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Extracampo: na ótica do cárcere
Extracampo: na ótica do cárcere
Extracampo: na ótica do cárcere
E-book291 páginas3 horas

Extracampo: na ótica do cárcere

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Sobre este e-book

O Brasil tem a terceira maior população carcerária do mundo, ficando atrás apenas dos Estados Unidos e China. O cotidiano do cárcere é uma realidade de quase um milhão de brasileiros e pouco sabemos a respeito desses excluídos do Brasil. Homens e mulheres que carregam o estigma de presidiário e, mesmo após o cumprimento da pena, irão conviver com uma marca daqueles que não acreditam na recuperação do ser humano.

Extracampo: na ótica do cárcere é um livro que revela, a partir da trajetória de Angelo Canuto, os caminhos da ressocialização, os passos do ser humano que errou, pagou, mas não desiste de lutar por aqueles que precisam de uma chance para voltar à sociedade.

Em cada uma de suas reflexões é possível projetar perspectivas em situações tão complexas, superar os desafios em momentos tão conturbados e seguir adiante.

Seu livro é uma parada obrigatória para conhecer uma face do Brasil ainda desconhecida, mas cheia de sonhos, guerreiros e possibilidades.

Vagner Aparecido Marques, Doutor em História Social pela PUC-SP e autor do livro Fé & Crime: Evangélicos e PCC nas periferias de São Paulo.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento23 de mai. de 2023
ISBN9786553554627
Extracampo: na ótica do cárcere

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    Extracampo - Angelo Canuto

    REFLEXÃO 1

    O FUTEBOL E MINHA CHANCE PERDIDA

    Qualquer pessoa mais velha já foi jovem e com certeza tem alguma história sobre um sonho muito desejado, mas que virou frustração ou um suspiro longo de vontade de viver o que não se pode. São muitos os fatores que levam à derrota e à desistência, talvez a falta de experiência de vida ou a falta de um conselho simples, mas certeiro, auxiliando a mente jovem e inquieta.

    Há 25 ou 30 anos, as colheitas para novos talentos do futebol não eram tão dinâmicas como são nos dias de hoje, quando o futebol, além de ser profissão, é fonte de muita renda para os que se destacam.

    Lembro-me de quando meu tio levou meu primo Márcio e eu a uma peneira de futebol¹. Na época, tínhamos cerca de 13 anos, nós dois éramos de 73, ele de março, e eu de outubro. Minha recordação ainda é viva e clara, como se tivéssemos ido lá ontem.

    A avaliação era destinada aos anos de 1972 e 1973. A peneira era realizada num campo, num terrão, chamado Serra Morena, e ficou bastante conhecida na época por dar grandes e valiosas oportunidades aos participantes.

    Era especialmente destinada ao Clube Portuguesa de Desportos de São Paulo – clube que revelou Denner, prodígio da bola, que, tragicamente, morreu em um acidente de automóvel. Ainda lamento sua morte e desejaria que ela pudesse ter sido evitada com uma simples questão de logística e acompanhamento, pois ele foi uma joia brotada do abençoado solo brasileiro, a maior jazida de joias futebolísticas do mundo.

    Depois de três meses de avaliação na peneira, eis que o destino me levou a uma disputa de posição como lateral direito com meu primo Márcio. Ele foi para uma equipe, eu, para outra, em um jogo que não passou de 45 minutos. O resultado foi para mim um mix de alegria e tristeza, para meu primo, restou-lhe a tristeza: fora dispensado e eu fiquei com a vaga, seguindo adiante em outras fases do processo seletivo.

    No retorno para casa, uma caminhada longa para o bairro do Pari e Brás, nós andávamos pelas ruas juntos, meu primo de cabeça baixa e olhos lacrimejantes, que de vez em quando me olhavam e procuravam nos meus uma resposta para sua derrota. Eu, triste e eufórico, tentava articular palavras para motivá-lo, tentava justificar algo que não dependia do meu crivo. Encontrei então uma saída.

    Disse a ele que, sem dúvida, ele era mais talentoso que eu, pois jogava muito e eu aprendia muito com ele, mas que, certamente, havia ficado claro que o biotipo físico dele não era o que procuravam, e nessa acabei levando sorte por ser em torno de 20 centímetros mais alto e, consequentemente, mais forte. Também disse que, se ele não tivesse escolhido ser lateral, estaria entre os escolhidos, talvez um meia-atacante. Percebi nele um pouco mais de orgulho e contentamento, meus elogios, que eram de fato verdade, fizeram-no aceitar melhor aquela derrota.

