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Os planos de Deus para a salvação do homem: uma visão cristológico-sistemática do Antigo Testamento
Os planos de Deus para a salvação do homem: uma visão cristológico-sistemática do Antigo Testamento
Os planos de Deus para a salvação do homem: uma visão cristológico-sistemática do Antigo Testamento
E-book543 páginas6 horas

Os planos de Deus para a salvação do homem: uma visão cristológico-sistemática do Antigo Testamento

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Sobre este e-book

O livro expõe os planos de Deus para a salvação do homem, segundo a visão do autor, utilizando uma forma didática para a exposição do tema, fugindo sempre que possível do "teologuês" e procurando estabelecer uma discussão especialmente voltada para o leitor leigo, sem fugir ao tratamento das questões fundamentais presentes na sua proposição. O cerne da "tese" esposada concerne ao reconhecimento de que alguns caminhos foram traçados no Antigo Testamento, mas que o fundamento da salvação sempre foi Cristo, desde antes da fundação do mundo.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento10 de out. de 2022
ISBN9786525257662
Os planos de Deus para a salvação do homem: uma visão cristológico-sistemática do Antigo Testamento

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    Os planos de Deus para a salvação do homem - H Malheiros

    1. O DIA EM QUE O CRISTIANISMO COMEÇOU E O PLANO B DA SALVAÇÃO

    1.1. DA CRIAÇÃO DO UNIVERSO À QUEDA DE SATANÁS E DE SEUS ANJOS

    (Ler Gn, caps. 1 a 3; Jo, cap. 1, versículos 1 a 18; e o profeta Ezequiel, 28, vv. 11 a 19).

    Esclarecemos inicialmente que, tendo em conta os objetivos deste texto e a necessidade o tornarmos palatável aos leitores (não o transformando em um calhamaço pesado e de difícil digestão, que fosse dirigido preferencialmente a teólogos ou a estudantes de teologia), fizemos uma seleção dos pontos que julgamos mais importantes para a compreensão daquilo que pretendemos transmitir, tendo os leigos como principais destinatários. Isto não significa dizer que o rigor teológico e doutrinário será ignorado.

    Algumas narrativas ficarão de lado, ou não serão aprofundadas, não porque as julgamos desimportantes, mas dado que, a partir de um juízo de valor, não seria absolutamente essencial que participassem do nosso arrazoado. Afinal de contas, a Bíblia é um universo inesgotável de revelações a respeito de Deus e da maneira como Ele se comunicou conosco pela Sua palavra.

    Partindo da interpretação de vários textos bíblicos que naturalmente se conjugam (porque a Bíblia é um todo orgânico), o cristianismo começou em um momento atemporal, na eternidade passada, o que é um modo de dizer, pois a eternidade é justamente eterna, não tendo início, meio ou fim. Naquele dia (digamos assim, portanto) a Santa Trindade reuniu-se e decidiu criar o universo (espiritual, mineral, vegetal e animal) e, como sua verdadeira razão de ser, foi idealizada a vida terrestre, contexto dentro do qual o homem é colocado como o elemento mais fundamental (conhecido no meio cristão como a coroa da Criação).

    A organicidade bíblica não se denota a partir de uma introdução esclarecedora (que teria lugar Gênesis. Ela é identificada ao longo do estudo da Bíblia, desde o seu primeiro livro até o último. Enquanto o texto é escrito pelo Espírito Santo mediante a utilização de mãos humanas, em primeiro lugar quem participa dos acontecimentos e em segundo quem passa a ter acesso à revelação escrita a partir da elaboração do Pentateuco (os cinco primeiros livros, escritos por Moisés) não tem qualquer noção do todo, apenas de uma pequena parte do que lhe é dado a conhecer. Muitos séculos se passaram até quando foi escrito o Apocalipse para que esse todo estivesse disponível. Mesmo assim, em muitos momentos e quanto a muitas questões teológicas, a sua interpretação é hermética, sujeita à construção de noções alternativas, nisto residindo o perigo do surgimento de heresias. Além disso, evidentemente o todo revelado não implica no pleno conhecimento de Deus pelo homem porque se assim fosse, a criatura se igualaria ao Criador. Claro, o todo de Deus jamais será conhecido pelo homem, nem sequer no final da eternidade (outro modo de dizer)

