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O Crime Da Rua Sarnystalinov
O Crime Da Rua Sarnystalinov
O Crime Da Rua Sarnystalinov
E-book310 páginas2 horas

O Crime Da Rua Sarnystalinov

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Sobre este e-book

Depois de anos morando num lugar chamado Dalask, Filipe, um solitário professor desempregado e vítima de invasão de sua privacidade, decide voltar para a longínqua República de Sarnyranhão, na Sibéria, sua terra natal, atendendo pedido da detetive Marie “Bourne” para lhe ajudar na resolução de um crime no qual estava envolvida a irmã do educador. O que parecia ser uma nova chance de reaproximação da família e uma oportunidade para encontrar a mulher da sua vida; o que assemelhava-se a mais um caso de corrupção envolvendo servidores públicos, transformou-se num grave e perigoso problema social, oculto na misteriosa casa “O”, nº 100 da Rua Sarnystalinov, cujo desfecho colocará em risco os investigadores.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento2 de jul. de 2017
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    Pré-visualização do livro

    O Crime Da Rua Sarnystalinov - Marcos Antonio Da Silva Lima

    o

    Crime

    da Rua

    Sarnystalinov

    MARCOS ANTONIO DA SILVA LIMA

    o

    Crime

    da Rua

    Sarnystalinov

    3ª edição

    2017

    Clube de Autores

    Esta é uma obra fictícia baseada em fatos reais que

    escrevi no Brasil. O desejo de publicá-la antes só não foi maior

    que meu empenho em honrar compromissos assumidos –

    motivo pelo qual não pude divulgá-la -, sobretudo porque a

    Esperança é minha companheira, sempre. Àqueles que me

    conhecem de longa data, sejam parentes ou amigos – e mesmo

    aos novos que me honram em permitir que eu exercite a difícil

    tarefa de tentar me divorciar de vez da velha solidão -, peço

    desculpas por andar sumido (o tema que proponho é

    autoexplicativo). Se tivesse que resumir em poucas linhas minha

    breve existência até aqui, o faria desta forma: Força de Vontade

    é meu apelido; Espírito de Luta é meu sobrenome.

    Marcos Antonio da Silva Lima,

    em trânsito,

    (Primavera de 2014)

    À memória de Isidro Fernandes Lima e

    Maria José Pereira da Silva, meus

    pais;

    Para meu irmão Isidro Fernandes

    Lima Junior e sua filha Sabrina da

    Silva Lima Oliveira.

    O Crime da Rua Sarnystalinov, por Marcos Antonio da Silva Lima

    Capítulo 1

    "Quem perde dinheiro, perde muito;

    quem perde parentes e amigos, perde mais;

    quem perde a coragem, perde tudo" .

    (autor desconhecido)

    ESTRANHA VONTADE DE VIAJAR

    – Depois de cometer todas essas atrocidades, Stalin teria sofrido

    um AVC, segundo as versões oficiais, e morrido sob os olhares

    irrequietos de Malenkov, Bulganin, Béria e Khrushchev, pondo

    fim a uma era que envergonha os comunistas – disse o professor

    Raskólhnikov II (que prefere ser chamado de Raskól II), quando

    fora interrompido pelo som da sirene, respondendo a uma última

    pergunta de um aluno bagunceiro que nunca havia tido interesse

    pelos estudos nos três meses desde a chegada desse educador

    substituto. Os demais estudantes já se encontravam com

    mochilas fechadas e se acotovelavam, arrastando as carteiras

    para ver quem chegava primeiro à porta, em parte porque se

    anunciava uma chuvinha, mas mais por praxe mesmo.

    – Aproveitem as férias! - ainda gritou o mestre, tendo como

    resposta dois Obrigado! com desejos iguais para si. Não

    9

    O Crime da Rua Sarnystalinov, por Marcos Antonio da Silva Lima

    demorou dez segundos para o professor se encontrar sozinho

    naquela classe de uma escola pública da periferia. Apagou o

    quadro e arrumou seus materiais. O caminho que faria daquela

    sala de aula, no bloco dos anos finais do Ensino Fundamental,

    até a sala dos professores, demorava uns cinco minutos de

    caminhada. Nesse percurso não pôde deixar de pensar no que

    faria dali em diante, mesmo tendo decidido cuidar disso só

    depois que chegasse em casa.

