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Aconselhamento pastoral: reflexões e práticas sob a ótica da cruz
Aconselhamento pastoral: reflexões e práticas sob a ótica da cruz
Aconselhamento pastoral: reflexões e práticas sob a ótica da cruz
E-book409 páginas9 horas

Aconselhamento pastoral: reflexões e práticas sob a ótica da cruz

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Sobre este e-book

Este livro busca auxiliar pastores na tarefa de aconselhar as pessoas nas mais variadas dificuldades enfrentadas no dia a dia, como luto, dependência química, problemas na vida em casal, na vida universitária, na vida familiar, entre outros.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento17 de nov. de 2022
ISBN9786555910711
Aconselhamento pastoral: reflexões e práticas sob a ótica da cruz

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    Aconselhamento pastoral - Gabriel S. Sonntag

    ACONSELHAMENTO PASTORAL

    Leonídio Schulz Görl

    Introdução

    Vivemos tempos difíceis. São tempos em que o sofrimento está em alta e a angústia se faz presente de uma forma mais intensa. Ainda hoje nos servem as palavras do Pregador: O que descobri é tão somente isto: que Deus fez o ser humano reto, mas ele se meteu em muitos problemas. (Eclesiastes 7.29) A questão preliminar na prática do aconselhamento pastoral é esta: O que é e como o aconselhamento pastoral pode ajudar as pessoas?

    Para responder essa e outras perguntas é que o presente capítulo tem como objetivo abordar tanto a necessidade do aconselhamento pastoral quanto o aproveitamento das crises como oportunidade de crescimento. Para tanto, verificaremos o que é aconselhamento pastoral, definindo os termos normalmente empregados na literatura relativa ao tema, bem como apresentaremos características próprias desse tipo de aconselhamento.

    Será oportuna a observação de que demonstraremos a necessidade do aconselhamento pastoral e suas possíveis abordagens, com destaque para um diálogo mais construtivo entre a teologia e a psicologia. Na parte final deste capítulo veremos como realizar um aconselhamento pastoral. Destacaremos alguns elementos e fenômenos que acontecem durante o processo do aconselhamento, para que você possa formular seu próprio método e prática.

    A necessidade do aconselhamento pastoral

    Num mundo tão complexo e caótico é natural que soframos. Sabemos que este caos diário é apenas mais um dos resultados da queda em pecado (Gênesis 3). A Palavra de Deus nos adverte que o pecado trouxe sérios problemas e comprometeu o nosso relacionamento com Deus e com o nosso semelhante e que corrompeu nosso equilíbrio interno. Desde então, o sofrimento passou a ser uma condição humana. Por isso o ser humano, nascido de mulher, vive breve tempo, cheio de inquietação. (Jó 14.1)

    Diante disso podemos concluir que não importa qual a origem, o nível social ou intelectual ou a religião, pois sempre estaremos de uma forma ou de outra envolvidos com angústias, depressão, conflitos, preocupações e desentendimentos. Outra conclusão que podemos ter é que, na maioria dos casos, não conseguimos resistir, suportar ou resolver nossas demandas sozinhos. Os esforços das pessoas para vencer as crises e traumas acompanham a história do ser humano. É nesse momento que precisamos de auxílio, socorro, apoio e conselho.

    No entanto, o ser humano não é somente alma nem apenas corpo, e é nessa complexidade que ele deve ser tratado. Hoff (1996, p. 18) afirma que todas as pessoas têm necessidades sociais, físicas e psicológicas que devem ser satisfeitas para que elas desfrutem de uma boa saúde mental. Mas assim como há doenças do corpo podemos dizer que há as enfermidades da alma. Clinebell (apud SCHNEIDER-HARPPRECHT, 1998, p. 269) usou o termo integralidade centrada no Espírito para designar uma visão holística do ser humano que se baseia na antropologia bíblica que descreve o ser humano como imagem de Deus, criado à sua semelhança como pessoa na integralidade de corpo, mente, espírito e em relação com os outros, a comunidade.

    Por isso não é correto, diante de doenças tanto da alma como do corpo, negligenciar as demandas do corpo nem atribuir os conflitos da alma apenas à falta de fé ou a forças espirituais. A Bíblia, além de falar do pecado e de não minimizar seus efeitos, nunca escondeu o fato que o povo de Deus também adoece física e psiquicamente. Depressão, neuroses, psicoses e doenças corporais em geral fazem parte do cardápio de todos.