    No sentido acima o "edifício teológico" que pretendemos visitar, o "Plano da Salvação", foi construído de forma completamente aleatória (segundo a perspectiva humana) não obedecendo as leis da física e/ou engenharia. A lógica de Deus é completamente ilógica para nós². Por exemplo, um dos andares mais altos, o da vitória de Cristo sobre Satanás é erigido logo no início, em Gênesis 3:15. Por outro lado, um dos fundamentos da sua base somente aparece de forma mais clara no Novo Testamento, correspondendo à mensagem de arrependimento pregada por João Batista. Esse edifício também pode ser visto como um labirinto que leva o leitor muitas vezes a lugares aparentemente sem saída, lhe custando muito esforço para identificar a trilha certa no emaranhado imenso de informações.

    Cabe a nós, portanto, um trabalho bastante ingente para chegarmos ao final proposto.

    A Trindade é composta por Deus o Pai, Deus o Filho (Jesus Cristo) e Deus Espírito Santo. Nós não conseguimos compreender como ela pode ser formada por três pessoas que ao mesmo tempo são uma só (de forma simplificada, três em um e um em três, simultaneamente). Este é um mistério indecifrável para a mente humana. O mesmo quanto aos anjos e arcanjos, todas as criaturas de Deus. Mas esta é uma verdade bíblica fundamental, insuscetível de contestação, sob pena de desconstrução da revelação que nos foi transmitida. Em teologia, verdades indiscutíveis são chamadas de dogmas.

    Ainda que eterna, una e indissolúvel, para a nossa pequena compreensão a Trindade pode ser tomada sob um aspecto funcional: (i) Deus é Pai; (ii) Cristo, o Filho, tomou a forma humana e deu a sua vida por nós; e (iii) o Espírito Santo é nosso consolador, convencendo-nos da existência do pecado, da justiça divina e da nossa submissão ao julgamento de Deus, os salvos para a vida eterno no céu e os não salvos para a condenação eterna no inferno.

    A propósito, pecado, justiça, arrependimento e inferno são palavras ignoradas na maioria das pregações atuais, que expressam um tipo de abordagem teologicamente correta.

    Esclareça-se que o estudo terá por base a análise de várias traduções da Bíblia, conforme a bibliografia colocada no final, entre as quais a Bíblia de Jerusalém, da editora católica Paulinos, exceto (na versão católica) quanto aos livros que os protestantes e evangélicos entendem como apócrifos (ou seja, cuja inspiração divina não é reconhecida). A maioria dos textos bíblicos citados foi retirada da versão eletrônica da Bíblia on line, na Nova Versão Internacional.

    Serão tomadas como base da pesquisa algumas poucas obras teológicas, indicadas na bibliografia de apoio, mas não citadas diretamente no texto, já que, como foi dito, ele não tem pretensão acadêmica.

    Declaramos reconhecer como autoridade divina tão somente a Bíblia. Na qualidade de autoridade reveladora, a tradição cristã, qualquer que ela seja, é desde logo inteiramente afastada. Quando muito ela indica a evolução da igreja e do culto cristão, frequentemente deturpados no evoluir do tempo, tendo sido incorporadas doutrinas e liturgias que nada têm a ver com os ensinamentos bíblicos. Trata-se da fabricação de heresias, muitas delas importadas remotamente dos cultos aos deuses egípcios, babilônicos, gregos e romanos. No Brasil nota-se uma influência muito forte de crenças africanas, que contagiaram o catolicismo, tendo criado um sincretismo religioso que deturpou a herança cristã³. Outras obras podem ser usadas como fontes ilustrativas. Entenda-se também que a Bíblia não é um livro científico, embora apresente verdades científicas. O embate entre a teologia bíblica e a ciência não é nosso objeto no momento.

    Observamos que cada unidade do texto bíblico pode apresentar as seguintes destinações em sua mensagem: (i) o tempo presente; (ii) o tempo imediato; (iii) o tempo mediato; (iv) o tempo distante; (v) o tempo escatológico ou fim dos tempos; e (vi) a eternidade. Por unidade do referido texto deve-se entender um versículo ou um conjunto de versículos que apresente uma mensagem geral individualizada a qual, por sua vez, pode estar dividida em submensagens. Finalmente, deve-se ter em vista que uma mesma unidade pode classificar-se em mais de um momento no tempo. Vamos a alguns exemplos.

