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Catolicismo e política: Pastoral da Juventude e a formação partidária no PT
Catolicismo e política: Pastoral da Juventude e a formação partidária no PT
Catolicismo e política: Pastoral da Juventude e a formação partidária no PT
E-book430 páginas5 horas

Catolicismo e política: Pastoral da Juventude e a formação partidária no PT

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Sobre este e-book

O que anima o militante? Nesse momento em que a política volta às discussões mais comuns, seja nos núcleos familiares, seja nas redes sociais, é muito bem-vindo um estudo de caso que esclareça o nascimento e as motivações sociais que levam os jovens a optarem pela militância política. Aqui, o Partido dos Trabalhadores, visto em sua fase nascente, revela sua ligação umbilical com a ética religiosa católica da Teologia da Libertação e os movimentos sociais de base. Nesse panorama, encontramos a Pastoral da Juventude e as propostas de que seria possível mudar o mundo e construir a "Civilização do Amor" a partir da militância, fosse ela político-partidária, sacerdotal ou mesmo de ação social do magistério.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento26 de jun. de 2020
ISBN9786555235852
Catolicismo e política: Pastoral da Juventude e a formação partidária no PT

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    Catolicismo e política - Ronald Apolinario de Lira

    Editora Appris Ltda.

    1ª Edição - Copyright© 2019 dos autores

    Direitos de Edição Reservados à Editora Appris Ltda.

    Nenhuma parte desta obra poderá ser utilizada indevidamente, sem estar de acordo com a Lei nº 9.610/98.

    Se incorreções forem encontradas, serão de exclusiva responsabilidade de seus organizadores.

    Foi feito o Depósito Legal na Fundação Biblioteca Nacional, de acordo com as Leis nºs 10.994, de 14/12/2004 e 12.192, de 14/01/2010.

    COMITÊ CIENTÍFICO DA COLEÇÃO CIÊNCIAS SOCIAIS

    Dedico este livro à minha mãe, Risalva Apolinario, à minha esposa, Luciana Marques, e aos meus filhos, Helen Christine e Hiram Said. Amplio a dedicatória

    ao meu avô José Apolinario (in memoriam).

    AGRADECIMENTOS

    Agradeço a todos os que me ajudaram a construir este livro, com esforço e perseverança. Inicialmente – e seguindo uma ordem cronológica! –, agradeço à minha querida mãe, Risalva Apolinario de Lira, por ter incutido em mim o amor pelo estudo, além dos valores que me acompanham até hoje. À minha amada esposa, Luciana Marques, que não apenas na construção deste livro, mas, principalmente antes, enquanto ainda fazia minhas pesquisas para o doutorado, proporcionou-me todo o apoio e ofereceu todo o seu amor, na forma de compreensão.

    Agradeço também aos meus entrevistados: Artur Messias, que me recebeu diversas vezes e de forma tão amigável, dando espaço em suas ocupadas horas de trabalho para conversarmos; André Taffarel, que, também em seu corre-corre, recebeu-me mais de uma vez para poder ser entrevistado; Márcia Brandão, padre Antônio Pedro, Maria de Fátima e Luis Menezes; padre Ricardo, Albea Regina e Jessé Dutra: nunca conseguirei agradecer o suficiente pela paciência e amizade de compartilharem seu tempo para a minha pesquisa.

    Agradeço à minha querida amiga professora Cecília Mariz, que durante toda a minha vida da pós-graduação esteve ao meu lado e, com sua forma meiga e profunda, ensinou-me, orientou-me e ajudou-me a construir meu conhecimento das Ciências Sociais.

    A todos os amigos que acreditaram em mim e apostaram nesta obra mesmo antes de ela existir. Nunca esquecerei de que foram vocês que permitiram que este livro se tornasse real. Sem sua ajuda e fé no meu trabalho ele não sairia no papel.