    Reconhecer a necessidade de buscar um auxílio é fundamental, mas tão importante quanto isso é buscar o aconselhamento de maneira correta. Mas quem seria a pessoa mais indicada para nos ajudar? Veremos que em muitos casos precisamos de um aconselhamento pastoral, pois as angústias que fazem parte de nossa vida, na maioria das vezes, estão direta ou indiretamente ligadas à nossa realidade de pecado.

    Quando nos deparamos com a questão de quem precisa de aconselhamento, certamente estamos tratando com algo complexo. Da mesma forma, é um desafio responder: Por que as pessoas procuram um conselheiro? O que elas desejam? Quais são as razões que levam um conselheiro a tentar ajudar essas pessoas? Collins (2004, p. 44) afirma que questionamentos dessa natureza são complexos porque cada pergunta pode ter várias respostas, dependendo do aconselhando e do próprio conselheiro.

    No entanto, de uma forma ou de outra, todos sofremos e passamos por crises. Por isso é aconselhável o auxílio de um conselheiro nesses momentos conflituosos, até porque algumas crises não podem ser evitadas. As situações de crise podem ser esperadas ou inesperadas, reais ou imaginárias, reais (como a morte de um ente querido) ou potenciais (como a probabilidade de que um ente querido venha a falecer em breve). (COLLINS, 2004, p. 74)

    Crises – perigo ou oportunidade?

    É interessante observarmos que o termo crise, na língua chinesa, é composto de dois ideogramas, sendo que um deles significa perigo e o outro significa oportunidade. Em linguagem formal, uma crise é qualquer evento ou série de circunstâncias que ameaça o bem-estar de uma pessoa, interfere na sua rotina de vida e afeta o ajustamento mental. Mesmo que cada crise seja única, algumas características parecem ser muito comuns: ansiedade, senso de incapacidade, dependência dos outros, sentimento de culpa pela dependência, perda de autoestima, ira, diminuição da eficiência. (COLLINS, 1990, p. 75-76)

    De certa maneira, todas as pessoas podem esperar por conflitos internos, depressão, conflitos interpessoais, sentimento de culpa, problemas matrimoniais e os demais dramas da vida diária. Hoff (1996, p. 15) destaca que existem quatro etapas na vida em que as mudanças físicas e sociais podem produzir crises e tensões: a adolescência, a maternidade, a menopausa e a velhice. Por isso, o desequilíbrio e os momentos de tensão estão basicamente presentes no decorrer da vida.

    Segundo Collins (2004, p. 76) existem três tipos de crise: acidentais ou circunstanciais, do crescimento e existenciais, e isso pode ser comprovado tanto com exemplos dos dias de hoje como nas histórias bíblicas.

    As crises acidentais ou circunstanciais acontecem diante de fatos desestabilizadores que surgem repentinamente. Aqui podemos incluir um acidente, morte de pessoa querida, perda de emprego, escândalos diversos que afetam o nome e a honra pessoal e/ou da família, etc. Todos esses exemplos são inesperados e circunstanciais e afetam o indivíduo e a sua rede de apoio.

    Quando falamos das crises do crescimento estamos abordando aquelas crises que acontecem no curso do desenvolvimento normal do ser humano nas quais não há surpresa, mas nem por isso deixam de ser crises que precisam ser observadas. Como exemplo podemos incluir: a reação às críticas na adolescência, o início da vida acadêmica, o primeiro dia no trabalho, a saída de casa para estudar em outra cidade, o casamento, o nascimento dos filhos, a aposentadoria e a adaptação à morte dos amigos na velhice. Essas crises podem requerer a aplicação de novas estratégias para adaptar-se às novas situações.

    Ainda queremos destacar as crises existenciais, que são o terceiro tipo de crises e que se sobrepõem às outras duas. Nas crises existenciais precisamos enfrentar verdades perturbadoras sobre nós mesmos: Quem sou eu? O que vou fazer quando concluir minha faculdade? Nunca vou vencer na vida! Não consegui aquela promoção que queria tanto. Minha vida não tem sentido nem propósito. Meu casamento acabou em divórcio. Estou com uma doença incurável. Não acredito em mais nada. Perdi tudo o que tinha. Já estou velho demais para recomeçar ou realizar meus sonhos.

