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Alice
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E-book546 páginas8 horas

Alice

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Sobre este e-book

Minha vida nunca foi um palco de grandes espetáculos, eu não tenho muita coisa a dizer antes do que realmente a mudou num todo, mas acho que existem coisas importantes lá atrás e sei que essas coisas podem explicar outros acontecimentos mais recentes... É o que penso pelo menos... É o que vou tentar fazer.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento3 de fev. de 2020
Alice

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    Alice - Karla Nunes

    Alice

    O Outro Lado da História

    1ª EDIÇÃO

    2019

    Série Depressão

    Título

    Alice – O Outro Lado da História

    Copyright Karla Nunes, Rio de Janeiro, 2019

    Todos os direitos reservados.

    Proibida a reprodução, no todo ou

    em parte, através de quaisquer meios.

    Os direitos morais do autor foram assegurados.

    Registrado no Escritório de Direitos Autorais - RJ

    sob o número: 564.369

    livro: 1.076  Folha: 427

    autor(a): Karla Lds

    29 de junho de 2012

    1 – Literatura brasileira

    2 – Romance

    3 – Vampiro

    Revisor: Eduardo Moraes,

    Estudante de Jornalismo

    Autora: Karla Nunes

    Agradeço a Deus em primeiríssimo lugar, pois sem Ele nada do que foi feito viria a se tornar realidade.

    Agradeço aos que, com muito carinho e interesse, leram e acompanharam a criação desta obra.

    Agradeço aos meus familiares e amigos que, cada um a seu modo, me ajudaram a dar vida a esta obra e torná-la um sonho possível.

    Agradeço também a você, leitor, que mostra-se interessado neste trabalho.

    Você é a parte mais importante de todo o processo.

    Enfim, muito obrigada a todos. Espero que gostem.

    Karla Nunes

    SUMÁRIO

    01- PASSADO      ___                              06

    02- ANTES                                    23

    03- DE PROBLEMÁTICA À MOCINHA                  40

    04- NOITE LONGA                              57

    05- QUERER OU NÃO QUERER                  74

    06- UM PEDIDO                                    92

    07- ELE TAMBÉM SENTE                        108

    08- PAIXÃO                                    125

    09- REVELAÇÕES                              142

    10- DECEPÇÃO                                    158

    11- REENCONTRO                              174

    12- SENTIMENTOS                              191

    13- CASAMENTO                              208

    14- COMPLETA                                    225

    15- DESCONFIANÇA                              241

    16- CONFUSÕES                              258

    17- TRANSFORMAÇÃO                              274

    18- O INÍCIO                                    291

    19- A CÂMARA                                    308

    20- FARRA                                    324

    21- SURPRESA                                    341

    22- O RETORNO                              358

    23- ABSTINÊNCIA                              374

    24- SINCERIDADE                              391

    25- STEFFANY                                    408

    26- ENCURRALADA                              425

    27- MENTIRAS                                    442

    28- ANOITECER                                    459

    29- O COMEÇO DO FIM                         476

    30- BUM                                          493

    31- RESSURGINDO                              510

    32- FIM                                          527

    01

    PASSADO

    Minha vida nunca foi um palco de grandes espetáculos, eu não tenho muita coisa a dizer antes do que realmente a mudou num todo, mas acho que existem coisas importantes lá atrás e sei que essas coisas podem explicar outros acontecimentos mais recentes... É o que penso pelo menos... É o que vou tentar fazer.

    Chamo-me Alice e recebi esse nome por causa da minha tataravó, pois essa era uma tradição de família, onde toda primeira menina que nascesse iria receber esse nome e um pingente em homenagem a ela, mas, sinceramente, isso não queria dizer nada pra mim, a única serventia daquele pingente era a lembrança que ele me trazia do meu pai... Esse era o maior valor que aquele objeto tinha pra mim.

    Vivi a maior parte de minha vida no interior do Estado onde nasci, vivia somente com os meus pais, pois não tinha irmãos, era filha única. Estudava em uma ótima escola, tinha uma vida razoavelmente tranquila, não precisava me preocupar com nada, apenas com os meus estudos e com os meus problemas, tanto os pessoais quanto os normais de uma adolescente.

    Eu não tinha uma relação muito boa com o meu pai, ele era muito rígido, vivia me proibindo de fazer o que eu queria, como ir a festas, por exemplo, dormir na casa de amigas, não que tivesse muitas, mas enfim... De namorar... Não que houvesse muitas opções também, mas isso me deixava muito chateada porque via minhas amigas vivendo e curtindo enquanto tinha que ser a santa e não achava isso justo, não queria fazer nada demais, queria apenas ser uma adolescente normal, mas pro meu pai o normal não era bom e isso me chateava muito... Foram várias as vezes em que brigamos por essas coisas... Arrependo-me muito disso.

    Saímos da nossa Cidade pequena e fomos pra outra diferente, pois, a nova era grande, assim como uns chamam. Lá quase terminei o colegial, teria sido lá se não fosse pelos contratempos da vida, mas foi lá onde ingressei na faculdade de biologia... Não foi exatamente da forma que sonhava, mas foi o melhor que pude fazer dentro das condições que me surgiram.

