Cúria Diocesana: Gestão Organizacional
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Cúria Diocesana - Dom Edson Oriolo
APRESENTAÇÃO
Em nossos dias, a administração diocesana vem se tornando cada vez mais exigente e complexa. A legislação brasileira, em matéria trabalhista (aí incluídas as questões de assédio moral), contábil, fiscal, patrimonial (aí incluídos os bens culturais da Igreja), o marco regulatório do terceiro setor, a nova Lei Geral de Proteção de Dados, as exigências da proteção e defesa de vulneráveis, a necessidade de uma saudável gestão de pessoas, tudo isso representa um grande desafio para o bispo ou administrador diocesano, que dificilmente poderá ser superado sem uma boa equipe que o auxilie. Quanto mais um bispo for obrigado a conduzir sozinho, ou com um número muito exíguo de peritos a seu dispor – e isso não é raro em tantas dioceses pelo Brasil afora, tão carentes dos necessários recursos humanos e materiais para o cumprimento de sua missão –, menos tempo ele disporá para ser um verdadeiro pastor no meio de seu povo.
A tudo isso se acrescentam as exigências próprias de uma ação pastoral orgânica, planejada, eficiente e eficaz. Também nesse campo, faz-se necessária uma adequada e permanente formação, não só dos agentes leigos e leigas, mas dos próprios ministros ordenados. A grande quantidade de documentos, orientações, reflexões produzidos pela Igreja em todos os níveis (Santa Sé, CNBB, CELAM, o próprio bispo diocesano), bem como os provenientes de uma imensa e bela plêiade de teólogos e outros peritos, tudo isso faz com que, com frequência, o bispo se sinta confuso, assolado por um sentimento de impotência. Mais do que nunca, temos que aprender a descentralizar as responsabilidades, ainda que mantendo uma coordenação central; a valorizar os diversos dons e carismas que o Espírito Santo suscita em nosso meio; a trabalhar em equipe; a nos organizar em redes de atuação. Tudo isso permeado por uma vida animada pela Eucaristia e pela Palavra de Deus.
O papa Bento XVI, logo na introdução de sua encíclica Deus Caritas Est, nos ensina que ao início do ser cristão, não há uma decisão ética ou uma grande ideia, mas o encontro com um acontecimento, com uma Pessoa que dá à vida um novo horizonte e, desta forma, o rumo decisivo
. Cada batizado e, a fortiori, o bispo precisam cuidar para não perder essa dimensão fundamental do ser cristão. Muito se fala em espiritualidade, às vezes sem muita clareza do que se está falando. A marca da espiritualidade que o papa Francisco nos propõe é a do seguimento de Jesus, a de sermos outros tantos misericordiae vultus Patris, outros tantos rostos da misericórdia do Pai.
Ou seja, a missão do bispo é cada vez mais desafiadora. Ele terá que aprender a ser imagem do bom pastor para seu povo e, ao mesmo tempo, administrar com sabedoria os bens materiais e espirituais que a Igreja coloca sob seus cuidados.
Uma gestão organizacional conduzida com excelência e animada pela força do Espírito – pois o Espírito não atua apenas no íntimo das pessoas, mas também as leva a produzir frutos de vida para a construção do Reino de Deus – é capaz de produzir frutos de justiça social e misericórdia no âmbito eclesial. Voltando o olhar para tantos irmãos e irmãs que diariamente se dedicam aos diferentes ofícios administrativos nas diversas dioceses do nosso querido Brasil, é justo reconhecer e agradecer pelo cuidado, destreza, criatividade, esforço de diálogo e de colaboração que respeita e valoriza a dignidade da pessoa humana.
Somos chamados a cuidar do que não nos pertence, mas que nos foi confiado pela Esposa de Cristo, a Igreja. A presente obra, mais uma que brota do inquieto e incansável coração de Dom Edson Oriolo, nos apresenta, de forma agradável, um rico material formativo que – estou certo – será de grande utilidade, em primeiro lugar para nós, bispos, e para nossos colaboradores mais imediatos, mas também para tantos irmãos e irmãs nossos que, com toda a generosidade, colocam seus talentos a serviço de nossas Igrejas particulares e, na docilidade à voz do Espírito de Deus, fazem acontecer o dia a dia de nossas cúrias diocesanas e de nossa organização pastoral.
A Igreja, simultaneamente ‘agrupamento visível e comunidade espiritual’, caminha juntamente com toda a humanidade, participa da mesma sorte terrena do mundo e é como que o fermento e a alma da sociedade humana, a qual deve ser renovada em Cristo e transformada em família de Deus
(Gaudium et Spes, 40). E mais: o que a alma é no corpo, sejam-no os cristãos no mundo
(Lumen Gentium, 38).
O chamado ao serviço no seio da mãe Igreja, além de requerer a devida competência humana, é, ao mesmo tempo, uma vocação que pede por contínuo aprimoramento, que requer busca constante de novos conhecimentos e, sobretudo, o abandono pessoal à ação do Espírito que sopra onde quer. Que esse esforço de Dom Edson Oriolo possa produzir muitos frutos para o bem do nosso amado povo, povo que é, sobretudo, de Deus.