    A Bíblia menciona todos esses tipos de crise, mas nem sempre conseguimos compreender o que realmente está acontecendo e quais seriam exatamente as razões para o sofrimento. Não ousamos recorrer a racionalizações devido à nossa falta de conhecimento. Sendo assim, o enigma do sofrimento obriga os cristãos a serem pacientes sob a graça de nosso Deus fiel (Tiago 1.12; 5.10-11; 2Coríntios 12.9-10; Jó 40.3-5; 42.1-6). Além dos patriarcas, reis e profetas, discípulos e evangelistas, temos o testemunho bíblico de que o próprio Jesus passou por momentos de crise, como podemos ler em Mateus 26.38-39:

    Então [Jesus] lhes disse: – A minha alma está profundamente triste até a morte; fiquem aqui e vigiem comigo. E, adiantando-se um pouco, prostrou-se sobre o seu rosto, orando e dizendo: – Meu Pai, se é possível, que passe de mim este cálice! Contudo, não seja como eu quero, e sim como tu queres.

    Os cristãos, além de passarem pelos dramas comuns da vida cotidiana, ainda podem enfrentar crises em sua fé envolvendo a vida espiritual, sentimento de culpa por um pecado cometido, questões doutrinárias, oscilação da fé pessoal, etc.

    Como vimos, existem diferentes etapas e tipos de crises. Evidentemente, não é correto e prudente tratar todos os casos da mesma forma, até porque as pessoas e seus respectivos contextos nunca serão idênticos. No entanto, Collins (2004, p. 77-82) ensina que existem técnicas de aconselhamento que se aplicam a todos os casos. Todo cristão que deseja ajudar as pessoas deve conhecer bem esses métodos de intervenção. Gary Collins (1990, p. 77) apresenta os modos sãos e os doentios de enfrentar uma crise:

    Assim, observamos que existem maneiras diferentes de lidar com uma crise e que é muito comum a pessoa em crise ter comportamentos, pensamentos e sentimentos doentios. No entanto, num momento agudo de crise o conselheiro pode ajudar a pessoa a organizar seu pensamento para voltar ao seu estado normal. Dessa forma, ele reduz a ansiedade e focaliza objetivamente naquilo que é saudável e construtivo, auxiliando a pessoa aconselhada a avaliar seus recursos para enfrentar as suas crises e amadurecer com elas, mesmo que não seja possível compreendê-las em toda a sua complexidade.

    O pastor como conselheiro

    Segundo Walther (1906, p. 76), a função mais importante de todas as funções ministeriais de cada pastor é a pregação pública da Palavra de Deus, mas destacamos que na teologia luterana o pastor é considerado um Seelsorger, isto é, um cura d’almas. (FRITZ, 1945, p. 172) Podemos entender cura d’almas no sentido amplo, abrangendo todo o ministério pastoral, ou no sentido restrito, que pode ser compreendido também como aconselhamento pastoral. Cura d’almas é um ministério de apoio e amparo para pessoas e todos aqueles que lhe são próximos e que estejam experienciando algum tipo de sofrimento, tais como doença, cirurgia, incapacidade, morte e desolação. (HULME, 1981, p. 9 apud PRIETO, 1997, p. 26)

    A expressão cura d’almas, para as pessoas não muito ligadas a uma igreja, não reproduz tão bem o sentido de cuidado espiritual pelas pessoas do que as expressões Seelsorge para os alemães e soul care para os de fala inglesa. Carecemos, em português, de uma expressão que possa reproduzir a ideia de cuidador de almas e que ao mesmo tempo soe bem aos ouvidos. (STEYER, 1995, p. 4)

    Na tradição cristã, o conceito curar (do latim curare), além de restabelecer a saúde física, tem o significado de cuidar da pessoa em sentido psicológico, social e espiritual. (HOCH, 2007, p. 5) Mueller e Kraus (1945, p. 141) afirmam que o aconselhamento pastoral individual está planejado para facilitar a aplicação da Lei e do Evangelho de Deus àqueles que vêm ao pastor em busca de ajuda na resolução de problemas e na retificação de suas vidas.

    Schneider-Harpprecht (1998, p. 256) destaca alguns termos técnicos usados nessa área de aconselhamento: a palavra poimênica (a ciência do agir do pastor [em grego poimen]), a "clínica pastoral (o acompanhamento pastoral na área da saúde), a psicologia pastoral (a interpretação da pastoral sob perspectiva psicológica) e ainda a definição dos parceiros na conversação como paciente, cliente e aconselhando". A origem dessas metáforas está na medicina, na psicanálise e no método psicoterápico de Carl Rogers (counseling).