    Não sei o porquê, mas sempre me interessei por essa matéria, achava fascinante como o corpo humano funcionava e tinha o desejo de conhecer mais, de me aprofundar mais naquele assunto, mas era uma disciplina um tanto quanto cara e eu não tinha mais o meu pai pra me ajudar a pagar... Enfim, nós saímos de nossa Cidade por causa do trabalho do meu pai e eu odiei, pois ia perder todas as minhas amizades por causa disso... Como se fossem muitas... Mas a questão era que a distancia era grande e só o telefone não era suficiente... Ou isso, ou não eram verdadeiras... Opto pela segunda opção.

    Lembro-me da dificuldade que foi quando eles me contaram o que iam fazer, cheguei a gritar em discussão, pois não queria ter saído de lá, já que todos que conhecia estavam lá e não tinha facilidade em fazer novos amigos, mas, por causa da mudança, eu seria obrigada a tentar fazer, o que pra mim era horrível, era como me expor a cães raivosos... Sei lá, só sei que pra mim era assustador.

    Em minha nova escola, depois do período de adaptação, que não foi nada fácil, eu o vi pela primeira vez e aquilo foi o suficiente pra me sentir apaixonada, pra querer namorá-lo... Bruno... O menino novo do penúltimo ano da escola, que era uma série acima da minha.

    Ele tinha vindo transferido, assim como eu havia sido num tempo antes e todas as meninas se derretiam por ele, mas não sei se pela beleza, ou por ele fazer parte do time da escola... Na verdade acredito que fosse pelos dois, elas eram muito interesseiras.

    É engraçado parar pra me lembrar dessas coisas, fazia algum tempo que não pensava nisso, normalmente tentava não pensar, ainda mais por causa dos meus pais porque não ter um bom relacionamento com eles não significava dizer que gostaria que acontecesse tudo o que aconteceu conosco, não sinto apenas por ter ficado sozinha, sinto principalmente pela saudade que tenho deles... Quando somos adolescentes não pensamos em muitas coisas e principalmente em nossos pais... Hoje não posso dizer que concordo com a rigidez do meu pai, mas posso dizer que sinto falta, aquela era a forma dele demonstrar que me amava... Nunca mais o poderá fazer.

    Acho que estou sendo um pouco superficial... Acho que é porque não é fácil tocar nesse assunto... Pra mim, nunca foi fácil nem me lembrar disso, quanto mais escrever a respeito... Sinto-me culpada pelo o que houve, eles não tinham que estar na rua àquela hora... Eu não tinha que estar na rua àquela hora, não era pra ter saído de casa, mas fui teimosa e colhi o que plantei... Colhi da pior forma possível.

    Fiz amizade com uma menina muito estudiosa chamada Steffany, a quem chamava de Steff, ela foi a primeira pessoa que falou comigo na nova escola e era um pouco excluída também por gostar de estudar enquanto os demais só pensavam em zoação. Nossa amizade se tornou muito forte, ela não tinha pais, foi criada pelos avós e não tinha irmãos... Assim como eu, que também não tinha e, depois que perdi meu pais e passei por toda a minha enrolação com o Bruno, ela foi um grande apoio na minha vida. Por sorte nos interessávamos pela mesma matéria, o que nos uniu novamente na faculdade, foi ali que nossa relação se estreitou, embora já existisse uma forte ligação antes.

    Tudo bem... To tentando entrar no assunto, mas ta complicado, acabei de ficar quase cinco minutos olhando pro papel sem conseguir mover minha mão... Não gosto dessas coisas... Nunca fui muito boa com essa coisa de escrever sobre a minha vida, nunca tive um diário, mas enfim, aqui estou e preciso tentar fazer isso ser melhor do que está sendo, até porque, é mais fácil escrever do que falar e... Enfim, depois entro nesse detalhe, uma coisa de cada vez é melhor.

    Eu estava saindo de uma aula e indo em direção ao meu armário, Steff tinha se despedido de mim na porta e dito que iria no banheiro e que me encontraria do lado de fora, os meninos iam treinar e nós tínhamos um tempo livre, por isso íamos aproveitar pra assisti-los... Obviamente eu ia por causa do Bruno e ela porque gostava de vê-los mesmo. – Riu. – Quando fechei a porta do meu armário cheguei a dar um pulo pra trás de susto, pois, Bruno estava encostado num dos armários que se seguia após o meu, de braços cruzados, sorrindo e olhando diretamente pra mim.

    – Não queria te assustar. – Disse ele enquanto se abaixava pra me ajudar a catar minhas coisas que haviam caído no chão.

    Senti-me extremamente envergonhada enquanto o meu coração pulsava muito rápido dentro de mim, tanto que cheguei a sentir uma leve tontura, acho que por falta de oxigenação no cérebro, ou coisa do tipo, só sei que fiquei muito nervosa, ainda mais porque, enquanto catava as folhas que se espalharam, ele pôs uma das mãos sobre a minha como se tivesse sido sem querer, como se sua intenção fosse pegar o mesmo papel que eu estava pegando.

    Olhamo-nos e recolhi minha mão no susto enquanto dizia:

    – Não precisa se preocupar, eu recolho.

    Ele sorriu pra mim e aquilo fez com que todo o meu corpo se arrepiasse. Meus olhos ficaram fixos em seus lábios, era quase como uma hipnose, simplesmente não conseguia desviar meu olhar, por mais que realmente estivesse tentando porque, por dentro, estava gritando comigo mesma.

    – A culpa foi minha, não queria te assustar e não me importo em ajudar, ainda mais ajudar a você. – Disse ele.

    Meu coração palpitou mais forte naquele momento... Ou ele era muito bom nisso, ou eu é que era patética demais quando o assunto era ele... Sinto-me mal só em lembrar.

