Homens de aço? Os super-heróis como tutores de resiliência
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Homens de aço? Os super-heróis como tutores de resiliência - Gelson Vanderlei Weschenfelder
COMITÊ CIENTÍFICO DA COLEÇÃO EDUCAÇÃO, TECNOLOGIAS E TRANSDISCIPLINARIDADE
A todos que acreditam em super-heróis.
Por que caímos, Bruce? Para nos erguermos.
(Batman)
PREFÁCIO
Ser convidada para escrever o prefácio deste livro incrível foi para mim uma enorme alegria. Dar marca a uma obra que transita livremente do literário para o científico não é tarefa fácil, mas tentarei traçar as minhas linhas para oferecer um retrato aproximado do percurso do autor durante sua tese de doutorado, foco da composição desta peça! Quero primeiramente acentuar que adentrar um programa de pós-graduação em Educação no Brasil com a firme proposta de construir uma tese sobre super-heróis, só poderia vir de alguém muito ousado, como é o autor principal desta obra, o Dr. Super Gelson, como eu costumo me referir carinhosamente a ele até os dias de hoje.
Pesquisar cientificamente o tema das histórias de super-heróis em quadrinhos
e cogitar a sua aplicabilidade em contextos educativos não representa simplesmente preencher uma lacuna e desenvolver um projeto de pesquisa diferente ou divergente de outros assuntos exaustivamente publicados na área da Educação. A temática requer muita disciplina teórica, flexibilidade conceitual e disponibilidade metodológica, além de grande disposição emocional para absorver críticas, confusões epistemológicas e interpretações equivocadas. É consenso que em nosso meio acadêmico contemporâneo, em pleno século XXI, temas dissidentes são desvalorizados e segregados com base em ideias preconceituosas amparadas por teorias implícitas e crenças negativas
. Estas certamente advêm de um terreno formado por pensamentos/pensadores conservadores, e, por vezes, obscurantistas
, que visam a limitar as chances de criatividade e de inovação dos educadores e de seus seguidores.
Devo dizer que essa era uma armadilha que me impossibilitaria de trabalhar as super ideias do Gelson no seu doutorado. Entretanto, passada a surpresa inicial sobre a originalidade da sua questão de pesquisa, senti-me desafiada em meu papel de pesquisadora de temas tendenciosamente concentrados no lado mainstream
da Psicologia do Desenvolvimento/Social/Comunitária, em que estariam meus conhecimentos consolidados acerca do construto de resiliência. Ao longo desses muitos anos estudando resiliência como fenômeno humano, cheguei à compreensão das complexidades que a explicam dentro de um conjunto de processos que vai muito além do enfrentamento de situações de sofrimento. É necessário salientar os indicadores relacionais de proteção, ou seja, os outros significativos
que possibilitam o fortalecimento, o empoderamento e as transformações pessoais/coletivas/culturais. Essas presenças, que podem ser imaginárias, como os super-heróis, reafirmam minha discordância veemente e retórica de usos adjetivados, substantivados ou quantificados de resiliência, que colaboram para dividir o mundo entre mais resilientes
e menos resilientes
.
O entusiasmo, a energia e a consonância sintônica de minhas teorias e visão de mundo com o meu novo super orientando revelavam a cada encontro, a cada aula, tudo que ele sabia sobre a importância dos super-heróis e suas vidas no desenvolvimento de crianças, adolescentes e adultos. E eu, por minha vez, numa ótica de orientadora-aprendiz de super-heróis, e inspirada pela filosofia do amado educador Paulo Freire, além de me encantar e me surpreender, compartilhava minhas convicções e ideias sobre o que eu sabia acerca dos processos de risco, proteção e resiliência no desenvolvimento humano. Assim, fomos pouco a pouco amalgamando nossos saberes e experiências para entender os super-heróis como tutores de resiliência
.
Aquele mundo de super-heróis e as vicissitudes de suas jornadas era quase totalmente desconhecido pra mim. Eu nunca havia lido sequer um gibi sobre esses personagens fantasiosos, mas já tinha assistido alguns poucos filmes durante minha juventude. Em contraposição à minha ignorância nesse quesito, a essência dos tais personagens se mostrava impressa na vida do Gelson como tatuagens definitivas e profundamente irremovíveis. Desde sua infância, ele colecionava imagens, objetos, revistas, estatuetas etc., e, para ele, os super-heróis eram/são íntimos que fazem parte de sua família e do seu mundo psicológico.
Mas devo dizer que não foi fácil infiltrar as vidas de super-heróis nos espaços científicos dos campos da Educação e da Psicologia, apesar das evidências da ética moral, dos desafios e dos superpoderes dos personagens. Mesmo quando Gelson apresentava os super-heróis como modelos de comportamento moral, de superação de si mesmos e de solidariedade, percebia-se o desconforto e a desconfiança de alguns de meus pares. Sem dar atenção para essa dimensão e focados em novas descobertas, fomos integrando nossos saberes até chegarmos a um insight que considero uma das grandes descobertas conceituais desta obra: a fase da vida de sofrimentos e adversidades dos super-heróis que precede os seus superpoderes, intitulada fase Pré-Capa
ou Pré-Máscara
. O brilho desta tese foi tão intenso que fomos agraciados com o XXIX Prêmio Jovem Cientista: Inovações para Conservação da Natureza e Transformação Social (CNPq, Banco do Brasil, Fundação Roberto Marinho, Grupo Boticário e Conselho Britânico). Uma parte do prêmio foi o financiamento de uma viagem e visita à Universidade de Oxford para Gelson apresentar os conceitos e resultados da sua tese! Meu orgulho de vê-lo atravessando continentes para falar da força dos super-heróis como promotores de resiliência em ambientes escolares foi proporcional à minha alegria de constatar que era possível dar a devida seriedade e cientificidade ao tema nesse engessado mundo acadêmico.
