana Lúcia, Sandra Vidal, Gilcina Carvalho, Gerusa Laudano, Olga Cardoso, Rilza Valentim (in memoriam), Nenca Pinho, Fátima Nunes, Jailma Gama, Ioná Queiroz, Romildes Machado, Moema Gramacho, Raimunda Santos e Maria Aparecida. Elas confiaram a mim suas histórias, que agora cumpro a tarefa de fazer ecoar suas vozes e promover visibilidades para que o devir histórico possa pulsar, impulsionar e revolucionar potenciais latentes para a promoção e educação para e pelos direitos humanos.

    Por fim, agradeço a Afonso Barbosa, Corina Faria, Otacílio Faria, Clera Cunha, Cleonice Barbosa, João Batista e Lucas Faria, minha família, alicerce e sustento da minha caminhada!

    Mietta Santiago

    loura poeta bacharel

    Conquista, por sentença de Juiz,

    direito de votar e ser votada

    para vereador, deputado, senador,

    e até Presidente da República,

    Mulher votando?

    Mulher, quem sabe, Chefe da Nação?

    O escândalo abafa a Mantiqueira,

    faz tremerem os trilhos da Central

    e acende no Bairro dos Funcionários,

    melhor: na cidade inteira funcionária,

    a suspeita de que Minas endoidece,

    já endoideceu: o mundo acaba.

    Carlos Drummond de Andrade¹

    PREFÁCIO

    Escribo y hablo para dejar constancia histórica de fenómenos sociales relevantes que me ha tocado vivir, y de los cuales fui testiga, y muchas veces, autora y/o víctima. No me arrepiendo de nada.

    Marta Zabaleta²

    Assumir primeira pessoa em qualquer língua é sempre um passo importante. Assumo aqui tentando acompanhar também o mesmo processo realizado por Claudia de Faria Barbosa em suas trilhas educativas. Formar e construir, aprender e seguir fazendo, tomar a vida profissional (pública) e a pessoal (privada) como instrumentos de educar para cidadania e para e pelos direitos humanos. Eis aqui eixos que compõem a vida de três gerações de investigadoras e militantes. A primeira é a autora da epígrafe de abertura desse texto. Marta R. Zabaleta, argentina, feminista, senior lecture da Middlesex University (Reino Unido) sempre conclama ao colocar ideias raras e valer-se da educação como potencial instrumento modificador. A segunda, eu mesma, e a terceira, percorrendo concomitantemente essas duas gerações anteriores e já mapeando seu próprio percurso como educadora-investigadora-militante, a própria Claudia. Fazendo uma genealogia e convocando influências e matizes da formação, de textos lidos e relidos, de conceitos e da persistência, me coloco e também a Claudia como comparsas dessas abordagens. Aprendemos umas com as outras e fortalecemos caminhos.

    Lá se vai já mais de uma década de partilhas e convivência, de estímulos e escritas parceiras, de vermos filhos(as) e produção acadêmica crescerem. Claudia começou já na especialização certa aproximação e ganhou força em duas etapas subsequentes de formação continuada (mestrado e doutoramento), bem como mobilidade internacional (França, Portugal, Espanha) e extensão (aqui foram inúmeras as atividades e projetos). Acompanhei sua "occupy" de assento em salas de aula (no ensino superior dividindo disciplinas e ideias). Obrigada, companheira. No entanto, ao prefaciar essa obra não posso somente me ater ao caráter mais pessoal e ao ver crescer e florescer uma educadora competente e séria.

    Suas escolhas foram de envolvimento, militâncias e de uma investidura empírica e de práxis sobre mulheres e políticas. Transitou entre realidades acadêmicas e foi mapeando trilhas e olhares sobre a política da presença³, para em seguida, reforçar a noção de consciência de ocupar espaços, sejam privados e públicos.

