Jesus no meio
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Jesus no meio - Chiara Lubich
Apresentação da Coleção
Deixa a quem te segue apenas o Evangelho.
Chiara Lubich esquadrinhou esse Evangelho de muitíssimos modos, concentrados em doze eixos: Deus Amor, a Vontade de Deus, a Palavra de Deus, o Amor ao próximo, o Mandamento Novo, a Eucaristia, o dom da Unidade, Jesus Crucificado e Abandonado, Maria, a Igreja-comunhão, o Espírito Santo, Jesus presente em nosso meio.
Tais pontos são um clássico
escrito na alma e na vida de milhares de pessoas de todas as latitudes, mas faltava um texto póstumo onde fossem reunidos trechos, inclusive inéditos, que os ilustrassem por meio de:
– uma dimensão de testemunho pessoal, ou seja, como Chiara Lubich os entendeu, aprofundou e viveu;
– uma dimensão de penetração no mistério de Deus e do homem;
– uma dimensão de encarnação nas realidades humanas, com um cunho comunitário, em sintonia com o Concílio Vaticano II (cf. Lumen gentium, n. 9).
Essa coleção contém doze livros úteis para quem deseja:
– ser acompanhado na vida espiritual por uma grande mestra do espírito;
– aprofundar o aspecto comunial da vida cristã e seus desdobramentos na Igreja e na humanidade;
– encontrar Chiara Lubich na vida de cada dia, conhecer o seu pensamento e obter pormenores autobiográficos dela.
Introdução
Em um mundo em que as redes de comunicação social se multiplicam exponencialmente, mas no qual, ao mesmo tempo e paradoxalmente, parece crescer cada vez mais uma sensação de isolamento e solidão, nós nos perguntamos sobre o significado profundo do ser humano, sobre sua realização, sua verdadeira felicidade. Se por um lado há a exaltação do indivíduo e de sua autodeterminação, por outro permanece o anseio perene de relações autênticas e profundas, bem como a pergunta, por vezes marcada pela angústia, sobre o significado da existência. Como conciliar essas exigências aparentemente conflitantes? E qual é o caminho para construir relacionamentos de verdadeira comunhão? Na realidade de Jesus no meio
apresentada neste volume se encerra a possibilidade de uma resposta a tais interrogações que tocam o coração de cada pessoa. Uma resposta que não brota do raciocínio, mas da vida.
Em 1953, quando Chiara Lubich se encontrou, no Vaticano, com Mons. Montini, que viria a ser o papa Paulo VI, falou-lhe sobre a vida do nascente Movimento dos Focolares, no qual resplandecia algo que valia mais do que todos os tesouros do mundo, até mesmo do que as obras de arte do Vaticano, mais do que a natureza, mais mesmo do que os laços familiares. Era a presença de Cristo vivo lá onde ainda que apenas dois, mesmo pequenos e pecadores arrependidos, uniam-se em nome Dele, prontos a se amarem até o ponto de dar suas vidas um pelo outro. Palavras fortes, pode-se dizer, para uma jovem provinciana diante de uma autoridade eclesiástica de Roma, mas nas quais transparecia uma convicção cristalina, ratificada pela realidade que havia experimentado e que se tornara o cerne da nova vida empreendida com as primeiras e primeiros companheiros. Realidade que eles simplesmente chamavam de Jesus no meio
.
Já fazia alguns anos que haviam descoberto que o salto qualitativo que irrompia na vida quando o amor de Cristo circulava entre eles, aquela paz que não é deste mundo
, o ardor, a luz para penetrar nas Escrituras e entender os passos a serem dados, podiam ser explicados com a promessa de Jesus: Onde dois ou três estiverem reunidos em meu nome, ali estou eu no meio deles
(Mt 18,20), juntamente com outra passagem que equivalia a um comentário da anterior, e que era seu fundamento: Como eu vos amei, amai-vos também uns aos outros
(Jo 13,34).
Hoje, na Igreja Católica, a ideia de que Cristo está presente na comunhão fraterna tornou-se familiar, mas em um ambiente eclesial anterior ao Concílio Vaticano II, no qual se destacava principalmente a estrutura jurídico-institucional da Igreja e a atenção se voltava sobretudo para a prática sacramental, esta experiência era praticamente desconhecida. É emblemático que, em 1960, na frase conclusiva de um dossiê da Conferência Episcopal Italiana, que tinha por objeto o fenômeno focolarino
, constem palavras de crítica precisamente em relação a Jesus no meio, avaliado como doutrina desconhecida
¹. Somente mais tarde, em seus vários contatos ecumênicos, Chiara descobriu que a presença viva de Cristo na comunidade era um tema muito valorizado pelas Igrejas Reformadas desde os seus primórdios, embora com nuances diferentes.