    – Você tem aula agora? – Perguntou a mim ele enquanto nos levantávamos.

    – Na verdade não... – Sorri sem graça. – to indo lá pra fora encontrar uma amiga minha, nós vamos assistir o treino de vocês.

    Ele sorriu largamente e levantou as sobrancelhas como se estivesse surpreso e perguntou:

    – Sério mesmo?! Se quiser posso te acompanhar até lá então.

    Nossa... Aquilo era mais do que tudo que já havia acreditado ser possível de acontecer entre nós dois... eu era muito ingênua, talvez por ter crescido em Cidade pequena, ou por meu pai ter me mantido presa demais, mas ele realmente conseguiu me iludir com o seu jeito e sua lábia... ele sabia ser gentil quando queria... Acho que foi toda essa enrolação e galanteio que me deixou ainda mais apaixonada por ele antes do que ele fez comigo.

    Quando cheguei do lado de fora acompanhada por ele de imediato Steff arregalou os olhos ao nos ver e eu lhe fiz careta indicando surpresa enquanto Bruno dizia:

    – Vai ter uma festa na casa de um dos rapazes do time, é quase uma despedida pela formatura, os pais dele não vão estar na Cidade e eu queria saber se você não quer ir comigo... Você topa?

    Na mesma hora me lembrei do tipo de pai que tinha e o meu semblante caiu porque aquela era uma grande oportunidade de poder me aproximar de Bruno e, sem dúvida, o meu pai não iria permitir que eu fosse a qualquer festa na casa de quem quer que fosse, ele mal me deixava ir fazer trabalho escolar na casa da Steff, quanto mais ir a uma festa onde só iria ter pessoas da minha idade, mas eu precisava encontrar uma solução e não queria que ele soubesse da minha dificuldade, então respondi:

    – Não sei se vou poder, eu preciso estudar...

    Bruno me interrompeu pulando na minha frente e dizendo:

    – Ah! Não faz isso! Se você não for eu também não vou.

    Seus olhos brilhavam junto com o seu sorriso... Eu o achava lindo... Naquele momento me senti zonza porque o rosto dele parecia iluminado e nunca tinha visto o Bruno falando assim com nenhuma outra garota, e esse era mais um incentivo à minha ilusão.

    – Quando é mesmo? – Perguntei com o coração apertado.

    – Daqui a três semanas.

    Tossi pra recobrar a consciência, desviei o meu olhar de sobre ele pro nada e disse:

    – Vou ver o que consigo fazer.

    Ele me beijou o rosto e, enquanto se afastava correndo, disse:

    – Garanto que você vai adorar!

    Fiquei paralisada exatamente onde estava, não conseguia dar um passo a frente... Era como se ainda pudesse sentir seus lábios em meu rosto... Ele havia me chamado pra uma festa... Isso era inacreditável... O garoto dos meus sonhos estava me chamando pra ir a uma festa com ele, como sua companhia, eu não conseguia acreditar, mas era real.

    Uma alegria imensa começou a crescer dentro do meu peito e um largo sorriso brotou no meu rosto, me sentia histérica. Corri na direção de Steff e a abracei contando-lhe o que Bruno havia me proposto... Éramos duas histéricas e ficamos dando pulinhos idiotas até que ela me segurou, me olhou e perguntou:

    – Como vai fazer pro seu pai deixar você ir?!

    – Não é hora de pensar na parte ruim, Steff! – Reclamei sorrindo. – O que importa é que ele me chamou pra ir nessa festa com ele! – Pus a mão no rosto e, quase chorando, disse. – Eu nem consigo acreditar.

    Ela me tomou pelo pulso e, enquanto me puxava, disse:

    – Vamos logo senão eles vão começar sem a gente pra assistir!

    Eu havia ficado tão emocionada com aquilo que não conseguia pensar em mais nada. Quando cheguei em casa não dei a menor atenção pra minha mãe e fui direto pro meu quarto, queria ficar sozinha com a minha imaginação e com aquela alegria dentro do peito, Bruno era o garoto dos meus sonhos, ele era tudo o que mais desejava num rapaz, sem dizer que todas o queriam, mas tinha sido a mim que ele havia chamado pra ir a festa... Eu era patética.

    Nos dias que foram se seguindo Bruno continuou jogando o seu charme sobre mim e isso chamava a atenção de todos da escola, eu podia notar a inveja estampada no rosto de diversas meninas, era como se houvesse um ponto de interrogação na testa delas, deviam se perguntar sobre os motivos que o fazia estar me dando confiança e isso me fazia me sentir o máximo... Boba... Eu era apenas mais uma idiota de sua listinha, mas ele era mais do que tudo pra mim... A cada momento eu o idolatrava mais.

    Finalmente chegou o grande dia da tal festa e por sorte eu tinha uma roupa pra vestir... Como não costumava frequentar festas, as pessoas não conheciam tudo que eu tinha no armário, isso me facilitou porque, qualquer peça que vestisse poderia passar como uma roupa nova, até porque elas praticamente eram realmente novas por quase nunca usá-las... Quase nunca mesmo.

    Esperei que meus pais fossem dormir, fui até o quarto deles e, com muito cuidado, peguei o chaveiro da casa que estava dentro da calça largada sobre uma cadeira... Meu pai sempre fazia isso, chegava e largava sua roupa em qualquer canto, depois minha mãe vinha e recolhia enquanto reclamava por ele ser tão relaxado.

