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Compreender o Antigo Testamento: Um projeto que se tornou promessa
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Compreender o Antigo Testamento: Um projeto que se tornou promessa
E-book745 páginas15 horas

Compreender o Antigo Testamento: Um projeto que se tornou promessa

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Sobre este e-book

Depois de L'insodable richesse du Christ (A insondável riqueza do Cristo), o autor nos propõe, com o presente livro, um sopro de ar fresco na compreensão do Antigo Testamento! Comentando os primeiros livros da Bíblia – do Gênesis aos livros de Samuel - , ele os interpreta, identificando suas implicações ao longo de toda a Bíblia, até as últimas páginas do Apocalipse! Levando em conta a História e as tradições presentes na própria fonte dos textos, Gilles Drollet estabelece como promessas e ao projeto de Deus se cumpriram em Cristo e estão em vias de realização para nós. Assim, o Antigo Testamento nos revela que o próprio Cristo ilumina nossa caminhada e nos conduz em direção à Terra Prometida da ressurreição. O livro que nutriu a esperança do Cristo pode, desse modo, sustentar a esperança de cada um de nós.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento28 de jul. de 2014
ISBN9788534939744
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    Pré-visualização do livro

    Compreender o Antigo Testamento - Gilles Drolet

    CapaRosto

    Índice

    Prefácio

    Considerações preliminares

    Introdução

    PRIMEIRA PARTE: Os onze primeiros capítulos do Gênesis - O projeto de Deus para a humanidade

    1. Alguns instrumentos para compreender bem Gênesis 1-11

    A) Os dois autores de Gênesis 1-11

    B) As semelhanças com relatos míticos mesopotâmicos

    C) A experiência histórica de Israel na fonte da composição

    2. Interpretação de Gênesis 1-11

    A) Gênesis 1: O sentido da narrativa da criação em seis dias

    B) Interpretação do relato do jardim do Éden ou do paraíso

    C) Gênesis 3-11: o significado do pecado, dos episódios de Caim e Abel, do dilúvio e da torre de Babel

    – O mal observável

    – O mal interior

    1 – Gênesis 3: ser como deuses

    2 – Gênesis 4: o pecado à porta

    3 – Gênesis 6-9: o coração malvado

    4 – Gênesis 11: querer atravessar os céus

    – As forças do mal

    D) Síntese geral de Gênesis 1-11

    SEGUNDA PARTE: De Gênesis 12 aos livros de Samuel - As promessas a Abraão e a Davi

    1 - GÊNESIS 12-50

    A) A história dos patriarcas de Israel

    B) As promessas e o seu desenvolvimento na Bíblia

    1 – As promessas, de Abraão a Josué (1850-1200 a. C.)

    2 – As promessas de acordo com os Profetas (1000-500 a.C.)

    3 – As promessas de acordo com os Sábios (500 a.C. – 0)

    4 – As promessas para Jesus

    5 – As promessas para nós

    2 - O Êxodo

    A) A fuga do Egito

    1 – A situação de Israel

    2 – O nascimento e o início da vida de Moisés

    3 – O chamado e a missão

    4 – A revelação do nome de Deus

    5 – As pragas do Egito

    6 – A Páscoa

    7 – A passagem pelo mar

    8 – O cântico de Moisés

    B) A caminhada no deserto (Ex 15-18)

    1 – A nuvem que guia e cobre com sua sombra

    2 – O maná

    3 – A água que brota da rocha

    C) A Aliança no Sinai (Ex 19-40)

    1 – O encontro com Deus: Israel é escolhido povo de Deus (Ex 19-24)

    2 – O dom dos dez mandamentos (Ex 20)

    3 – A Tenda da Reunião e a Arca da Aliança (Ex 25-40)

    3 - O livro de Josué

    A) A conquista da Terra Prometida (Js 1-12)

    1 – Raab e os espiões de Josué em Jericó (Js 2)

    2 – A passagem do Jordão (Js 3-4)

    3 – A celebração da Páscoa e o fim do maná (Js 5,10-12)

    4 – A conquista de Jericó (Js 6-12)

    5 – Josué e Jesus

    B) A partilha da terra entre as tribos (Js 13-21)

    C) O fim da carreira de Josué (Js 22-24)

    4 - O livro dos Juízes

    5 - Os livros de Samuel

    A) A figura de Davi

    B) As três promessas a Davi e o desenvolvimento delas na Bíblia

    1 – As promessas no tempo de Davi e Salomão (1000-931 a.C.)

    2 – As promessas de acordo com os Profetas (1000-500 a.C.)

    3 – As promessas de acordo com os Sábios (500 a.C.-0)

    4 – As promessas para Jesus

    5 – As promessas para nós

    Conclusão Geral

    Sinceros agradecimentos

    Ao senhor Jean-Paul Desbiens, marista, ex-diretor geral do campus Notre-Dame-de-Foy por suas reflexões e seus encorajamentos

    e ao senhor Raymond Boutin, marianista, emérito professor de francês do campus Notre-dame-de-Foy pela revisão do texto.

    E, começando por Moisés e por todos os Profetas, [Jesus] interpretou-lhes em todas as Escrituras o que a ele dizia respeito.

    (Lc 24,27)

    PREFÁCIO

    A PRESENTE OBRA se configura como um guia de leitura do Antigo Testamento. Por volta de 1996, Gilles Drolet me pediu para ler os trechos deste livro, à medida que ele os escrevia. Periodicamente, ele me entregava 10 a 20 páginas de seus manuscritos, para que eu os comentasse. Sua atitude demonstra uma grande humildade, e, no final das contas, tudo foi proveitoso para mim em tal processo.

    Este guia de leitura assume, em alguns trechos, a aparência de um manual. Ora, um manual possui o mérito de guiar pela mão, como é sugerido por seu próprio nome; o guia acompanha, passo a passo, o explorador que se arriscou em um país desconhecido, mal conhecido ou não muito bem mapeado. É próprio do guia demarcar o caminho, ao mesmo tempo em que se preserva, como afirma o escritor Alain, da funesta preocupação de ser completo, o que estraga tantos livros.

    Para minha geração, e a fortiori para as gerações precedentes, a Bíblia era um livro fechado. Nas últimas décadas, as pesquisas têm sido tão abundantes e sábias, que voltamos a ter a impressão de que a Bíblia está reservada aos especialistas. Consideremos aqui as palavras do cardeal Joseph Ratzinger, que se tornaria o Papa Bento XVI:

    Por meio da pesquisa histórico-crítica, a Sagrada Escritura voltou a ser um livro aberto, mas igualmente um livro fechado. Um livro aberto: graças aos trabalhos de exegese, nós percebemos a palavra da Bíblia de um modo novo, em sua originalidade histórica, na variedade de uma história em constante devir e em expansão, repleta daquelas tensões e contradições que constituem ao mesmo tempo sua riqueza incalculável. Mas, conseqüentemente, a Escritura voltou a ser um livro fechado: ela se tornou objeto de especialistas; o leigo e até mesmo o Teólogo que não é exegeta não podem mais se aventurar a opinar sobre ela. De fato, parece que a Bíblia foi retirada da leitura e reflexão dos fiéis, pois o que resultasse de tal leitura seria considerado reflexão de amador. A ciência dos especialistas ergue uma cerca ao redor do jardim das Escrituras, tornada inacessível ao leitor não especializado.¹

    A obra de Gilles Drolet possibilita a compreensão do Antigo Testamento, sem desviar seu foco de abordagem da pessoa de Cristo, seu cerne e seu alvo.