    Dentre esses amados amigos, gostaria de agradecer em especial ao professor Paulo Alves, que não apenas me empurrou na empreitada de publicar este livro, mas por toda a sua ajuda ao longo desses mais de 20 anos de amizade. Foi você, Paulo, que me ensinou a ser o professor que sou hoje, ensinou-me a ensinar e, a cada passo que dei na vida acadêmica, sempre estava lá uma palavra sua para me incentivar a ir adiante. Você me fez acreditar que eu iria mais longe, ao doutorado e à vida de professor universitário. Sua parcela na minha vida nunca será apagada.

    APRESENTAÇÃO

    Tudo se iniciou em 1988, quando eu tinha de 13 anos e comecei a participar da Comunidade Eclesial de Base de São José, no bairro de mesmo nome, em Belford Roxo. Eu não era muito interessado em ir às missas, mas um vizinho mais velho, colega de meus irmãos, chamava-me no portão todos os domingos, às sete e meia da manhã.

    Ingressando em uma Comunidade bastante pobre e com dificuldades de preencher todos os bancos vazios do templo, composta majoritariamente de pessoas maiores de 40 anos, eu comecei a me interessar nas atividades religiosas e sociais da sua igreja: cantava nas missas e celebrações; ajudava na festa do padroeiro, além de participar do grupo de jovens. Crismei-me aos 15 anos e logo me vi como um dos coordenadores do meu grupo jovem, mais tarde denominado Jovens seguindo a Cristo (Josec), uma corruptela para incluir o nome de São José como identificador comunitário nos encontros de juventude.

    Foi por meio de seu grupo que tive contato com a Pastoral da Juventude (PJ) paroquial. Minha paróquia, Nossa Senhora Aparecida, instância superior à CEB de que participava, era composta de treze comunidades, algumas tão ou mais pobres que a dele. O meu grupo jovem, descobri em um encontro na paróquia, deveria ter representante na comissão paroquial da PJ, para receber todo o apoio de formação devido aos jovens católicos. Fui o escolhido como membro representante de meu grupo, seguindo o que os membros da PJ chamavam de militância.

    Entre a PJ paroquial e o abandono do catolicismo, muitos anos depois, eu trafeguei pelos principais eventos de juventude da PJ da diocese de Nova Iguaçu: organizando retiros de formação sociopolítica; participando e às vezes coordenando a PJ nos níveis paroquial, regional e diocesano. Essa trajetória militante construiu-me uma visão de mundo muito peculiar, majoritariamente de esquerda e apegada ao campo das ciências humanas e sociais. Assim também ocorreu com boa parte dos entrevistados para o trabalho que deu origem a este livro, que militavam na PJ junto comigo: Taffarel, Márcia Brandão, Albea Regina e Maria de Fátima.

    Algumas das ideias que deram origem às minhas pesquisas nasceram ainda naquele período de militância de PJ. Foi lá que pude perceber a relação entre a política, a pobreza e a religião católica da Teologia da Libertação (TL). Para nós, militantes da PJ, os outros jovens que não estavam interessados em debater a política social em que vivíamos dentro da igreja eram "alienados". Falávamos de práxis e utilizávamos o léxico marxista sem saber mesmo quem era Karl Marx! Essas experiências marcaram a geração de membros da PJ que, como veremos nas páginas deste livro, foi o palco de transformações importantes no meio popular da diocese de Nova Iguaçu. Muitos se aliaram aos movimentos de esquerda e ao PT, alcançando postos na administração pública.

    O livro que você agora tem em mãos é o resultado de quatro anos de esforço. Ele nasceu dos resultados da minha pesquisa de doutorado, defendida pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) em 2015. Mesmo que haja certo espaço de tempo entre a conclusão dos estudos e a publicação em livro desse material, os dias de hoje clamam pela discussão das questões de políticas de esquerda e suas relações em diferentes esferas da sociedade.

