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O BRAVO SOLDADO SVJEK
O BRAVO SOLDADO SVJEK
O BRAVO SOLDADO SVJEK
E-book296 páginas6 horas

O BRAVO SOLDADO SVJEK

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Sobre este e-book

Jaroslav Hašek foi um escritor, humorista, satírico, jornalista, boêmio e anarquista checo que. além disso tudo, participou da 1ª Grande Guerra lutando como soldado pelo exército Austro-Húngaro, inicialmente, e depois pelo lado do exército vermelho, desta vez como escritor de propaganda revolucionário. A vivência de Hašek no ambiente militar lhe propiciou "munição" para a escrita de sua obra-prima: O Bravo Soldado Svejk, uma coletânea não terminada de incidentes cômicos de um soldado na Primeira Guerra Mundial e uma sátira sobre a inépcia das autoridades. O personagem Švejk é a própria ambiguidade, conciliando tragédia e comédia em uma só pessoa. O romance foi publicado em sessenta idiomas, tornando-se o mais traduzido na literatura checa. Aventuras do Bravo Soldado Svejek também faz parte da famosa coletânea: 1001 livros para ler antes de morrer.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento16 de jan. de 2021
ISBN9786587921280
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    O BRAVO SOLDADO SVJEK - Jaroslav Hasek

    cover.jpg

    Jaroslav Hasek

    O BRAVO SOLDADO SVEJK

    Título original:

    Osudy dobrého vojáka Švejka za světové války

    1a edição

    img1.jpg

    Isbn: 9786587921280

    LeBooks.com.br

    A LeBooks Editora publica obras clássicas que estejam em domínio público. Não obstante, todos os esforços são feitos para creditar devidamente eventuais detentores de direitos morais sobre tais obras. Eventuais omissões de crédito e copyright não são intencionais e serão devidamente solucionadas, bastando que seus titulares entrem em contato conosco.

    PREFÁCIO

    Prezado Leitor

    Jaroslav Hašek (Praga, 30 de abril de 1883 – Lipnice, 3 de janeiro de 1923) foi um escritor, humorista, satírico, jornalista, boêmio e anarquista checo que. além disso tudo, participou da 1ª Grande Guerra lutando como soldado pelo exército Austro-Húngaro, inicialmente e depois pelo lado do exército vermelho, desta vez como escritor de propaganda revolucionário.

    A vivência de Hašek no ambiente militar lhe propiciou munição para a escrita de sua obra-prima: O Bravo Soldado Svejk, uma coletânea não terminada de incidentes cômicos de um soldado na Primeira Guerra Mundial e uma sátira sobre a inépcia das autoridades.

    O personagem Švejk é a própria ambiguidade, conciliando tragédia e comédia em uma só pessoa. Ele entrou para a história da literatura por sua picardia, era o espírito da nova república tcheca que emergia das cinzas da Primeira Guerra Mundial.

    O romance foi traduzido em sessenta idiomas, tornando-se o romance mais traduzido na literatura checa. Também faz parte da famosa coletânea: 1001 livros para ler antes de morrer.