    Dito isso, é necessário nos prevenirmos de uma objeção: Gilles Drolet cita abundantemente vários autores. De fato, podemos citar outros textos, para marcar um desacordo ou apresentar uma opinião favorável: Eu não saberia me expressar melhor em tão poucas palavras.

    Assinar um prefácio significa autorizar uma obra. Repito simplesmente o que já disse repetidas vezes ao autor: a leitura destes textos foi extremamente enriquecedora para mim.

    Jean-Paul Desbiens

    1 RATZINGER, Joseph. Entretien sur la foi. Paris, Fayard, 1985, p. 87 [versão brasileira: RATZINGER, Joseph & MESSORI, Vittorio. A fé em crise?. São Paulo, Editora Pedagógica e Universitária, 1985].

    CONSIDERAÇÕES PRELIMINARES

    A SEDE ESPIRITUAL, ou a busca de sentido, habita o homem desde que ele é homem. É incontestável, entretanto, num mundo pluralista como o nosso, que essa sede busque saciar-se em qualquer que seja a fonte. Como prova disso, podemos citar a abundância de seitas, de gurus, falsos profetas...

    Contudo, a humanidade em geral e os cristãos em particular dispõem da fonte de água viva, dentro deste grande livro que chamamos a Bíblia, considerada a Palavra de Deus.

    Mas a Bíblia assusta, particularmente o Antigo Testamento. Para muitos, o que ela inspira é um medo do próprio Deus, que para eles é visto como um Deus severo, o Juiz impiedoso que devemos temer. Basta colocarmos uma Bíblia sobre a carteira de um estudante de Ensino Médio ou nas mãos da maioria de nossos contemporâneos para constatarmos esse fato.

    Além disso, para a maioria das pessoas, o Antigo Testamento representa um livro arcaico e ultrapassado ou extremamente denso e complicado para que se possa aventurar em sua leitura.

    Será que este guia de leitura conseguirá mostrar a simplicidade da Bíblia, assim como sua profundidade e incrível atualidade? Grande pretensão... No entanto, a Bíblia foi certamente feita para ser lida e entendida. E por todos:

    A Bíblia, por ser rústica, é um livro do povo, e continuará sendo. Sabemos a que nível ela promoveu os pequeninos, os pobres: ao nível da preferência de Deus. Por esse e por outros motivos, ela se dirige verdadeiramente a todos os homens e pode ser compreen­dida pelos homens mais diferentes.¹

    Felizmente, nossos predecessores no caminho da fé já nos mostraram o nobre caminho para a compreensão dos textos bíblicos. Os Atos dos Apóstolos relatam o episódio de um alto funcionário etíope, o qual, tendo vindo em peregrinação a Jerusalém, ao voltar para casa, sentado em sua carruagem, lia o profeta Isaías:

    Filipe perguntou-lhe: Entendes o que lês?. Como o poderia, disse ele, se alguém não me explicar?. Abrindo então a boca e partindo deste trecho da Escritura, Filipe anunciou-lhe a Boa Nova de Jesus (At 8,30-31.35).

    Esse exemplo nos revela que nossos melhores guias a nos ajudar na compreensão do Antigo Testamento serão aqueles que testemunharam a Ressurreição de Jesus. Poderemos vislumbrar, com eles, como o projeto de Deus, que havia se tornado promessa, cumpriu-se plenamente em Jesus Cristo e permanece atual no meio de nós.

    Dito isso, é hora de indicar as etapas deste estudo.

    A introdução justificará a divisão do Antigo Testamento em quatro partes:

    1) Os onze primeiros capítulos do Gênesis

    2) Do capítulo 12 do Gênesis até os livros de Samuel

    3) Os profetas

    4) Os sábios

    Essa divisão permite compreender o movimento de fundo de todo o Antigo Testamento. O projeto de Deus aparece na primeira parte e as promessas, na segunda. A presente obra diz respeito, mais especificamente, a essas duas partes, que vão do Gênesis até os livros de Samuel. Os profetas e os Sábios, sem ser estudados sistematicamente, serão, entretanto, evocados e indicarão o aprofundamento e a compreensão final do projeto e das promessas de Deus. E todo esse conteúdo de revelação convergirá em direção ao Novo Testamento, em que se encontrará o cumprimento das promessas do Antigo Testamento, na pessoa de Jesus Cristo.

    Poderemos assim apreciar a riqueza dos primeiros livros da Bíblia, que se desenvolverá de maneira contínua até as últimas páginas do Apocalipse. Ao mesmo tempo, poderemos admirar a impressionante pedagogia de Deus e seu domínio absoluto da História humana.

    1 AUZOU, Georges. La parole de Dieu, 3.ª ed. Paris, Éditions de l’Orante, 1960, p. 162.

    INTRODUÇÃO

    Algumas chaves de leitura para abrirmos a Bíblia

    O ANTIGO TESTAMENTO representa uma massa impressionante de documentos que foram traduzidos, examinados, comentados, rezados há aproximadamente 3.000 anos. Contudo, encontramo-nos freqüentemente despreparados perante todas essas páginas que, além do mais, podem nos parecer ultrapassadas, enraizadas num tempo ultrapassado. É história antiga!, diz-se.

    No entanto, bastam apenas algumas chaves de leitura para nos situarmos na compreensão da Bíblia e, mais ainda, para descobrirmos nela nosso presente e nosso futuro.

    Esta é a proposta deste trabalho: dar uma explicação de conjunto do Antigo Testamento, colocando em evidência alguns termos importantes, palavras que se aprofundam sem cessar ao longo da narração e que ressoam até as últimas páginas do Apocalipse, o derradeiro livro da Bíblia.

    Pois este é o movimento característico do Antigo Testamento: as palavras postas no início assumem constantemente um sentido novo e atingem finalmente um alcance infinito.

    Interessar-se por essa progressão torna possível a percepção da unidade e da simplicidade da Bíblia, sem a necessidade de nos perdermos nos detalhes. Como dizia meu antigo professor, Évode Beaucamp, a quem este livro deve bastante: Há especialistas que olham tanto para os talos de planta com a lupa, que não percebem as montanhas!.

    Por certo, a estrutura dos textos, seu autor ou a tradição que os produziu, o significado preciso das palavras, os dados históricos, geográficos, arqueológicos... Tudo isso é útil e importante, mas não é suficiente:

    Não é correto pensar que, para nos iniciarmos na leitura da Bíblia, seja suficiente lermos, além de sua tradução, as notas literárias e históricas que colocarão em evidência o que os primeiros leitores serão capazes de compreender nesses textos. As notas podem ser perfeitamente ortodoxas, sem por outro lado responder ao que esperamos delas: encontraremos nelas tudo, menos o essencial.¹

    Em nosso tempo, marcado ao mesmo tempo pela ignorância religiosa e pela abundância da literatura religiosa, podemos nos espantar, especialmente no meio católico, pelo lugar insignificante que se dá à explicação da Bíblia. É sem dúvida por essas razões que ainda hoje alguns se perguntam se nossos primeiros pais de fato comeram uma maçã no paraíso terrestre, ou se Jonas poderia permanecer três dias no ventre de uma baleia...