    Saí da casa e lá estava Bruno em seu carro me esperando conforme havíamos combinado.

    – Por que não me deixou tocar a campainha? – Perguntou sorrindo.

    – Você quer ou não ir a essa festa?

    Perguntei desconversando e tentando sorrir. Bruno sorriu largamente, se esticou e destrancou a porta do lado do carona, entrei, ele engatou a marcha e arrancou com o carro.

    Steff não havia sido convidada, então não poderia estar lá e isso me deixava ainda mais nervosa porque não iria haver nenhum amigo no local, ou seja, todas as pessoas que conhecesse seriam apenas conhecidos de vista, nada muito intimo, o único com quem estava tendo maior contato era com o Bruno, isso porque ele ficava atrás de mim pelos corredores da escola... o que eu adorava.

    Nunca havia entrado numa festa, aquela foi a primeira vez... Senti-me um peixe fora d’água, mas achei muito interessante. A casa tava cheia e a música tava alta, eles dançavam e bebiam, tudo bem típico dos filmes que costumava assistir.

    – Quer beber alguma coisa?! – Me perguntou Bruno tentando se fazer escutar em meio ao som alto e eu apenas confirmei com a cabeça. – Já volto então.

    A pior coisa que poderia ter feito era ter ido naquela festa... Steff não era a favor, um tempo depois que havia lhe contado sobre o convite de Bruno, ela disse não estar confiando nas intenções dele, disse ter visto ele de risinhos com os colegas quando me avistavam de longe, mas eu não quis saber, não lhe dei ouvidos... Antes tivesse feito.

    Bebi e dancei até que, me sentindo meio zonza, comecei a cambalear pra longe da rodinha de pessoas onde estava... É incrível como agora consigo me lembrar mil vezes melhor do que houve naquela noite, mas não consigo saber se foi posto algo na minha bebida pra eu ter ficado tão zonza como fiquei porque não conhecia o gosto das coisas e não sei o que bebi exatamente pra poder fazer algum comparativo... enfim, antes não lembrava por causa do álcool, mas agora consigo me lembrar perfeitamente bem.

    Bruno me segurou pela cintura e passou meu braço por cima de seu ombro enquanto dizia:

    – Vem cá, vou te ajudar a andar.

    Ele me levou pro andar de cima, acho que pro quarto do filho dos donos daquela casa. Desabei sobre a cama do garoto, tudo girava pra mim, não me sentia nada bem, pelo contrário, nunca tinha sentido aqui, eu simplesmente fiquei muito mal e num espaço muito curto de tempo.

    Bruno deitou a metade de si sobre mim se apoiando em seu cotovelo.

    – Eu preciso ir pra casa. – Tentei dizer.

    – Shhii... Preciso te dizer algo. – Sussurrou ele.

    Eu sentia uma de suas mãos alisando o meu rosto enquanto ele dizia aquilo pra mim. Abri os olhos e o seu rosto estava extremamente próximo ao meu, o que fez meu coração palpitar mais acelerado do que já estava... Eu estava mal, mas não teria como não me lembrar daquele momento.

    – O que você quer...

    Ele calou a minha boca pondo a ponta de dois de seus dedos sobre os meus lábios enquanto fazia novamente o som para que eu ficasse quieta.

    – Acho que uma atitude deve dizer melhor o que eu quero te dizer.

    Foi naquele momento que me beijou.

    – Quero namorar com você, Alice... – Sussurrou no meu ouvido. – Você aceita namorar comigo?

    – Aceito. – Foi patético, mas eu realmente me senti nas nuvens.

    Sinto raiva de mim mesma desde aquele dia, pois não devia ter ido naquela festa, não devia ter bebido, na verdade eu não devia ter achado que o Bruno era um cara legal, fui uma completa idiota, acreditei nas declarações de amor que se seguiram, mas não sei se pela bebida, ou se pela paixonite aguda que havia dentro de mim, só sei que naquela noite, naquele quarto, ele conseguiu o que queria e eu me odiei por isso.

    Acordei um bom tempo depois com um cobertor sobre mim e com muita dor de cabeça, olhei no relógio e já era muito tarde, por isso levantei desesperada, mas rapidamente me contive porque só havia o cobertor sobre o meu corpo... foi quando me lembrei, vagamente, sobre o que tinha acontecido e quase entrei em desespero.

    Quando cheguei no andar debaixo e fui ao encontro do Bruno, ele estava entre seus amigos e ria muitíssimo, a festa ainda estava rolando e havia muita gente e muita música... Todos me olharam... Não era um olhar comum e eu só entendi quando ele, sorrindo pra mim, disse em alta voz:

    – Foi mais fácil do que eu pensei que seria.

    Os demais caíram na gargalhada enquanto uns me zoavam e me faziam propostas indecentes na frente dos demais... eu apenas olhava pra ele, não queria acreditar no que estava acontecendo e no quanto havia sido idiota em ter acreditado nele... Respirei fundo... Precisava sair dali com um pouco de dignidade, por isso forcei um sorriso debochado pro Bruno, olhei pros demais e, enquanto dava-lhes as costas, disse:

    – Nem foi tão bom assim.

    Eu os ouvi gargalharem e o zoarem enquanto me dirigia pra saída daquela casa... Tudo o que mais queria era ir embora dali, mas enquanto caminhava sobre o gramado em direção a calçada Bruno me puxou pelo braço perguntando:

    – Como assim não foi tão bom assim, garota?! Ficou doida!

