Prazeres da Mesa

NADA CAI DO CÉU

Achef Helena Rizzo é hoje uma das profissionais de cozinha mais completas e aclamadas da gastronomia. Mas é preciso falar aos incautos e desinformados que esse respeito não caiu de paraquedas no colo da chef, foi conquistado com muito trabalho. Vale lembrar que até chegar ao comando do restaurante Maní – em São Paulo –, essa gaúcha de Porto Alegre passou pelas cozinhas de feras como o francês Emmanuel Bassoleil, o italiano Luciano Bossegia e a superpolivalente Neka Menna Barreto. Com essa bagagem, abriu o restaurante Na Mata Café, em São Paulo, e descobriu que era essa mesmo sua vocação. Abandonou de vez a carreira de modelo e partiu para a Europa em busca de mais conhecimento no ramo da gastronomia. Passou por casas na Itália e em oito restaurantes na Espanha, com destaque para o frequentador permanente da lista de melhores restaurantes, El Celler de Can Roca, reputado templo da boa comida, sonho de consumo de todo aprendiz de cozinheiro. Coroando essa trajetória, Helena foi escolhida, em 2014, como A Melhor Chef Mulher do Mundo, na premiação que faz parte do 50 Best, da revista britânica Restaurant. A chef recebeu PRAZERES da Mesa no Maní.

Como é que de uma carreira de modelo, tendo de estar sempre com o corpo em dia, você se interessou por gastronomia?

Na verdade, antes de me tornar modelo, a culinária era uma paixão. Minhas brincadeiras eram em torno da cozinha. Quando criança, fazia receitas fáceis com as vizinhas, tias e avós. Passávamos férias na praia e eu ia comprar ingredientes para fazer um bolo, de um livro que tinha visto, eu achava superdivertido. Modelo tem essa cobrança de estar magra, mas então você acaba cuidando mais da alimentação. Lembro-me de que quando comecei, ficava muito preocupada em estar magra e acabei encontrando uma “parceira” na comida. Sempre fui muito comilona e, na época em que vim para São Paulo trabalhar como modelo, as agências tinham permuta com os restaurantes. Então, realmente continuei comendo muito, mesmo nessa fase. Comia entrada, prato e sobremesa todos os dias. Além do que, sempre fui modelo publicitária e tinha certeza de que não seria aquela minha carreira.

Já pensava em ir para a cozinha nessa época?

Sim. Em paralelo ao trabalho de modelo, fui buscar experiência na cozinha. A primeira porta em que bati foi o restaurante da Neka Menna Barreto, por ser ela gaúcha como eu. A partir daí foram surgindo vários estágios e comecei a abrir mão dos trabalhos de modelo.

Procurou formação profissional?

Não. Eu sempre fui muito empreendedora nesse sentido. Eu gostava de cozinhar, fiz os estágios. Juntei-me a algumas amigas e começamos a servir jantares na casa dos clientes, em minha casa e acabou fluindo.

Por quais lugares você passou?

Quando decidi mudar de carreira, aos 18 anos, eu estava cursando arquitetura, no Sul. Tranquei a faculdade e comecei os estágios em São Paulo, com a Neka. Na sequência, fui para o Roanne – casa icônica dos anos 1990, inaugurada pelo chef Claude Troisgros – quando estava sob o comando do Emmanuel Bassoleil. Estagiei no Gero e fiz o menu do Na Mata Café. Àquela altura eu tinha 21, 22 anos e tudo havia acontecido muito rápido para mim, eu queria mais conhecimento. No Na Mata, conheci um sommelier italiano que tinha um restaurante na Itália e acabei conseguindo um estágio. Fiquei um ano e depois fui para Milão para um dois estrelas Michelin. Acabei em Barcelona, para encontrar amigos, e decidi morar por lá. Foram três anos na Espanha, quando tive a oportunidade de trabalhar no El Celler de Can Roca.

Nessa época, você já almejava ter um restaurante?

Eu tinha vontade de ter o meu negócio e, depois dessa temporada na Espanha, achei que era o momento de voltar ao Brasil e comecei o projeto do Maní.

Os chefs que passam por estágios longos em outros países geralmente voltam com uma cabeça feita para a cozinha internacional. O Maní tem uma pegada bem brasileira. Como foi a definição desse conceito?

Eu vivi um dela, com Ferran Adrià e com a cozinha tecnoemocional de muita técnica, mas ao mesmo tempo muito questionadora. Uma cozinha que já levantava a bandeira dos produtos locais e acho que aprendi lições que eu poderia aplicar em qualquer lugar. Voltei para o Brasil com uma cabeça muito crítica, do que fazer por aqui, de como aproveitar os ingredientes que eu tinha por perto. Então, não era simplesmente replicar o que eu havia vivido lá, tinha todo um conceito e uma filosofia por trás. No começo, eu quis, sim, usar tudo o que havia aprendido, minha grande escola foi realmente a Espanha, mas sem deixar de lado as tradições brasileiras, minha história, minhas memórias do Sul. Mas o Maní, no início, tinha bastante espuma, brincadeiras com esferificações, enfim. Além do que, na época eu estava casada com o Daniel , que é espanhol e fazíamos dupla na cozinha do Maní. Vivi um período de muito aprofundamento na cozinha, as pessoas estudando muito, entregues àquilo. Sinto que voltamos com esse estímulo. No Maní, com seus quase 14 anos – abrimos em 2006 – levantamos muito essas questões, refletimos o tipo de cozinha que gostaríamos de fazer.

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