    Os matizes da vida política em tempo presente trazem inúmeras abordagens e análises extremamente importantes, clamando por olhares inter/transdisciplinares e averiguando a complexidade e a historicidade de analisar/interpretar essa mundivisão multifacetada. Dentro do Programa de Pós-Graduação em Família na Sociedade Contemporânea da Universidade Católica do Salvador e das experiências do Núcleo de Pesquisa e Estudos sobre Juventudes e Identidades (Npeji/Ucsal), coordenado por 13 anos (2004-2017) pela Prof. Dr. Mary Garcia Castro e por mim, contando com uma centena de investigadores(as) cujo eixo maior versava sobre identidades, gêneros e cidadania, fundou e confirmou sua presença. Um dos objetivos do Npeji/Ucsal/CNPq é formar pesquisadores(as) e educadores(as) na temática e os resultados podem ser observados na produção científica, vistos e compartilhados na escritura que se apresenta também aqui como foco sobre Mulheres na Política Local.

    Tendo como referências baianas os trabalhos desenvolvidos por Ana Alice Costa e Dora Leal Rosa, ambas da Universidade Federal da Bahia, trouxe não somente reconhecimento pela produção acadêmica, como também percorrendo a história e a historiografia da participação de mulheres na esfera pública da administração local. Ambas estudiosas do tema não deixaram a política e gestão como não lugares. Ambas foram e são exemplos de enfrentamentos. Apropriando da experiência de outras mulheres, Claudia cruza fronteiras de áreas científicas e mescla com seriedade História, Política, Educação e Sociologia, não descuidando de leituras de clássicos(as) e contemporâneos(as) para sua revisão sistemática. O início está delimitado pelo querer realizar uma linha/projeto de investigação, não apenas obter descritores, mas transitar sobre histórias de mulheres, percebendo nuances e matizes de sujeitos que se movimentam entre esferas; que são colocadas à prova pelas escolhas.

    Descortinar mais que uma cartografia da política dos municípios baianos, enveredar por um processo de vulnerabilidades, de tomadas de decisão, de assumir cargos pelo passado, pelo presente e pelo futuro são alguns dos registros que Claudia traz nestas páginas que se seguem. Em nossas trajetórias como investigadoras, não poderiamos deixar de acrescentar que o estudo versaria não pelos resultados quantitativos de ocupar assentos, mas de um germinar do ingresso feminino na política como caminho possível de transformações. Esta escrita doutoral – revisada e transformada em livro – contempla uma delimitação mais específica e um processo de investigação na qual esteve envolvida nas duas modalidades (mestrado e doutorado): sujeitos do sexo feminino, interconectando categorias sociais e representações de gênero, classe, territórios, etnia/raça (diferentes das primeiras estudiosas já citadas anteriormente), bem como as relações familiares expressas e construídas a partir da intergeracionalidade e da força da tradição, especialmente nos municípios mais interioranos e de menor índice populacional.

    Usando de uma abordagem metodológica qualitativa, traz uma ênfase nas narrativas e histórias de vida. A organização deste livro estrutura-se desde a contextualização aos matizes e aos cruzamentos da vida privada e pública dessas mulheres e vale uma menção à criteriosa revisão de literatura interdisciplinar, com ênfase nas Ciências Sociais e Humanas e em investigações contemporâneas. Dentre resultados alcançados, as expressões sobre os porquês e os sentidos de terem decidido enfrentar candidaturas, cargos públicos e discursos: para além da presença, o não mais deixar as ausências invisibilizarem as lutas de e para mulheres.

    Nesse processo – e aqui ainda destaco uma característica basilar da autora –, contou com escritas conjuntas (ver Referências), trajetórias associativas e um constante aventurar-se também por mares nunca dantes navegados e, principalmente, ocupação de lugares, tais como salas de aulas e transportes (no ir e vir para o interior dessa gigante Bahia) – como aprendiz e como educadora, revelando-se potencial e reconhecidamente pelas(os) que com ela dividem esses espaços.