    Quando chegamos à estação de trem no Brás, meu primo, sempre parceiro, um pouco menor e mais leve, nessa hora levou larga vantagem. Especialmente porque, quase sempre, burlávamos os guardas ferroviários. Assim que eles davam bobeira, tínhamos a chance de adentrar as plataformas e, num pé de vento, correr pelas composições, sumindo no horizonte em meio àquelas sucateadas, mas operantes, minhocas de ferro.

    Voltamos para casa, os dias se passaram e minha rotina no processo seletivo era mais triste sem meu primo comigo. Eu fui forte e segui meu sonho, agora um pouco mais sozinho. Não foram raras as vezes em que cheguei ao treino em cima da hora e realizava as avaliações quase às pressas, embora já estivesse bem aquecido pois o treino já começava bem cedo para mim.

    Caminhava e corria uma verdadeira maratona, que se iniciava às 4h30 da manhã, pulando os muros e as telas da estação de Guaianazes. Para mim, não era fácil pular o muro e enganar os guardas. Agora, já na plataforma, aprendi rapidamente a me camuflar no meio dos inúmeros trabalhadores, esbarrando em marmitas e tomando empurrões. Eu era constantemente abduzido pelo vagão devido à quantidade de pessoas.

    Quando chegava ao Brás, atravessava a região do Pari e chegava à rua da piscina. Logo já via os uniformes sobre o restinho de grama na lateral do terrão, um leve orvalho do amanhecer umedecia as camisas limpas, porém surradas devido às repetidas vezes que eram usadas e lavadas. Havia dois uniformes, um oficial da lusa, outro do patrocinador master, o Premier.

    A hora da verdade havia chegado, o teste final. Depois do dia exaustivo, minha glória havia chegado. Senhor Manolo, um velhinho de pernas de alicate², baixinho, rígido, mas muito carismático, veio com uma listagem, dando-nos um feedback. Um por um, ele foi dando explicações e justificativas para a dispensa, mas também os motivou. Para nós, que esperávamos, a tensão era imensa e aumentava a cada nome. Eis que acabou a lista da dispensa e eu não conseguia entender que, com o fim dos nomes, eu tinha sido aprovado.

    Foi quando aquela figura fraternal nos disse:

    — Vocês agora são da Portuguesa e passarão a treinar lá dentro.

    Ele se referia ao campo gramado, o Canindé. Chorei, não consegui conter a emoção. Precisava mostrar que era homem e que homem não chora, seguindo o bordão, mas me vieram à cabeça todas as dificuldades enfrentadas, a tristeza de meu primo e, assim, não pude conter as lágrimas.

    Retornei para casa, para meu lar humilde, muito característico nas periferias. A época era difícil para brasileiros com a inflação e a recessão. O desemprego era enorme. Na minha casa, a presença de um pai nunca foi realidade, minha mãe era mais ausente que presente, mas minha avó era a minha certeza, meu porto seguro pois, mesmo com toda dificuldade, estava sempre a me abraçar.

    Comi um torrão de arroz frio, bebi um copo de café e fui para a rua esquecer o sofrimento. Retornei aos treinos na Serra Morena, no terrão, apesar de já ser da Lusa. Voltava para casa assim como chegava ao treino: faminto. Não era fácil treinar com aquele cheiro de lanche que vinha da cantina ao lado do campo, pois em casa eu comia, no máximo, um pão com manteiga. O clube ainda não se organizara com essa questão, mas para mim não fazia mais diferença.

    Nas estações, a segurança ferroviária tinha sido reforçada. Minha astúcia de garoto de periferia, bacharel em furar estações, já não vencia mais a truculência daqueles simpatizantes da ditadura. Um dia, apanhei feito vagabundo, minha mochilinha com uma chuteira viola de couro³ e solado gasto de plástico voou longe, e minha orelha fervia feito chaleira de café queimado. Meu sonho teve de ser abandonado.

    Deixei de ser jogador porque a vida, para mim, tinha escrito uma nova história; achou melhor me aproveitar em um campo, quem sabe, da motivação, da literatura, ou para mostrar aos outros garotos que vale a pena acreditar. Mas sei que vale mais a pena valorizar.


    1 Peneira de futebol – avaliação de atletas jovens com a intenção de separar os melhores para continuar o treinamento e se tornarem jogadores profissionais de futebol.

    2 Pernas alicate – gíria utilizada para se referir às pessoas com pernas com uma distância considerável de um joelho ao outro, formando um ângulo interno no formato triangular.