    Dessa forma, podemos observar que é possível encontrar um lugar próprio para o aconselhamento pastoral dizendo que é uma forma específica de exercer a cura d’almas. Além do conteúdo do aconselhamento pastoral não diferir do conteúdo da proclamação pública da Palavra de Deus (no aconselhamento pastoral ela apenas toma uma forma particular), temos o aspecto da pastoral/poimênica, pois o pastor é aquele que está cuidando do seu rebanho. Certamente, o pastor possui recursos que conselheiros humanísticos não possuem e que mesmo outros conselheiros cristãos podem não ser capazes de usar de maneira eficaz. Estes recursos são a Lei e o Evangelho, a Palavra de Deus que capacita as pessoas a terem uma vida abundante e eterna em Jesus Cristo através da obra do Espírito Santo. (MUELLER e KRAUS, 1945, p. 151)

    Segundo o teólogo luterano Warneck (2018, p. 225-229), o pastor proclama e aplica a Palavra do Senhor aos cristãos em suas necessidades – ansiedade, desapontamento, disfunção, obstinação, etc., mas também quando eles celebram vitórias, satisfações e alegrias. O cuidado pastoral também auxilia as pessoas com problemas a alcançar o bem-estar emocional e a maturidade, de modo que possam ajudar a si mesmas.

    Características do aconselhamento pastoral

    Existe uma vasta literatura destinada ao aconselhamento pastoral, mas nem sempre os autores usam a mesma expressão para designar os envolvidos no aconselhamento. Inclusive não há consenso nos conceitos referentes ao processo que faz parte desse aconselhamento. Na verdade, o conceito "aconselhamento pastoral é uma tradução para o português da expressão em inglês pastoral counseling, usada especialmente no contexto norte-americano do século XX." (SCHNEIDER-HARPPRECHT, 1998, p. 256)

    Heimann (2015, p. 26) afirma que mesmo não havendo unanimidade entre os autores em função da diversidade de conceitos como poimênica, cura d’almas e cuidado pastoral, é possível identificarmos um rol de características que delimitam e circunscrevem o aconselhamento pastoral.

    De acordo com Soares (apud HEIMANN, 2015, p. 26-27), algumas características do aconselhamento pastoral são:

    •É uma especialização da teologia pastoral;

    •Não é um tratamento de longo prazo, tendo duração curta;

    •É exercido por um pastor ou liderança da igreja com algum preparo na arte do aconselhamento cristão;

    •Lida com aspectos da vida toda do indivíduo: sociais, pessoais, emocionais, relacionais e espirituais;

    •Parte de uma relação humana altamente interativa, que implica confiança;

    •Pode se utilizar de leituras bíblicas como parte da orientação ao aconselhando;

    •Tem na oração um recurso importante para fortalecimento da fé e espiritualidade do aconselhando;

    •É marcada por um caráter pedagógico e educativo, que visa ao apoio e à orientação;

    •Procura ser direto e específico, focalizando um problema determinado, constituindo-se em uma ajuda de caráter mais situacional;

    •Apropria-se de princípios da psicologia como ferramenta para melhor auxiliar o aconselhando, desde que esses não se choquem com princípios bíblicos;

    •Evita fixar-se nas patologias do aconselhando, procurando enfocar as suas potencialidades e recursos para a resolução dos problemas;

    •Visa ao bem-estar integral da pessoa, em todos os seus aspectos, não apenas o espiritual, mesmo que este seja o proprium do aconselhamento cristão.

    Como podemos observar, mesmo que possa haver uma ou outra crítica em torno dessas características, elas formam um conjunto consensual que serve para balizar a teoria e a prática do aconselhamento cristão. (HEIMANN, 2015, p. 28) Em suma, poderíamos definir aconselhamento pastoral como uma dimensão do ministério pastoral que procura ajudar as pessoas por meio da conversação e outras formas de comunicação metodologicamente refletidas para que possam viver a relação com Deus, consigo mesmas e com o próximo de uma maneira consciente e adulta. (SCHNEIDER-HARPPRECHT, 1998, p. 256-257)

    Para Heimann (2015, p. 28) o aconselhamento pastoral é uma prática metodologicamente refletida e não deveria se basear apenas no feeling ou na intuição e experiência pessoal. O pastor conselheiro deveria se apoiar em conhecimentos bíblico-teológicos sólidos, mas também deveria manter um diálogo crítico com outras ciências, buscando a apropriação de conhecimentos seculares úteis para uma melhor compreensão do ser humano, visando uma intervenção mais profícua.