    Seu percurso não foi individual. Sua escrita sempre solidária e parceira foi se construindo e reforçando em linha eleita para pesquisa e ensino. Tal processo se consolida não somente na formação, mas na inclusão de aprofundamentos e novas investigações interdisciplinares, almejando sempre observar as transformações sociais e as formulações contemporâneas no que se refere às categorias. Coaduna-se a esse fenômeno o ritmo vertiginoso das mudanças sociais e políticas, em que viu chegar à Presidência da República brasileira uma mulher; acréscimos em números, mas também reduções e novas e fortes violências na bancada feminina; entrada de representações Lgbts; montagem e desmontagem de agendas e secretarias de políticas para mulheres. Bandeiras desfraldadas em tempos pretéritos e lutas ainda por construir um cenário mais democrático e mais justo.

    Como fator de complexidade, ainda fica a esperança e a convocatória: mais mulheres na política, com práticas feministas e representantes da diversidade, da pluralidade e de emergências sociais e identitárias (raça/etnias, territórios, classe). Agendas públicas por serem conquistadas e convocatórias para as ruas, como vimos no último Fazendo Gênero (Florianópolis, UFSC, 2017) e Marcha Mundial de Mulheres, ou na tomada da reitoria da Ufba por pessoas negras para ouvir Angela Davis, comunista, feminista, negra, militante de tantas causas. Ocupar assentos na política, para ética e para leituras.

    Salvador, agosto de 2018

    Vanessa Ribeiro Simon Cavalcanti

    Feminista, professora, historiadora, amiga

    Universidade Federal da Bahia – PPGNeim/UFBA e Universidade Católica do Salvador – PPGFSC/Ucsal

    APRESENTAÇÃO

    A desigualdade entre homens e mulheres é uma característica presente na sociedade e manifesta-se de forma mais visível nas esferas privada e pública. Nesse sentido, nesta publicação⁴ trago discussões sobre as mulheres, fruto de uma investigação sobre a atuação delas na política, segmento de um grupo antes não autorizado a mostrar-se na vida pública, pelo menos até a metade do século XX, por advir de uma cultura patriarcal, na qual elas foram relegadas ao espaço privado, da casa e da família⁵.

    A motivação para o desenvolvimento desta pesquisa possui bases na minha experiência no desenvolvimento de atividades profissionais na União dos Municípios da Bahia⁶ ao observar o comportamento e a atuação das prefeitas municipais⁷ e concretizou-se nos cursos de mestrado e doutorado no Programa Interdisciplinar em Família na Sociedade Contemporânea. A intenção é compreender problemas arraigados cultural e historicamente na política local, objeto de estudos que demanda debates e olhares mais atenciosos do que somente ficar na constatação da ínfima presença das mulheres nos espaços de poder da política representativa.

    Dentre as questões investigadas, busquei analisar como as prerrogativas de gênero perpassam por interesses pessoais e familiares na participação pública, pelo fato das mulheres viverem paradoxos nos espaços privados e públicos. Em condições e perspectivas diversas, há aquelas que saem de seus cotidianos com duplas jornadas, chefias familiares⁸, investidas de vontade de superar a imagem criada para se aventurar na política com desejo de transformar o mundo. São sujeitos que acreditam na possibilidade de sensibilizar-se e responsabilizar-se pelos problemas coletivos, sem a permanência do papel, função e divisão sexual do trabalho⁹ representativo que confirmam a ideia de cuidadora natural. Por outro lado, há aquelas que, por motivações diversas, se aventuram nessa ação em um mundo ainda dos homens,¹⁰ sem necessariamente conscientizarem da relevância de suas atuações, nas esferas pública e privada.

    Trata-se, portanto, de uma investigação sobre os entraves e desafios vividos pelas mulheres na política. A reflexão recai sobre os obstáculos enfrentados entre a ideologia de mudança e a manutenção de um sistema advindo por tradição e gerações. Uma verificação sobre o sentido de acesso à política por essas mulheres implica em pensar a produção e práxis¹¹ cotidiana. Sob a ótica das esferas privada e pública presta atenção especialmente no contexto da política representativa nos municípios, nesse caso no estado da Bahia, lócus da investigação.