    Três grandes chaves de leitura

    Três chaves de leitura são indispensáveis para uma boa compreensão dos textos da Bíblia. Elas provêm de três constatações simples: a Bíblia forma um todo, a Bíblia é uma biblioteca, e a Bíblia veicula palavras importantes, constantemente retomadas e aprofundadas, que culminam nas duas últimas páginas do Apocalipse.

    Primeira chave: a Bíblia como um todo

    Pode parecer elementar recordar que a Bíblia se divide em duas grandes partes: o Antigo e o Novo Testamento. Em conseqüência disso, pode-se afirmar que: em primeiro lugar, o período de composição do Antigo Testamento (1.000 anos) é muito mais longo que o do Novo Testamento (50 anos); em segundo lugar, muitas pessoas são colocadas em evidência no Antigo Testamento, ao passo que no Novo Testamento, somente uma o é: Jesus. Além disso, uma tendência à unidade se manifesta de um Testamento a outro, sendo ela pontuada pelas promessas e profecias que caminham em direção a uma plena realização. Essa tendência à unidade é coroada pelo anúncio do Messias, aquele que deve vir. Por fim, o Antigo Testamento conhece uma progressão constante até a afirmação final de uma ressurreição dos mortos, profecia que Deus cumpre no Novo Testamento, com a Ressurreição de Jesus.

    Visualizemos estes dados capitais:

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    Essa visão de conjunto nos apresenta perspectivas muito fecundas! Já sabemos que o Antigo Testamento progride, que seu ponto culminante reside na afirmação da ressurreição dos mortos e que a ressurreição de Jesus o consagra como Messias e representa a assinatura de Deus em todas as profecias.

    Pode-se dizer que o coração pulsante da Bíblia é a ressurreição dos mortos, já inaugurada pela ressurreição de um homem! É ele quem dá sentido à vida!

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    Se, ao explicar a Bíblia, não falamos da ressurreição, vazia é a nossa pregação (1Cor 15,14). Logo, as pessoas buscarão em outros lugares o sentido último da vida: reencarnação, nirvana, corpo estelar, fusão com o Grande Todo etc.

    É evidente que, no desenrolar da explicação, nós iremos explorar a chave de leitura por excelência, ou seja, a pessoa de Jesus de Nazaré, que hoje vive. O Antigo Testamento nos fala dele.

    De fato, é bastante significativo que o Ressuscitado, ele mesmo, caminhando com os discípulos de Emaús, tenha retomado todo o Antigo Testamento, aplicando-o a si próprio, como Ressuscitado: Começando por Moisés [a Lei, o Gênesis] e percorrendo todos os Profetas, interpretou-lhes em todas as Escrituras o que a ele dizia respeito (Lc 24,27).

    Isso significa que as profecias que anunciavam o Messias continuam a descrevê-lo, hoje, em sua Ressurreição. Assim, para apreciar toda a riqueza de Cristo, nós precisamos não somente do Novo Testamento, mas igualmente do Antigo Testamento. O ressuscitado continua a dizer: Era preciso que se cumprisse tudo o que está escrito sobre mim na lei de Moisés, nos Profetas e nos Salmos (Lc 24,44). Logo, é necessário tudo compreendermos em sua relação ao Cristo Ressuscitado, por meio de cuja luz a mente se abre ao entendimento das Escrituras (Lc 24,45) e o coração se torna ardente ao ouvi-lo falar (Lc 24,32).

    Albert Gelin tinha razão ao escrever: O Antigo Testamento é uma imensa profecia, da qual é preciso encontrar as estruturas mestras; uma terra misteriosa na qual se discernem caminhos sagrados que desembocam em Cristo.²

    Procedendo desta maneira, nós iremos seguir a linha diretriz do Concílio Vaticano II:

    Como a Sagrada Escritura deve ser lida e interpretada com o mesmo espírito com que foi escrita, não menos atenção se deve dar, na investigação do reto sentido dos textos sagrados, ao contexto e à unidade de toda a Escritura, tendo em conta a Tradição viva de toda a Igreja e a analogia da fé. Foi por isso que Deus, inspirador e autor dos livros dos dois Testamentos, dispôs tão sabiamente as coisas, que o Novo Testamento está latente no Antigo, e o Antigo está patente no Novo. Pois, apesar de Cristo ter estabelecido uma nova Aliança no seu sangue (cf. Lc. 22,20; 1Cor 11,25), os livros do Antigo Testamento, ao serem integralmente assumidos na pregação evangélica, adquirem e manifestam a sua plena significação no Novo Testamento (cf. Mt 5,17; Lc 24,27; Rm 16,25-26; 2 Cor 3,14-16), que por sua vez iluminam e explicam. ³

    Assim, sem uma visão de conjunto, corremos o risco de omitir o essencial:

    Existe um significado bíblico de conjunto que atravessa, une e ultrapassa o significado dos livros considerados em separado. A miopia, em toda leitura e compreensão de texto, é causa freqüente de engano. Se quisermos alcançar o significado correto da Bíblia, será preciso compreendê-la como um todo.

    Segunda chave: a Bíblia, uma coleção de livros diferentes

    Basta estar atento para constatar que a Bíblia ainda é lida e interpretada ao pé da letra. Tudo é considerado praticamente como uma narrativa histórica. Certamente, Deus pode ir ao encontro das pessoas por meio desse tipo de leitura, dita fundamentalista, porém, não devemos colocar a fé lá onde ela não é de forma alguma requerida.

    Por exemplo, a propósito da cena de Gênesis 3, alguns se perguntam se uma serpente pode realmente ter falado a uma mulher. Alguns responderão: Não há nada impossível a Deus!. Uma resposta como essa pode testemunhar uma certa fidelidade a Deus e a sua Palavra, mas Deus não espera de nós esse tipo de fé. Da mesma maneira, com respeito ao relato do dilúvio, é demonstração de um bom espírito crítico perguntar-se sobre a possibilidade de um homem poder reunir machos e fêmeas de todas as espécies de seres vivos, para os embarcar num enorme navio fabricado por ele.

    A Bíblia é uma coleção de livros bem diversos. Eis alguns exemplos de escritos diferentes:

    – Um poema: a criação em seis dias (Gn 1).

    – Uma narrativa simbólica: Deus passeia pelo jardim do Éden (Gn 2).

    – Uma epopéia (na qual se exagera um acontecimento): a travessia do mar (Ex 14).

    – Um texto legislativo: o livro do Levítico.

    – Um relato histórico: a tomada da cidade de Hasor por Josué (Js 11).

    – Arquivos ou anais: os dois livros dos Reis.

    – Orações: os Salmos.

    – Oráculos: os Profetas.

    – Um conto humorístico: Jonas.

    – Aconselhamentos: Provérbios.

    – Uma peça de teatro ou uma tragédia: o livro de Jó.

    – Um poema de amor: o Cântico dos Cânticos.

    – Reflexões: Eclesiastes.

    – Revelações: o livro de Daniel e o Apocalipse de São João.

    – Cartas: as epístolas de São Paulo.