    O tempo presente se verifica quando Deus apresenta uma mensagem cujo conteúdo se realiza imediatamente, sem intervalo temporal. Este foi o sentido da maldição proferida contra a serpente no Jardim do Édem, logo depois que o Senhor descobriu a desobediência do primeiro casal (Gn. 3:14).

    O tempo imediato foi aquele que decorreu, em um exemplo, entre a promessa de Deus sobre a praga das rãs que alcançaria o Egito e a sua efetiva realização, poucas horas ou dias (Gn. 8: 1 a 6).

    O tempo mediato correspondeu ao da ordem do Senhor a Jonas para pregar em Nínive e o momento em que o profeta obedeceu, depois de haver tomado um navio para fugir e passar três dias no ventre de um peixe, ao invés de dar-se o contrário, isto é, o peixe ir para a barriga de Jonas.

    O tempo distante foi o da profecia dada a Miqueias sobre o nascimento do Messias em Belém, a qual se realizou mais de 700 anos depois de anunciada (Mq. 5:1).

    O tempo escatológico ou fim dos tempos se verifica na visão das 70 semanas e o anúncio dos últimos dias, encontrado no profeta Daniel.

    O tempo da eternidade é aquele verificado depois dos acontecimentos relativos aos mil trezentos e trinta e cinco dias, referido pelo mesmo Daniel, que encontraria repouso no fim dos dias (Dn. 12:12 e 13). Como se trata de eternidade, os seus dias jamais chegarão a um fim.

    Em Ageu (que se tornou profeta por volta de 520 a.C), por sua vez, encontramos ao mesmo tempo uma palavra imediata do Senhor no sentido da retomada da reconstrução do templo; e a promessa de bênção para o povo de Israel, povo este que seria formado na vinda de Cristo pelos membros de Sua igreja.

    De outro lado, não se pode esquecer que toda a Bíblia tem uma aplicação atemporal, válida para todas as gerações que tiveram, têm e terão acesso à revelação progressiva do Senhor desde a elaboração do primeiro livro até o fechamento do cânone no Apocalipse. A Palavra de Deus, a nós revelada, é útil e necessária a cada dia para conversão, encorajamento, admoestação, santificação, ensino, enfim, para todo o propósito do Senhor⁴.

    A linguagem da Bíblia muitas vezes é alegórica ou figurativa. Isto porque nossa mente limitada não tem a capacidade de compreender a grandiosidade e os desígnios de Deus em toda a Sua plenitude, sendo-nos revelado pela Bíblia apenas uma pequena parte do Seu conhecimento.

    Finalmente, pedimos desculpas pelo nosso atrevimento, em abordar como leigo um tema que tem sido essencialmente reservado a teólogos. Mas, em contrapartida, essa reserva de mercado, fundada no direito que seria exclusivo de escrever sobre teologia aos que recebem o selo de uma faculdade ou seminário teológico, tem afastado intelectuais leigos, que poderiam dar uma importante contribuição ao estudo da Bíblia. Somente pela multiplicação de homens e mulheres com forte formação bíblica é que as igrejas podem se sustentar, pois serão o suporte dos seus pastores no macrocosmo de uma quantidade de membros. Tais Igrejas somente poderão manter a rigidez da verdadeira doutrina cristã pela ajuda de leigos, devidamente preparados, colocados à frente de pequenos grupos, os quais conheçam a Bíblia em profundidade nos seus fundamentos. A profissionalização extrema dos diversos ministérios nas igrejas locais têm os efeitos de aumentar o custo do seu funcionamento (pago pelos membros contribuintes), a par do desestímulo e acomodação quanto ao uso dos dons⁵.

    1.2. A CRIAÇÃO DO HOMEM E O PROPÓSITO DIVINO REVELADO A ADÃO E EVA. O PLANO B

    Voltando um pouco atrás, como dissemos, em um momento atemporal a Trindade se reuniu e resolveu criar o universo:

    "No princípio criou Deus o céu e a terra.

    A terra, porém, era sem forma e vazia; havia trevas sobre a face do abismo, e o Espírito de Deus pairava por sobre as águas.

    E disse Deus: Haja luz; e houve luz.