    O gráfico a seguir demonstra a evolução do número de mulheres a governarem os municípios do estado da Bahia desde 1936, quando pela primeira vez uma mulher assume a prefeitura de um dos quatrocentos e dezessete municípios baianos. Os números são pouco expressivos, mas confirmam a evolução da presença daquelas que enveredam pela política local e enfrentam situações de violências, desafios e dificuldades.

    gráfico 1 – Quantidade de Prefeitas dos municípios da Bahia 1936 – 2016

    Fonte: elaboração da autora

    O recorte da pesquisa em termos de grupos de informantes foram as mulheres eleitas para o cargo de prefeita municipal no pleito de 2008, para a gestão 2009-2012, portanto, a pesquisa empírica se deu com a colaboração dessas mulheres, ocupantes do cargo majoritário de prefeitas. O intuito é que participassem do universo completo todas as prefeitas do período, entretanto algumas não puderam participar. Foram entrevistadas trinta e seis da totalidade de quarenta e oito prefeitas à época. Vale a assertiva de que as prefeitas colaboraram de muitas formas: contaram suas histórias, expuseram suas dificuldades e enfrentamentos. Quanto a não participação, os silêncios também falam. Os pressupostos para qualquer recusa ao convite, nem sempre denotam falta de comprometimento, medo de se sujeitar a situações de exposição de ideias e atitudes e confrontar alicerces frágeis de militâncias. Os motivos são individuais e não cabe analisá-los, sobretudo, porque as colaborações foram de relevância e prestadas com a intenção de ajudar a compreender o fenômeno das mulheres no âmbito do poder público local da política representativa.

    O critério estabelecido para fazer parte da investigação foi de que a prefeita estivesse no exercício do cargo no período pesquisado. Dentro desse universo ficaram de fora aquelas que protelaram a participar, considerando que muitos sujeitos, na condição de figuras públicas, não se negam ao convite, mas também não se deixam ser localizados, contatados e não retornam os recados e mensagens deixados nos gabinetes e, até mesmo, com parentes, além de correspondências, correios eletrônicos e mensagens nos telefones¹².

    A coleta de dados privilegiou a dinâmica das entrevistas em profundidade para examinar as questões subjacentes às representações sociais advindas de suas próprias construções, como também sobre como imaginam que as pessoas pensam sobre suas posturas e atuações. Durante essa fase, emergiram da fala das interlocutoras diversas questões sobre a atuação das mulheres no lócus público e os conflitos individuais vividos na construção da democracia.

    Após contatos para a pesquisa e autorização da coleta de dados junto às gestoras convidadas a participar, elas foram informadas acerca do trabalho. A autorização foi obtida diretamente junto às entrevistadas. O objetivo, no caso específico da entrevista é preservar a espontaneidade e acompanhar os meandros do pensamento das protagonistas. Entrementes, os sentidos transformados em técnica para coleta e aproximação com os sujeitos históricos atuantes e definidores de uma trama contemporânea de longa duração. Apesar da escolha desses sujeitos ser determinada pela posição que ocupam, a decisão das participantes foi motivada também pela facilidade de acesso, horário, disponibilidade e convite para a visita ao município, quando a tentativa de um encontro na capital foi frustrada. Antes de cada entrevista as prefeitas foram informadas novamente sobre a pesquisa, o caráter sigiloso da identidade e a confidencialidade, com o uso de nomes fictícios, quando assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido para a participação.

    A obra está organizada em três capítulos, os dois primeiros trazem a base teórica da discussão sobre a ciência política e a epistemologia feminista e o terceiro evidencia a investigação empírica. O primeiro trata da luta pela cidadania das mulheres como um percurso de longa duração, o segundo discute e analisa o pensamento político contemporâneo e o terceiro capítulo trata sobre as vivências das mulheres na política local. O cotidiano¹³ é elucidado com detalhamento das trajetórias, das famílias e do processo de inserção na vida pública.