    3 Viola de couro – chuteira utilizada na época, fabricada com couro duro.

    REFLEXÃO 2

    QUEM SOU

    Muitos anos se passaram, hoje tenho 45 anos, estamos em janeiro de 2019. Minha vida teve inúmeros episódios trágicos, poucos de glória. Porém todas as glórias foram muito bem aproveitadas e comemoradas. Procurei tirar ainda mais proveito das derrotas e dos capítulos de sobrevivência. Aprender com a dor o torna mais crítico, mais resistente e ainda mais capaz, resiliente.

    Muitos títulos poderiam ter me definido ao longo de minha vida: moleque de rua, feirante, camelô, trombadinha e repositor de supermercado; ajudante de pedreiro, ajudante geral em indústria têxtil, policial da tropa de choque em São Paulo, marginalizado e, enfim, acusado de extorsão e tráfico. Este último levou-me a sete anos de prisão em regime fechado e quatro anos em semiaberto.

    Ainda preso, concluí ensino médio e faculdade, sou bacharel em Administração. Em liberdade, já no regime aberto, tornei-me empresário do ramo de transporte de cargas, criei empregabilidade para ex-sentenciados, conceituei logística para áreas de risco criando um modo de distribuição de encomendas porta a porta nas periferias de São Paulo. Continuando nos estudos, fiz pós-graduação, um MBA em Gestão e Marketing Esportivo.

    Continuei a crescer ainda mais e, com muita alegria, retornei ao ramo que tanto amo, o de futebol, mas agora empresariando jogadores e gerindo carreiras de atletas profissionais. Revelei Luciano, no Corinthians, e pude, nessa ocasião, bem no íntimo do peito, confirmar o quanto vale a pena acreditar e sonhar, além de valorizar os estudos e buscar aquilo que se deseja no cerne do nosso coração.

    Por razões irrelevantes no momento, pois bem me defendo de acusações absurdas, ainda assim respeitando a justiça, aguardo pacientemente os ritos legais. Infelizmente, o estereótipo permanece: uma vez presidiário, sempre presidiário. Mais uma vez me valho do rap, na voz dos Racionais MC’s, para expressar o que digo:

    […] Te chamarão para sempre de ex-presidiário […]

    Essa mácula o torna vulnerável, uma pessoa com a reputação assassinada. Facilmente lhe imputam um crime, e o pior, mais facilmente o condenam. Na prisão, até o trato com nossos familiares é marginalizado, alguns agentes dizem: família de preso é tudo bandido. No entanto: As grades podem confinar meu corpo, mas jamais confinarão minha alma e meu pensamento.

    Nessa oportunidade de ter espírito e corpo livres é que busco ser mais útil, procuro desenvolver a criatividade, ajudar pessoas, honrar minha família e honrar quem acredita em mim, meus amigos, e o mais importante entre todos, Jesus. Assim como aqui estou, haverei de um dia voltar para casa.

    REFLEXÃO 3

    PARALELOS: DAQUI PARA FRENTE

    Vou valer-me dos paralelos e comparar o cárcere e seu funcionamento com o futebol e suas engrenagens. Os mundos são distintos, superficialmente, mas um olhar mais atento e minucioso vai mostrar a semelhança de estrutura e de como se perde quando se pensa só em si mesmo.

    Imagine só, um atleta é contratado por determinado clube, trata-se, no entanto, de um jogador experiente, de talento apreciado por muitos. O clube se faz valer, naturalmente, de um contratante, usando-o sob a batuta de seus dirigentes com a prerrogativa de inserir aquele atleta ao grupo, pois, embora os funcionamentos da diretoria e da gerência estejam em ordem, nada se compara ao entrosamento orgânico e necessário para o grupo, a coletividade de jogadores que já está formada e afinada.

    Este último tem nos bastidores uma força indiretamente maior que a própria decisão dos mandatários. O contratado precisa de um comportamento bom e relevante, pois, se ele não tiver adequado espírito de grupo, passa a contaminar a estrutura coletiva. A contratação deve estar perfeitamente equalizada à opinião do grupo ou à sua maioria.

    Todo grupo naturalmente elege ou reconhece o seu líder. Essa liderança, além de nata, é também uma referência de força e motivação. Porém, o grupo deve estar capacitado psicologicamente, o que não é muito natural, para aceitar o desafio de resgatar a ovelha que, por qualquer razão, venha a se desgarrar, bem como aquela que começar a perder a lã, transformando-se num astuto lobo.