    Eu o empurrei e disse:

    – Você se acha o máximo, não é, garotão?! Volta pra sua festinha idiota, com os seus amigos idiotas e nunca mais olha na minha cara!

    – Você tá despeitada, isso sim!

    – Não enche, garoto! Tenho mais o que fazer do que perder mais do meu tempo com você!

    Novamente lhe dei as costas e voltei a caminhar.

    – É você quem sabe, sua maluca! – Gritou ele enquanto me afastava.

    Eu chorava pelo caminho de volta pela vergonha que estava sentindo, trazendo em mim as poucas lembranças que tinha a respeito do que havia acontecido... Meu desejo era sumir... Não queria ver ninguém... Não queria encarar o meu pai e eu sabia que Steff ia perguntar a respeito, mas não estava com coragem de contar e nem de ir à escola no dia seguinte, já que a maioria dos que estavam lá estudavam no mesmo lugar.

    Quando cheguei em casa notei que a porta estava destrancada, mas não fazia sentido porque eu a havia trancado quando saí, então, sem os sapatos nos pés, subi as escadas devagar com receio de acordar alguém, ou de haver alguém acordado... Era tudo o que eu não precisava naquele momento, mas, sinceramente, me arrependi desse pensamento porque, na verdade, pensando a respeito disso hoje, aquilo era tudo que queria que tivesse acontecido.

    Meus pais não estavam no quarto deles e não havia som nenhum pela casa, o que me preocupou muitíssimo, então os procurei pelo andar de cima, mas não estavam lá, desci as pressas pelas escadas e olhei tanto na cozinha, como na sala, mas não havia nenhum dos dois lá... corri até a garagem... O carro também não estava lá.

    Meu coração parecia que ia saltar pra fora do meu corpo quando passei pela porta da frente novamente e o telefone começou a tocar.

    – Alô. – Atendi tensa.

    – Senhorita Alice? – Perguntou uma voz masculina.

    Sentei-me no sofá e, quase sussurrando por causa do meu estado emocional, falei:

    – Sou eu.

    Era como se já esperasse pelo que estava por vir, a sensação de que alguma desgraça havia acontecido era tremendamente forte dentro de mim, como se fosse uma premunição.

    – Desculpe ligar por  essa hora, ainda mais com a notícia que estou pra lhe dar, eu sou o policial Lopez... – Policial, dizia ele.

    Meu coração pareceu ter parado de bater por um segundo... meus pais não estavam em casa, a casa estava destrancada, o carro não estava na garagem e agora um policial estava ligando pra mim querendo dizer que não tinha uma noticia boa para me dar.

    – Sobre o que é? – Perguntei quase sussurrando.

    – Sobre seus pais.

    Meus olhos se encheram d’água antes mesmo de saber sobre o que aquele policial poderia estar querendo falar a respeito dos meus pais... Não é nada fácil pra mim esse momento de me lembrar dessas coisas, na verdade nunca entrei em grandes detalhes a esse respeito porque é um assunto extremamente doloroso pra mim... Eu tinha tudo que uma garota poderia querer, mas sentia como se não tivesse nada... Talvez tivesse sido por castigo que tudo aconteceu... Eu não sei, só sei que duas das coisas mais importantes que eu tinha me foram tiradas numa única noite.

    – Houve um acidente de carro... – Começou o policial a dizer. – Seus pais estavam em um dos carros envolvidos.

    Pus uma das mãos na boca enquanto as lagrimas escorriam pelos cantos do meu rosto.

    – O que houve com eles? – Perguntei já em desespero.

    – Bem... – Pausou ele parecendo receoso. – Eles colidiram com um caminhão, era uma pista de mão dupla e o caminhão vinha no sentido contrário ao deles e, infelizmente, sinto informar que seus pais não sobreviveram.

    Senti como se uma faca estivesse sendo enfiada no meu peito, não havia motivo pra eles saírem de casa àquela hora da noite, eles nunca fariam isso se não houvesse um bom motivo e eu tinha lhes dado um ótimo motivo pra irem pra rua, já que não avisei que iria a festa e não deixei nenhum recado a esse respeito... Todo o meu corpo se arrepiou e a dor era profunda dentro de mim.

    A culpa é minha... Eu não devia ter feito isso... Eu não devia ter feito isso... – Era só nisso que eu pensava enquanto ele me dizia que já havia uma patrulha indo à minha casa me buscar... Pra piorar a minha desgraça eu ia ter que fazer o reconhecimento dos corpos... o acidente tinha sido bastante violento.

    Acho que uma das piores cenas pra vida de uma pessoa deve ser ver seus pais nas condições em que eu vi os meus... Não consigo dizer como eles estavam... Não consigo conter as lágrimas enquanto escrevo, até fica difícil enxergar o papel em meio a elas... a culpa foi minha, eles saíram pra me procurar... Eu não devia ter saído, eu tinha que ter ficado em casa... – Respirou fundo. – Não adianta pensar nisso agora, o que tá feito, tá feito, nada pode mudar, por mais que eu realmente quisesse que mudasse.

    A minha vida nos meses que se seguiram foi em profunda depressão, tentaram me levar a psicólogos, mas a única coisa que fiz foi me afundar nos estudos... Eu não contei a ninguém o que havia acontecido, nem Steff sabia disso, na verdade ela mal soube o que tinha ocorrido e que eu havia me mudado pra casa de meus parentes... Eu não queria falar a respeito, por isso eu me afastei bruscamente... Eu precisava esquecer, eu precisava pelo menos tentar.