    Com o impeachment da presidente Dilma Rousseff em 2016, o debate acalorado que assolou o país sobre esquerda e direita necessita, a meu ver, de materiais para aprofundar teoricamente o assunto. Nas páginas a seguir, apresento uma faceta do nascimento do PT em um município periférico do Rio de Janeiro e mostro como, com o passar de um pouco mais de trinta anos, não só as concepções acerca do significado da dicotomia esquerda-direita, mas o próprio sentido da ideia de militância, mudou drasticamente. Atualmente as discussões mais comuns nas redes sociais se tornam guerras abertas pela simples menção da palavra PT. É um bom exercício de história lembrar que há uma longa história anterior aos escândalos da Operação Lava-Jato.

    A principal intenção deste livro é fazer um exercício de sociologia histórica compreensiva, baseando-me, principalmente, na obra de Max Weber. Defendo aqui que as esferas política e religiosa são espaços amplos e não impermeáveis, em que, a todo o momento, é visível o compartilhamento de sentido entre elas. Especificamente falando sobre o assunto do livro, apresentarei de modo paulatino a composição do sentido religioso presente na política de esquerda nos anos de 1980 e como esse mesmo sentido se desenvolveu ao longo de duas décadas, modificando-se e se ajustando às demandas sociais de seu tempo e lugar. Compreender o sentido da ação política, dado por movimentos sociais e religiosos, permite-nos ampliarmos nossas concepções sobre o que leva o indivíduo escolher essa ou aquela forma de atuação no espaço público.

    Assim, pretendendo demonstrar como sujeitos concretos no mundo dão sentido a suas ações políticas, sentido esse, inicialmente, fornecido por uma forma específica de catolicismo. Decidi compreender como a Teologia da Libertação pôde influenciar gerações de jovens a atuar de forma enérgica nas questões políticas, tanto na esfera dos partidos políticos de esquerda como no encaminhamento de outras questões, como a vida consagrada – formação de padres e/ou freiras – e serviços diversos na sociedade civil, como o ofício do professor.

    Especificamente no que tange o Partido dos Trabalhadores em Nova Iguaçu, tentei entender se, ao longo do tempo, o projeto de formação de jovens militantes de esquerda, apregoado pela Pastoral da Juventude, seria o real motivo de vitórias alcançadas em pleitos eleitorais por alguns de seus antigos membros nos anos 2000.

    Para tanto, foi necessário contextualizar o meio geográfico escolhido – o município de Nova Iguaçu e alguns outros, hoje dele emancipados, principalmente o município de Mesquita – e o seu desenvolvimento sociopolítico e econômico ao longo de sua história, e aplicar sobre essa trajetória a presença da Igreja e de sua vertente militante de esquerda, a Teologia da Libertação. Feito isso, pudemos ver nas trajetórias de certos indivíduos se ainda é possível fazer política baseando-se na ideologia religiosa apreendida pela PJ nos seus tempos de juventude ou, pelo contrário, se, com o passar dos anos, os ideais religiosos se dissiparam, sendo substituídos pela forma de política guiada por necessidades práticas.

    Já no campo dos demais agentes de pastorais formados pela PJ nos anos de 1980-90, debrucei-me sobre semelhante questão: será que, depois de mais de 30 anos, aquelas pessoas formadas pela PJ ainda possuem o ethos militante nas suas ações sociais/profissionais? E, especificamente no caso dos padres, será que, depois de um desmonte da ideologia da TL, ocorrida em meados dos anos de 1990, tanto nas esferas eclesiásticas como em diversos espaços da Igreja, ainda há lógica em defender tais ideais de esquerda?

    A divisão do livro se dará da seguinte forma: o primeiro capítulo versará sobre a Baixada Fluminense. A escolha do tema se deu por eu acreditar que, antes de tratar dos assuntos relativos aos militantes da PJ, seria necessária uma inserção na realidade sui generis da Baixada, destrinchando tanto seu perfil histórico como político e econômico. Nesse momento discutirei a relação entre a política e as heranças deixadas pela ditadura militar na forma das famílias importantes e influentes da região tanto na economia e política regional. Achei importante desvelar as diferentes concepções da Baixada tanto para os pesquisadores especialistas como para seus moradores e visitantes. A ponte que liga o tema dos militantes da PJ ao debate sobre a Baixada está na atuação da diocese de Nova Iguaçu, em especial, a de seu bispo Dom Adriano Hypólito, grande apoiador das políticas sociais na região. Na linha de continuidade da ação da Igreja iguaçuana, apresentarei as suas relações com a formação do PT na Baixada por meio de quadros essencialmente católicos.

