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Política e metafísica
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E-book190 páginas4 horas

Política e metafísica

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Sobre este e-book

O que é a política? O que poderia ser a vida comum? Essas perguntas estão no início dessa pesquisa. Se às perguntas faltam uma sugestão, procuraremos entender como essas palavras aparecem na história. Este é o caminho da discussão.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento17 de mar. de 2017
ISBN9788575491188
Política e metafísica

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    Política e metafísica - Miroslav Milovic

    Miroslav Milovic

    POLÍTICA

    E METAFÍSICA

    POLÍTICA E METAFÍSICA

    Copyright: Miroslav Milovic

    Copyright da presente edição: Editora Max Limonad

    Revisão : Rochelle Cysne Frota d’Abreu e Renato Reis Caixeta

    ISBN: 9788575491188

    www.editoramaxlimonad.com.br

    editoramaxlimonad@gmail.com

    Para

    Níkola, Lia, Lolô e Roche

    INTRODUÇÃO

    O que é a política? O que poderia ser a vida comum? Essas perguntas estão no início dessa pesquisa. Se às perguntas faltam uma sugestão, procuraremos entender como essas palavras aparecem na história. Este é o caminho da discussão.

    Vamos então iniciar a discussão no contexto grego, tradicional. Não é algo que já cria um olhar eurocêntrico da discussão. Este início grego simplesmente chega até nós. Por isso a escolha.

    Neste contexto grego, vamos entender a relação íntima entre a metafísica e a política, ou melhor dizendo, os pressupostos metafísicos da política. Para saber o que fazer, precisamos de uma orientação ampla, ligada aos fundamentos do mundo.

    Este é o primeiro passo da discussão. Vamos ver que as leituras posteriores, cristãs, ficam neste horizonte, que também podemos chamar de Tradição. Os pressupostos metafísicos da política articulam o mundo grego e cristão. Isso é a Tradição.

    Como e por que este mundo mudou? Como entender a política no mundo que estamos chamando de modernidade? Ou seja, como compreender estas articulações políticas no nosso mundo. Obviamente algo mudou. Não tem sentido usar a palavra diferente para o mesmo mundo. O que é, então, a Modernidade?

    No início da política ainda não fica clara a perspectiva política. Alguns falam sobre a separação política dos pressupostos tradicionais. Outros pensadores dessa época se dedicam a uma leitura diferente, científica do mundo, e por isso até falam que é uma perda de tempo procurar as verdades do nosso mundo social.

    Mas estamos já no contexto social e queremos entender isso. O que seria, então, a verdade da política? Para entender a resposta possível, temos que entender uma palavra específica da Modernidade. É a palavra subjetividade. A Modernidade é o mundo dos sujeitos. Pelo menos a partir do século XVIII temos essa leitura. Pensar o mundo, como veremos já com Kant, significa pensar os pressupostos da sua constituição. Kant, assim, inventou os sujeitos. Mas ele ainda não chega até à política. A questão dos sujeitos políticos é uma invenção de Hegel. Pensar os pressupostos, para Hegel, vai incluir a dinâmica social, vai revelar os pressupostos políticos do mundo. Assim estamos chegando até uma consequência impensável no mundo tradicional. Agora é a política que cria os pressupostos da metafísica. É uma mudança estrutural. Política no fundo da metafísica e não a metafísica no fundo da política. Talvez a mais importante na relação entre a Tradição e a Modernidade. Este é o segundo passo da discussão.

    O mundo moderno, criado, constituído, nos afirma, pensa Hegel. A consequência é a realização política da nossa liberdade. Por isso tem sentido modernizar o mundo, mesmo repetindo o passado. Repetir, sim, porque chegamos até as últimas consequências da história do ser humano, até a verdade dele. Por isso, mesmo nessa ausência de futuro, Hegel vê a nossa afirmação. Hoje ainda somos testemunhas dessa repetição.

    Podemos ainda problematizar essa leitura feliz da Modernidade? As dúvidas aparecem logo. Onde Hegel procura a nossa realização política aparecem as leituras sobre a despolitização. Este é o próximo, terceiro passo da discussão. Schmitt, Arendt, Habermas... São algumas sugestões dessa leitura. Ou poderia ser o próprio Marx quem logo, mesmo aprendendo muito com Hegel, vai falar sobre o profundo conflito na Modernidade: no fundo da Modernidade, segundo Marx, está a crise e não a nossa afirmação.

    O último passo da discussão radicaliza as consequências dessa despolitização. Aqui aparece a palavra biopolítica. Os gregos separam a política da vida biológica. É o milagre deles. Por que a vida se aproximou da política no nosso mundo moderno? Por que um dos nossos projetos desde o início da Modernidade, que estamos sentindo no nosso cotidiano, é sobreviver, preservar a vida natural? O que significa essa presença da vida na política? Os gregos não pensavam assim. Parece que ficamos sem a expectativa de que a política seja algo mais, algo do divino, como eles esperavam. Parece que no final da modernidade ficamos sem a política. É a consequência da leitura sobre essa palavra biopolítica. É ainda possível reinventar a política e a vida comum?