    – Testemunhos sobre Jesus: os Evangelhos.

    Cada um desses textos possui uma característica própria e manifesta um gênero literário: simbólico, histórico, poético, épico, apocalíptico... Daí procede a chave de leitura capital, qualificada em 1943 como regra suprema pelo papa Pio XII, que autorizava finalmente os católicos a não tomarem literalmente os textos da Bíblia:

    A regra suprema para a interpretação dos textos sagrados é descobrir e definir aquilo que o escritor quis dizer e prestar atenção aos gêneros de discurso que ele utiliza (Encíclica Divino affante Spiritu).

    Portanto, é preciso fazer uma distinção entre a mensagem e a maneira pela qual ela é expressa. Em verdade, a Palavra de Deus se encarnou. Deus respeitou a liberdade de cada escritor, que pôde se exprimir segundo seu jeito próprio de ver, seu plano, sua arte, seu estilo e o gênero de escrita que ele julgou o mais apropriado para transmitir sua mensagem. Encontramos, portanto, uma variedade de livros na Bíblia, que consiste numa pequena biblioteca.

    Terceira chave: as palavras importantes, presentes no fim do Apocalipse

    Se muitos ficam imóveis diante da Bíblia como na entrada de uma floresta impenetrável,⁵ é porque as pistas necessárias e os pontos de referência não lhes foram indicados. O caminho, no entanto, é bem demarcado.

    Ora, para alcançar um pouco de altitude, nada pode nos ser tão vantajoso quanto nos transportarmos ao final da Bíblia. De fato, as últimas páginas de um livro são sempre importantes. Nelas podemos reencontrar as palavras inauguradas na introdução, além de percebermos o ponto de convergência e o ponto de chegada dos grandes temas. Aquilo que aparecia até então de modo velado ou inacessível, até mesmo incompreensível, manifesta então todo o seu significado.

    Esse é o caso da Bíblia. Embora Deus tenha escrito por intermédio de numerosos escritores, num período de mais de mil anos, todo o seu pensamento parte do Gênesis, desenvolvendo-se em cada um dos livros, para finalmente culminar nos dois últimos capítulos do Apocalipse, os capítulos 21 e 22. O autor está consciente, ao cabo dessas duas páginas, que a revelação está concluída: Não acrescentem nada, nem retirem nada das palavras deste livro (Ap 22,18-19).

    Uma análise do final da Bíblia nos permitirá encontrar as palavras importantes que formam a trama de todo o Antigo Testamento. Teremos assim a confirmação, desde o início deste estudo, de que estamos seguindo as boas pistas.

    Salientemos que esses textos do Apocalipse se caracterizam como uma literatura de gênero fantástico, fabuloso. Será possível, como nessas duas páginas, exprimir de modo tão poético os desejos humanos mais profundos?

    Apocalipse 21

    ¹ Vi então um céu novo e uma nova terra – pois o primeiro céu e a primeira terra se foram, e o mar já não existe. ² Vi também descer do céu, de junto de Deus, a Cidade santa, uma Jerusalém nova, pronta como uma esposa que se enfeitou para seu marido. ³ Nisto ouvi uma voz forte que, do trono, dizia: "Eis a tenda de Deus com os homens. Ele habitará com eles; eles serão o seu povo, e ele, Deus-com-eles, será o seu Deus. ⁴ Ele enxugará toda lágrima dos seus olhos, pois nunca mais haverá morte, nem luto, e nem dor haverá mais. Sim! As coisas antigas se foram!".

    ⁵ O que está sentado no trono declarou então: Eis que eu faço novas todas as coisas. E continuou: Escreve, porque estas palavras são fiéis e verdadeiras. ⁶ Disse-me ainda: "Elas se realizaram! Eu sou o Alfa e o Ômega, o Princípio e o Fim; e a quem tem sede eu darei gratuitamente da fonte de água viva. ⁷ O vencedor receberá esta herança, e eu serei seu Deus e ele será meu filho. ⁸ Quanto aos covardes, porém, e aos infiéis, aos corruptos, aos assassinos, aos impudicos, aos magos, aos idólatras e a todos os mentirosos, a sua porção se encontra no lago ardente de fogo e enxofre, que é a segunda morte".

    ⁹ Depois, um dos sete Anjos das sete taças cheias com as sete últimas pragas veio até mim e disse-me: Vem! Vou mostrar-te a Esposa, a mulher do Cordeiro! ¹⁰ Ele então me arrebatou em espírito sobre um grande e alto monte, e mostrou-me a Cidade santa, Jerusalém, que descia do céu, de junto de Deus, ¹¹ com a glória de Deus. Seu esplendor é como o de uma pedra preciosíssima, uma pedra de jaspe cristalino. ¹² Ela está cercada por muralha grossa e alta, com doze portas. Sobre as portas há doze Anjos e nomes inscritos, os nomes das doze tribos de Israel. ¹⁴ A muralha da cidade tem doze alicerces, sobre os quais estão os nomes dos doze Apóstolos do Cordeiro.

    ²² Não vi nenhum templo nela, pois o seu templo é o Senhor, o Deus Todo-poderoso, e o Cordeiro. ²³ A cidade não precisa do sol ou da lua para a iluminar, pois a glória de Deus a ilumina, e sua lâmpada é o Cordeiro. ²⁴ As nações caminharão à sua luz, e os reis da terra trarão a ela sua glória; ²⁵ suas portas nunca se fecharão de dia – pois ali já não haverá noite – ²⁶ e lhe trarão a glória e o tesouro das nações. ²⁷ Nela jamais entrará algo de imundo, e nem os que praticam abominação e mentira. Entrarão somente os que estão inscritos no livro da vida do Cordeiro.

    Apocalipse 22

    ¹ Mostrou-me depois um rio de água da vida, límpido como cristal, que saía do trono de Deus e do Cordeiro. ² No meio da praça, de um lado e do outro do rio, há árvores da vida que frutificam doze vezes, dando fruto a cada mês; e suas folhas servem para curar as nações.

    ³ Nunca mais haverá maldições. Nela estará o trono de Deus e do Cordeiro, e seus servos lhe prestarão culto; ⁴ verão sua face, e seu nome estará sobre suas frontes. ⁵ Já não haverá noite: ninguém mais precisará da luz da lâmpada, nem da luz do sol, porque o Senhor Deus brilhará sobre eles, e eles reinarão pelos séculos dos séculos.

    ⁶ Disse-me então: Estas palavras são fiéis e verdadeiras, pois o Senhor Deus, que inspira os profetas, enviou o seu Anjo para mostrar aos seus servos o que deve acontecer muito em breve. ⁷ Eis que eu venho em breve! Feliz aquele que observa as palavras da profecia deste livro. ⁸ Eu, João, fui o ouvinte e a testemunha ocular dessas coisas. Tendo-as ouvido e visto, prostrei-me para adorar o Anjo que me havia mostrado tais coisas. ⁹ Ele, porém, me impediu: Não! Não o faças! Sou servo como tu e como teus irmãos, os profetas, e como aqueles que observam as palavras deste livro. É a Deus que deves adorar!"