    (...)

    E disse Deus: Façamos o homem à nossa imagem, conforme a nossa semelhança; e domine sobre os peixes do mar, e sobre as aves dos céus, e sobre o gado, e sobre toda a terra, e sobre todo o réptil que se move sobre a terra (Gn: 1.1, 2, 3 e 26).

    (...)

    No princípio era o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o Verbo era Deus.

    Ele estava no princípio com Deus.

    Todas as coisas foram feitas por ele, e sem ele nada do que foi feito se fez (Jo 1:1-3).

    Como se verifica dos textos acima, a Trindade está presente na criação. Deus o Pai; Jesus Cristo, o Verbo; e o Espírito Santo. Para alguns intérpretes a expressão "façamos o homem" não é um plural majestático ou respeitoso, mas indica precisamente a Trindade trabalhando junto.

    Anteriormente ao homem foram criados outros seres celestiais, inclusive os anjos, aos quais também foi outorgado o livre arbítrio. Tanto é verdade que, liderados por Satanás (que um dia procurou tomar o lugar de Deus), foram capazes de fazer uma escolha em favor da rebelião, tendo sido definitivamente derrotados. Esta foi a única tentativa de sublevação celestial, que jamais tarde se repetirá, pois a Bíblia não dá indicação de que outros anjos poderão tornar a revoltar-se. Tudo indica que a escolha entre Deus e Satanás pelos seres celestiais foi definitiva, tendo sido selada eternamente a bênção da permanência ao lado de Deus em favor dos anjos fiéis e a condenação eterna ao desterro do anjo chefe rebelde e dos seus comparsas. A este respeito veja-se abaixo trecho do cap. 28. vv. 12 a 19 do Profeta Ezequiel, no qual o rei de Tiro é figura de Satanás. Seu pecado principal foi o orgulho, cuja consequência foi promover uma rebelião para ocupar o lugar de Deus:

    12. Veio a mim a palavra do Senhor, dizendo:

    13. Filho do homem, levanta uma lamentação sobre o rei de Tiro, e dize-lhe: Assim diz o Senhor DEUS: Tu eras o selo (aferidor) da medida, cheio de sabedoria e perfeito em formosura.

    14. Estiveste no Éden, jardim de Deus; de toda a pedra preciosa era a tua cobertura: sardônia, topázio, diamante, turquesa, ônix, jaspe, safira, carbúnculo, esmeralda e ouro; em ti se faziam os teus tambores e os teus pífaros; no dia em que foste criado foram preparados.

    15. Tu eras o querubim, ungido para cobrir, e te estabeleci; no monte santo de Deus estavas, no meio das pedras afogueadas andavas. Perfeito eras nos teus caminhos, desde o dia em que foste criado, até que se achou iniquidade em ti.

    16. Na multiplicação do teu comércio encheram o teu interior de violência, e pecaste; por isso te lancei, profanado, do monte de Deus, e te fiz perecer, ó querubim cobridor (protetor), do meio das pedras afogueadas.

    17. Elevou-se o teu coração por causa da tua formosura, corrompeste a tua sabedoria por causa do teu resplendor; por terra te lancei, diante dos reis te pus, para que olhem para ti.

    18. Pela multidão das tuas iniquidades, pela injustiça do teu comércio profanaste os teus santuários; eu, pois, fiz sair do meio de ti um fogo, que te consumiu e te tornei em cinza sobre a terra, aos olhos de todos os que te veem.

    19. Todos os que te conhecem entre os povos estão espantados de ti; em grande espanto te tornaste, e nunca mais subsistirá.

    Portanto, aquele querubim foi criado de forma especial por Deus, tendo sido condenado por causa da sua sublevação. Havendo tomado a forma de uma serpente pensante e falante, estava no Jardim do Éden, pronto para trazer a tentação para Adão e Eva, no que foi bem-sucedido como sabemos, assunto que será tratado no próximo item.

    Temas de grande discussão teológica são o da criação dos dinossauros e de toda a grande família de seres extintos, a respeito dos quais a Bíblia é absolutamente silenciosa. A mesma coisa se diz quanto a outras raças humanoides dotadas de inteligência, os cromagnon, neandertais e os denisovan. Seus fósseis e esqueletos estão aí para provar que existiram, mas quase nada se sabe sobre como, quando, onde surgiram. São assuntos que não interessam aqui abordar. Muito menos a idade do universo e da terra.