    Os meus parentes cuidaram de mim, do jeito deles, mas, de certa forma, eles sabiam o que tinha acontecido... Sabiam que a culpa era minha, isso porque meu pai, antes de sair de casa pra ir atrás de mim, chegou a ligar pra um deles perguntando se tinha notícias de minhas, então a noticia se espalhou e tudo que eu não queria aconteceu... Eu era vista como a culpada, que realmente eu era.

    Eu não suportava continuar com eles e não queria mesmo voltar pra casa onde eu morava com os meus pais, por mais que ela fosse legalmente minha, mas a questão era que eu tinha que sair dali, eu precisava sair dali. Meu celular tocou e eu quase caí pra trás quando vi quem era que estava me ligando, pois eu tinha os números registrados na agenda do meu celular... Do meu novo celular... Eu tinha só pro caso de precisar, nem que fosse pra saber se eu atenderia, ou não, mas até pra isso, eu os tinha.

    – O que você quer e como conseguiu esse número? – Perguntei de forma ignorante.

    – O que houve com você? Nunca mais te vi? – Houve silencio, eu não queria responder àquelas perguntas. – Eu soube do que houve com os seus pais naquela noite... quero te encontrar. – Disse Bruno.

    – E quem te disse que eu quero te ver?

    – Olha só... Eu sei que errei contigo, e sei também que as coisas por aí não andam nada bem, eu tenho uma proposta pra você, mas preciso conversar com você pessoalmente.

    Aquilo era muito estranho pra mim, mas eu realmente precisava sair dali, eu não suportava mais suportar os olhares e as piadinhas que alguns soltavam de vez enquanto, então eu lhe dei meu endereço, até porque, próximo ao apartamento onde eu estava morando havia uma praça por isso lhe sugeriu que poderíamos conversar na praça e ele aceitou e desligou.

    Estou a dez minutos olhando pro papel sem coragem de continuar... Nunca fui santa, mas tenho nojo do que me tornei com tudo aquilo... Eu ainda gostava daquele infeliz, mesmo ele tendo feito o que tinha feito comigo, no fundo me apeguei àquela ligação como se ela me desse um motivo de continuar vivendo, uma ilusão besta é claro.

    Naquele mesmo dia, à noite, fui até à praça, no horário combinado e ele estava lá... As minhas pernas tremeram ao vê-lo parado, em pé, me esperando... No inicio ele não me viu, estava de costas pra mim, por isso eu ainda pensei duas vezes antes de me aproximar, respirei fundo e fiz a escolha errada... Fui até ele.

    – O que você quer comigo? – Perguntei ignorante.

    Ele se virou e me olhou de cima a baixo.

    – Você está horrível. – Ele disse se referindo a minha aparência.

    – Não veio aqui pra falar mal das minhas roupas veio? O que você quer de mim?

    – Em resumo? – Pausou. – Eu quero você e estou disposto a te bancar.

    Aquilo me assustou muitíssimo, por mais que eu quisesse que houvesse algum interesse da parte dele por mim, eu realmente nunca imaginei que ele dissesse aquilo pra mim.

    – Ficou louco!

    Gritei com ele, dei-lhe as costas e comecei a andar. Bruno me segurou pelo braço, ficou de frente a mim me segurando pelos dois braços e disse:

    – Presta atenção, a minha família conhece a sua, eu sei o que você tem passado e sei que a culpa foi daquela noite, não quero apagar o que houve, na verdade você realmente mexeu comigo, mas eu não podia mostrar isso pros caras...

    – E o que você sugere?! – Perguntei interrompendo-o. – Quer me ter como amante?!

    – Eu sei que você não tem dinheiro pra fazer sua faculdade, então eu proponho bancar a sua faculdade e o lugar que você quiser morar, contanto que você seja minha... – Ele respirou fundo e disse. – Você não pode ter me esquecido tão facilmente... Me aceita, vai.

    Meu pai nunca foi militar, eu nunca recebi pensão do governo, eu era bancada por aquele infeliz do Bruno, por isso eu tinha roupas dele na minha casa e por isso, também, a minha família não queria saber de mim... Já que é pra contar a verdade, então essa é a primeira delas... Eu era bancada por aquele infeliz.

    02

    ANTES

    – Alô? 

    Eu disse, receosa, ao ligar pra Steff dois meses depois da visita do Bruno, dois meses depois de ter fugido de casa, dois meses depois de me instalar no apartamento que era dele e que ele disse que estaria passando pro meu nome... eu ia começar a estudar e descobri que Steff iria estudar no mesmo lugar que eu por problemas financeiros dos avós dela, uma feliz e infeliz coincidência, feliz pra mim e uma pena pela situação  da família dela.

    – Garota! O que houve com você?! Por que você sumiu?! Eu te liguei mil vezes e o seu celular só dava fora de área ou desligado tentou te achar com os seus parentes, mas eles não queriam me dar informações a seu respeito! – Gritou Steff comigo no telefone ao me reconhecer.

    Eu realmente não sabia o que dizer... Ou como dizer... Enfim... Eu tava me sentindo muito mal com tudo aquilo, eu realmente não queria que ninguém soubesse... Na verdade eu não suportava pensar no assunto, parecia haver um buraco dentro do meu peito toda vez que eu pensava a respeito... Aquilo era insuportável.