    A Teologia da Libertação será o assunto do segundo capítulo, no qual tratarei não apenas da teologia em si, mas também de todo entorno histórico que cerca a sociedade brasileira e latino-americana nos anos próximos ao Concílio Vaticano II (1962-1965). É no final da década de 1950 que movimentos católicos de esquerda começarão a surgir no continente e que, segundo Michael Löwy,¹ serão influenciados principalmente pelo modelo da Revolução Cubana de 1959. É um momento que coincidirá com o golpe militar de 1964 e a radicalização da repressão contra todos os movimentos de esquerda. Em momentos decisivos, certos setores progressistas da Igreja irão se pronunciar contra as constantes violações dos direitos humanos, enfrentando as ordens do governo militar. Aqui será gestada a proposta de uma nova forma de catolicismo na Teologia da Libertação, que, mais adiante, influenciará diferentes movimentos e pastorais, como o MST e o PT, como a PJ e a Comissão Pastoral da Terra (CPT).

    O terceiro capítulo tratará da Pastoral da Juventude, desde as suas origens até o seu dilema com as novas agendas políticas. Abordarei como a PJ desenvolveu seu método, herdeiro das antigas ACEs – Ver, Julgar e Agir – numa nova configuração. A PJ será beneficiada teoricamente pela rica produção bibliográfica de teólogos de peso, como Leonardo e Clodovis Boff, Ivo Lesbaupin e Frei Betto, construindo uma estrutura formativa sólida, alcançando todas as dioceses do Brasil. A PJ diferenciar-se-á de todos os movimentos de juventude anteriores, ao promover uma formação orgânica, coordenada por um corpo de religiosos, inclusive bispos responsáveis pela formação dos jovens. Tratarei também de apresentar a ligação dessa pastoral com os movimentos sociais, em especial a afinidade eletiva entre suas ideias e as do PT nascente.

    O capítulo quatro terá o tema das mudanças ocorridas nos últimos anos do segundo milênio dentro da PJ, pondo ênfase na relação entre o marxismo, adotado pela TL, e a relativização desse discurso com a primazia das ideias individualistas da Segunda Modernidade. Nesse capítulo, veremos como as relações da PJ, fundadas nos valores de esquerda e voltadas para uma vivência religiosa pautada na formação política dos jovens, enfrentará os desafios dos tempos de relativização de valores absolutos.

    No quinto capítulo trabalharei com a trajetória dos militantes da PJ que optaram pela vida política partidária, ocupando cargos políticos no PT de Mesquita. Tratarei de explicar as relações entre a lógica da formação da PJ e a atuação dos petistas na atuação da política no mundo empírico. As relações entre os valores marxistas e relativistas apontados anteriormente também serão analisadas por intermédio da trajetória dos políticos de Mesquita, levando-nos a pensar sobre a possibilidade da atuação política pautada em ideais religiosos.

    No sexto e último capítulo, abordarei a trajetória das outras duas categorias analíticas: os sacerdotes que foram participantes da PJ e os que optaram por outro campo de militância, mais especificamente para o magistério. Problematizarei a questão de que certos atores sociais, possuidores da mesma vivência de grupos – em alguns casos, membros dos mesmos grupos jovens –, entenderam de forma diferente a formação política da PJ.