    1.3. A TEOLOGIA DAS ALIANÇAS. ADÃO E EVA SUCUMBEM À TENTAÇÃO. OS PLANOS DA SALVAÇÃO. FIM DO PLANO B DE DEUS E O REGISTRO INICIAL DO PLANO A E DO PAPEL DE CRISTO. A TEOLOGIA DAS DÁDIVAS (GÊNESIS, CAPS. 1 A 3)

    1.3.1. A ALIANÇA OU O CONCERTO E OS PLANOS DA SALVAÇÃO. ALIANÇA CONDICIONAL OU INCONDICIONAL. SUA RELAÇÃO COM CONVENÇÕES, CONTRATOS, OU OFERTAS PÚBLICAS

    As relações de Deus com o homem têm sido expressas pela teologia sob a denominação de alianças ou de concertos. O termo aliança no hebraico é berit, significando, de forma geral, um compromisso assumido por alguém que se submete a cumprir uma obrigação.

    Claro que não se pode estudar a Bíblia sem se ter em conta a doutrina das alianças, mas pretende-se neste texto adotar outra visão sobre as relações entre Deus e o homem, a partir da identificação de planos divinos da salvação⁶. Estes foram superados na medida em que seu objetivo ficou frustrado por culpa não do Senhor, claro, mas exclusivamente das pessoas, tribos ou nações que Ele designou para um retorno à relação uma vez existente no Éden, antes da Queda.

    Antes de desenvolvermos a nossa concepção dos planos da salvação, devemos esclarecer que estamos recorrendo a uma abordagem didática, mas que apresenta uma conotação teológica profunda e muitas vezes despercebida. Sempre houve somente um único plano para a salvação do homem, o oferecimento da vida de Cristo como forma de pagamento da dívida representada pelos nossos pecados. Mas não podemos deixar de entender que, de forma aparentemente paradoxal, as alianças (na nossa apreciação, planos) sempre representaram uma efetiva oportunidade de cumprimento da vontade do Senhor, inicialmente feita com Adão e Eva; do seu restabelecimento (no dilúvio; e na escolha de Abraão e na instituição da nação de Israel) da comunhão perdida, por meio da religação com Ele (daí religião, do latim religio, - onis).

    Isto porque o comando de Deus no sentido da obediência e da fé não foi a designação de uma missão impossível para os destinatários. Lembremo-nos da conhecida série de filmes estrelados com esse nome por um famoso ator americano. Apesar de ditas impossíveis, todas as tarefas que foram destinadas ao herói das histórias sempre foram cumpridas. O mesmo quanto ao ser humano na sua devida obediência para com Deus.

    Vamos nos arriscar e dizer que teria sido injusto que o Senhor tivesse atribuído ao homem missões que este jamais pudesse cumprir, ao mesmo tempo em que o responsabilizaria pelo fracasso. Não! Adão e Eva; os descendentes de Noé e Abraão e o povo de Israel sempre foram capacitados para a obediência e para a fé, ainda que tivessem feito escolhas erradas.

    Uma coisa foi Deus ter dado o poder de se manter ou de se restabelecer a comunhão com Ele; outra muito diferente, a realidade de natureza estatística, no sentido de que toda a ação humana seria sempre voltada para o próprio umbigo, isto é, tomar medidas relacionadas com a sua pretensa autonomia diante do Criador (fundamento do ateísmo) ou de conseguir voltar para Ele por méritos próprios (as diversas religiões fundadas no valor do sacrifício pessoal ou de outra oportunidade mediante reencarnação).

    Essa interpretação parece ficar provada com a escolha de Saul para rei de Israel, que será estudada nos itens 3.15.1 e 3.15.2, adiante. Saul foi a resposta de Samuel ao povo que pedia um rei, tal como acontecia com as demais nações. Este ato foi diretamente contrário à condução do povo de Israel diretamente pelas mãos de Deus (uma nação teocrática), tal como está expressamente referido no relato bíblico.