    – Eu não fiquei nada bem depois do que houve... – Minha voz começou a apresentar os sintomas de quem vai chorar. – Eu tive culpa Steff... eu não to nada bem... Eu... Enfim... Não quero falar disso não.

    – Onde você está morando?

    – Vendi a casa dos meus pais e comprei um apartamento, to vivendo de pensão. – Menti.

    – Pensão?

    – É... Era algum plano de seguro de vida que o meu pai tinha... Enfim... Não entendo muito bem dessas coisas não.

    Eu tinha vergonha de dizer o que tava acontecendo, preferia manter em segredo. Bruno tinha uma boa condição financeira graças ao pai que era bem sucedido e era separado da mãe, aí ele dava uma mesada gorda pro filho, pra ele gastar com o que quisesse, ou com o que precisasse... Bem... Precisar ele não precisava de muita coisa, então começou a gastar comigo.

    A aparência disso é que fiz isso apenas por dinheiro e liberdade, mas não foi bem assim, eu realmente era apaixonada por aquele canalha, foi ao longo do tempo que fui vendo, ainda mais, o canalha que ele realmente era, porque no início ele se fazia de bom moço, dizia que havia se arrependido do que tinha feito e que queria reparar o erro dele me ajudando, já que ele tinha tanto dinheiro e eu não tinha a mesma condição... É difícil explicar isso sem que fique estranho, até porque isso é estranho, principalmente pra mim, me sinto quase uma garota de programa, mas na realidade o meu problema era apenas um, era estar apaixonada por aquele cafajeste e não o dinheiro dele.

    Steffany sabia o básico, sabia que eu estava namorando, mesmo que de uma forma quase casada, com o Bruno, isso era tudo o que eu conseguia dizer a ela, mas não foram poucas as vezes que tive a chance de dizer, até porque, ele começou a se considerar meu dono, começou a implicar com os meus colegas de faculdade querendo dizer que todos queriam algo que seria dele e às vezes fazia isso na frente das outras pessoas... Tratava-me como se eu fosse um objeto... Várias vezes ela me pedia pra conversar comigo porque tava preocupada, mas eu desconversava e fugia de suas conversas... Eu tinha vergonha de toda aquela podridão.

    Deixe-me explicar melhor... Quando os meus pais faleceram eu tinha dezoito anos de idade, era final de ano e, pelas minhas notas, eu tinha certeza de que já havia conseguido avançar pro ultimo ano do colegial, mas, devido a morte de meus pais e a minha ida pra casa de parentes... Até porque nem o meu pai e nem a minha mãe tinham irmãos, eu terminei meu colegial em outra escola, de outra Cidade... Foi onde me afastei de tudo e de todos, inclusive da Steff.

    Com tudo isso, posso afirmar que o Bruno só ressurgiu quase um ano depois da morte dos meus pais, exatamente quando eu não sabia mais o que fazer da minha vida, já que estava encerrando o colegial, sem dizer que havia acabado de completar dezoito anos de idade, me tornando assim dona do meu próprio nariz e das minhas próprias decisões... o sonho de consumo de diversas meninas... Também já havia sido o meu, mas não era mais, não naquelas circunstâncias.

    Meu relacionamento com o Bruno durou dos meus dezenove até os meus vinte e um anos, que foi quando ele me agrediu pela última vez e eu o denunciei, pois foi tão forte que fui parar no hospital com costelas fraturadas e algumas outras coisas... eu o denunciei, o meu corpo naquele momento comprovava a minha denuncia e ele foi julgado, mas como é riquinho, ele não seria preso, por isso o meu advogado, que de bobo não tinha nada e eu não sei como, mas conseguiu que me fosse estabelecida uma pensão e que me fosse passado o apartamento, ainda mais depois de comprovar que havia em torno de dois anos e pouco que eu vivia naquele local.

    À época foi um escândalo no meu condomínio, mas os meus vizinhos ouviam diversas das nossas discussões, senhoras de idade apareciam na minha porta tentando me aconselhar dizendo que eu era muito nova pra me sujeitar àquilo... eu concordava, mas não resistia quando ele surgia aos prantos se jogando aos meus pés, pedindo perdão por tudo que havia feito e dizendo que o seu maior problema teria sido se apaixonar por mim, já que ele nunca tinha se apaixonado.

    Ele alegava não saber como lidar com aquilo e eu, uma idiota apaixonada, acabava perdoando e continuando naquele relacionamento doentio. A última agressão surgiu justamente por eu não suportá-lo mais, eu estava terminando com ele por causa de suas atitudes e de suas agressões enquanto ele achava que era por causa de outro homem, isso gerou nossa ultima briga, a ultima vez em que ele me agrediu durante nosso relacionamento.

    Fiquei praticamente um ano sem ter noticias dele, apenas via seu dinheiro na minha conta e nada mais... Um ano sem o Bruno e sem ninguém, não por falta de opções, mas por vontade própria, eu queria paz e não mais estresse, ainda mais desnecessário porque, caso eu viesse a me relacionar com alguém, eu não tinha estrutura emocional pra isso e como eu ia explicar a minha situação e ser respeitada ao mesmo tempo... o ar em meus pulmões alivia a tensão desse pensamento, mas o fato é que eu não me via com muitas escolhas, então preferia continuar como estava, era melhor, ou, como alguns diriam, era menos pior.