    ¹⁰ E acrescentou: Não retenhas em segredo as palavras da profecia deste livro, pois o Tempo está próximo. ¹¹ Que o injusto cometa ainda a injustiça e o sujo continue a sujar-se; que o justo pratique ainda a justiça e que o santo continue a santificar-se. ¹² Eis que eu venho em breve, e trago comigo o salário para retribuir a cada um conforme o seu trabalho. ¹³ Eu sou o Alfa e o Ômega, o Primeiro e o Último, o Princípio e o Fim. ¹⁴ Felizes os que lavam suas vestes para terem poder sobre a árvore da Vida e para entrarem na Cidade pelas portas. ¹⁵ Ficarão de fora os cães, os mágicos, os impudicos, os homicidas, os idólatras e todos os que amam ou praticam a mentira.

    ¹⁶ Eu, Jesus, enviei meu Anjo para vos atestar estas coisas a respeito das Igrejas. Eu sou o rebento da estirpe de Davi, a brilhante Estrela da manhã.

    ¹⁷ O Espírito e a Esposa dizem: Vem! Que aquele que ouve diga também: Vem! Que o sedento venha, e quem o deseja receba gratuitamente água da vida.

    ¹⁸ A todo o que ouve as palavras da profecia deste livro, eu declaro: Se alguém lhes fizer algum acréscimo, Deus lhe acrescentará as pragas descritas neste livro. ¹⁹ E se alguém tirar algo das palavras do livro desta profecia, Deus lhe tirará também a sua parte da árvore da Vida e da Cidade santa, que estão descritas neste livro!

    ²⁰ Aquele que atesta estas coisas, diz: Sim, venho muito em breve! Amém! Vem, Senhor Jesus.

    ²¹ A graça do Senhor Jesus esteja com todos! Amém (Ap 21,1-27; 22,1-21).

    Tais visões podem nos deixar um pouco espantados e mesmo confusos. Em princípio, uma linguagem como essa pode parecer insólita para nossa mentalidade racional e científica...

    No entanto, essas visões têm um alcance incomparável: elas nos desvendam um futuro absolutamente impenetrável, buscando representar o outro mundo... Por esse motivo, o apelo à poesia e à linguagem simbólica era indispensável.

    Nós que somos tão apegados ao nosso mundo e tão sujeitos ao tempo, eis que somos subitamente arrebatados de nosso planeta e transportados para além do tempo. Essas páginas nos revelam que a história humana caminha em direção a um desfecho, um futuro luminoso. Nossa história tem um sentido, segue uma direção. Somos convidados a voltar nosso olhar para o futuro.

    Entretanto, se o autor nos revela as coisas que deverão acontecer depois destas (Ap 1,19), e muito em breve (Ap 1,1; 22,6), é para nos interpelar em nossa vida presente, neste último período da história que se estende da Ascensão de Cristo até o seu retorno (Ap 1,18). Em diversas passagens, está escrito que esse retorno está para acontecer em breve (Ap 22,7.12.20). Logo, a vida presente se define por uma característica extremamente séria: ela é o lugar de uma batalha da qual é preciso sair vencedor (Ap 21,7). Cabe a cada um tomar sua própria decisão diante de Deus, de modo a estabelecer seu futuro pessoal. Aquele que não quiser se relacionar com Deus conhecerá a segunda morte (Ap 21,8), pior que a morte física. Ele mesmo causará seu distanciamento de Deus e acabará ficando sozinho. Deus o respeitará. Esse é o significado destas duras palavras: Quanto aos covardes, porém, e aos infiéis, aos corruptos, aos assassinos, aos impudicos, aos magos, aos idólatras e a todos os mentirosos, a sua porção se encontra no lago ardente de fogo e enxofre, que é a segunda morte (Ap 21, 8); Ficarão de fora os cães, os mágicos, os impudicos, os homicidas, os idólatras e todos os que amam ou praticam a mentira (Ap 22,15). Cada um receberá o salário conforme o seu trabalho (Ap 22,12). Trata-se de um apelo à conversão, apelo que ecoa por toda a Bíblia. O próprio Jesus mudou o foco do nosso olhar, orientando-o ao futuro, interpelando-nos em nossa vida presente: O Reino de Deus está próximo! Arrependei-vos e crede no Evangelho (Mc 1,15).

    Consideremos as palavras-chave dessas páginas que significam a grande esperança do fim dos tempos.

    No capítulo 21, mencionam-se, antes de tudo, um novo céu e uma nova terra. Essas palavras lembram o primeiro versículo do Gênesis e o projeto inicial de Deus: No princípio, Deus criou o céu e a terra. Portanto, o anúncio de uma criação perfeita é retomado no Apocalipse.

    No capítulo 22, o autor faz referência ao rio de água da vida, no meio da praça; em seguida, à árvore da Vida (22,1.2.14.19). Tais expressões remetem dessa vez ao segundo capítulo do Gênesis, ao relato do jardim do Éden que também expõe o projeto de Deus: Iahweh Deus fez crescer a árvore da vida no meio do jardim. Um rio saía do Éden para regar o jardim (Gn 2,9-10).

    As duas últimas páginas da Bíblia retomam, assim, as duas primeiras! Elas reafirmam o projeto que Deus havia concebido desde o princípio: o projeto de uma criação em que tudo é bom e o projeto do paraíso. Encontramos nelas as mesmas características do Gênesis: Ele habitará com eles. Ele enxugará toda lágrima de seus olhos, pois nunca mais haverá morte, nem luto, nem clamor, nem dor haverá mais (21,3-4).

    Essas primeiras e últimas páginas revelam a vontade de Deus. O que Deus quer é um mundo no qual tudo seja bom, um paraíso em que não haja sofrimento nem morte.

    Essas são as mais belas páginas da Bíblia: no princípio, assim como no fim, não existe o mal, nunca mais haverá maldições (Ap 22,3); tudo é novo, tudo é como Deus sempre quis. Em dois momentos, é mencionado que o primeiro céu e a primeira terra se foram, [que] as coisas antigas se foram (Ap 21,1.4). Esse mundo antigo é o mundo atual, corrompido pelo mal, cuja descrição se inicia em Gênesis 3 e se estende até Apocalipse 20. Desse modo, somos colocados diante do grande enigma das forças do mal, que aparecem no princípio, por sob a imagem da serpente astuciosa (Gn 3,1) e que desaparecem no final, quando o Diabo [é] lançado no lago de fogo e de enxofre, onde já se achavam a Besta e o falso profeta. E serão atormentados dia e noite, pelos séculos dos séculos (Ap 20,10).

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    Assim, o novo céu e a nova terra coincidem com o paraíso. Trata-se de uma esperança decisiva, certa: Estas palavras são fiéis e verdadeiras, o que se repete por duas vezes (Ap 21,5; 22,6). Se nós de fato tomássemos consciência de que esse novo universo um dia existirá, nossa vida seria envolvida por uma grande luz.

    Eis as primeiras palavras-chave: criação perfeita e paraíso. Elas, por si mesmas, expressam e contêm o projeto de Deus.

    A quem estão destinados esse novo céu e essa nova terra? O início da Bíblia nos responde: ao homem e à mulher; portanto, à humanidade inteira. O Apocalipse o confirma: Deus quer habitar com os homens (Ap 21,3).

    Ora, no mesmo versículo, os homens são designados como sendo seu povo. Eis uma outra expressão capital: Eles serão o seu povo (Ap 21,3).