    Uma excelente leitura

    LeBooks Editora

    SUMÁRIO

    SOBRE O AUTOR E OBRA

    Prólogo

    I - COMO O BRAVO SOLDADO ŠVEJK INTERVEIO NA GRANDE GUERRA

    II - NA CHEFATURA DE POLÍCIA

    III - ŠVEJK DIANTE DOS MÉDICOS LEGISTAS

    IV - COMO ŠVEJK FOI POSTO À PORTA DO ASILO DE ALIENADOS

    V - ŠVEJK NA DELEGACIA DE POLÍCIA DA RUA SALMOVA

    VI - ŠVEJK RESTITUÍDO À LIBERDADE

    VII - ŠVEJK VAI À GUERRA

    VIII - COMO ŠVEJK FOI REDUZIDO AO TRISTE ESTADO DE SIMULADOR

    IX - ŠVEJK NA PRISÃO DA PRAÇA DE PRAGA

    X - COMO ŠVEJK SE TORNOU ORDENANÇA DO CAPELÃO MILITAR

    XI - ŠVEJK AJUDA A MISSA CAMPAL

    XII - CONTROVÉRSIA RELIGIOSA

    XIII - ŠVEJK CONDUZ OS ÚLTIMOS SACRAMENTOS

    XIV - ŠVEJK, ORDENANÇA DO TENENTE LUCAS

    XV - CATÁSTROFE

    Notas e Referências

    APRESENTAÇÃO

    Sobre o autor e obra

    img2.jpg

    Jaroslav Hašek (Praga, 30 de abril de 1883 – Lipnice, 3 de janeiro de 1923) foi um escritor, humorista, satírico, jornalista, boêmio e anarquista checo. É mais conhecido pelo seu romance O Bravo Soldado Švejk (em checo, Osudy dobrého vojáka Švejka za světové války), uma coletânea não terminada de incidentes burlescos de um soldado na Primeira Guerra Mundial e uma sátira sobre a inépcia das figuras de autoridade.

    A obra foi traduzida em sessenta idiomas, tornando-se o romances mais traduzido da literatura checa.

    Juventude

    Hašek nasceu em Praga, Boêmia (na altura pertencente ao império Austro-Húngaro, atualmente parte da República Checa), filho do professor de matemática Josef Hašek e da sua esposa Kateřina. A pobreza forçou a família, com três filhos – o outro filho Bohuslav, três anos mais novo que Hašek, e uma prima órfã Maria – a mudar-se regularmente, mais de quinze vezes durante a sua infância.

    Hašek nunca conheceu uma verdadeira casa e este desenraizamento influenciou claramente a sua vida com sede de viagens. Quando tinha 13 anos, o pai de Hašek morreu de alcoolismo e a sua mãe não conseguiu educá-lo com firmeza. O adolescente desistiu da escola secundária aos 15 anos para se tornar farmacêutico, mas acabou por formar-se em gestão. Trabalhou brevemente como bancário em 1903, antes de embarcar numa carreira de escritor e jornalista freelancer. No final de 1910, foi também vendedor de cães (uma profissão que atribuiu ao seu herói Švejk e a partir da qual se basearam algumas das anedotas improváveis ditas por Švejk).

    Ativismo político

    Em 1906, juntou-se ao movimento anarquista, tendo participado, enquanto estudante, nas manifestações de 1897 contra a Alemanha, em Praga. Deu palestras regulares a grupos de trabalhadores proletários e, em 1907, tornou-se o editor do jornal anarquista Komuna. Enquanto anarquista no Império Austro-Húngaro, os seus movimentos foram monitorizados rigorosamente pela polícia, tendo sido preso e encarcerado regularmente. As acusações contra si incluíam numerosos casos de vandalismo e, pelo menos, um caso de agressão a um agente policial, pelo qual passou um mês na prisão. Os extremos cometidos pela polícia Austro-húngara na detenção de suspeitos de subversão política foram satirizados nos capítulos iniciais de O Bravo Soldado Svejk.

    Casamento

    Hašek conheceu Jarmila Mayerová em 1907 e apaixonou-se por ela. Contudo, devido ao seu estilo de vida boêmio, os pais de Jarmila o consideraram inadequado para casar-se com a sua filha. Consequentemente, Hašek tentou afastar-se das suas políticas radicais e obter um emprego estável como escritor. Quando foi preso por profanar uma bandeira em Praga, os pais de Mayerová levaram-na para o campo, esperando que isso terminasse a sua relação, o que não ocorreu, mas contribuiu para que Hašek renovasse o seu foco na escrita. Em 1909, já tinha 64 contos publicados, mais do que dobro do que tinha no ano anterior, e foi também nomeado editor do jornal Svět zvířat (O Mundo Animal). Contudo, este emprego não durou muito tempo, tendo sido despedido pouco depois, por publicar artigos sobre animais imaginários que tinha sonhado (e que serviram para alimentar a obra Švejk).

    A 23 de maio de 1910, casou-se com Jarmila. Apesar do longo namoro, o casamento foi infeliz e durou pouco mais de um ano. Com o início da Primeira Guerra Mundial, Hašek viveu periodicamente com o cartunista Josef Lada, que ilustrou mais tarde O bravo soldado Švejk.