    Mas é que sentia que aquele ambiente escolar pelo qual

    vinha lutando tanto pra conquistar, o desafio de despertar

    mentes especiais, os excluídos e vítimas dos desgovernos

    neoliberais, parecia distanciar-se dele cada vez mais. Não por

    sua decisão, pelo contrário: tudo levava a crer que queriam sua

    distância de algumas salas de aulas, para ser mais preciso, de

    uma escola em especial, não esta em que acabara de encerrar o

    expediente, mas uma onde substituiu uma colega de trabalho.

    Sim. Com certeza foi dali que partiram aqueles ataques

    covardes. Mas ninguém chuta um cão morto, confortava-se o

    professor no instante em que descia as escadas e cumprimentava

    uma zeladora com votos de boas férias e um Até breve!. Esse

    pensamento dele se referia às frases "Quem você pensa que é,

    seu professorzinho substituto de merda?, Vamos te dar uma

    passagem só de ida pra tua Sibéria dos escravos. Nunca deveria

    ter saído de lá e vindo pra civilização europeia. Vai estudar e

    aprender a dar aulas, seu meio professorzinho sem competência

    pra passar em concurso!", escritas anonimamente num blog

    onde também era administrador.

    10

    O Crime da Rua Sarnystalinov, por Marcos Antonio da Silva Lima

    As desconfianças de que esses ataques xenófobos

    partiram dos colegas invejosos da escola de adultos e jovens

    excluídos, onde lecionou recentemente, devem-se aos trabalhos

    que ali Raskól II tentou implantar. Assim que lá chegou pra

    substituir uma professora que adoecera e entrara de licença por

    três meses, percebeu que os alunos não eram habituados a ter

    aulas coletivamente: eles eram atendidos individualmente, da

    maneira antiga, modelo este que a Secretaria de Educação já

    determinara a extinção. Raskól II não só colocou em prática o

    que pedia os administradores de seu cargo, como também

    passou a levar, pela primeira vez, os alunos de 15 a 70 anos ao

    laboratório de informática (cujos computadores pareciam está lá

    somente para os mais civilizados ou para aqueles que não

    furtariam pequenas peças dos micros), a utilizar vídeos nas aulas

    expositivas, dar mais valor às questões subjetivas nas avaliações

    dos educandos, etc.

    O boato era de que seu contrato com a Secretaria da

    Educação seria encerrado mesmo, embora soubesse de casos de

    prorrogação de trabalho a pedido de pessoas influentes no

    governo. Ele poderia discutir sua perseguição cibernética com

    os amigos do partido, ao lado dos quais havia se dedicado anos a

    fio. Eles leem meu blog, sei perfeitamente disso. Se não me

    ligaram, nem colocaram um só comentário lá ou escreveram

    um mísero e-mail para dar uma força pelos malditos ataques,

    então é porque não se importam mais comigo, se é que um dia

    assim o fizeram, apressava-se em concluir a reflexão já a poucos

    passos da sala dos mestres, no mesmo instante em que

    11

    O Crime da Rua Sarnystalinov, por Marcos Antonio da Silva Lima

    observava os últimos alunos saindo pelo portão com seus gritos

    e brincadeiras típicos da adolescência.

    Acho que meu erro com esse pessoal foi ter sido sincero

    nas críticas que escrevi no blog, principalmente referentes ao

    partido e à educação pública feita pra não funcionar. Talvez

    não me abandonariam se eu não as publicizasse. Não sei. Sinto-

    me traído. Pra falar a verdade, não sei o que faço tentando dar

    aulas na rede pública, tão sucateada em detrimento da

    mercantilização do ensino e aposta na manutenção da falta de

    conhecimento da maioria da população para que continuem

    elegendo corruptos do naipe de Sarnystalinov. Não sei por que

    insisto nisso. Por que tanto romantismo, achando que vou

    salvar o mundo, se a máquina é monstruosa? A mudança tem

    que ser lá em cima: uma grande reforma educacional

    priorizando o ensino básico; desgraçados são esses

    empresários que não deixam o presidente fazer a grande

    mudança logo!, ainda insistira nas motivações do desemprego

    iminente e revelando seu pessimismo pela profissão de

    educador.