    Nessa abertura para um possível diálogo podemos verificar as seguintes reações: assimilação, reação e diálogo¹ ou ainda uma relação de luta, delimitação, modelo de integração pelo diálogo, cooperação, mediação filosófica ou crítica mútua com as ciências humanas. (SCHNEIDER-HARPPRECHT, 1998, p. 276-277) Assim, percebemos a necessidade de abertura para um diálogo com as ciências humanas, tomando o devido cuidado para não reinterpretar o Evangelho em termos psicológicos nem reduzir a alma apenas em consciência e subconsciente (aquilo que move o ser humano em seu raciocínio, sentimento e desejo), comprometendo assim nossa pastoral.

    Reinterpretamos o Evangelho em termos psicológicos quando usamos técnicas de aconselhamento a partir da Bíblia apenas para oferecer saúde corporal e mental para nossos aconselhandos e ignoramos e/ou diminuímos o fato de que a Escritura Sagrada é a Palavra de Deus e tem como objetivo apresentar Jesus Cristo como o Filho de Deus, a fim de que todo aquele que nele crer tenha a vida eterna (João 20.31). Convém lembrar que a Bíblia tem elementos que ajudam no aconselhamento, mas ela não é um dicionário enciclopédico que contém tópicos de aconselhamento e que lista o tratamento ou o remédio para todos os problemas.

    Assim também podemos dizer que reduzimos a alma apenas em consciência e subconsciente quando usamos técnicas terapêuticas que negligenciam a afirmação da própria Palavra de Deus que nos diz que o ser humano possui uma alma (Gênesis 2.7), que ele nasce em pecado e que é totalmente dependente da ação de Deus no que diz respeito às questões espirituais (João 3.6-7; Efésios 2.1). Ignorar isso é deixar que elementos estranhos adentrem a teologia e maculem nossa prática pastoral.

    Abordagens de aconselhamento pastoral

    ²

    Quando falamos de aconselhamento pastoral precisamos lembrar que estamos falando especialmente de um relacionamento de comunicação entre duas ou mais pessoas: o conselheiro e o(s) aconselhando(s). Sendo assim, convém lembrar que nesse processo inevitavelmente usaremos algum tipo de abordagem, mesmo que não tenhamos consciência desse fato.

    Por isso, um aspecto útil ao conselheiro pastoral envolve o conhecimento de abordagens de aconselhamento que podem ser utilizadas ao longo das consultas e sessões de aconselhamento, pois os relacionamentos interpessoais são psicodinâmicos e o aconselhamento pastoral formal se efetiva por meio de um método de abordagem que visa atingir um objetivo.

    De acordo com Heimann (2015, p. 35), esses fenômenos psicodinâmicos precisam ultrapassar o conhecimento do senso comum e ser descritos e aprendidos sob uma perspectiva de maior cientificidade. Segundo ele, o campo conceitual da psicologia é muito amplo, levando-se em conta as diferentes teorias psicológicas existentes. Assim, há diversos conceitos, princípios, fenômenos, recursos e técnicas psicológicas que podem ser muito úteis para o conselheiro pastoral na sua tarefa de acompanhar, compreender e cuidar de pessoas.

    A utilização específica de cada uma das abordagens é mediada pela sensibilidade do conselheiro diante do conteúdo que lhe é apresentado pelo aconselhando na consulta. Schneider-Harpprecht (1998, p. 266) ressalta a importância de quatro modelos teóricos de aconselhamento pastoral na América Latina: a) o modelo fundamentalista; b) o modelo evangelical de psicologia pastoral; c) o modelo holístico de libertação e crescimento; e d) o modelo contextual de uma poimênica de libertação.