    Decidi utilizar no texto a narrativa em primeira pessoa, pois, como ficará claro ao longo do livro, as trajetórias aqui estudadas devem ser somadas à minha própria vivência na PJ e no PT. Não seria possível separar as experiências por mim vividas, até mesmo porque foi por essas mesmas experiências que consegui alcançar e entrevistar todos os sujeitos aqui presentes. Devo admitir que, às vezes, a minha presença teve um efeito negativo nas entrevistas, já que todos os entrevistados eram velhos amigos meus, a maioria deles compartilhava boa parte de suas memórias nas experiências de PJ comigo. Essa limitação, assim como certo sentimento de companheirismo, fez com que muito das entrevistas se dirigissem a memórias da PJ, não alcançando sempre o alvo de certas questões mais técnicas, como situação social e origem dos entrevistados, dados que eu já deveria saber. Assumo que, assim como os entrevistados, as entrevistas me atingiram como antigo membro da PJ e amigo, fazendo com que até mesmo eu me sentisse como um de dentro, deixando de questionar aquelas coisas citadas acima que, para mim, pareceriam óbvias.

    As entrevistas

    Ao todo, nove militantes foram entrevistados num período de três anos de trabalho de campo. Ao invés de enquadrá-los em grupos divididos por faixa-etária, optei pela divisão por categorias de militância, ou seja, segui o modelo de formação da PJ, que advogava que, ao final da caminhada, ou seja, do processo de formação daquela organização, os jovens militantes atuariam como protagonistas em três direções: 1) a militância no partido político; 2) a vida consagrada e 3) a militância no mundo social, como nas carreiras acadêmicas ou, simplesmente, na vida da sociedade como leigos engajados. Nem em todos os casos decidi manter os nomes verdadeiros dos entrevistados. Alguns deles pelo motivo de serem pessoas públicas, como Artur Messias e Taffarel, não seria possível ocultá-los. Apenas um dos sujeitos teve seu nome verdadeiro omitido. Essa omissão não se deu a pedido, mas, sim, uma escolha minha, por motivos de preservação de sua identidade.

    Dentre as três categorias de entrevistados, é sobre a categoria 1 que apresentarei mais dados. O motivo para essa discrepância se dá porque a maior parte dessa pesquisa baseia-se nela. Para as outras duas categorias decidi tratar de ex-militantes que escolheram possíveis alternativas à primeira, não saindo, ainda assim, da proposta de formação política da PJ, incluindo como contraponto à primeira. Seria possível encontrar outros antigos membros da PJ para equalizar as categorias – ainda que a segunda seja realmente pequena – e, assim, elencar dados mais acurados das trajetórias de membros da PJ em Nova Iguaçu, mas o aumento de depoentes expandiria demais o universo da análise qualitativa, obrigando-me a traçar uma nova metodologia de adequação de pessoas de paróquias e faixas-etárias diferentes.

    Dessa forma, dividi os entrevistados nas três categorias a seguir:

    a) Participantes políticos de Mesquita – aqui, agrupei os antigos militantes a PJ e crisma da diocese de Nova Iguaçu que participaram da gestão de Artur Messias no Executivo de Mesquita, de 2004 a 2012, sem me apegar na duração de seus serviços no governo.² Eles são: Artur Messias; Márcia Brandão; Albea Regina e Jessé Dutra. No campo do Legislativo, o entrevistado é André Taffarel, que, mesmo não sendo o único vereador do PT no município, nem sendo o único de origem católica, merece o recorte por seu papel na proposta do livro.

    b) Militantes religiosos – os religiosos que são abordados nesta categoria são dois padres da diocese de Nova Iguaçu: o padre Antônio Pedro, da paróquia do bairro do Caonze, e Ricardo Barbosa, sacerdote da paróquia de Santa Rita, no bairro de mesmo nome. O primeiro é o responsável pelo Setor Juventude da diocese enquanto o segundo coordena a Cáritas diocesana, setor da Igreja que organiza sua ação social.

    c) Militantes na sociedade laica – nessa categoria figuram o casal de professores Luis Menezes e Maria de Fátima, moradores de Nova Iguaçu, com participação premente na PJ no início de sua existência na diocese de Nova Iguaçu.