    No Exército Austro-Húngaro

    Em dezembro de 1914, Hašek foi mobilizado e juntou-se ao exército austro-húngaro a 7 de fevereiro de 1915. A sua unidade foi o batalhão de substituição do 91.º Regimento de Infantaria, localizado em České Budějovice (a partir de 1 de junho em Királyhida). Hašek inscreveu-se imediatamente na escola de oficiais de reserva, mas a 6 de março já estava hospitalizado. Os relatórios médicos revelam que sofria de problemas cardíacos e reumatismo. Em resultado, foi dispensado do serviço regular do exército, mas aí permaneceu, com tarefas mais ligeiras. Participou na batalha de Sokal no final de julho, recebendo após a batalha uma medalha de prata pela bravura. Hašek não combateu durante muito tempo, sendo capturado pelos Russos a 24 de setembro de 1915.

    Inúmeros detalhes e fragmentos das suas experiências no 91.º regimento de Hašek foram incluídos no romance O Bravo Soldado Švejk. Muitas das personagens baseiam-se em pessoas que conheceu: Lukáš, Vaněk, Biegler, Ságner, Schröder, Wenzl, Adamička, Ibl. Grande parte da rota descrita no romance corresponde à própria jornada da batalha de 12 de março. O seu transporte ferroviário começou em Királyhida a 30 de junho e terminou em Sambir a 4 de julho. A viagem continuou a pé e, ao atingir a frente de batalha, a 11 de julho, Hašek foi atribuído à 11.ª companhia, comandada pelo tenente Rudolf Lukas. O seu comandante de batalhão era o tenente Vinzenz Sagner. Também serviu como mensageiro da companhia, outro paralelismo com Švejk.

    Na Rússia

    No campo em Totskoye, contraiu tifo, embora mais tarde tenha tido uma vida confortável. Em junho de 1916, foi recrutado enquanto voluntário para integrar a Brigada Checoslovaca, uma unidade de, maioritariamente, voluntários checos, que estavam lutando pelo Império Austro-Húngaro. Esta unidade foi mais tarde conhecida como Legião Checoslovaca. Trabalhou respectivamente como escriturário, jornalista, soldado e agente de recrutamento até fevereiro de 1918.

    Em março de 1918, a Legião Checoslovaca embarcou numa jornada para se juntar à Frente Ocidental através de Vladivostok, que controlava a ferrovia Transiberiana e muitas das maiores cidades na Sibéria. Hašek discordou desta decisão e decidiu sair da legião em favor dos revolucionários checos e russos. Em outubro de 1918, juntou-se ao Exército Vermelho, trabalhando principalmente como recrutador e escritor de propaganda. Em 1920, casou-se novamente, apesar de ainda estar casado com Jarmila.

    Últimos anos

    Acabou por regressar a Praga em dezembro de 1920. Contudo, porque não era uma figura popular em alguns meios, tendo sido acusado de traição e bigamia, teve dificuldades em encontrar uma editora para as suas obras. Antes da guerra, em 1912, publicara o livro O valente soldado Chvéïk e outras histórias estranhas (Dobrý voják Švejk a jiné podivné historky), onde a figura de Švejk apareceu pela primeira vez; mas foi apenas depois da guerra, no seu famoso romance, que Švejk se tornou uma espécie de humorista alegre que brincava com a guerra, como se fosse uma briga de taberna.

    Nesta altura, Hašek ficou gravemente doente e perigosamente obeso. Já não escrevia, mas ditava os capítulos de Švejk no seu quarto, na aldeia de Lipnice, onde morreu a 3 de janeiro de 1923 de insuficiência cardíaca. Hašek publicou em vida cerca de 1500 contos.

    Prólogo

    Uma grande época exige grandes homens. Há heróis desconhecidos, obscuros, que não conquistaram a glória de Napoleão e não entraram na História como ele. E, no entanto, seu caráter é tão rico e tão complicado que faria sombra ao próprio Alexandre, o Grande. Nas ruas de Praga pode-se hoje encontrar um homem desalinhado, que ignora o importante papel que desempenhou na história desta grande época nova. Segue pacificamente o seu caminho, sem incomodar ninguém e sem ser confundido pelos jornalistas, que não lhe pedem nenhuma entrevista. Se alguém lhe perguntar pelo seu nome, ele responderá com o ar mais tranquilo e natural destes mundos Eu sou Švejk...

    E este homem, taciturno e mal vestido, não é mais nem menos que o bravo soldado Švejk, guerreiro heroico e valente, cujo nome, sob a Áustria, todos os cidadãos do reino da Boêmia traziam na boca, e cuja glória, não há dúvida, não mais se apagará na nova República tcheco-eslovaca.