    Tendo sido designado como rei porque se destacava entre o povo pela sua estatura (cérebro verdadeiramente Saul não possuía) e, mesmo considerando que o seu reinado havia sido estabelecido contra a vontade meramente permissiva de Deus, ainda assim, se aquele rei tivesse conduzido o povo segundo os caminhos divinos, ele teria sido abençoado, Israel teria cumprido o seu papel de nação santa e a linhagem de Davi não teria sido estabelecida como aquela dentro da qual nasceria séculos mais tarde o Salvador.

    É estranho? Sim é, mas vejamos o que diz a Bíblia a respeito, em um episódio no qual Saul desobedeceu às instruções do profeta Samuel e realizou sacrifícios (I Sm; 13: 13 e 14:

    "Então disse Samuel a Saul: Agiste nesciamente e não guardaste o mandamento que o Senhor, teu Deus, te ordenou; porque, agora, o Senhor teria confirmado o teu reino sobre Israel para sempre".

    Porém, agora, não subsistirá o teu reino; já tem buscado o Senhor para si um homem segundo o seu coração e já lhe tem ordenado o Senhor que seja chefe sobre o seu povo, porquanto não guardaste o que o Senhor te ordenou.

    Está muito claro que, se Saul tivesse sido obediente, a história de Israel e da humanidade teria sido outra, sem Davi e, pasmem, mesmo sem Cristo! Será? Heresia? Claro que não. Estamos diante de uma situação teológica hipoteticamente plausível, o que, do ponto de vista lógico representa uma contradição em termos (melhor, entre os termos). Mas há muitas contradições aparentes em relação a Deus e a nós, seres humanos limitados, somente resta aceitá-las sem compreendê-las⁷.

    Na lógica clássica, uma contradição consiste numa incompatibilidade lógica entre duas ou mais proposições. Isso ocorre quando as proposições, tomadas em conjunto, geram conclusões que formam inversões lógicas, geralmente opostas uma da outra.

    Mas essa possibilidade, enfatizamos, foi a mesma dada a Adão e Eva, aos descendentes de Noé, a Abraão e os seus descendentes e à nação de Israel como um todo. Nenhuma delas orientou-se para o lado positivo.

    Precisamos compreender que a liberdade de escolha do caminho a ser trilhado, dada ao homem por Deus (a figura das duas portas referida por Jesus, uma larga e outra estreita) nada tem a ver com o fato de que Ele é onisciente; e que, portanto, desde antes da fundação do mundo, sabia que o homem iria escolher errado e que a única forma de restauração seria o sacrifício vicário de Cristo.

    Não houve missões impossíveis: houve homens falhos em crer e obedecer. E, caro leitor, não pense que você é melhor do que qualquer dos rebeldes e teria agido diferente se tivesse estado no lugar de Adão, Abraão, Saul e outros. Eu e você teríamos feito da mesmíssima forma.

    Vamos deixar aqui de lado as questões da eleição e da predestinação, que não estão dentro do objetivo de nosso texto.

    1.3.1.1. AS RELAÇÕES ENTRE A TEOLOGIA E O DIREITO

    Façamos uma comparação entre a teologia e a ciência jurídica, que apresentam inúmeros pontos de conexão. Isto se dá principalmente em relação ao Antigo Testamento, porque este trata da origem da Lei e de sua interpretação e aplicação. Como se sabe, a Lei no sentido teológico foi estabelecida por Deus por meio de Moisés na elaboração do Pentateuco. Este é formado pelos cinco primeiros livros da Bíblia, cuja autoria é atribuída àquele líder de Israel. Esses dois ramos do conhecimento versam, portanto, de maneira geral sobre normas ou comandos, cujo descumprimento gera penalidades, conforme previamente determinado pelo legislador.

    Em direito, os compromissos são chamados de convenções ou de contratos ou, ainda, de promessas. Existem os chamados contratos unilaterais e os bilaterais. Os primeiros estabelecem obrigações para somente um dos contratantes e os segundos para ambos. Exemplo do contrato unilateral é a doação pura. Nesta o doador assume voluntariamente a obrigação de dar uma coisa a alguém, cabendo ao donatário tão somente aceitar ou não. O contrato de compra e venda, por sua vez, é um contrato bilateral porque o vendedor se obriga a entregar a coisa vendida e o comprador a pagar o preço combinado. Trata-se, portanto, de prestações e obrigações recíprocas. Neste sentido, a oferta da vida de Cristo como preço para a nossa salvação correspondeu a um contrato de doação, sem encargo de qualquer espécie para os donatários, fundada na graça.