    O autor

    PREFÁCIO

    Em que medida os ensinamentos e valores religiosos recebidos na adolescência e juventude afetam a trajetória dos indivíduos e as suas vidas adultas? Se afetam, de que forma o farão e em que contextos? Essas perguntas, que provavelmente muitos líderes religiosos e professores se fazem, têm uma grande importância para a sociologia da religião. Para a sociologia da religião, no entanto, essas são perguntas muito difíceis de serem satisfatoriamente respondidas. São muitas as variáveis a serem consideradas e controladas e há muitas suspeitas metodológicas sobre a confiabilidade dos dados que possam ser coletados. No entanto, apesar da dificuldade da empreitada, considero que o livro de Ronald Apolinário de Lira é uma contribuição importante para a reflexão sobre essas perguntas quando se pensa sobre a influência da experiência católica em Pastoral da Juventude.

    Neste livro vamos encontrar uma cuidadosa análise de falas coletadas por meio de entrevistas semiestruturadas e conversas informais com ex-participantes da Pastoral da Juventude (PJ) Católica da Diocese de Nova Iguaçu em diferentes momentos, nos anos de 1980 e 1990. Sem nos esquecermos dos ensinamentos de Berger sobre a reconstrução do passado e os de Bourdieu sobre a ilusão biográfica, é possível encontrar nessas falas elementos que nos ajudam a avaliar os reflexos na vida adulta das ideias e valores que foram adquiridos naquela experiência religiosa da juventude. Inspirado na metodologia do tipo ideal de Weber, Ronald vai identificar por intermédio dessas falas basicamente três tipos de trajetórias fruto dessa experiência religiosa.

    Um primeiro seria o daqueles cuja militância na PJ lhes teria despertado a vocação política vivida especificamente pelo engajamento e luta no PT. Esse tipo era de se esperar a partir dos ensinamentos que enfatizavam a união da fé com a política. O sucesso eleitoral desses líderes nos mostra como o catolicismo da libertação de Nova Iguaçu, que teve poucos resultados eleitorais nos anos de 1990, foi capaz de criar lideranças políticas bem-sucedidas no século XXI. O segundo tipo seriam os entrevistados que optaram pelo sacerdócio e que mantiveram essa vocação por décadas. Esse tipo me surpreendeu, pois eu julgava que pelo fato do catolicismo da libertação ser uma visão de mundo muito racionalizadora, não alimentaria por muito tempo vocações sacerdotais. Por fim, o terceiro tipo, evidentemente o único com potencial de alcançar uma parcela maior dos jovens da PJ, é formado pelos que buscaram ser professores e estudar na universidade. Em geral, esses jovens eram vindos de famílias sem tradição universitária.

    Com efeito, esse é um estudo de caso e suas conclusões possuem os alcances e limites de pesquisas dessa natureza. A problemática que se colocava exigia uma metodologia de pesquisa qualitativa, como a adotada. Os limites de pesquisas desse tipo se referem à dificuldade de generalização, mas podem ser superados com novas pesquisas. Portanto o trabalho realizado por Ronald, que é apresentado neste livro, tem uma qualidade característica de toda boa pesquisa: estimular novas pesquisas.

    Para contextualizar os dados acima, Ronald apresenta previamente uma discussão rica sobre a história de Nova Iguaçu, destacando os principais problemas e peculiaridades sociais e políticos dessa região, entre esses os heróis da vizinhança. Em seguida, a partir de uma revisão da bibliografia de referência sobre o tema, o autor também nos oferece uma descrição atenta às transformações e tensões internas do catolicismo que resultaram no projeto do que tem sido chamado do catolicismo da libertação. Focalizando a Baixada Fluminense, detalha como esse catolicismo era hegemônico nas dioceses de Nova Iguaçu e Duque de Caxias, especialmente durante o bispado de D. Adriano Hypólito e D. Mauro Morelli, especificamente. Destacando a relação entre a militância católica, em especial da PJ e o Partido dos Trabalhados (PT), comenta, ainda, sobre os limites e alcances dos projetos políticos da esquerda em geral e desse partido em particular naquela região.