    Gosto muitíssimo desse bravo soldado Švejk, e, contando as suas aventuras durante a grande guerra, estou convencido de que todos simpatizarão com este herói desconhecido e modesto. À semelhança do idiota Erostrato, ele não pôs fogo no templo de Diana para ter seu nome nos jornais e nos livros de leitura da primeira infância.

    E isto já é muito belo, creio!

    O Autor.

    I - COMO O BRAVO SOLDADO ŠVEJK INTERVEIO NA GRANDE GUERRA

    — Meu patrão — declarou a locadora de M. Švejk, que após ter sido declarado completamente idiota pela junta médica, renunciara ao serviço militar e vivia agora da venda de cães mestiços, monstros imundos, para os quais ele fabricava pedigrees de circunstância. Nas suas folgas, cuidava também do reumatismo, e, precisamente no instante em que a locadora o interpelou, estava friccionando os joelhos com bálsamo de opodeldoch.

    — E então? — perguntou ele.

    — Pois bem! o nosso Fernando... não existe mais!

    — De que Fernando está falando, Sra. Muller? — perguntou Švejk, sem interromper sua fricção. — Eu conheço dois. O Fernando, que é empregado do farmacêutico Proucha e que bebeu uma vez, por engano, uma garrafa de loção para cabelos, e o Fernando Kokoschka, o que recolhe os excrementos dos cães. Se é um desses dois, não se trata de grande perda.

    — Mas, meu patrão, é o Arquiduque Fernando, o de Konopiste, o grande vigarista, compreendeu?

    — Santo Deus! que novidade é esta? — gritou Švejk. — E onde aconteceu isto ao Arquiduque?

    — Em Sarajevo. Tiros de revólver. Tinha ido ali de automóvel com a Arquiduquesa.

    — Isso, por exemplo! Bem sim, de automóvel. Está vendo só, Sra. Muller, compra-se um carro e não se pensa no fim... Uma derrapagem, isso pode sempre acabar mal, mesmo para um senhor como o Arquiduque... E sobretudo em Sarajevo! É em Bósnia, a senhora sabe, Sra. Muller, só há turcos que são capazes de um golpe sujo como esse. Não deveriam tê-los levado à Bósnia e à Herzogovina, eis tudo. Agora eles se vingam. Então, nosso bom Arquiduque foi para o Céu, Sra. Muller? Essa foi de amargar, palavra! E ele entregou sua alma serenamente, ou sofreu muito em seu último momento?

    — Foi liquidado rapidamente, patrão. Imagine, um revólver não é um brinquedo de criança. Há pouco tempo, entre nós, em Nusle, um senhor brincou com um revólver e matou toda a família, inclusive o porteiro que subiu ao terceiro andar para ver o que se passava.

    — Há revólveres, Sra. Muller, que não disparam, mesmo que se queira atirar de qualquer maneira como um louco. E há muitos desse sistema. Só que, a senhora compreende, para servir um arquiduque não se escolhe bugiganga, e eu estou quase certo de que o homem que fez o disparo se vestiu antes chiquemente. Um atentado como este não é um caso comum, não é como quando um malandro atira não guarda. E, além disso, arquiduques são tipos difíceis, não chega a eles quem quer, não é verdade? Não se pode apresentar mal vestido diante de um grande senhor como este, não adiantam subterfúgios. É preciso pôr uma cartola, sem o que se é preso, e, por Deus, vã aprender boas maneiras na caserna!

    — Parece que eram vários.

    — É claro, Sra. Muller — respondeu Švejk, terminando a massagem no joelho. — Uma suposição: a senhora quer matar o Arquiduque ou o Imperador, pois bem! A primeira coisa a fazer é pedir conselho a alguém. Cada cabeça, cada sentença. Este aconselha uma coisa, aquele outra, e então a coisa sai bem, como se canta no nosso hino nacional.