    Sob outro aspecto, a finalização jurídica de um contrato, convenção ou promessa pode ser vinculada a algum ato a ser realizado por uma das partes, estabelecendo-se, portanto, uma condição que estabelece uma mudança nos efeitos do contrato. Por exemplo, o comprador pode condicionar a venda à sua satisfação por meio da verificação da efetiva qualidade do bem vendido, conforme prometido pelo vendedor. Trata-se da condição resolutiva. Se o objeto da venda não preencher o requisito de qualidade, então a venda se resolve, ou seja, é cancelada. É como se aquele contrato jamais tivesse sido assinado entre as partes. Se o comprador tiver pagado uma parte ou a totalidade do preço, o vendedor deve devolver integralmente o que recebeu.

    De outro lado, a venda pode estar subordinada a uma condição suspensiva. Tomando-se o mesmo exemplo da qualidade do bem, a venda é celebrada, mas sua conclusão efetiva somente se dará se aquela qualidade se revelar verdadeira. Neste último caso, advinda a condição, o contrato não chegou a ser efetivamente concluído entre as partes, dele não tendo nascido qualquer efeito ou obrigação.

    Podemos tentar simplificar dizendo que, na primeira hipótese, o contrato já existia e ele foi cancelado em virtude de fato novo (a condição resolutiva que se caracterizou). Na segunda hipótese o contrato teve uma existência provisória, mas jamais chegou a ter plena eficácia por ter se dado a condição suspensiva. Morreu antes de ter sido formado.

    Mas há outra figura (em direito chamamos de instituto) que para mim melhor explica as relações do homem com Deus. São as promessas do tipo ofertas públicas, que podem ser dirigidas a pessoas determinadas ou indeterminadas.

    Uma oferta pública determinada se dá, por exemplo, quando um empresário dirige ao controlador de uma sociedade uma proposta de compra da totalidade ou de parte de suas ações, já determinando antecipadamente o preço. Essa oferta é válida tão somente para o acionista a quem ela é especificamente dirigida, durante o período marcado pelo proponente e segundo o preço por ele anunciado.

    A oferta pública indeterminada é dirigida a toda e qualquer pessoa que dela tomar conhecimento, como fazem as lojas nos seus anúncios em jornais, revistas, rádio, televisão ou internet. É estabelecido um prazo fixo de validade ou ela ficará de pé até que seja vendido o último exemplar do estoque (que o ofertante deve informar em sua proposta).

    O elemento comum a todos os exemplos dados acima está na caracterização de um tipo de vontade manifestada pelos contratantes no sentido do fechamento de um determinado negócio. Em direito essa vontade somente é legitimamente reconhecida como válida se tiver sido manifestada de forma livre, sem qualquer coação de uma parte pela outra. A coação é frequente em práticas religiosas, como aconteceu, por exemplo, na conquista da América Central e do Sul, quando a Igreja Católica obrigava os índios a aderirem ao seu credo. Ainda hoje em certos países o reconhecimento da nacionalidade ou de direitos depende da adesão dos habitantes à religião oficial. A aceitação desta define a própria cidadania. Em outros casos a nacionalidade depende concomitantemente da raça e da escolha religiosa. As demais pessoas são destituídas dos direitos fundamentais. Adiantamos que Deus jamais coagiu qualquer pessoa a aceitá-lo. Este ato depende exclusivamente da fé livremente manifestada por qualquer indivíduo.

    Finalmente há outro aspecto do direito relativamente aos contratos, consistentes naqueles que são formados pela adesão da vontade de uma das partes à vontade da outra. Neste caso, a primeira parte, mais fraca geralmente quanto aos pontos de vista econômico e jurídico, não tem a possibilidade de modificar sequer uma vírgula nos termos da proposta da outra. Ou aceita o pacote completo ou não faz negócio. Algumas vezes a imposição de um contrato totalmente formatado por um dos lados diz respeito ao próprio tipo de negócio, que se tornaria de realização prática impossível se fosse permitida a discussão do seu modelo ponto por ponto. A massificação das vendas não permite essa uma forma individualizada de tais negócios, que são celebrados de maneira padronizada.