    Tratando-se de todos os homens, esse povo é formado pelo povo de Israel, evocado por meio da referência às doze tribos de Israel (Ap 21,12), e também formado pela Igreja, evocada pela referência a Igrejas e pela menção dos nomes dos doze Apóstolos do Cordeiro (22,16; 21,14). Os escritores da Bíblia haviam percebido, desde o início, que Deus não podia ser exclusividade de um só povo. O autor do Apocalipse sela essa perspectiva afirmando que as folhas da árvore da vida podem curar as nações (22,2), ou seja, os pagãos.

    Onde viverá esse povo? Na nova terra. Essa expressão, que ainda há pouco designava a nova criação, compreende igualmente a rea­lidade da terra prometida. Essa terra é sempre anunciada como uma terra de repouso. Nela encontramos a paz, a segurança, como é o caso neste versículo: (...) nem clamor e nem dor haverá mais (21,4).

    Nessa nova terra, Deus está em relação com o homem e o homem em relação com Deus. Trata-se da aliança, outra palavra fundamental da Bíblia: Deus é amigo do homem e seu aliado. Ele está com o homem. As diversas fórmulas da aliança se encontram aqui: Eis a tenda de Deus com os homens; eles serão o seu povo, e ele, Deus-com-eles, será o seu Deus (21,3). Essa aliança é expressa de maneira ainda mais pessoal pela seguinte promessa: Eu serei seu Deus e ele será meu filho (21,7). Nós a encontramos igualmente por trás das magníficas imagens da esposa que se enfeitou para seu marido (21,2), e da mulher do Cordeiro (21,9).

    Eis três outras palavras importantes: povo, terra e aliança.

    Ora, essas três palavras aparecem na Bíblia a partir de Gênesis 12 e remetem a três promessas que Deus dirige a Abraão: este terá numerosos descendentes, que habitarão a terra prometida, e Deus estará com eles. Essas promessas retomam o grande projeto de Deus anunciado em Gênesis 1-2, em que toda a humanidade, dentro de uma criação perfeita, está em relação com Deus.

    Assim as palavras criação, paraíso, terra prometida se unem.

    Nessa nova terra é construída uma cidade: a nova Jerusalém. Esta também se confunde com o paraíso! De fato, como no meio do jardim do Éden, "o rio de água da vida, saía (...) no meio da praça" (Ap 22,1-2). É lá que se encontra igualmente a árvore da vida, de modo que assim está escrito: [eles terão] poder sobre a árvore da Vida e [entrarão] na Cidade pelas portas (22,14). Menciona-se igualmente, lado a lado, a parte da árvore da Vida e da Cidade santa (22,19). A nova Jerusalém é o paraíso.

    Nessa cidade, não [se vê] nenhum templo, pois o seu templo é o Senhor, e o Cordeiro (21,22). O templo era o sinal da presença de Deus em Jerusalém. Aqui, esse sinal não é mais necessário, pois se verá a face de Deus (22,4). Todo sinal é substituído pela presença concreta de Deus. A nova Jerusalém é a tenda de Deus (21,3). Estamos no céu, na Cidade de Deus (21,2). O universo inteiro está repleto de sua presença.

    Enfim, nessa Cidade se encontra o trono de Deus e do Cordeiro (22,3). Deus é efetivamente o rei, o Deus Todo-poderoso (21,22), o que está sentado no trono (21,3.5). Ele reina por meio de Jesus, o Ressuscitado, o rebento da estirpe de Davi (22,16). A nova Jerusalém corresponde, portanto, ao Reino de Deus!

    Estas são as três últimas palavras-chave: uma cidade, um templo, um rei.

    Ora, essas três palavras aparecem na Bíblia nos livros de Samuel e estão em relação com três promessas que Deus dirige a Davi: em Jerusalém, Deus habitará o templo, e um descendente de Davi será rei para sempre. Podemos notar, mais uma vez, que essas três promessas correspondem ao projeto de Deus expresso em Gênesis 1-2, segundo o qual Deus havia criado um lugar ideal para morar com o homem e a mulher, e para ser seu rei e protetor.

    As duas últimas páginas do Apocalipse, escritas em linguagem muito simples, retomam o projeto de Deus para toda a humanidade, projeto que se tornou promessa na história de Israel, por meio daquelas promessas dirigidas a Abraão e a Davi.

    Eis por que, desde o início de seu Evangelho, São Mateus escreve: Jesus Cristo, filho de Davi, filho de Abraão (Mt 1,1). O Evangelista designa os dois homens do Antigo Testamento aos quais Deus dirigiu as promessas. Eis aqui uma ótima chave de interpretação.

    As palavras do Apocalipse que sintetizam o Antigo Testamento são carregadas de um simbolismo que jamais terminaremos de desvendar: criação perfeita, paraíso, nova terra, nova Jerusalém, Reino de Deus, morada/tenda de Deus com os homens, aliança eterna... Por sua própria simplicidade, elas aludem a uma realidade que sempre nos arrasta para além daquilo que experimentamos.

    Agrupemos agora as expressões do Apocalipse analisadas e reparemos como elas se implicam mutuamente:

    Projeto para toda a humanidade

    Essa análise das duas últimas páginas do Apocalipse é absolutamente essencial. Desse modo, tornamo-nos conhecedores das palavras importantes que permitem descobrir a simplicidade da Bíblia. Essas palavras aparecem do início da Bíblia até os últimos livros de Samuel. Elas designam o projeto de Deus para a humanidade (Gênesis 1-2), projeto esse resgatado pelas promessas a Abraão e Davi (Gênesis 12 a Samuel). Que o projeto de Deus seja formulado em termos de promessas constitui, aliás, uma extraordinária perspectiva referente a Deus! O Deus das promessas é o Deus da gratuidade! E a gratuidade procede do amor.

    Esses elementos do Apocalipse traçam nosso percurso.

    Assim sendo, o Antigo Testamento compreende quatro grandes partes:

    Primeira parte: os onze primeiros capítulos do Gênesis

    O projeto de Deus para a humanidade: uma criação perfeita e um paraíso.

    Segunda parte: de Gênesis 12 aos livros de Samuel

    O tempo das promessas.

    As promessas a Abraão: um povo, uma terra, uma aliança.

    As promessas a Davi: uma cidade, um templo, um rei.

    Tudo é realizado primeiramente sobre a terra.

    * Gênesis 12-50, Êxodo, Josué, Juízes, Samuel.

    Terceira parte: os Profetas

    O desenvolvimento das promessas

    Tudo será novo

    * Elias, Amós, Oséias, Isaías, Jeremias, Ezequiel, Segundo Isaías.

    Quarta parte: os Sábios

    O cumprimento das promessas

    Tudo se cumprirá com a ressurreição dos mortos!

    * Provérbios, Jó, Eclesiastes, Eclesiástico, Daniel.

    Essa disposição realça o fio condutor do Antigo Testamento. A primeira parte nos fará apreender o desígnio global de Deus para toda a humanidade (Gn 1-11), o que é primordial. Na segunda parte, observaremos a retomada desse desígnio com as promessas a Abraão e a Davi (Gn 12 a Samuel). Deus tem um único projeto. Gênesis 12 a Samuel se encontram intimamente ligados a Gênesis 1-11, ainda que este último se distinga, desde o início, da história judaica propriamente dita.