Para Chiara e para o pequeno grupo ao redor dela, do que se tratava? Certamente não apenas de um conceito ou de uma doutrina, mas – como se pode perceber nas suas palavras a Mons. Montini – da presença real do Cristo ressuscitado onde dois ou três estiverem reunidos em seu nome
. Portanto, não apenas nos altares das igrejas com a Eucaristia, mas nas famílias, nas ruas, nos locais de trabalho, nas escolas… Ele era o Deus próximo
, presente na comunhão daqueles que se amavam como Ele ama
. Uma compreensão que emergiu gradualmente também nos documentos da Igreja Católica que, durante alguns séculos, após o Concílio de Trento, havia falado de presença real
referindo-se quase que exclusivamente à Eucaristia. Em seguida, com a encíclica Mystici Corporis, de 1943, o Magistério apresentou a Igreja como Corpo Místico de Cristo e, desde então, os horizontes se ampliaram até o reconhecimento explícito, com a encíclica Mysterium Fidei (1965), dos vários modos igualmente reais
da presença de Cristo na Igreja: na Palavra, nos sacramentos, na assembleia de cristãos reunidos. É a época em que se coloca em destaque a Igreja como comunhão, e a citação de Mt 18,20 aparece em alguns docu-
mentos do Vaticano II.
Portanto, a experiência antecipatória que Chiara compartilhou com Mons. Montini estava, ao mesmo tempo, em sintonia com a nova perspectiva que vinha desabrochando na Igreja Católica.
De fato, a realidade e a práxis de Jesus no meio, que emergiu de maneira particular com o Carisma da Unidade, nada mais são – como Chiara repetia frequentemente –
do que a vida da Igreja colocada em prática, a Igreja vista como Corpo Místico de Cristo (cf. 1Cor 12,12-27), na qual o amor circula pela comunhão entre os membros. Na Igreja assim compreendida, atualiza-se aquilo que já existe em potencial, como a luz halógena, que, através de um potenciômetro, vai do zero ao máximo; ou, para usar outra expressão de Chiara, como uma rede de galerias escuras que se iluminam com o amor. É o já e ainda não
da perspectiva escatológica. Graças ao batismo, estamos inseridos em Cristo Ressuscitado e, com Jesus em nosso meio, somos ajudados a nos tornar aquilo que já somos.
Seria muito oportuno fazer um estudo aprofundado da relação que existe no pensamento de Chiara Lubich entre os dois conceitos: a unidade (cf. Jo 17,21) e Jesus no meio. Às vezes ela os identifica, às vezes diz que um é premissa para o outro. E os descreve de duas perspectivas: da ascética (aquilo que é exigido de nós) e da mística
(a dádiva de Deus). Neste segundo sentido, a unidade é a dádiva de sermos transformados em Cristo Ressuscitado, individualmente e ao mesmo tempo juntos, em um único movimento de amor. Em muitos textos de Chiara, a unidade está ligada ao mistério eucarístico. Podemos e devemos nos predispor para acolher o dom, criando o espaço
necessário com o amor mútuo total e imensurável (cf. Jo 15,12-13); mas este dom transcende a nossa natureza, permanecendo sempre uma dádiva do alto. Por um lado, ele já nos foi oferecido de uma vez por todas com o mistério pascal de Cristo; por outro, a sua manifestação plena em nossos relacionamentos permanece incompleta. Por isso Chiara fala de Jesus no meio como de uma graça particular, a graça da atualização da unidade, da luz acesa
: a da manifestação da presença de Cristo entre nós.
Outro ponto chave que tem uma forte ligação tanto com Jesus no meio como com a unidade é Jesus Abandonado
. Esta expressão se refere ao grito de Jesus na cruz: Meu Deus, meu Deus, por que me abandonaste?