    Queria agradecer aos meus alunos da graduação e da pós-graduação da Faculdade de Direito da Universidade de Brasília pelas discussões. Por isso o livro poderia ter também o subtítulo: ensaios sobre a filosofia do Direito.

    METAFÍSICA E POLÍTICA

    METAFÍSICA E POLÍTICA

    1. Nessa parte gostaria de mostrar a ligação entre metafísica e política no contexto tradicional no sentido de uma específica dependência política da metafísica. Num momento posterior, falando sobre a Modernidade, vamos encontrar algo, eu diria, completamente diferente. Parece-me que no contexto moderno é a própria política que cria um fundo metafísico. Isso será uma das mudanças estruturais entre a Tradição e a Modernidade. Como entender isto?

    Vamos primeiro seguir os passos da Tradição. Vou discutir alguns pontos falando sobre Platão e Aristóteles. Acho que eles determinam, talvez, o mundo grego. Falando sobre a Tradição, ligada com o pensamento grego, não quero criar nenhum olhar eurocêntrico. Mencionei isso já no início. São os gregos que articulam o início da nossa cultura e entre eles, Platão e Aristóteles, determinam as consequências chegando talvez até nós.

    São, na verdade, duas perguntas que nos interessam. Uma é a relação posta entre a metafísica e a política e outra a pergunta sobre a própria metafísica. Finalmente a pergunta sobre a relação entre a metafísica e a política tem que esclarecer o próprio início, quer dizer, a própria metafísica.

    Vou seguir uma leitura conhecida. Os gregos investigam o mundo, mas dizem algo que vai determinar a nossa cultura. Por um lado, eles, por exemplo, colocam as perguntas sobre a física. Por outro, eles acham que existe algo além das pesquisas sobre a física, o que determina o seu próprio fundamento. Além da física, existe a metafísica. Isso está no início. Platão e Aristóteles usam a palavra a filosofia primeira. A metafísica como palavra vai aparecer depois no contexto da sistematização da obra aristotélica. O mundo tem os fundamentos que a física ou, poderíamos dizer, a ciência não conhece. O mundo tem a estrutura metafísica. Isso, de novo, está no início da cultura europeia e chega até hoje, como queria mostrar. É algo que poderíamos entender como milagre grego: pensar o mundo não se identifica com o pensar as suas aparências e sim os seus fundamentos. O milagre aparece com a metafísica.

    Aqui também aparece o sentido da filosofia. Ela se identifica com a metafísica. Os amigos da sabedoria, como pensa Platão, que não se deixam seduzir pelo conhecimento das aparências estão no caminho da metafísica. Suponhamos uns homens, fala ele no início do sétimo livro da República, numa habitação subterrânea em forma de caverna, com uma entrada aberta para a luz, que se estende a todo o comprimento dessa gruta. Então lá dentro desde a infância, algemados de pernas e pescoços, de tal maneira que só lhes é dado permanecer no mesmo lugar e olhar em frente; são incapazes de voltar a cabeça, por causa dos grilhões; serve-lhes de iluminação um fogo que se queima ao longe....[1] Sair da caverna, ver a luz, a transparência, a verdade do mundo: isso é o recado platônico. Um recado ainda para nós, talvez. Por um lado difícil, mas por outro lado talvez nem tanto. É só virar a cabeça... Περιαγωγή é a palavra grega. Só virando a cabeça mas não ainda, como pensarão os cristãos, questionando a própria razão. Pelo contrário, a razão para os gregos é o único caminho seguro.

    Já temos, então, uma ligação íntima entre a filosofia, a metafísica e a razão. Poderíamos colocar a palavra ontologia ao lado. A ontologia é a pergunta sobre o ser que se abre para um olhar metafísico. Teoria poderia ser outra palavra neste contexto. Vem deste olhar contemplativo. Com a teoria como filosofia e como metafísica, o ser humano pode se entender. Entender a própria origem divina, por um lado, e entender como agir, por outro. Ou como pensa Sócrates, para agir precisamos saber o que é o mundo, o logos dele. Precisamos entender o que é a própria natureza para poder nos entender. Por isso este olhar teórico, a vida contemplativa tem a primazia para os gregos. E vamos ter que esperar muito tempo, milhares de anos para entender o recado kantiano sobre a primazia do prático. A nossa discussão sobre a política obviamente tem que entender essas mudanças.

    O milagre grego, falei. Já na teoria, talvez, pensando sobre Hannah Arendt, que procurou, como vamos ver, o milagre grego só na política. Este milagre talvez ainda possa falar algo para nós, nos inspirar. Talvez só essa diferença entre a metafísica e física, entre a filosofia e a ciência pode ainda dizer muito para nossa cultura. Para uma cultura que abandonou as perguntas filosóficas e se entregou à ciência. No nosso tempo é a ciência que orienta a filosofia e não a filosofia que orienta a ciência. A filosofia guardou só um nome triste, chamado epistemologia que se pronuncia com muito respeito e significa uma desgraça espiritual. Como e por que aconteceu tudo isso? Como os gregos pensam a primazia da filosofia e nós da ciência?