    Essa segunda parte, assim delimitada, possui a grande vantagem de considerar como um conjunto o afresco que vai de Abraão a Davi, pintura infelizmente, e com freqüência, fragmentada. É certamente tradicional dividir o Antigo Testamento em três grandes partes: a Lei, os Profetas e os Sábios. Infelizmente, especialmente na tradição católica, estudamos a Lei por si mesma (o Pentateuco), para em seguida passarmos diretamente aos Profetas. O que vêm a ser então os livros de Josué, dos Juízes, de Samuel e dos Reis? Livros classificados como históricos e freqüentemente fadados ao silêncio. Não é de se espantar que as promessas de Deus não sejam enfatizadas nem acompanhadas em seu desenvolvimento.

    Adotando esta divisão, poderemos discernir melhor as três grandes etapas da história de Israel, tais como o Evangelho de Mateus as revelou:

    – de Abraão a Davi;

    – de Davi ao exílio na Babilônia;

    – do exílio na Babilônia até a Vinda do Messias (Mt 1,17).

    Esses três períodos marcam justamente a progressão das promessas: as promessas se cumprem primeiramente entre Abraão e Davi, em seguida são aprofundadas pelos profetas no tempo do exílio, e, após o exílio, projetadas no mundo da ressurreição pelos Sábios. Uma outra extraordinária chave de interpretação!

    Com essas três grandes chaves de leitura – ler a Bíblia como um todo, prestar atenção aos gêneros literários, conhecer as palavras importantes –, podemos abordar o Antigo Testamento de um modo verdadeiramente apropriado, já o considerando como um livro futurista, pois seu desenrolar nos conduzirá ao mundo da ressurreição, no qual Jesus já se encontra! Ora, se tudo já se cumpriu para ele, nada se cumpriu ainda para nós. O Antigo Testamento é, portanto, de uma atualidade impressionante. O caminho que Israel seguiu, e que o próprio Jesus assumiu, é também o nosso.

    1 GRELOT, Pierre. Sens chrétien de l’Ancien Testament, 2.ª ed., Paris, Desclée, 1962, p. 422.

    2 GELIN, Albert. Les idées maîtresses de l’Ancien Testament, Foi vivante n° 30. Paris, Cerf, 1966, p. 7.

    3 Constituição Dogmática Dei Verbum, Sobre a Revelação Divina, n° 12 e 16. http://www.vatican.va/archive/hist_councils/ii_vatican_council/documents/vat-ii_const_19651118_dei-verbum_po.html

    4 AUZOU, Georges. La parole de Dieu, 3.ª ed. Paris, Éditions de l’Orante, 1960, p. 418.

    5 DIÉTRICH, Suzanne de. Le dessein de Dieu. Neuchatel, Delachaux et Niestlé, 1965, p. 8.

    PRIMEIRA PARTE

    OS ONZE PRIMEIROS CAPÍTULOS DO GÊNESIS

    O projeto de Deus para a humanidade

    O CONTEÚDO dos primeiros capítulos do Gênesis é geralmente bem conhecido. Aliás, já se ouviu falar muito a respeito deles, de modo que podemos querer guardar tais histórias numa gaveta, de uma vez por todas. São aparentemente pouco interessantes, ultrapassadas, completamente fora de moda... Por que então nos interessarmos ainda por estes textos sobre a criação em seis dias (Gn 1), o paraíso (Gn 2), Adão e Eva (Gn 3), Caim e Abel (Gn 4), o dilúvio (Gn 6-9), a Torre de Babel (Gn 11)?

    Certamente, muitas expressões desses capítulos continuam a povoar nossas conversas, tais como: Estou me sentindo no paraíso, esta chuva está parecendo o verdadeiro dilúvio, esta empresa é a própria torre de Babel... Contudo, a compreensão das primeiras páginas da Bíblia permanece quase sempre muito limitada, até mesmo lamentável.

    De fato, são as páginas mais significativas do Antigo Testamento, nas quais os autores falam a respeito da humanidade em geral, mas também são as mais complexas, de modo que o grande Teólogo Karl Rahner chegou a escrever: Minha fé não dependerá da questão de saber se os exegetas ou o Magistério da Igreja conseguiram ou não interpretar corretamente os primeiros capítulos do Gênesis!.¹

    Bem pretensioso, portanto, quem pretendesse dar a última palavra sobre esses textos! Entretanto, poderemos vislumbrar a mensagem essencial que eles trazem e seu papel fundamental como ponto de partida para o desenvolvimento de toda a Bíblia. Deveremos pelo menos evitar que nossa interpretação se estabeleça a partir de dados inaceitáveis.

    Ora, o erro mais comum referente a esses textos é o de os considerar ainda ao pé da letra. Desse modo, estima-se pura e simplesmente que:

    – a criação foi feita em seis dias;

    – o paraíso existiu no princípio;

    – o homem foi feito da argila;

    – depois, foram criados os animais;

    – em seguida a mulher, a partir da costela do homem;

    – o primeiro homem se chamava Adão; a primeira mulher, Eva;

    – uma serpente falou à mulher;

    – eles tiveram a infelicidade de comer o famoso fruto;

    – todos nós sofremos e morremos por causa disso;

    – Deus os puniu e expulsou...

    Explica-se, em seguida, o relato de Caim e Abel como se fosse a história da primeira família e do primeiro homicídio; o relato do dilúvio como se um homem tivesse realmente reunido machos e fêmeas de todas as espécies de viventes e os tivesse embarcado num navio; o relato da torre de Babel como se todos os homens tivessem se reunido para realizar uma construção gigantesca que atravessaria as nuvens...

    Prosseguindo por essa abordagem insatisfatória, faz-se ainda uma infinidade de falsas perguntas sobre os textos: Deus criou cada espécie de uma vez por todas ou por meio de um processo evolutivo? Quem pecou primeiro, o homem ou a mulher? Que ato eles puderam cometer? Onde se encontram os querubins que guardam o caminho da árvore da vida? Como os homens podiam viver seiscentos ou novecentos anos?

    Algumas pessoas ainda imaginam que o paraíso existiu e que acabaremos encontrando a arca de Noé... Pensam que tais descobertas arqueológicas provariam que a Bíblia disse a verdade. Évode Beaucamp dizia: Aqueles que procuram pela arca de Noé, eu os admiro mais como alpinistas do que como especialistas em Bíblia!.

    Os escritores da Bíblia certamente ficariam incomodados ao nos verem, em algum ponto do planeta, correndo atrás de uma árvore bizarra, conhecida como a árvore do conhecimento do bem e do mal! Eles com certeza nos diriam: Ora, pois! Trata-se apenas de uma imagem!.

    Rememoremos aqui a chave de leitura formulada pelo Papa Pio XII:

    A regra suprema para uma interpretação correta dos textos bíblicos consiste em encontrar e definir o que o autor quis dizer e estar atento aos gêneros de discurso ou de escrita que ele utiliza (Encíclica Divino afflante Spiritu, 1943).

    Se há textos da Bíblia que não devemos considerar ao pé da letra, os onze primeiros capítulos do Gênesis estão entre eles.