    Após esvaziar o armário e despedir-se de dois colegas

    (um que ainda se encontrava na sala dos mestres e outro que

    passava de encontro a si num corredor da escola), pôs a mochila

    nas costas e montou na sua bicicleta. Nas primeiras ruas do

    início de seu trajeto até sua casa, ainda pôde buzinar para alguns

    alunos que iam a pé para a parada de ônibus ou para suas

    residências próximas dali. Gostava de fazê-lo também para que

    aquelas crianças não se esquecessem da condição humilde do

    12

    O Crime da Rua Sarnystalinov, por Marcos Antonio da Silva Lima

    professor siberiano (era raro, nesses tempos de agora, um desses

    ir pra escola de bicicleta, a grande maioria tinha carro). Talvez

    fosse a última vez que faria aquele gesto por ali. Olhou para a

    velha magrela que pedalava, de tinta azul desbotada,

    companheira há treze anos. Com quem ficarás? Não arrisco

    vender-te por preço baixíssimo que querem dar. Mais antes

    doar-te para quem de fato precise de ti, continuava a refletir um

    exausto Raskólhnikov II, em meio ao barulho do trânsito,

    fechadas de motoristas nada educados e ao vento trazendo uma

    fria garoa que lhe cortava a orelha (desprotegida da velha touca

    esquecida em casa – a previsão meteorológica não se

    confirmara), num dia atípico do outono no leste europeu de

    2011.

    Depois de chegar à kitnet que alugava, ele tomou uma

    ducha quentinha, esquentou e almoçou a comida que deixara

    pronta na geladeira (frango ao molho, arroz integral, salada de

    hortaliças e legumes). Torrou no forno alguns amendoins e foi

    para o quarto. Sentou-se na frente do seu Pentium IV que um dia

    arriscou chamá-lo de máquina - o sonho de ter um notebook

    ainda não podia ser concretizado. Nunca cochilava após as

    refeições porque quase sempre dormia bem à noite - raramente

    saía nesse horário. Naquele instante, contudo, talvez devido ao

    frio inesperado e às insônias recentes, pensou em ir pra cama.

    Mas resolveu pegar um cobertor pra se cobrir e sentou-se na

    cadeira à frente do computador, ligando-o em seguida.

    Pôs pra tocar uma seleção de músicas preferidas

    (começando, bem baixinho, com a que mais gostava, "Heaven

    13

    O Crime da Rua Sarnystalinov, por Marcos Antonio da Silva Lima

    and Hell", de Vangelis) e abriu o Ubuntu na página do Blog

    Poseidon e seu Tridente Poderoso, que também administrava.

    Pegou o mouse e passou a fuçar o blog, ao mesmo tempo que,

    como no ritual que principiou a fazer com a bike, conversava

    com seus outros objetos do lar: é que todos lhe tinham custado

    mais que simples valor monetário: era como se fossem a

    extensão do seu próprio corpo, tamanho o apego e zelo que tinha

    por eles, sobretudo se pensarmos que durante muito tempo esses

    objetos foram apenas uma imagem de desejo naquela mente,

    pois seu salário não dava para adquiri-los, exceção feita nos

    últimos cinco dos vinte anos desde que chegou em Dalask

    apenas com a mala e a mochila.

    A explicação para tais preocupações era devido à

    estranha vontade de viajar, de mudar, que retornara à sua mente.

    Parecia que o tempo que ficou em Dalask foi um interlúdio nas

    viagens que Raskól II fez por quase toda a Rússia. Quando

    alcançou a maioridade, com os pais mortos, resto da família

    abandonando-o à própria sorte, miséria reinante na República de

    Sarnyranhão, este jovem saiu sem destino explorando seu país à

    procura de lugar pra morar. Durante quase quatro anos não fez

    outra coisa senão viajar de cidade em cidade, coisa que na época

    ele não sabia bem qual o significado, mas que aquilo serviria pra

    algo em sua vida. Não passava mais do que três meses num

    lugar (a média era uma vila a cada três dias). Sempre vinha uma

    vontade estranha, louca, de conhecer outros destinos. Até que,

    de tanto os poucos parentes que aparentavam se preocupar com

    aquilo começarem a criticá-lo, dizendo que ele não sabia o que

    queria, resolveu fixar-se em Dalask, uma média cidade do

    14

    O Crime da Rua Sarnystalinov, por Marcos Antonio da Silva Lima

    extremo noroeste russo, terceira região metropolitana da

    República de Diasnará.