    Dessa forma, Ronald nos ajuda a pensar sobre várias outras questões, para além das acima mencionadas sobre a influência da experiência religiosa na juventude na vida adulta. Ajuda, por exemplo, a refletir sobre os dilemas políticos da Baixada Fluminense, sobre os problemas e controvérsias da política contemporânea.

    Desde as primeiras páginas do livro e durante todo o texto, Ronald explicita que é parte daquilo que pesquisa. Procurando exercitar o ofício do cientista social, como sociólogo e historiador, que procura estranhar o familiar, Ronald destaca a proximidade afetiva que tem com seus entrevistados e com Baixada Fluminense, com a diocese de Nova Iguaçu e a PJ. Todo esse exercício metodológico do autor, que a todo tempo busca olhar como um de fora, enquanto pesquisador, sem perder o que a experiência de ser um de dentro, permite um melhor entendimento do que a analisa, enriquecendo ainda mais o texto e suas reflexões. Pesquisar um objeto tão próximo é um grande desafio que exige coragem.

    Por tudo que já falei, sinto-me muito feliz de poder apresentar este livro, originado da tese de doutorado que por mim fora orientada e defendida na UERJ, no Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais (PPCIS/UERJ). Agradeço a Ronald pelo convite para ser apresentadora deste seu primeiro livro e por todas as trocas e diálogos que temos tido ao longo dos anos.