    Hoje, graças às descobertas de numerosos especialistas nos dois últimos séculos, podemos penetrar melhor no contexto da época em que os livros da Bíblia foram escritos. Inúmeros estudos sobre as línguas antigas, o contexto histórico e social, os costumes e a mentalidade dos autores, seu estilo literário, as imagens de que se utilizaram, os empréstimos que fizeram dos escritos de povos vizinhos... Tudo isso nos permite uma melhor percepção do alcance de seus textos:

    O resgate das literaturas antigas, que recoloca o Antigo Testamento em seu ambiente natural, é algo absolutamente moderno. O Renascimento, nem a Idade Média, nem a própria antiguidade cristã puderam instituir uma comparação direta entre os textos da Bíblia e seus correspondentes mesopotâmicos, egípcios e cananeus.²

    Atualmente conhecemos textos mesopotâmicos sobre a criação, o jardim do Éden, o dilúvio, e sabemos que os autores da Bíblia se inspiraram neles para expor sua própria visão das coisas e do mundo. Desse modo, podemos entender melhor sua mensagem.

    Portanto, os onze primeiros capítulos do Gênesis devem ser considerados sob uma nova perspectiva, o que nos permitirá descobrir sua riqueza.

    Esta primeira parte compreenderá dois capítulos:

    1- Alguns instrumentos para compreender bem Gênesis 1-11.

    2- Interpretação de Gênesis 1-11.

    1 RAHNER, Karl. Est-il possible aujourd’hui de croire? Paris: Mame, 1966, p. 18.

    2 GRELOT, Pierre. Sens chrétien de l’Ancien Testament. 2.ª ed. Paris: Desclée, 1962, p. 410.

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    Alguns instrumentos para compreender bem Gênesis 1-11

    A fim de esclarecer melhor os onze primeiros capítulos do Gênesis, consideremos os seguintes dados:

    A) Os dois autores de Gênesis 1-11.

    B) A similaridade com narrativas mesopotâmicas.

    C) A experiência histórica de Israel na fonte da composição.

    A) Os dois autores de Gênesis 1-11

    Há dois autores na origem desses primeiros capítulos do Gênesis. Os especialistas os nomearam o escritor Javista e o escritor Sacerdotal. O Javista chama a Deus de Iahweh e o Sacerdotal utiliza simplesmente Deus (ou Elohim). Cada um dos dois tem um relato próprio da criação. O Javista escreve: "No tempo em que Iahweh Deus fez a terra e o céu (Gn 2,4b), e o Sacerdotal: No princípio, Deus criou o céu e a terra (Gn 1,1). Esses dois autores podem se encontrar num mesmo texto, como o relato do dilúvio tal qual o conhecemos hoje. O Javista escreve: Iahweh disse a Noé... (Gn 7,1), e o Sacerdotal: Deus disse a Noé..." (Gn 6,13).

    O autor Javista mostra um Deus pessoal, agindo como um homem. Iahweh é alternativamente oleiro (com argila ele dá forma ao homem), jardineiro (ele planta um jardim), anestesista (ele faz o homem adormecer), cirurgião (ele retira uma costela do homem, colocando carne no lugar), costureiro (ele confecciona túnicas de pele para o homem e a mulher). Além disso, ele passeia no jardim, ao sopro da brisa noturna, e procura pelo homem (Onde estás? – Gn 3,9), queixa-se (Que fizeste? – Gn 3,13), expulsa o homem e a mulher, fecha a porta da arca de Noé, desce à Terra para ver a cidade e a torre que os homens construíram, dispersando-os em seguida... Estes são, evidentemente, modos simbólicos de expressão.

    O escritor Sacerdotal descreve um Deus mais transcendente. Em seu relato da criação, Deus cria num ato exclusivo de sua palavra: Deus disse... e assim se fez (Gn 1,29-30). Portanto, cada autor tem seu jeito próprio de apresentar Deus.

    É preciso salientar que esses dois autores escrevem em períodos distantes, com mais de 400 anos de diferença. O Javista viveu no tempo de Davi e Salomão, por volta de 1000 e 950 antes de Cristo. O Sacerdotal se situa bem depois, no tempo do exílio na Babilônia, por volta de 550 antes de Cristo.

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    A parte maior da composição dos onze primeiros capítulos do Gênesis é atribuída ao escritor Javista. Deve-se a ele o relato do Jardim do Éden (Gn 2), a descrição da falta do homem e da mulher (Gn 3), do episódio de Caim e Abel, com um texto sobre a descendência de Caim (Gn 4), um relato sobre o dilúvio, e a narrativa da torre de Babel (Gn 11,1-9). O Sacerdotal acrescentou seu relato da criação em seis dias (Gn 1), uma genealogia que vai de Adão a Noé, seu relato do dilúvio, imbricado no relato do Javista (Gn 6-9), e uma genealogia que vai de Noé a Abraão (Gn 10 e Gn 11,20-26).

    Feitas tais considerações, temos o seguinte quadro:

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    O fato de haver dois autores que escreveram 950 ou 550 anos antes de Cristo deve nos levar a refletir. Não podemos lhes pedir para nos contar como surgiu o universo, nem como se deu a origem da humanidade no mundo. Aliás, eles não procuram saber como o mundo e a humanidade nasceram – o que compete à ciência –, mas por que há um mundo com seres humanos e por que existe o sofrimento e a morte, o que é completamente diferente. A Bíblia se interessa por uma questão: o destino final do ser humano e de todo o universo. A ciência observa como evoluem a vida, as forças do universo ou o ser humano; ela não afirma o que é a vida, o que é a energia ou o ser humano. Ela também não diz qual o sentido para tudo isso. A questão por que o mundo? é bem diferente da questão como é feito o mundo?

    Também não é preciso pedir a esses dois autores uma genealogia do gênero humano desde o primeiro homem – aliás, eles não quiseram falar somente do primeiro homem – até o patriarca dos Judeus, Abraão. Hoje nós sabemos que a humanidade surgiu na África há mais de três milhões de anos. Os autores não sabiam disso. Portanto, não devemos considerar seus números como dados matemáticos, procurando saber se Matusalém realmente viveu 969 anos. Perguntas como esta são falsas.

    Coloquemos em evidência o empreendimento do primeiro escritor da Bíblia, o Javista. É ele quem estabelece os fundamentos da Sagrada Escritura, desde o Gênesis até os livros de Samuel, que são a base da Bíblia.

    Vivendo no tempo dos reis Davi e Salomão, o Javista empreendeu em primeiro lugar o relato da história de seu povo, remontando, o mais longe que pôde, ao tempo de Abraão, o Patriarca, que viveu por volta de 1850 antes de Cristo. Ele quis rememorar a história da nação judaica, seguindo os principais acontecimentos de que tinha conhecimento. Mas além dessa época, ele quis esboçar uma visão da fundação do mundo (12 a 15 bilhões de anos?) e da humanidade (3 milhões de anos?):

    A novidade se encontra no autor Javista, o qual, por sua própria autoridade, constrói, como prólogo à história judaica, a história das origens da humanidade em geral.¹

    No quadro que segue, partindo da direita, o escritor, contemporâneo dos reis Davi e Salomão, reconstitui a História até Abraão; em seguida, até o começo do mundo!

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