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Diretivas Antecipadas de Vontade:  a interface entre autonomia privada e o ordenamento jurídico brasileiro
Diretivas Antecipadas de Vontade:  a interface entre autonomia privada e o ordenamento jurídico brasileiro
Diretivas Antecipadas de Vontade:  a interface entre autonomia privada e o ordenamento jurídico brasileiro
E-book211 páginas2 horas

Diretivas Antecipadas de Vontade: a interface entre autonomia privada e o ordenamento jurídico brasileiro

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Sobre este e-book

A morte, como democrática que é, não faz distinção entre os viventes. Com o avanço da tecnologia e da ciência, esse processo, outrora natural, em dadas circunstâncias torna-se longo, doloroso, e completamente artificial.

Se o findar era tratado sob a perspectiva patrimonial, com a consolidação de princípios como a dignidade da pessoa humana, um olhar humanístico é voltado àquele que se encontra sobre a iminência do findar.

Nessa perspectiva, com o escopo de manifestar sua vontade inequívoca, a pessoa declara por meio das Diretivas Antecipadas de Vontade a respeito de tratamentos que deseja ou não se submeter quando não mais for possível externar a sua vontade, inexistindo no ordenamento jurídico pátrio o tratamento adequado da questão, seja com previsão legal ou documento válido para tal.

Debates a respeito da autonomia da pessoa fora de possibilidades terapêuticas não recebem destaque doutrinário ou parlamentar, razão pela qual os profissionais da saúde, apesar de seus códigos de ética, encontram-se desguarnecidos de legislação sólida que lhes assegure respeitar a vontade daqueles que se encontram no processo de findar avançado.

Sob a perspectiva civil-constitucional os autores examinam novos paradigmas para a complexidade do findar, como consequência das relações humanas, sejam elas no ambiente hospitalar, sejam elas no íntimo familiar, mormente sob a perspectiva da autonomia da vontade.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento1 de ago. de 2022
ISBN9786525253671
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    Diretivas Antecipadas de Vontade - Eduardo Augusto Gonçalves Dahas

    1. A JORNADA DO MORRER FACE A AUTONOMIA PRIVADA

    Medular se faz, a recognição da autonomia privada quando defronte ao processo do finar com dignidade, vez que a outrora autonomia da vontade, trespassou-se ante a conformação jurídica inaugural, trasladando de forma digna a pessoa constitucional e o processo que a conduz a estar morta ao cerne do sistema jurídico, posto que, a aptidão para autodeterminar-se é silogismo que tem por premissa basilar a dignidade, interpretada como autonomia ao que tange deliberar sobre seu singular processo do morrer com dignidade. Adjacente ao arrazoado, pujante faz-se avultar que o legislador constituinte por intermédio da Magna Carta asseverou as pessoas constitucionais um encadeamento de direitos fundamentais, como a dignidade, concepção umbilicalmente contígua à autonomia, que, tem por incumbência delimitar a atuação do Estado-juiz e de terceiros ao que tange situações existenciais, acautelando, desta feita, a circunjacência singular de deliberação pessoal do sujeito, quando afetas a sua autonomia privada e sua existência, desde que os revérberos advindos de sua deliberação não afetem a terceiros, sendo este exercício da autonomia efetivado nas fronteiras da juricidade, que tipifica a sincronia da heteronomia na lição de Ana Carolina Brochado Teixeira, infra colacionada:

    No Estado Democrático de Direito, por conviverem subjetividades e intersubjetividades, autonomia coexiste com heteronomia, de modo que ambas cedem espaços recíprocos, dependendo, principalmente, da natureza da situação jurídica em que consiste o caso concreto. (TEIXEIRA, 2018, p. 75, grifo nosso)

    Os fundamentos jurídicos em début, propõem a pormenorização do exercício da autonomia privada face a jornada do morrer, por conseguinte, torna substancialmente meticuloso o estudo da autonomia privada ante as conjunturas existenciais. Nada obstante, a autonomia privada ao ser plenamente exercida pela pessoa constitucional fora de possibilidades terapêuticas, ante o derradeiro póstero, deverá estear-se no consentimento livre e esclarecido em conformidade com os preceitos constituintes, outorgando-lhe, desta feita, o direito a finar-se dignamente, vez que, a jornada do morrer está a integrar o filete da vida, que há de escoar com dignidade.

