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A Banalidade do Mal
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A Banalidade do Mal
E-book140 páginas1 hora

A Banalidade do Mal

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Sobre este e-book

O objetivo deste livro não é mostrar apenas o Auschwitz histórico, mas o Auschwitz que se enraizou no ser humano: a incapacidade de distinguir entre o bem e o mal; a teimosia em reafirmar a própria identidade como unicamente humana e a impossibilidade de pensar a alteridade, de tal forma que, ainda hoje, persiste como um legado, do qual nosso mundo é executor e herdeiro. Auschwitz é, portanto, o ponto de partida, e não o ponto final.

É um estudo que demonstra o modelo anti-homem que surge da antropologia nazista, contrário ao modelo de homem revelado pela antropologia cristã.

Publicação parcial da tese de doutorado da autora.

IdiomaPortuguês
EditoraBadPress
Data de lançamento10 de jun. de 2021
ISBN9781667403700
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    A Banalidade do Mal - Ana Rubio-Serrano

    FACULDADE DE TEOLOGIA DA CATALUNHA

    INSTITUTO DE TEOLOGIA FUNDAMENTAL

    Ana Rubio-Serrano

    A BANALIDADE DO MAL

    A CONTRA-IMAGEM DE DEUS NA LÓGICA NAZISTA

    PUBLICAÇÃO PARCIAL DA TESE DE DOUTORADO

    Apresentada para a obtenção do título de Doutor em Teologia

    Orientador da tese: Dr. José Sols Lucia

    Membros da Banca Examinadora: Dr. J. Ignacio González Faus e Dr. Xavier Morlans Molina

    O Secretário da Faculdade de Teologia da Catalunha CERTIFICA:

    Que Ana Rubio-Serrano defendeu e foi aprovada com grau de excelência a tese A banalidade do mal. A contra-imagem de Deus na lógica nazista [La banalidad del mal. La contraimagen de Dios en la lógica nazi], na Faculdade de Teologia da Catalunha, perante a banca formada pelo orientador da tese, Dr. José Sols Lucia e pelos examinadores, Dr. J. Ignacio González Faus e Dr. Xavier Morlans Molina, no dia 29 de setembro de 2005.

    Assinado: Sr. Vicenç Bosch, Secretário da FTC.

    ––––––––

    Website da autora:

    https://anarubioserrano.com

    ––––––––

    Blog sobre o nazismo (ES/EN):

    https://nazismandholocaust.blogspot.com

    ÍNDICE

    ABREVIATURAS

    AUSCHWITZ: O REINO DO HOMEM ANTICRIAÇÃO

    A ANTROPOLOGIA DO TOTALITARISMO NAZISTA CRITICADA A PARTIR DE UMA FILOSOFIA PERSONALISTA

    A despersonalização contrária ao «rosto»

    O sofrimento do outro como (in)útil

    O «mulçumano», exponente da violência extrema e (in)útil

    O «eu» diante do sofrimento (in)útil

    A negação da vida, a negação da morte

    CRÍTICA DA ANTROPOLOGIA NEOPAGÃ NAZISTA À LUZ DA ANTROPOLOGIA TEOLÓGICA CRISTÃ

    Mal, pecado, reconciliação de vítimas-algozes

    Sobre a origem do mal: teologia cristã das vítimas contra o dualismo ontológico nazista

    Pecado pessoal e pecado estrutural no sistema nazista

    Solidariedade compassiva e reconciliação vítimas-algozes

    O homem fazedor, um produtor cosmológico.

    A ocultação de Deus, liberdade do homem-liberdade divina.

    BIBLIOGRAFIA

    ALEMANHA E ADOLF HITLER (1889-1945). Datas relevantes

    NOTAS

    ABREVIATURAS

    ––––––––

    Documentos dos Julgamentos de Nuremberg[1]

    ––––––––

    IMT

    International Military Tribunal. Trial of the Major War Criminals before the Internacional Military Tribunal.[2]

    NMT

    Trials of War Criminals before the Nuernberg Military Tribunals.[3]

    NCA

    Nazi Conspiracy and Agression.[4]

    NO

    Nuremberg Organization Documents (NO- series).[5]

    Outros documentos

    ÄfB

    Ärzteblatt für Berlin.