    a) O modelo fundamentalista (noutético³) – O teólogo norte-americano Jay E. Adams (1977, p. 55-75) descreve nouthesia como um vocábulo rico de significação, sem equivalente exato em português, e declara haver três elementos básicos dentro da prática do aconselhamento noutético: 1. Efetuar mudança de conduta e de personalidade; 2. Confrontação verbal em relação interpessoal; 3. Motivação pelo amor – para o bem do cliente e para a glória de Deus. (apud HURDING, 1995, p. 321-322) Esse modelo é baseado no aconselhamento centrado na Bíblia como única fonte de orientação relativa ao ser humano e às causas de seu sofrimento e rejeita toda e qualquer perspectiva psicológica. O método de Adams considera que doenças psíquicas têm a sua raiz no pecado da pessoa. Para Adams (1977, p. 12) os conselheiros e os especialistas em saúde mental estavam equivocados porque procuravam transferir a responsabilidade do pecador para fatores estruturais ou sociais que estariam fora do controle dele. Por outro lado, Adams afirmava que, de acordo com a Palavra de Deus, a fonte de todos os problemas tinha como fonte a depravação da natureza humana decaída.

    b) O modelo evangelical de psicologia pastoral – O psicólogo Gary R. Collins buscou a integração da psicologia com a teologia para realizar um aconselhamento mais efetivo, formando um modelo psicoteológico. Mesmo que a revelação bíblica tenha prioridade sobre a revelação natural, Collins (apud HURDING, 1995, p. 273) declara que as verdades provenientes dessas duas fontes ‘não podem contradizer-se’: a Palavra de Deus e o mundo de Deus estão em harmonia perfeita.

    De acordo com Collins (2004, p. 24), tanto a Bíblia quanto a psicologia são instrumentos de Deus em favor dos conselheiros e dos aconselhandos. Inclusive, ele diz que limitaremos muito nossa capacidade de aconselhamento se assumimos uma postura de repúdio a toda e qualquer contribuição que a psicologia possa oferecer. Na verdade, nossa integridade fica comprometida quando dizemos que rejeitamos a psicologia, mas usamos seus conceitos na prática do aconselhamento. Por isso, é fundamental crer com firmeza tanto na inspiração e na autoridade da Bíblia bem como usá-la como parâmetro com o qual devemos testar e julgar todo o conhecimento da psicologia.

    c) O modelo holístico de libertação e crescimento – Esse modelo tem como seu maior expoente o pastor metodista Howard J. Clinebell Jr., que baseou seu modelo de aconselhamento numa visão holística da pessoa criada à imagem e semelhança de Deus e que, por meio de Cristo, alcança uma vida abundante. O modelo de Clinebell abriu-se para impulsos da psicologia humanística, porém tenta fundamentá-los biblicamente. (SCHNEIDER-HARPPRECHT, 1998, p. 270)

    Clinebell (1998, p. 27) diz que o objetivo do estilo de vida do cristão, da poimênica e do aconselhamento pastoral é a libertação o mais plena possível das pessoas, na totalidade de seus contextos relacionais e sociais. Para tanto, ele faz uso de três imagens: coloca a imagem de um posto de salvamento ao lado de uma imagem de jardim no qual, segundo ele, o crescimento das pessoas é cultivado durante toda a jornada de sua existência, e acrescenta ainda a imagem de um centro de treinamento, no qual essas pessoas são equipadas para serem agentes de transformação na vida de outras pessoas na sociedade. Dessa forma, o Evangelho libertaria e capacitaria as pessoas para realizarem o sonho e a intenção de Deus de que todos tenham vida em abundância.

    d) O modelo contextual de uma poimênica de libertação – Schneider-Harpprecht destaca que esse modelo está representado especialmente pelo teólogo luterano Lothar Carlos Hoch. A característica principal desse modelo de aconselhamento é que parte do sofrimento atual das pessoas, tem o caráter de apoio solidário na luta popular e acontece dentro do contexto específico de grupos. O aconselhamento é exercido pelos próprios atingidos ou por representantes especializados que trabalham com o objetivo de capacitar as vítimas de problemas e injustiças sociais para defender os seus interesses vitais. (SCHNEIDER-HARPPRECHT, 1998, p. 270)

    Hoch (1989, p. 27) afirma que é fundamental que o aconselhamento pastoral surja de um espírito comunitário e que inclua também na sua perspectiva de ação a dimensão estrutural, para não operar com um conceito individualista, ficando refém de ideologias estranhas.