Dom Dimas Lara Barbosa
Arcebispo de Campo Grande (MS)
INTRODUÇÃO
A presente obra, Cúria diocesana: gestão organizacional, pretende dar pistas para dinamizar a cúria diocesana na direção pastoral, no cuidado da administração da diocese e no exercício do poder judicial (cf. CDC 469) numa organização inovativa, isto é, receptiva a inovações.
Atualmente, o cenário empresarial está sofrendo enormes mudanças e transformações no aspecto organizacional. Uma organização comprometida com mudanças. Para melhor organizar, estão alterando pessoas, recursos, metas, comando, foco, processo, logística, sistema de recompensa, uso de consultoria, estrutura, custos etc.
A Igreja católica apostólica romana vive, desde Jesus Cristo, constantes mudanças em sua eclesiologia, cristologia, logística, pastoral e, nas últimas décadas, no aspecto organizacional. São transformações de grande repercussão, mas que acontecem com a suavidade da ação do Espírito de Deus.
Depois de três séculos do Concílio de Trento (1545-1563), o papa Pio IX surpreende os cardeais, convocando um Concílio Ecumênico com o objetivo de expor claramente os princípios da verdade católica e adaptar às circunstâncias e exigências da época a disciplina eclesiástica.
No entanto, acredito que esse Concílio Vaticano I (1869-1870) influenciou na elaboração do Código de Direito Canônico Pio-Beneditino de 1917, elucidando que as cúrias diocesanas deveriam voltar-se para Roma na centralidade do poder papal. Roma tem a primazia hierárquica da Igreja católica. Toda eclesialidade é centrada no bispo de Roma.
Destarte, o Concílio Vaticano II (1962-1965), pentecostes na Igreja, à luz da encíclica Ad Petri Cathedram, de 29 de junho de 1959, indica os principais objetivos do concílio: o desenvolvimento da fé católica, a renovação da vida cristã dos fiéis, a adaptação da disciplina eclesiástica às exigências da época
. No decreto Christus Dominus – fruto das sessões do concílio – sobre o múnus pastoral dos bispos na Igreja, encontramos a transformação na relação entre a cúria diocesana e a Igreja católica apostólica romana. O decreto coloca o bispo diocesano como o referencial da cúria diocesana, e não mais a diocese de Roma, como foi apresentado no conhecido Código de Direito Canônico de 1917.
A presente obra está dividida em cinco capítulos. O primeiro capítulo apresenta um percurso da história do Concílio Vaticano I até alguns documentos inspirados pelas constituições, decretos e declarações do Concílio Vaticano II. Um garimpar de reflexões, pensamentos, conceitos e contribuições sobre a evolução do conceito cúria diocesana
. Uma passagem de beija-flor para ajudar a entender a transformação contínua que vem acontecendo na organização, natureza e finalidade da cúria diocesana ao longo da história da Igreja.
O segundo capítulo apresenta a estrutura organizacional da cúria diocesana na dinâmica da gestão. As pessoas que participam no processo organizacional das cúrias diocesanas possuem identidades, relacionamentos, atitudes, emoções e poderes diferenciados. É uma organização hierárquica, mas que carece de descentralização, em que as unidades individuais tenham autonomia, estabelecendo equipes multidisciplinares para lidar com questões fundamentais, como os benefícios dos colaboradores ou o aperfeiçoamento de processos que envolvem vários departamentos. Pretendemos apresentar diretrizes e um organograma básico de como deve ser a cúria diocesana, produzindo resultados na pastoral, administração e nas questões jurídicas eclesiásticas.
No terceiro capítulo, trabalhamos com os quatro eixos do pensamento do papa Francisco na perspectiva de melhorar a organização das cúrias diocesanas. A Evangelii Gaudium apresenta uma riqueza imensa de conteúdos para a ação evangelizadora da Igreja. São tendências que ajudam na gestão eclesial. No capítulo IV da Exortação Apostólica, A dimensão social da evangelização
, o papa Francisco apresenta quatro critérios que podem nortear bons planejamentos da ação evangelizadora, abrindo espaço para a organização. Os critérios são: o tempo é superior ao espaço (cf. EG 222-225); a unidade prevalece sobre o conflito (cf. EG 226-230); a realidade é mais importante do que a ideia (cf. EG 231-233); e o todo é superior à parte (cf. EG 234-237). Esta obra faz uma releitura sobre esses quatro ganchos na dinâmica da organização da cúria diocesana.
No quarto capítulo, temos uma releitura da obra de São Gregório Magno, Regra Pastoral, apresentando princípios para a gestão dos diversos colaboradores das cúrias diocesanas neste espaço de interação (cf. Rm 12,4-8; 1Cor 3,9; Mc 10,42-45), através de um décalago
com princípios a ser seguidos pelos colaboradores das cúrias diocesanas para melhor atender as