    AVA

    Allgemeines Verwaltungsarchiv, Wien.

    BAK

    Bundesarchiv Koblenz.

    BDC

    Berlin Dokument Center.

    IfZ

    Institut für Zeitgeschichte, München.

    JAMA

    Journal of the American Medical Association.

    LA Berlin

    Landesarchiv Berlin.

    StA

    Staatsarchiv.

    StAH

    Staatsantwaltschaft bei dem Landgericht Hamburg.

    ZStL

    Zentrale Stelle der Landesjustizverwaltungen zur Aufklärung national-sozialistische Verbrechen in Ludwigsburg.

    AUSCHWITZ: O REINO DO HOMEM ANTICRIAÇÃO

    ––––––––

    Este livro não pretende mostrar o Auschwitz histórico, mas sim o Auschwitz[6] que transformou o ser humano em um homem cuja única identidade reside em ser um «homem-massa», em um homem sem alteridade que nega toda alteridade com um «rosto».[7]

    Sem dúvida, todos nós estamos cientes dos horrores causados pelo nazismo, afinal, toda aquela barbárie se baseava numa pseudofilosofia e numa contrateologia que compararemos a seguir; em primeiro lugar, com uma visão ética personalista e humanista e, em segundo lugar, com a visão de pessoa que surge da revelação cristã e que, em última instância, o Nacional-Socialismo procurou afogar, abortar, aniquilar e erradicar.

    Auschwitz é o Reino[8] daquele homem anticriação que trabalhou para o Führer nos campos de extermínio. E é a partir desse homem anticriação, dessa condição desumana, que o ser humano deve repensar. É indiscutível que Auschwitz atingiu um grau de maldade que nenhum outro genocídio jamais alcançou por causa de sua dimensão destrutiva; mas não pelo número de vítimas, mas pelo aniquilamento sistemático, legal e religiosamente justificado levado a cabo contra a vida humana pelo próprio Estado. Isso deu luz verde para a erradicação de povos inteiros, cujas pegadas tiveram que ser apagadas de sua visão de mundo. Às vítimas foram negadas a morte e a lembrança: elas eram apenas «fragmentos de madeira» prontas para serem incineradas. Fábricas de morte foram construídas onde os prisioneiros foram furtados de sua humanidade a ponto de transformar muitos em «muçulmanos», isto é, em «cadáveres vivos», o estágio pré-final da desumanização. O homem anticriação de Auschwitz detesta o ser humano porque ele é diversidade (criatividade, fraqueza, diferente em identidade: natalidade),[9] e ele vê na alteridade o inimigo que impede o advento de seu Reino, a saber, a prática da redução do outro ao Mesmo, ou seja, exercer a soberania do «eu» transferida para a esfera político-existencial onde as vítimas deviam se converter, e se converteram, em uma massa torturada e pronta para eliminar, e os algozes, em uma massa torturadora e dispensável. Uma vez submersos ambos na mais absoluta «solidão», isto é, na renúncia à Existência e ao «Ser-si-mesmo», seriam e, de fato, foram incapazes ver a alteridade tanto do «outro» humano, como do «Outro» transcendente, invisível, divino. Ou seja, o reconhecimento do outro, externo a si mesmo, como ser individualmente diferente e excepcional, sem que uma alteridade fique reduzida à outra. Diferente porque cada pessoa é única; e excepcional porque cada pessoa é uma meta e uma origem, ou seja, uma lógica de relações, e não de soberania ou escravidão.