    –– O essencial é escolher o bom momento, quando o tal personagem passa diante da gente. E mais, deve lembrar-se ainda do tal M. Luccheni, que feriu a golpes de estoque a nossa falecida Imperatriz Elizabeth. Este ainda fiz melhor: passeava tranquilamente ao lado dela e, de repente, a coisa estava feita. É preciso não confiar demasiado nas pessoas, Sra. Muller. Desde então as imperatrizes não podem mais passear. E não acabou, há ainda muitos outros personagens que esperam sua vez. A senhora verá, Sra. Muller, que se cuidem o czar e a czarina, pode ocorrer-lhes o mesmo, já que a série começou por seu tio, nosso Imperador, pode passar em breve por ele... Ele tem muitos inimigos, a senhora sabe, o nosso velho pai, muito mais do que esse Fernando. É como dizia no outro dia um senhor no restaurante!

    –– Tempo virá em que os monarcas esticarão as canelas um após outro, e nem o Procurador-Geral poderá fazer nada. Por azar, este senhor de que estou falando não tinha dinheiro para pagar a conta, e o proprietário teve de chamar um guarda. Ao receber esta decisão, o senhor deu uma bofetada no patrão e duas no milico, e foi levado no tintureiro para onde a senhora sabe. É verdade, Sra. Muller, acontece cada uma nestes tempos! E a Áustria só tem a perder. Quando eu prestava serviço, um soldado matou um capitão. Ora, o pobre-diabo carrega o seu fuzil e vai ao escritório. Ali o mandaram dar o fora, mas ele insiste que quer falar com o capitão. Finalmente, o capitão sai do gabinete e aplica ao camarada quatro dias de prisão. A partir daí as coisas andaram sozinhas: o camarada apontou o fuzil e meteu uma bala bem no coração do capitão. Ela saiu pelas costas e ainda fez estragos no escritório. Arrebentou uma garrafa de tinta e manchou a papelada.

    — E o que aconteceu a esse soldado? — perguntou a Sra. Muller, enquanto Švejk se vestia.

    — Foi enforcado com um par de cordas — respondeu Švejk escovando seu chapéu-coco. — Com cordas que não eram dele, por favor! Ele teve de pedi-las emprestadas ao seu guarda-chefe, a pretexto de que as calças lhe caíam. Bolas! por que esperar que o conselho de guerra condene à morte, não? A senhora compreende, Sra., Muller, que, em semelhantes circunstâncias, e gente perde a cabeça. O guarda-chefe foi rebaixado e pegou seis meses de cadeia. Mas não apodreceu na prisão. Deu o fora para a Suíça, onde conseguiu um lugar de predicante de não sei mais que igreja. As pessoas honestas são raras hoje em dia, a senhora sabe, Sra. Muller. A gente se engana facilmente. Decerto era o caso do Arquiduque Fernando. Ele vê um sujeito que lhe grita Glória!, e imagina tratar-se de um tipo como convém. Mas, já se viu, as aparências enganam... Ele recebeu um tiro só, ou vários balaços?

    — Está escrito nos jornais, meu patrão, que o Arquiduque foi crivado de balas como uma escumadeira. O assassino disparou todas as suas balas.

    — Nossa! É preciso ser rápido nesses negócios, Sr. Muller. A rapidez é tudo. Eu, em semelhante caso, compraria um Browning. Este não tem pinta de nada, é pequeno como um bibelô, mas com ele a gente pode matar em dois minutos uma vintena de arquiduques, sejam eles gordos ou magros. Entre nós, Sra. Muller, a gente tem sempre mais chance de acertar em um arquiduque gordo do que em um arquiduque magro. Foi o que se viu em Portugal. À senhora se lembra da história do rei furado de balas? Este também era do gênero do Arquiduque, gordo como todos. Diga então, Sra. Muller, vou agora para o meu restaurante Ao Cálice. Se alguém vier procurar pelo rateiro — já recebi uma pequena quantia por conta — a senhora diga, por favor, que ele se encontra no canil do campo, que eu acabei de lhe cortar as orelhas e que ele não estará em condições de viajar enquanto elas não cicatrizarem, pois poderia resfriar-se. A chave, a senhora entregarão à porteira.

    Em Ao Cálice só havia um freguês. Era Bretschneider, um agente à paisana. O proprietário, M. Palivec, lavava os pratos, e Bretschneider tentava em vão entabular conversa.

    Pavilec era célebre pela aspereza de sua linguagem, e não sabia abrir a boca sem dizer cu ou merda. Mas era lido e aconselhava a quem o quisesse entender que relesse o que escrevera a respeito de Vítor Hugo na passagem em que citou a resposta da velha guarda de Napoleão aos ingleses, na batalha de Waterloo.