    Isto posto, face a odisseia da morte avisada, estando o achegar da finitude como condição inevitável, a pessoa constitucional, indivíduo de circunstâncias existenciais, com o escopo de que lhe seja asseverada a autonomia para deliberar quanto ao seu processo do morrer, toma por sustentáculo o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, que, propiciará a liberdade de autonomamente proceder em congruência com seus intrínsecos valores, derrogando, desta feita, manifestações heterônomas, posto que, estas, ante a tutela dos direitos fundamentais e da pessoa humana, ilegítimas são, pois a influência da ingerência externa na concepção singular de autonomia configura um flagrante ultraje a percepção de boa vida eleita por cada sujeito de direito, conforme aclara Ana Carolina Brochado Teixeira:

    A imposição autoritária no espaço individual nega de forma veemente a autonomia e a responsabilidade individual. Por isso não é o legislador quem deve indicar como a experiência do morrer deve ser experienciada por cada pessoa... é ela própria, na medida possível, quem deve fazer escolhas sobre esse momento de despedida. (TEIXEIRA, 2018, p. 78)

    Assoma, neste ínterim, face ao supra colacionado aclarar que o processo do morrer com dignidade é uma idealização que deve suceder de forma autônoma por intermédio exclusivamente do consentimento livre e esclarecido, sem ingerências extrínsecas, outorgando, assim, legitimidade a materialização deste processo, porquanto em teor de avultada singularidade ora pautada no horizonte das diretrizes normativas constitucionais e seus fundamentos, inconcebíveis e antagônicas são cânones heterônomos, mesmo que emanados do Estado-juiz.

    Isto posto, no âmbito dos direitos individuais, a dignidade da pessoa humana personifica-se por intermédio da contemporânea autonomia privada, que tem por nascedouro a liberdade e a igualdade das pessoas, antevisão positivada na Carta Magna:

    Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade [...] (BRASIL, 1988)

    A autonomia privada é pedra angular e fundamento que aclara o porquê dos direitos humanos, desvelando-se por intermédio de medulares aspectos ora desnudados em tela por Barroso, (2012, p. 252), em sua obra colacionada: "a) a capacidade de autodeterminação; b) as condições para o exercício da autodeterminação; c) a universalidade; d) a inerência da dignidade ao ser humano." Percebidas a dignidade e autonomia privada, estas projetam-se ao campo das liberdades, sob a condição de respeitados os direitos de outrem e observadas as circunstâncias materiais, psíquicas e físicas para a realização da autodeterminação, neste sentir, a pessoa há de ser percebida, compreendida, como ser moral, capaz de eleger, deliberar e avocar suas responsabilidades.

    1.1 A AUTONOMIA PRIVADA ANTE O FINDAR DA EXISTÊNCIA E O DIREITO FUNDAMENTAL A MORTE DIGNA

    No permear do tempo, a concepção do termo autonomia não persistiu abarcada pelo manto da singularidade, encontrando-se esta conceituada sobre o cintilar das ciências sociais aplicadas e sobre o prisma da hermenêutica filosófica, copiosas são as facetas talhadas à autonomia, dentre tantas autodesenvolvimento, autogoverno, autodeterminação, autoconstrução, privacidade e deliberação, independência, estando todas estas quimeras a projetar a construção do agir em conformidade com seus próprios valores. Os helenos, aficionados pela autonomia, a percebiam como a capacidade pessoal de auto administrar-se, perceber este que ante o delongar dos papiros aos papéis, faz avocar os epígrafes de Cervantes em sua obra Dom Quixote (2005, p. 185): (...) debaixo do meu manto, o rei eu mato, dessa forma a regência íntima da pessoa constitucional é livre de heteronomias, conforme leciona T. L. Beauchamp e J. F. Childress (2002, p.138) o eu é livre tanto de interferências controladoras por parte de outros como de limitações pessoais que obstam a escolha expressa da intenção, tais como a compreensão inadequada, fazendo aflorar a concepção habermasiana que a contemporânea autonomia privada deve ser desvelada mediante o consentimento informado, sobretudo ante o funesto término da vida.