Com tudo isso, quero reiterar que o Gelson não foi simplesmente meu orientando
no Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade La Salle. Foi e ainda é um grande parceiro de muitas novas elaborações, publicações e inspirações orientadoras e desorientadoras provocadas pelas fantasias super-heroicas e seus superpoderes, que são, comprovadamente, transformadores de vidas de crianças e adolescentes.
Assim, apresento aos leitores um livro inovador que preenche vazios, enfrenta desafios e propõe mudanças estruturais e criativas para os ancestrais espaços educativos de algumas de nossas escolas. Conforme demonstram os conhecimentos do autor desta obra, o ambiente escolar pode ser reinventado e ressignificado de forma a abrir o diálogo franco e sincero com crianças e jovens tão ávidos por novidades e por movimento! O trabalho de Gelson, desenvolvido sob a ótica do conceito de resiliência, é uma construção respeitosa e atenta às possibilidades de transformação e de empoderamento de seres humanos em qualquer etapa de desenvolvimento. Ademais, transpirando vigor, energia, coragem, elasticidade e esperança, é uma obra recomendável para todo e qualquer integrante de organização educativa. É uma leitura que pode auxiliar na compreensão e no enfrentamento mais divertido das complexas situações que o cotidiano do trabalho educativo nos impõe.
À guisa de conclusões, quero renovar minha gratidão por todas as aprendizagens e os momentos compartilhados com o autor deste trabalho superpoderoso! Desejo uma leitura empoderadora e transformadora a todos e todas.
Dr.ª Maria Angela Mattar Yunes
Docente permanente nos Programas de Pós-Graduação em Psicologia Social na Universidade Salgado de Oliveira, Universo, Niterói (RJ) e docente colaboradora no Programa de Pós-Graduação em Educação na Universidade La Salle, UNILASALLE/Canoas (RS).
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
Sumário
INTRODUÇÃO 19
1
BEM VINDO À SUPERAVENTURA: DAS PÁGINAS
DAS HQS À SALA DE AULA 25
1.1 É um pássaro, um avião, é... 25
1.2 Os mitos contemporâneos 26
1.3 A história das críticas à utilização da imagem do
super-herói na educação 29
1.4 As histórias em quadrinhos e seu papel formativo 35
1.5 O super-herói como modelo de inspiração 41
1.5.1 Super-heróis e as adversidades 43
1.6 Risco, proteção e a busca por resultados de resiliência 48
2
SUPER-HERÓIS COMO RECURSOS PARA PROMOÇÃO
DE RESILIÊNCIA EM CRIANÇAS E ADOLESCENTES 51
2.1 Super-heróis, Entretenimento e a Vida Real 52
2.2 Super-heróis, Resiliência e Proteção ao Desenvolvimento
na Infância e Adolescência: uma Relação Possível? 53
2.3 Super-Heróis e o Paralelo com a Vida Real 55
2.4 Fase Pré-Capa/Pré-Máscara dos super-heróis 56
2.5 Enquanto isso, na sala da justiça 62
2.6 Avante, Vingadores 64
3
PERCEPÇÕES E CRENÇAS DE LEITORES DE QUADRINHOS
ACERCA DAS ADVERSIDADES VIVIDAS POR SUPER-HERÓIS 67
3.1 Significados e atribuições de leitores de histórias
de quadrinhos às superaventuras dos super-heróis 67
3.2 O percurso da jornada 69
3.3 Perfil do leitor de superaventura 70
3.4 Super-heróis como fonte de inspiração 71
3.5 Adversidades vividas pelos super-heróis 74
3.6 Visão dos leitores 76
4
ANÁLISES DE INTERVENÇÕES PSICOEDUCACIONAIS POSITIVAS 79
4.1 Super-Heróis na fase Pré Capa/Pré-Máscara como base
de inspiração para intervenções psicoeducacionais positivas 79
4.2 Intervenções com super-heróis em ambientes
educativos e clínicos 81
4.3 Panorama nacional e internacional de intervenções
com super-heróis 82
4.4 O super-herói em sua fase Pré-Capa/Pré-Máscara 87
4.5 Um olhar para Gotham 90
5
INTERVENÇÃO POSITIVA: SEJA O SUPER-HERÓI
DE SUA PRÓPRIA VIDA 93
5.1 Proposta de Intervenção Positiva promotora de resiliência
em ambiente educacional – Seja o Super-Herói
de sua própria vida 93
5.1.1 Intervenções Positivas na área da educação 93
5.2 A jornada da superaventura: os caminhos percorridos
para a criação da intervenção 94
5.2.1 As entrevistas com os líderes de
intervenções mapeadas 95
5.2.2 Projeto Piloto: Criando Roteiros de Vida com foco
na fase Pré-super-heroica 97
5.2.3 Programa de Intervenção "Seja o Super-Herói de
sua própria vida" 99
5.3 Os Encontros, análise e discussão 106
5.4 Síntese da análise dos resultados da intervenção 123
6
PARA O ALTO E AVANTE 125
REFERÊNCIAS 133
ANEXO 1 145
ÍNDICE REMISSIVO 155
INTRODUÇÃO
Pode até parecer estranho que alguém dedique anos de sua vida a pesquisar e produzir textos sobre as histórias em quadrinhos de super-heróis. Poderia ser perda de tempo se considerássemos que tais histórias se restringem à função de entretenimento do grande público e, principalmente, do público infanto-juvenil. Mas não é bem assim, nem tampouco poderia parecer assim, pelo menos se for levado em conta tudo que já se investiu na difusão dessas histórias, seja na sua forma impressa, clássica, seja