    — Temos um verão soberbo — começou Bretschneider, desejoso de fazer falar o patrão.

    — Pouco menos que merda respondeu Palivec, arrumando os pratos sobre a mesa.

    — Fizeram tolices nesse sagrado Sarajevo! — aventurou Bretschneider com uma remota esperança.

    — Em que Sarajevo? — perguntou Palivec. — O botequim de Nusle? Isso não me impressiona, ali se briga diariamente. Todo o mundo sabe o que é Nusle...

    — Mas eu lhe falo de Sarajevo, em Bósnia, patrão. Acabam de assassinar o Arquiduque Fernando. Que lhe parece?

    — Em coisas como essa eu não me meto. E mando à merda quem me vier chatear com semelhantes besteiras — respondeu Palivec acendendo o cachimbo. — Ocupar-se de assuntos como este nos dias de hoje, é de lascar! Eu sou comerciante, não sou? e, quando alguém chega e me pede uma cerveja, estou a seu serviço. Mas pouco importa Sarajevo, a política ou o finado Arquiduque; nada disso é da nossa conta. Não rende mais do que uma estada em Pankrac.

    Desiludido de seu objetivo, Bretschneider calou-se e circunvagou os olhos pela sala vazia.

    — Há tempos, você tinha aqui um retrato do nosso Imperador — repisou ele, após um momento de silêncio. — Estava pendurado exatamente ali, onde se acha agora o espelho.

    — É certo, você tem razão — respondeu o patrão. — Mas, como as moscas defecavam nele, mandei tirá-lo e levá-lo para o celeiro. Você compreende: vem muita gente aqui, e poderia ocorrer facilmente que alguém fizesse uma reflexão descortês, e isto me traria aporrinhações. E eu tenho lá necessidade disso?

    — Não há dúvida, não deve ter sido engraçado este Sarajevo funesto, não é, patrão?

    A essa pergunta, que lhe pareceu azeda, Palivec respondeu evasivamente:

    — Naquela época fazia em Bósnia e Herzegovina um calor formidável. Quando eu ali prestava o serviço militar, todos os dias punham gelo na cabeça do nosso coronel.

    — Em que regimento o senhor serviu, patrão?

    — Não encho a cabeça com semelhantes bobagens. Jamais me ocupei com tais bagatelas, e, além do mais, não sou curioso a este ponto — respondeu Palivec. — É demasiada ignorância.

    O agente calou-se. Seu olhar entristeceu-se e só se iluminou com a chegada de M. Švejk, que, abrindo a porta, pediu logo uma negra.

    — Em Viena também se está de luto hoje — acrescentou.

    Os olhos de Bretschneider iluminaram-se de esperança.

    — Em Konopiste, há uma dezena de bandeiras negras disse secamente.

    — Deveria haver uma dúzia observou Švejk depois de beber a sua cerveja.

    — Por que justamente doze? — perguntou Bretschneider.

    — Para que faça um número redondo: uma dúzia, assim se conta melhor. Além disso, é sempre mais barato quando a gente compra por dúzias. — Replicou Švejk.

    Fez-se um longo silêncio, que Švejk interrompeu suspirando:

    — Ei-lo diante da justiça de Deus: que Deus o receba em sua glória. Não viveu bastante para ser imperador. Quando eu estava no regimento, um general também caiu do cavalo e morreu docemente. Tentou-se ajudá-lo a montar outra vez, mas logo se viu que ele estava mortinho da silva. Ele também chegaria em breve a marechal de campo. Isto aconteceu em uma revista. Estas revistas militares nunca dão nada que preste. Pois é o que lhe digo, em Sarajevo foi também uma revista a causa de tudo. Eu me lembro que em uma revista destas me faltavam, por acaso, uns vinte botões no uniforme. Ah! me engaiolaram quinze dias em um cubículo, e durante dois dias eu me retorci como um Lázaro, amarrado como um salsichão, Mas a disciplina na caserna, eu não conheço mais que isso, é necessária, veja bem, Nosso Coronel Makovec nos dizia sempre: "A disciplina, cambada de estúpidos, é necessária, visto que, sem ela, vocês trepariam nas árvores como macacos,

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