    A ênfase recai sobre atuações e práxis cotidianas das prefeitas e são apresentados dados sobre as carreiras pessoais e profissionais, quando elas falam sobre as adversidades da vida privada e pública, estratégias de campanha e obstáculos enfrentados em disputas eleitorais com aproximações sobre a gestão e as ações exercidas no âmbito público na política. A abordagem se dá sobre as categorias de análise, nas quais o estudo empírico é evidenciado e as problemáticas são expostas nos casos múltiplos.

    Justifico a investigação pelo fato de que as pesquisas sobre as práticas políticas, relações de gênero na esfera pública e comportamentos familiares como objeto de estudo interdisciplinar despertam interesse dos pesquisadores sociais pela complexidade apresentada. Ademais, há demandas para repensar a dinâmica social que engendra múltiplas possibilidades em tempos de mudanças. As transformações nas relações e nos papéis de gênero intensificam a necessidade de pesquisas sobre o fenômeno social das mulheres no cenário político, movimento de modernização da vida privada, bem como, atuação delas na vida pública.

    Por fim, trago à tona algumas respostas às questões da pesquisa e sínteses possíveis, nas quais o foco recai na análise das variáveis a partir do objetivo proposto. Se as mulheres são o diferencial e se fazem presentes no cenário político brasileiro, especialmente no nordestino, percebo que o micro espaço em estudo é significativo na medida em que influencia e caminha para uma crítica mais ampla do mundo social, em vista da mudança e quebras de paradigmas nos modos de vida e de ação.

    LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

    Sumário

    ASPECTOS INTRODUTÓRIOS

    CAPÍTULO I

    A LUTA DAS MULHERES PELA CIDADANIA 

    1.1 AS MULHERES NA ESFERA PÚBLICA: UM PERCURSO DE LONGA DURAÇÃO

    1.2 O VOTO DAS MULHERES NO BRASIL

    1.3 OS ESTUDOS SOBRE AS MULHERES NA POLÍTICA: REVISANDO A LITERATURA 

    1.4 MOVIMENTOS DE MULHERES: PLURALIDADE IDEOLÓGICA

    1.5 O PODER E O EMPODERAMENTO DAS MULHERES

    CAPÍTULO II

    PENSAMENTO POLÍTICO: PERMANÊNCIAS E RUPTURAS

    2.1 PRESSUPOSTOS FILOSÓFICOS E EPISTEMOLÓGICOS SOBRE A POLÍTICA

    2.2 POLÍTICA DE IDEIAS E POLÍTICA DE PRESENÇA

    2.3 A POLÍTICA E O CAMPO POLÍTICO

    2.4 DEMOCRACIA: OS PARADOXOS DA IGUALDADE E LIBERDADE

    2.5 AS ESFERAS PÚBLICA E PRIVADA E A CONSCIÊNCIA DE SI E PARA SI

    2.6 POLÍTICAS PÚBLICAS COM ENFOQUE DE GÊNERO 

    CAPÍTULO III

    AS MULHERES NA ESFERA PÚBLICA: CENÁRIOS E SUJEITOS 

    3.1 REMINISCÊNCIAS E SUPERAÇÕES DE SITUAÇÕES VIVIDAS

    3.2 O LEGADO FAMILIAR E A VINCULAÇÃO ENTRE SEUS MEMBROS

    3.3 PERCURSOS E INVESTIDURAS DE AÇÕES NO CAMPO PROFISSIONAL E POLÍTICO

    3.4 TEMPO E COTIDIANO VIVIDO NA ESFERA PÚBLICA

    3.5 ESPAÇOS DE PODER E FRENTES DE BATALHA: VIOLAÇÕES DE DIREITOS? 

    3.6 AS CANDIDATURAS: ESTRATÉGIAS E OBSTÁCULOS EM  DISPUTAS ELEITORAIS

    CONSIDERAÇÕES FINAIS

    REFERÊNCIAS

    APÊNDICE

    ASPECTOS INTRODUTÓRIOS

    O pensamento e a obra são duas atividades diferentes que nunca coincidem completamente: o pensador que desejar dar a conhecer ao mundo o conteúdo de seus pensamentos deve, antes de tudo, parar de pensar e lembrar-se de seus pensamentos. Neste, como em todos os casos, a lembrança prepara o intangível e o fútil para sua materialização final; é o começo do processo da obra e, como o exame e o artesão faz do modelo que lhe guiará a obra, o seu estágio mais material.