    Temos, claro, que entender se isso é uma mudança justificada. Por que, finalmente, defender a filosofia? Melhor, talvez, abandonar essa sedução grega. O nosso mundo é outro. E, falando sobre a filosofia, qual é a filosofia que queremos defender? Ainda podemos falar sobre um olhar privilegiado, chamado filosofia? Deixo, pelo menos essa diferença entre a filosofia e a ciência, como um recado grego importante, penso. Ou melhor, como uma inspiração. Porque o que acompanha o recado são as leituras platônicas muito dramáticas. Falando sobre o mundo, Platão, por exemplo, já está fazendo uma hierarquia entre o mundo dos fundamentos e o das aparências, por um lado e uma hierarquia entre vários tipos do conhecimento, como a filosofia e a ciência, por outro. E só a questão do momento em que essa hierarquia vai se articular como a hierarquia social.

    Vamos continuar por aqui indo para uma articulação do prático querendo mostrar a sua origem metafísica. Podemos aqui ouvir as palavras de um sofista: As leis são criadas por convenção, não pela Natureza, fala Antifo, no tratado Sobre a Verdade.[2] E um pouco depois: Podemos observar as características de qualquer das faculdades que pela natureza são necessárias a todos os homens… Nenhum de nós, grego ou bárbaro, tem essas características de forma especial. Todos respiramos o mesmo ar, pelas narinas e pela boca.[3] Pode ser que a nossa cultura seria melhor sem as hierarquias platônicas, com essa leitura dos sofistas sobre a contingência e a convenção. Mas, somos herdeiros de Platão e temos que entender isso. Ele combate sofistas com toda a força tentando mostrar a origem divina do ser humano, a metafísica e não as práticas particulares da cultura. Ele é explícito neste ponto. As leis não podem ser pensadas a partir das conveniências. A lei e a arte provém ambas da natureza.[4]

    Pode ser que essa origem nos relacione de outra maneira com o mundo e, neste caso, poderíamos ainda seguir a leitura platônica. Deus é a medida de todas as coisas e não o homem, fala ele nas Leis[5]. Um recado sábio para a nossa época dominada pela afirmação do homem do jeito que chegamos até as catástrofes ecológicas e a destruição nuclear. Não vamos entrar nessa estrutura metafísica do mundo platônico. Não é mais o argumento que podemos seguir. No contexto moderno vamos num momento voltar para uma específica confrontação hegeliana com a herança platônica. Hegel vai se confrontar com o idealismo platônico afirmando outro idealismo ligado à ideia da subjetividade. Será importante entender porque Hegel afirma a estrutura idealista do mundo na época da revolução francesa, na época de um forte desencantamento moderno e de uma explícita transparência moderna ligada ao avanço da ciência.

    Vamos deixar outras perguntas de lado também. Entre elas, as questões da relação entre as ideias, por exemplo, da ideia do Bem com o divino, as questões da criação do mundo, etc. Vamos seguir outro exemplo ilustrativo para a nossa discussão. É a pergunta platônica sobre a justiça. Discutindo essa pergunta fica muito explícito o vínculo entre a metafísica e o mundo prático, entre a metafísica e a política. A gente, neste momento, talvez ainda não tenha a sistemática aristotélica da relação entre o prático e o teórico, mas a inspiração metafísica da política fica bem visível. Falando, então, sobre a justiça, Platão dirá que cada um de nós deve ocupar-se de uma função na cidade, aquela para a qual a sua natureza é mais adequada.[6] O que significa essa diferenciação das funções, onde Platão procura a justiça? Como saber que estamos agindo da maneira justa? Para poder responder temos que saber como Platão relaciona o mundo metafísico e o nosso mundo prático. Aqui nos ajuda outra palavra importante – alma. Numa época, a nossa alma viveu no mundo metafísico, das ideias, e volta para ele depois de um tempo. Neste sentido, aprender, fala Platão no Fédon não é outra coisa senão recordar... não há dúvida de que, numa época anterior, tenhamos aprendido aquilo de que no presente nos recordamos.[7]

    O próximo passo é a questão sobre a estrutura da nossa alma. Talvez Platão, observando o nosso corpo, faça a diferença entre a nossa razão, o nosso espírito e o nosso apetite. Essas partes correspondem com as virtudes. Assim a virtude ligada a nossa razão é a sabedoria, a virtude ligada com o nosso espírito é a coragem e a virtude ligada com o nosso apetite é a temperança. E só um passo a mais para Platão determinar a estrutura ideal do estado. Essa estrutura tem que corresponder à estrutura da nossa alma. Platão acha que o estado é uma específica realização da nossa alma. Assim quem tem que governar são as pessoas ligadas à sabedoria, quer dizer, os filósofos. Depois chegam os militares ligados à coragem e finalmente os agricultores relacionados à temperança. Com essa estrutura se realiza

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