    Já havia passado nessas terras no primeiro ano das

    andanças sem destino. Naquela ocasião, lembrava-se

    perfeitamente, dormiu no único albergue da cidade por três

    noites - esse era o limite permitido - até ser mandado para uma

    vilinha ali próximo, num trabalho duro que consistia em quebrar

    pedras, dentre outras funções. Durou uma semana nessa tarefa.

    Voltou para Dalask e conseguiu mais três pernoites na referida

    instituição acolhedora de mendigos, até que deram-lhe passagem

    de ônibus para migrar para outra República vizinha dali. Mas,

    voltando ao caso de sua fixação nas terras dalaskenses, aquele

    então jovem andarilho fora atraído para lá devido a três fatores

    primordiais: à relativa proximidade de Dalask com as mais

    famosas e culturalmente ricas capitais europeias, ao clima não

    tão rigoroso comparando com o inverno siberiano e, sobretudo,

    ao fato de não haver por ali históricos relevantes dos mais

    graves problemas sociais típicos de grandes centros urbanos,

    conforme anotara num diário suas estatísticas pesquisadas.

    Sem escolher tipos de tarefas, desde que fosse um meio

    de ganhar dinheiro honestamente, possuindo apenas o ensino

    fundamental como grau de instrução, o siberiano agora

    sentindo-se radicado em Dalask foi conquistando essa cidade

    com sua força de vontade impressionante. Influíra-se mais no

    meio religioso e político da cidade. Em apenas cinco anos ali, de

    um mero servente de pedreiro, chegou ao cargo de assessor

    parlamentar na câmara de vereadores. No décimo segundo ano

    15

    O Crime da Rua Sarnystalinov, por Marcos Antonio da Silva Lima

    de sua estadia no meio dos dalaskenses, graduou-se na única

    universidade pública da cidade, universidade esta, por várias

    vezes, considerada uma das mais conceituadas de toda aquela

    república do extremo noroeste russo.

    Sem êxito na política (viu que era melhor fazer seu

    trabalho extraoficialmente apenas nos bastidores, nas bases, pois

    fora traído por alguns componentes do seu grupo) e, adiando

    lecionar em escolas públicas porque queria conhecer melhor as

    pessoas que compunham seu circulo amistoso, decidiu viver de

    produção de textos durante oito anos – tal tarefa consistia em

    fazer trabalhos principalmente para os movimentos sociais

    (embora não descartasse pedidos do setor de serviços), como,

    por exemplo, produção de resenhas e textos de conclusão de

    cursos para os formandos universitários, artigos para diretorias

    de sindicatos, centros acadêmicos, partidos políticos e

    instituições religiosas; ganhava por produção - até sentir a queda

    dos pedidos e decidir que era hora de usar o diploma e

    candidatar-se a professor substituto no ensino público. Assim foi

    levando a vida.

    É evidente que já se sentia fixo na terra dos sonhos -

    expressão utilizada por ele naqueles primeiros anos, e somente

    neles, é bom que se diga - e até escreveu sobre essa temática no

    blog. Mas algo estava mudando em sua vida, ou melhor, vários

    acontecimentos o empurravam para o retorno das aventuras.

    Há seis meses, pela primeira vez em todos esses anos,

    Raskól II começou a pensar em abandonar Dalask. Jamais tinha

    16

    O Crime da Rua Sarnystalinov, por Marcos Antonio da Silva Lima

    imaginado isso com tanta veemência como agora, ao contrário

    das outras vezes - quase sempre quando passava situações de

    desemprego ou escassez de dinheiro - quando confortava-se

    dizendo que iria mostrar para os parentes distantes e alguns

    amigos que sua empreitada para estas bandas não seria em vão;

    que ir embora de Dalask seria um reconhecimento de que o

    inimigo (a elite racista) teria vencido. Agora chegou inclusive a

    arrolar no seu diário o que chamou de principais motivos desse

    desencanto das terras ricas russas: o não chamamento do

    concurso para professor parecia ser o crucial, a incerteza de

    emprego naquilo para o qual se formara; mas também as

    decepções no grande jogo da convivência humana, quer nas

    amizades que ali cultivou, quer nos amores e desamores que lá

    viveu. Todavia,

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