    Após vermos os quatro modelos de aconselhamento convém salientar que cada um deles tem um método próprio de ação. Compreendemos que método é um caminho organizado e planejado de atos comunicativos para alcançar um objetivo premeditado. (SCHNEIDER-HARPPRECHT, 1998, p. 277) Certamente, todos os métodos devem ser questionados em relação aos seus fundamentos filosóficos e religiosos. Entendemos que métodos baseados em considerações religiosas que não estejam de acordo com a fé cristã não podem ser usados. Existem ainda muitos métodos e técnicas terapêuticas que podem auxiliar no aconselhamento pastoral⁴ e, de acordo com Heimann (2015, p. 29), aliados ao método bíblico clássico, o conselheiro pode ordenar seu trabalho individual e/ou coletivo de maneira criativa usando elementos da psicanálise, da Gestalt terapia, do psicodrama, da terapia familiar sistêmica, da programação neurolinguística e muitas outras técnicas das mais variadas escolas psicoterápicas.

    Sendo assim, o pastor estará aberto para obter conhecimento das ciências comportamentais que procuram elucidar a condição humana e acolherá prontamente todo aquele conhecimento que traz consigo seus problemas, submetendo casos que vão além de sua competência a profissionais especializados na área da saúde.

    Como realizar um aconselhamento pastoral

    Compartilho agora alguns pontos que usei em minha prática de aconselhamento e que julgo importantes na realização do aconselhamento pastoral, para que você possa ter mais elementos na formulação do seu próprio método e prática.

    O contato inicial

    Uma coisa que aprendi é que o aconselhamento começa antes mesmo dos encontros e sessões. Seja quando a pessoa procura você ou quando você procura a pessoa que deseja aconselhar, ressalto que todos os detalhes contam. A comunicação vai além das palavras! Por isso, é fundamental começar bem. Esse contato inicial dará o tom do processo. Lembre-se desde o início que você precisa dar atenção ao fator tempo durante todo o processo de aconselhamento, pois o aconselhando precisará de tempo para expor seu problema. No caso desse contato ser presencial, preste bastante atenção na sua fala. Demonstrar calma, empatia e confiança ajudam o aconselhando a estabelecer um contato melhor para o estabelecimento de uma aliança terapêutica. No entanto, se o contato pessoal não for possível e você tiver que conversar via mensagem escrita tome um cuidado redobrado. Costumo dizer que a palavra escrita não tem sentimento em si, mas o sentimento será colocado pela pessoa que lê. Sendo assim, convém ser mais assertivo numa abordagem direta, cuidando para não dar oportunidade para uma interpretação ambígua.

    O local/setting

    Após o contato inicial é importante vermos o melhor local para o aconselhamento. Esse local é chamado também de setting terapêutico. Pastoralmente falando, podemos ter uma infinidade de locais. Em todo o caso, o conselheiro privilegiará pelo bom-senso um ambiente agradável, confortável, reservado e privativo. Aqui nos preocupamos com o ambiente físico, psicológico e ético que precisa ser criado para que o aconselhamento flua com naturalidade. É imprescindível que o aconselhando tenha certeza de que o local oferece a privacidade e o sigilo tão necessários para quem deseja expor um problema pessoal. Da mesma forma é necessário que se cuide para que esse momento não seja facilmente interrompido, pois isso acaba interferindo negativamente no aconselhando. Lembre-se: a pessoa que busca auxílio já está fragilizada, tensa e com a estima baixa. Por isso, reserve um bom tempo na sua agenda, coloque seu telefone celular no silencioso, desconecte-se das redes sociais e dedique sua atenção ao aconselhando. Creio que convém ressaltar que não devemos deixar de oferecer o aconselhamento caso não seja possível estabelecer um local/setting adequado. Em muitas situações necessitaremos atuar em condições desfavoráveis, como num presídio, hospital, instituições psiquiátricas ou até mesmo na casa do próprio aconselhando.

    A aliança terapêutica

    Após o primeiro contato e o estabelecimento de um local, nossa atenção se volta para o encontro em si. Nesse encontro previamente agendado tomamos os mesmos cuidados do contato inicial. É importante logo de início agradecer a confiança depositada na pessoa do conselheiro e assegurar o aconselhando que o local é privativo e sigiloso e que vocês não serão interrompidos. Enfatize que tudo que será conversado durante o aconselhamento não será compartilhado com ninguém. Dessa forma, você vai criando um clima favorável para o estabelecimento da aliança terapêutica. Prefiro esclarecer de

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