    Não posso dizer que não senti falta, houve momentos bons, momentos divertidos, mas os momentos ruins eram fortes e pesados demais. A justiça havia determinado que ele não poderia me procurar pra nada e que se ele fosse pego próximo a mim iriam prendê-lo e não teria como escapar da condenação, ele iria ter que cumprir, na cadeia, os anos que deveria ter pego no primeiro julgamento.

    A noite da última aula antes do período de férias era a noite que precedia a noite que mudou completamente a minha vida. Steff, eu e nossos colegas de classe saímos depois da última aula pra nos divertirmos, quase uma despedida de mais um ano puxado de estudos, sem dizer que agora não falta muito pra nos formarmos, por isso fomos pra uma boate onde dançávamos e bebíamos muito, quase que uma comemoração.

    Naquele tempo eu estava muito mal emocionalmente, cheguei a procurar psicólogos, quase toda noite eu sonhava com os meus pais e com o Bruno, era como se eu reprisasse o dia da festa e às vezes em que ele estava me agredindo. Quando acordava, o silêncio do apartamento e a realidade da minha solidão me faziam chorar em silencio... Foram noites que passei assim, atormentada pela minha culpa da morte dos meus pais e por ter aceitado a proposta do Bruno, por me sentir uma garota de programa... Não que eu as desmereça como pessoas... Enfim... Não vou entrar nesse mérito.

    Steff nem costumava se divertir como poderia, ela dizia que não podia me deixar ficar largada em qualquer sarjeta... Várias vezes eu chorei no colo dela, ela me pedia pra eu dizer o que tava acontecendo, mas eu dizia que não queria falar nada, eu só queria desabafar, era tudo que eu queria... Ela era a única pessoa que realmente se preocupava comigo... Ela era a única pessoa que tinha paciência pra me aturar, foi assim que nossa amizade ficou mais forte e mais sólida.

    Não posso dizer que eu prestava, já disse que nunca fui santa, mas não era que houvesse uma intenção ruim dentro de mim... Na verdade nunca houve... O que havia era medo, tristeza e solidão... Antes por não conseguir interagir como gostaria por causa da rigidez do meu pai e da minha própria timidez... Coisa normal de adolescente... Depois por perdê-los de uma forma tão cruel... Eu me sentia como um bicho acuado e com medo, minhas únicas distrações eram as aulas da faculdade, era quando íamos pro laboratório do pai do David, onde virávamos crianças fazendo experiências biológicas e, não com menos frequência, quando saíamos pra nos divertir.

    Estávamos dançando quando um homem muito estranho entrou na boate, ele era muito pálido e se vestia de preto, aquilo dava um contraste berrante, não tive como não notá-lo no salão, sem dizer que havia um sorriso meio sinistro em seu rosto, como se estivesse se preparando pra fazer alguma besteira... E ele realmente estava... Eu o reparei e minha euforia começou a se desfazer enquanto eu o observava, tanto foi que comecei a parar de dançar pra acompanhar os movimentos que ele fazia.

    – O que houve? –       Perguntou a mim, David, que tava dançando comigo.

    – Aquele homem é muito estranho! – Eu disse indicando-o com o rosto.

    – Deixe-o! – Disse David sorrindo. – Deve ser apenas mais um estranho no meio da multidão!

    Eu sorri pra ele querendo expressar concordância, mas eu não conseguia realmente concordar, pra mim havia algo a mais naquele cara, não era alguém comum, era como se ele emanasse alguma energia negativa... Eu não sei como explicar, sei apenas a sensação ruim que ele me transmitia apenas pelo olhar... Eu não sabia ainda, mas ele iria ser o primeiro vampiro que eu teria visto na minha vida... Até onde eu sei.

    Ele começou a puxar assunto com uma garota e eu não conseguia tirar os meus olhos de sobre os dois, tanto que parei literalmente de dançar dizendo que tava com cede e fui me sentar no bar porque ali eu conseguiria ter uma vista melhor daquele rapaz estranho... Eu me virei por um segundo pra tomar um gole do meu refrigerante, quando olhei novamente eu me assustei... Ele tava do meu lado e olhando diretamente nos meus olhos.

    – Por que você ta me olhando tanto? – Me perguntou ele sorrindo e me olhando de forma muito estranha e cobiçadora.

    Todo o meu corpo se arrepiou, eu quase engasguei com o refrigerante que ainda estava na minha boca pra ser engolido... Eu nunca tinha visto alguém como ele... Os olhos eram escuros e a pele era muito pálida, era como se ele estivesse doente, embora parecesse bem forte pra alguém doente, tanto em porte físico, como em saúde... Ele sorria pra mim... Não era um sorriso normal, ele era malicioso, realmente parecia estar me cobiçando com os olhos, eu podia sentir isso e era o que mais me assustava... Até aquele momento.

    – Quem é esse cara?! – Perguntou Tony, um de meus amigos, enquanto se aproximava junto com os outros três rapazes do nosso grupo.

    Aquele rapaz os olhou como se eles fossem nada e disse:

    – Eu acho que vocês não iriam querer saber quem eu sou.

    – Vamos embora daqui. – Eu disse me levantando e empurrando Tony pelo peito.

    Tony me segurou pelos braços e me pôs de lado, então se aproximou daquele cara e, encarando-o, disse:

    – Me diz então, quem é você?

    – Eu sou o cara que veio buscar a tua alma pra levar ela comigo pro inferno. – Disse ele ao se transformar enquanto sorria.

    Foi tudo muito rápido,

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