    Sob o último aspecto, tome-se o exemplo da telefonia celular. O interessado procura uma empresa do ramo com a finalidade de adquirir uma linha e o aparelho necessário para utilizá-la. Ele tem inicialmente uma escolha entre o pacote pré-pago (que lhe dá um limite máximo de utilização, a ser renovado toda vez que se esgote), ou um pacote pós-pago, entre os à disposição, conforme o usuário deseje mais ou menos tempo de uso, acesso à internet etc. Seria absolutamente impraticável que as empresas de telefonia estivessem subordinadas a negociar contrato por contrato com cada um dos interessados em seus serviços.

    1.3.1.2. AS ALIANÇAS ENTRE DEUS E O HOMEM E OS PLANOS DA SALVAÇÃO. A TEOLOGIA DAS DÁDIVAS

    Pensando na forma pela qual Deus, no sentido macro, relacionou-se com a humanidade, os teólogos indicam que isso foi feito por meio de alianças que começaremos a estudar. Certos conhecimentos e citações bíblicas feitas na exposição que se segue serão objeto de um aprofundamento maior na medida em que o texto for desenvolvido. Se o leitor não tiver familiaridade com alguns dos aspectos a serem em seguida apresentados, não fique ansioso porque na hora certa esperamos poder completar as lacunas presentes neste momento. Trata-se, portanto e em grande parte, de um trailer do que está por vir.

    (I) A ALIANÇA FEITA PELA TRINDADE OU ENTRE A TRINDADE. OFERTAS PRIVADAS E PÚBLICAS DE SALVAÇÃO

    A primeira aliança se estabeleceu entre as três pessoas da Trindade, o Pai, o Filho e o Espírito Santo, em algum momento da eternidade, quando foi resolvida a criação do universo. Do ponto de vista lógico, uma eternidade não é suscetível de ser dividida em momentos, do que decorre encontrar-se o autor utilizando uma figura de linguagem, entre uma imensa multidão delas que serão trazidas neste texto.

    Durante o processo da criação, a Trindade resolveu criar o homem: Façamos o homem à nossa imagem, conforme a nossa semelhança (Gn. 1:26). Este termo "façamos" indica, segundo uma interpretação, a presença das três pessoas da Trindade, que deliberou unanimemente a respeito do objeto do seu entendimento. No entanto, em sua onisciência, os autores da criação sabiam justamente por serem oniscientes, que Adão e Eva depois de criados se tornariam desobedientes por terem perdido a fé no seu Criador e que isto resultaria na perda da comunhão que foi inicialmente desenvolvida entre Criador e criaturas.

    No sentido acima (e aqui vem a nossa teologia, na qual tomamos a liberdade de adotar um caminho não tradicional), passaram a ser feitas ofertas privadas e ofertas públicas (estas, conforme o caso, a pessoas determinadas ou indeterminadas) como caminhos sucessivos no tempo para que o ser humano pudesse restabelecer a comunhão que havia sido perdida em relação ao Senhor.

    Ora a primeira aliança, de natureza inicialmente privada e incondicional encontra-se registrada em Apocalipse 13:8, referindo-se ao Cordeiro que foi morto antes da fundação do mundo. Esse cordeiro é, evidentemente, Cristo. Tal oferta teve a natureza privada no seu estabelecimento prévio, constituída entre as três pessoas da Trindade porque a humanidade (nem o universo físico) ainda não existia e sua origem estava no conhecimento do fato de que Adão e Eva pecariam e que o seu pecado geraria uma descendência marcada pela inclinação espiritualmente genética de desobediência e de falta de fé no Criador. Em direito, no plano interno da Trindade tal tipo de resolução seria chamado de pacto sujeito a uma condição suspensiva, isto é, ele operaria apenas a partir do momento em que a humanidade fosse criada e que, nela, Adão e Eva viessem a pecar como efetivamente ocorreu.

    Mas a aliança, também subordinada à mesma condição suspensiva, tinha em vista a própria humanidade como o seu outro lado, que beneficiaria todas as pessoas a serem salvas mediante o sacrifício do Cordeiro. É o que se encontra na Carta aos Efésios, cap. 1, v. 2, onde se lê que fomos eleitos por Deus antes da fundação do mundo para que fôssemos santos e irrepreensíveis, diante dele em

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