    Cecília Loreto Mariz

    Doutora em Ciências Sociais

    Professora titular do PPCIS UERJ

    Sumário

    INTRODUÇÃO

    1

    A BAIXADA FLUMINENSE

    1.1 Abordagens sócio-históricas

    1.2 Geografia e sociedade

    1.2.1 Iguassú/Nova Iguaçu 

    1.2.2 Ocupação da terra

    1.3 Rede de resolução de problemas práticos

    1.4 Os amados heróis da vizinhança

    1.4.1 Política centrípeta e a valorização dos heróis da vizinhança

    1.4.1.1 Tenório Cavalcanti

    1.4.1.2 Joca

    1.4.1.3 Zito

    1.5 O interregno da transição democrática no brasil e seu reflexo na baixada

    1.5.1 Os movimentos sociais

    1.5.2 O PT quer ser governo: políticos e emancipações

    2

    IGREJA, MARXISMO E PRÁXIS POLÍTICA

    2.1 A igreja da libertação

    2.1.1 A Ação Católica Brasileira

    2.2 Urgências latino-americanas e o concílio Vaticano II 

    2.2.1 Frutos do Concílio

    2.3 Mudança social e mudança na religião

    2.4 A ética econômica das religiões

    2.5 Viés histórico do cristianismo de libertação

    2.5.1 O caminhar da Igreja popular: os anos da ditadura

    2.6 A teologia da libertação

    2.6.1 Marxismo e cristianismo

    2.6.2 Os resultados do CL na sociedade

    2.7 O declínio da militância

    2.8 As CEBs

    3

    A PASTORAL DA JUVENTUDE E SEUS DESDOBRAMENTOS

    3.1 A civilização do amor

    3.1.1 Um rápido histórico da PJ

    3.2. O tempo antes da PJ: o ocaso das juventudes da ACE

    3.3 Os movimentos de encontro

    3.4 1983: nasce uma pastoral da juventude orgânica

    3.4.1 Organização e histórico após 1983

    3.5 Estudo de caso: o nascimento da PJ em Nova Iguaçu

    3.5.1 Grupos jovens

    4

    PASTORAL DA JUVENTUDE E A PÓS-MODERNIDADE

    4.1 O que fazer sem as classes?

    4.2 Mudanças de sentido na PJ

    5

    A PASTORAL DA JUVENTUDE E O PT EM NOVA IGUAÇU

    5.1 Os diferentes caminhos da militância

    5.1.1 Militantes da política

    5.2 Pastoral da juventude e PT: o que sobrou do céu?

    5.2.1 Críticas ao governo do PT por militantes da PJ

    5.3 Sucessão de messias, derrota de Taffarel

    5.4 O envolvimento da Igreja de Nova Iguaçu

    5.5 O que move o militante: a ética da convicção versus a ética da responsabilidade

    5.5.1 Política como vocação

    5.5.2 Mesquita: responsabilidade e convicção

    6

    ALTERNATIVAS MILITANTES À POLÍTICA PARTIDÁRIA

    6.1 Militantes pela fé: pastoral de juventude e o caminho da ordenação

    6.1.1 Vida sacerdotal militante

    6.2 AGENTES SOCIAIS LEIGOS

    6.3 OUTRAS MILITÂNCIAS, OUTROS LUGARES

    CONSIDERAÇÕES FINAIS

    REFERÊNCIAS

    INTRODUÇÃO

    No ano de 2016, a cidade de Nova Iguaçu completou 100 anos. Mas isso é só parte de seu jubileu, pois assim como toda comunidade imaginada, usando os termos de Benedict Anderson,³ datas de aniversário nem sempre dizem mais do que os seus criadores desejam que seja dito. Em outras palavras, a cidade de Nova Iguaçu traça muito mais tempo do que os registros iniciados em 1916, ano da transferência do centro da capital do município, da Vila de Iguassú para a da antiga freguesia de Maxambomba, atual centro de uma Nova Iguaçu.

    A história desse município percorre, como veremos em detalhes mais adiante, uma linha que nasce ainda no período colonial, passando pelos tempos do Primeiro e Segundo Reinados, encontrando a febre desenvolvimentista da Primeira República e alcançando os dias atuais. Nesse percurso, muitas mudanças ocorreram no tecido geográfico do município por meio de mais de seis emancipações, todas ocorridas no século XX. Outras mudanças se referem à política local que, acompanhando as modificações socioeconômicas do país, transformaram-se ao longo do tempo: agricultura de exportação; especialização no transporte fluvial do café do Vale do Paraíba; exportador de laranjas e, por fim, cidade-dormitório, produtora de mão de obra e receptora dos migrantes do Nordeste do país.

    Outro ponto importante da história desse município é a ligação entre a Igreja Católica e a política. Essas alianças, ao longo do tempo, não se resumiriam apenas às terras de Iguassú, mas da relação secular entre a Igreja e o Estado desde a colonização do país. Diversos autores trabalham com o tema da ligação entre a política e a Igreja, como Paulo César Gomes;⁴ Scott Mainwaring;⁵ Maria das Dores Campos Machado;⁶ Kenneth Serbin⁷ e Pedro Simões.⁸ Um autor que trata especificamente da diocese de Nova Iguaçu é João Marcus F. Assis.⁹

    A Igreja está profundamente enraizada na Baixada Fluminense, já que ela foi e ainda é detentora de grandes áreas doadas pelo governo português e, em seguida, pelos governantes brasileiros. Os moinhos de farinha e cana-de-açúcar pertencentes ao clero recortaram a região de Iguassú, nomeando lugares e definindo suas fronteiras.

    Mas, com o passar do tempo, tanto o Estado quanto a Igreja vieram a se modificar, adequar-se às realidades sociais de suas épocas. Em nível nacional, podemos apontar a chegada do regime militar, iniciado em 1964 e encerrado vinte e um anos mais tarde. Esse período de exceção marcaria a vida nacional, não apenas politicamente, mas também na esfera cultural, econômica e até mesmo religiosa. Nesse período, não apenas os sindicatos, artistas ou políticos eram perseguidos e condenados a torturas, mas também foram perseguidos religiosos e religiosas, assim como leigos engajados nas ações sociais da Igreja.¹⁰

    As mudanças que ocorrerão no interior da Igreja dar-se-ão principalmente pelo Concílio Vaticano II (CV-II): uma reunião dos bispos católicos convocada pelo papa

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