    Hannah Arendt¹⁴

    O objeto deste livro não se limita à atuação das mulheres na política, mas a transposição, o caminho que percorrem em um momento de ruptura de papeis, quando se introduzem no desempenho de atribuições na esfera pública por meio da política representativa. O pressuposto é que, apesar da possibilidade de as mulheres estarem presentes nas esferas privada e pública, serem chefes de famílias, atuarem em duplas jornadas de trabalho, elas encontram obstáculos para serem reconhecidas nos espaços de poder e decisão e sofrem discriminações, mas também discriminam quando estão em lados opostos.

    As questões geradoras investigadas são orientadas pelas perguntas: como essas mulheres chegam ao cargo na política representativa local?; será que o fato de haver representações femininas na política nos últimos anos vem de um processo de autonomia, tomada de consciência e empoderamento¹⁵ou vivem os dilemas da reprodução social?; aquelas que enfrentam os desafios conseguem reconhecer que o seu empoderamento deve ser utilizado em favor de pessoas que vivem em condições de extrema pobreza e vulnerabilidade, sobretudo mulheres e crianças, utilizando suas influências para promover melhorias em suas vidas cotidianas?; hasteiam bandeiras acerca dos direitos humanos e que interfiram diretamente na construção de um mundo em prol de justiça e liberdade sociais?; será que buscam transformar práticas culturais discriminatórias em uma bandeira de luta contra a violência doméstica, familiar e de gênero, com consciência e exercício da cidadania, nos espaços público e privado, fazem valer o princípio da não discriminação?; a douta ignorância e a ecologia dos saberes¹⁶ e ¹⁷ são utilizadas para um germinar das ações afirmativas?

    Esses questionamentos induzem ao problema da investigação que se insere na tentativa por compreender aspectos fundamentais das formas de inserção na política local e as relações familiares, sociais e de gênero que norteiam o sistema democrático sobre o qual se instaura as instituições políticas. Com o propósito de ultrapassar a visão essencializada e naturalizada do papel feminino no espaço político, este estudo tem como objetivo geral analisar como se dão as relações entre o público e o privado das mulheres que atuam na política, com a perspectiva de compreender como elaboram a consciência de si e para si.

    De forma específica, discuto na tentativa de compreender como as mulheres investidas de um cargo político na administração local exercem a cidadania nos espaços público e privado, se promovem o princípio da não discriminação; se conseguem autonomia e/ou empoderar-se no sentido de tomar atitudes e levantar bandeiras de luta contra as segregações, violências e vulnerabilidades; conhecer as trajetórias e motivos que as levam a inserir no campo político e enfrentar os desafios e compensações da esfera pública. Ademais, articular teorias e domínios das ciências sociais e humanas de forma a alargar o campo das reflexões sobre representatividade política e representações sociais, embasadas em aspectos cotidianos, científicos e interdisciplinares. Aliado ao estudo de caso está a análise de conteúdo que ajuda no processo de decompor e analisar as entrevistas consistindo em

    um conjunto de técnicas de análise das comunicações visando obter, por procedimentos, sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens, indicadores [...] que permitam a inferência de conhecimentos relativos às condições de produção/recepção (variáveis inferidas) destas mensagens¹⁸.

    De acordo com a referida autora, trata-se de um conjunto de instrumentos metodológicos sutis em constante aperfeiçoamento que se aplicam à análise de mensagens variadas, tendo como tarefa mostrar a realidade, com base na dedução por

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