(cf. Mt 27,46; Mc 15,34) e à atitude do cristão de se moldar a Ele abandonado e ressuscitado em todas as situações de limite e de sofrimento. Jesus Abandonado
ensina como não ficarmos concentrados em nós mesmos para estarmos totalmente projetados fora, no amor pelos outros, uma atitude que comporta a morte de si mesmo, a crucificação do próprio eu. É um ato de anulação livre e deliberada que coincide com o amor, não um ato obscurantista. "Esta anulação
é importante – disse Chiara em uma palestra inédita – e é
necessário anular até mesmo as inspirações, até mesmo o divino em nós, como Jesus Abandonado, para chegar à unidade, para ter Jesus no meio"². Portanto, Jesus Abandonado
expressa a natureza radical do amor que é exigido aos cristãos para estarem unidos, amando-se reciprocamente como
Jesus nos amou, mas é preciso enfatizar que tudo é amor, que significa também ressurreição.
Ao coletar os textos que compõem as páginas deste livro, encontramos um duplo desafio. Primeiramente, a enorme abundância de fontes nas quais escolher – milhares de palestras, escritos, temas, respostas a perguntas –, que ilustram o significado e a centralidade de Jesus no meio para a Obra de Maria e para a Igreja, bem como a práxis
desenvolvida ao longo de muitos anos sobre o que fazer para garantir e manter esta presença nos vários acontecimentos concretos das relações humanas. Chiara
Lubich estava ciente de ter recebido um carisma, não para si mesma ou para um pequeno grupo, mas para o bem de muitos e que, portanto, não podia guardá-lo para si. A necessidade de se comunicar inflamava o seu coração: Falarei e escreverei, comunicarei tudo com todos os meios
, havia anotado em 1949, e foi o que ela realmente fez por mais de sessenta anos. Em suma, a tarefa de reduzir muito a pouco foi um desafio.
Além disso, alguns dos textos mais profundos e significativos sobre Jesus no meio já haviam sido publicados nos volumes anteriores da série na qual este livro está inserido, que, desde 2011, vem recolhendo trechos de Chiara para a meditação sobre os pontos centrais do Carisma da Unidade. Todo ano, a atenção se concentrou em um dos doze pontos-chave da espiritualidade do Movimento,
listados em seus Estatutos: Deus Amor, a Vontade de Deus, a Palavra, o Amor ao próximo, o Mandamento Novo, a Eucaristia, a Unidade, Jesus Abandonado, Maria, a Igreja, o Espírito Santo, Jesus no meio. Já vimos o forte elo entre Jesus no meio, a Unidade e Jesus Abandonado. Agora, tendo chegado ao último ponto, observando bem, tem-se a impressão de que Jesus no meio já está expresso, de certo modo, em todo lugar.
Na realidade, isso não deveria surpreender. De fato, Jesus no meio deve permear toda a vida dos membros da Obra de Maria que, como dizem seus Estatutos, deseja ser uma presença de Maria e, de certo modo, uma continuação dela, gerando
Cristo espiritualmente no mundo onde dois ou três…
. Tudo aquilo que fazemos só tem valor se Ele estiver presente – Chiara comentou em várias ocasiões – caso contrário não tem sentido³. Em seu diário ela anotou: Os pontos da espiritualidade são ‘Jesus no meio’ descerrado
, no sentido de estar aberto, como um leque
(cf. Diário, 13 de abril de 1967).
Portanto, no decorrer dos capítulos deste livro, às vezes veremos esse leque ser reaberto, com referência frequente a outros pontos de espiritualidade já meditados anteriormente. Em particular:
– Ao considerar a descoberta de Jesus no meio nos primeiros tempos do Movimento, vêm em evidência o amor ao próximo e, em particular, o amor recíproco, do qual Jesus no meio é fruto.
– No segundo capítulo, em que veremos os efeitos a partir dos quais podemos reconhecer a presença real do Ressuscitado entre os irmãos reunidos, veremos, entre outras coisas, que Ele ilumina a mente para entender a vontade de Deus e compreender a Palavra da Escritura.
– Examinando no terceiro capítulo a práxis
, ou seja, como ter e manter a presença de Jesus no meio, descobriremos que está ligado intrinsecamente à vida de unidade e a Jesus Abandonado.
– Ao considerar a relação entre Jesus no meio e a Obra de Maria, podemos ver, além do mais, que, como Maria deu Jesus ao mundo, a Obra Dela tem esta finalidade: doar Cristo espiritualmente presente entre dois ou mais.
– No capítulo sobre Jesus no meio e a Igreja
, vem em relevo a dimensão eclesial da sua presença onde dois ou três
estão reunidos, muito importante para o ecumenismo, e emerge também a relação entre Jesus no meio e