    A ANTROPOLOGIA DO TOTALITARISMO NAZISTA CRITICADA A PARTIR DE UMA FILOSOFIA PERSONALISTA

    A despersonalização contrária ao «rosto»

    Sim, para o nazismo, com Hitler à frente, o «outro» (o diferente ao Mesmo —o Mesmo considerado como coluna vertebral do seu Reino) é a debilidade, a incapacidade que corrói a humanidade, a encarnação da própria desumanidade que restringe toda a liberdade de ação e progresso no homem, o inimigo que se deve destruir; para Levinas, o «outro» é precisamente a essência do humano. Encontramos o humano na resposta ao chamado do outro que reivindica nossa preocupação por ele, nossa responsabilidade. Não é a autonomia do sujeito, então, que define o homem como ser humano, capaz e livre, mas a heteronomia. A responsabilidade antecede, assim, à liberdade.[10] O «eu» se converte em «refém do outro», na expressão de Levinas, ou seja, o outro no encontro se manifesta como o limite de si mesmo. Além disso, «no âmbito interpessoal, o eu e o você se constituem limitando-se mutuamente, contradizendo-se, afirmando sua alteridade mútua».[11]

    No caso do nazismo, a heteronomia foi abolida por ser considerada um perigo para a formação da nova raça ariana que deve realizar o estabelecimento de um novo Reich milenar, uma vez que colocar o outro antes do «eu» não permite a criação de um totalitarismo absoluto, niilista e concentrador. Heteronomia é abertura, aceitação, relacionamento interpessoal, diálogo e, acima de tudo, compromisso; mas a autonomia também foi varrida no campo da liberdade subjetiva. O «eu» não pertence mais a cada indivíduo, mas ao Führer. O totalitarismo nazista supõe que a autoridade do Führer, por meio de seus colaboradores, seus seguidores e do Partido, se estende a todas as esferas da vida pública e privada:

    Ele (Hitler) molda a vontade coletiva do povo de acordo com a sua própria vontade e usufrui da unidade política e de todo o povo em oposição aos interesses individuais. O Führer reúne em si mesmo toda a autoridade soberana do Reich; toda autoridade pública do estado e do movimento deriva da autoridade do Führer [...] O estado não detém a autoridade política como uma unidade impessoal, mas a recebe do Führer como o executor da vontade nacional. A autoridade do Führer é completa e abrange tudo; esta reúne em si mesma todos os meios de liderança política; estende-se a todos os campos da vida nacional; abrange o povo inteiro, que é obrigado a ser leal e a obedecer ao Führer.[12]

    Assim, a autonomia conferida ao Terceiro Reich é apenas uma sombra que foi coisificada. A nova autonomia e a falta de heteronomia levam inevitavelmente à despersonalização do indivíduo.

    Enquanto para Bruno Bettelheim «o objetivo do sistema nazista era a despersonalização»,[13] para Tzvetan Todorov, a despersonalização é um «meio para transformar os indivíduos em ingredientes de um projeto que os transcendia».[14] Para nós, a despersonalização é, efetivamente, um meio que tem como fins intermediários, primeiro, o aniquilamento do ser humano (a pessoa é reduzida à última expressão até que seja reduzida a nada); e segundo, a conquista do mundo (o advento do Terceiro Reich). Assim, ambos os fins intermediários devem levar a um fim último: a «conquista» do homem; a nova era em que o homem anticriação é o único ator protagonista.

    É, sem dúvida, a despersonalização dos indivíduos, especialmente nos Läger (campos de concentração, lugares onde se vivencia o Reino como uma experiência que, uma vez demonstrado o seu sucesso, deve ser transferido para toda a sociedade) onde o mal totalitário ganha mais força e se torna mais aparente. As vítimas foram a evidência mais óbvia. Os prisioneiros não tinham rosto: «Raramente eu os via como indivíduos. Sempre foram uma grande massa», diz F. Stangl, comandante de Sobibor e Treblinka.[15] O ser humano fica, assim, reduzido a uma categoria, perdendo a sua condição de se revelar, de se manifestar ao «eu», em suma e nas palavras de Lévinas, de «epifania do rosto». Por isso, nos campos de concentração e extermínio, se evitava que os algozes ficassem frente a frente com

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