As Lamentações
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As Lamentações - Leonardo Antunes Barreto Noman
Era noite de uma segunda-feira. Mal começava a semana e Carlos Andrade Rosa já pensava em desistir dos seus planos. Fazia o curso de graduação de Bacharelado em Matemática e junto a isso, Iniciação Científica em Sistemas Dinâmicos na Universidade Federal de Minas Gerais. Seu objetivo era estudar Mecânica Celeste junto ao seu grande e respeitado orientador Rodrigo Santos. Todavia, ele não aguentava mais. A rotina de estudos, o namoro com Bruna Almeida, sua mãe pouco afetuosa e seus problemas do dia a dia o desanimaram.
— Creio que amanhã não vou acordar mais — disse ao seu cachorro, Zequinha.
Estava farto do que a vida lhe oferecera até então. Tinha apenas vinte e seis anos, mas não havia uma luz no fim do túnel. Seus dias eram sórdidos. Pouco amorosos, pouco afetuosos. Tomara então quarenta comprimidos de um remédio que certamente lhe causaria a morte. Ou apenas era o que a Internet diria. Abraçou seu cachorro pela última vez e se deitou. Sempre gostou de ouvir músicas tristes. E esse momento era perfeito para tal. A cada comprimido que tomava, não parava para pensar. Era um pequeno gole de água atrás de outro. E sua maior decepção neste momento não seria deixar seus amigos, familiares ou a Bruna tristes.
Sua maior decepção nesse momento foi nunca ter dedicado uma carta sequer à sua mãe. Roberta Rosa era rica. Podre de rica. Foi ironicamente abençoada há onze anos pela queda de avião que matou seus pais. Era filha única, e seus pais, bilionários. A companhia Rosa era uma das quatro grandes montadoras nacionais da indústria automobilística brasileira. Foi casada com Thiago Jorge por vinte e três anos. Thiago era um dos mais humildes mecânicos que se podia encontrar em Belo Horizonte. Acreditava que apenas o trabalho podia salvar as pessoas. Mas o trabalho nunca o salvou. Sempre foi vulgarmente pobre. E Roberta tomou a decisão de se separar assim que herdou toda a fortuna. Era uma mulher boêmia, que sempre traiu Thiago sem que ele soubesse. Thiago gostaria que o casamento fosse reatado. Não pelo dinheiro. Mas por ter sido a única mulher que amara em toda a sua pacata vida.
Roberta não se importava com os filhos. Nem com Carlos Andrade nem com Caroline Rosa. Nunca foi exemplo em demonstração de afeto. Nunca checou se sua prole fizera o dever de casa. Como estão? Tudo bem?
nunca foi dito por Roberta a seus filhos. Roberta sempre foi rígida com o dinheiro em relação à criação das crianças. Desde sempre foi mão de vaca com elas. Com si, não. Eram aulas de pintura, academia, pilates, salão de beleza, aulas de francês, joias caras e, em compensação, presentes baratos. Se a vida de Carlos passasse pelos seus olhos no quadragésimo comprimido, poderia então contar com exatidão quantos abraços recebeu da mãe. Foram exatos sete. Sete abraços, em sete Natais distintos. O oitavo nunca ocorreu. No oitavo ano de vida de Carlos Andrade, os guardiões das famílias de Thiago e Roberta brigaram. Nunca mais houve tal comemoração cristã em sua casa.
Como começaria sua carta? Quais adjetivos maléficos usaria? Se inspiraria em seu ídolo Franz Kafka em Carta ao Pai? Ou seria mais original para dilacerar sua mãe em palavras na sua própria carta?
— Pois bem, escreverei — disse