    Neste diapasão, imperioso se faz aclarar, que a autonomia privada ao ser legitimada em um corpo social plural e democrático deverá considerar a concretude da pessoa constitucional no uso do consentimento em eufonia com suas projeções existenciais, vez que, as diretrizes que estão a compor as conformações normativas que regram este corpo social, foram amoldadas pelo legislador constituinte com o fito de asseverar a pessoa constitucional a capacidade de autodeterminar-se ao que tange a sua existência, acautelando, a intimidade, a privacidade e a autonomia de consciência, posto que, ao sentir do legislador, as deliberações que abarcam circunstâncias existenciais  concernentes a unidade corporal estão albergadas pela órbita da intimidade e do autogoverno, pois, essencialmente estão correlacionadas ao cerne da pessoa humana, cognominado pessoalidade.

    Isto posto, é por meio da autonomia que se edifica a privacidade, asseverando-se o espaço adequado ao autodesenvolvimento da personalidade, assim, por intermédio da autonomia privada, no que concerne ao acatamento dos direitos constitucionalmente fundamentais, pode a pessoa, quando resignada exercer, ou não, sua autonomia e materializar o seu porvir, pois, o acautelamento constitucional, atribuído a esta pessoa de direito e constitucional, em matéria de inviolabilidade, lhe assevera o poder de autogovernar-se, vez que, o fundamento da dignidade da pessoa humana é sustentáculo que irá estear a existência digna, tal qual o morrer com dignidade, abarcando a liberdade e a capacidade para deliberar o escoar da existência. Neste tocante:

    A capacidade de decisão existencial ou de auto escolha radical opera sempre no âmbito de um horizonte da história de vida, a partir de cujos traços o indivíduo pode aprender quem ele é e quem gostaria de ser. Por fim, o dever categórico de mandamentos morais é direcionado para a vontade livre de uma pessoa que age segundo leis que ela mesma se dá. Apenas esta vontade é autônoma no sentido de que se deixa determinar inteiramente pelo conhecimento moral. (HABERMAS, Conferência realizada em outubro de 1989.)

    Urge, ante o exposto aclarar que autonomia privada deve ser percebida adstritamente com o fundamento da dignidade da pessoa humana, abarcando temas de ordem privada e pública, existenciais e patrimoniais.

    1.1.1 O DESENVOLVIMENTO E A APLICABILIDADE DA AUTONOMIA PRIVADA EM CONSONÂNCIA COM O ORDENAMENTO JURÍDICO PÁTRIO

    Imprescindível faz-se, aclarar, ante o desenvolvimento da autonomia privada a presença de duas nomenclaturas na órbita forense, aludindo a acepções reciprocamente incongruentes, posto que, a fraseologia autonomia da vontade malgrado fora operado como expressão de sentido semelhante a autonomia privada no âmbito jurídico, basilar desvelar que a autonomia da vontade coadunou-se ao liberalismo que, por conseguinte, correlacionava-se a propriedade privada, amoldando-se como princípio norteador da inteligência de uma agregação de direitos negativos face ao Estado Social e a outros sujeitos de direito, refutando ingerências estatais perante as inclinações subjetivas, fazendo aflorar a faceta da autonomia ilimitada ou ajustamento de vontade.

    Nada obstante, o liberalismo deu causa a sua catástase como sistema de produção, fazendo eclodir uma contemporânea concepção de acautelamento do interesse particular e coletivo, desta feita, em uma dogmática jurídica o princípio da autonomia da vontade granjeou seu ápice no séc. XIX como corolário de um jus racionalismo liberal, voluntarista e individualista, conforme o qual a dignidade da pessoa humana somente coaduna com a vontade, regrada pela responsabilidade, obstando-se a heteronomia, parâmetro no qual o indivíduo estabelece-se intrinsicamente ante o Estado, nesta conjuntura social, contexto em que indivíduo e autonomia se correlacionavam.

    Neste interim, malgrado a autonomia da vontade ter tangido seu ápice no séc. XIX, foi no findar deste, que sucedeu seu declive, sem embargo ulteriormente a cognominada Guerra das Guerras¹ e a II Corrida Industrial, o Estado ambicionando a justiça instrumental, fez aflorar transfigurações sócio-político-filosóficas que soergueram sincrônicas as grandes correntes de pensamentos, de forma que o princípio da função social passara a nortear a concomitância social, desmistificando e ultrajando o oitocentista jus naturalismo, fustigando as bases dogmáticas da vontade e promovendo a justiça social, inteligência pela qual, a autonomia da vontade acaba por ser suplantada pela autonomia privada, conforme lições de Elzy

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