    Como é estar preparado? A ideia pode ser sintetizada na simples frase Daqui para frente: daqui para frente, toda a responsabilidade de sucesso ou insucesso é transferida imediatamente ao iminente desertor, ao que abandonou o grupo. Pesa nele o resultado, mesmo que este tenha sido construído pela coletividade. Quando o resultado é positivo, há bônus e certa lucratividade, quando negativo, há natural rejeição do grupo e consequências irremediáveis para a carreira do rebelde, que não pode clamar por ajuda ou responsabilizar qualquer esfera dentro da estrutura daquela instituição.

    Contudo, para os observadores, é fácil distinguir se cada indivíduo está mesmo pensando no grupo. Alguns podem até pregar esse objetivo, porém, entre o que sai de suas bocas e o que praticam, existe um enorme espaço. O que é esse espaço? Chama-se contradição. O comportamento desses contribui para dividir o grupo pelas contendas criadas em razão da diferença avassaladora entre o que se diz e o que se vive.

    No grupo futebolístico, lá no fundo do peito para muitos, o objetivo é ser o melhor, ser reconhecido, ganhar fortuna e fama. No grupo aprisionado, a presunção é de que todos atinjam a liberdade.

    As contas dos que erram passam a ter um rombo irreparável, saldo negativo, a vulnerabilidade é gritante. Os que mais sofrem – e são expostos dolorida e claramente – são os familiares. Como atingir a meta pressuposta se não se está contribuindo para o saldo positivo? Sem condições de conter o desastre, o clube perde e o que se rebela perde uma grande chance de vencer na vida. No cárcere, perde-se a chance de viver.

    Então, nota-se que o Daqui para frente tem não só um grande significado, mas também uma essência que combina perfeitamente com a disciplina. Essa fórmula pode, se não levar ao sucesso, garantir que se continue a sonhar e a buscar seus objetivos, suas metas.

    Ao grupo de apenados chegou certo rapaz. Cheio de marra, bem à vontade, demonstrando total identificação com o mundo de ferro, do sol quadrado, da expertise e malandragem. Dando referências de sua quebrada citando consideráveis vagabundos, não se deixando titubear – postura que lhe proporcionou considerável respeito. Não muito moroso, passou a ter sua oportunidade no grupo de pensadores e líderes que se destacavam naquele centro.

    Costumamos dizer que três meses são suficientes para ter certeza de quem é aquele que acabara de chegar. Medida infalível. Dentro dessa perspectiva, esse malandreado astuto, percebendo uma atmosfera tranquila, vendo o leão alimentado, o gigante adormecido, passa a agir sorrateiramente, buscando levar vantagem em tudo, lesando sempre alguém com pequenos gestos e a conta-gotas.

    Assim é o atleta considerado Perna, leva vantagem sempre que pode. Deixando as suas obrigações para os mais jovens e menos experientes dentro do grupo e fazendo corpo mole nos treinos. Ele dá migué nos treinos físicos, nos jogos de menor importância e nos de longa distância, que são os mais cansativos. Mesmo assim, em seu medíocre e limitadíssimo universo intelectual, ele acredita não prejudicar o coletivo.

    Ao sentenciado, coube-lhe uma colheita cheia de referências de sua vida fora da prisão, pois as oportunidades confiadas a ele, de cela em cela, já refletem o que ele viveu antes de chegar ali. Nem sempre por opção, pois, para quem morou cada vez mais com famílias precárias, sem princípios, sem bons exemplos de procedimento, vendo relações interpessoais se tornarem cada vez mais violentas, já se sabe: quando a cabeça não pensa, o corpo padece.

    Quando reflito na percepção dos familiares em suas visitas, lembro-me da frustração em seus rostos, afinal, o cansaço, o cheiro e a perturbação são quase impossíveis de serem escondidos ou camuflados. O resultado é sofrimento e prejuízo. A trajetória desse atleta extracampo pesa, ficando comprometida. Sua fama o precederá, fechando suas portas antes mesmo de nelas sonhar em bater.

    Dos paralelos concluo: proceda com a verdade, não desonre seus objetivos, sente-se sempre na última cadeira, aguardando o convite para mais à frente se acomodar. Apresse-se em ser solidário e prestativo, mas tarde em julgar, assim, quando você for julgado, colherá no mínimo uma decisão imparcial, justiça de fato. Todo ser humano tem igual poder de destruição, entretanto, o poder de construir, esse, sim, é peculiar e deve ser buscado com o cerne da mente.

    REFLEXÃO 4

    FOCO É FUNDAMENTAL

    Os fatos, quando generalizados, nem sempre trazem bons resultados ou perspectiva real do que se analisa. Individualizar o que quer que seja nos permite ser mais justos para darmos o mérito a quem merece, bem como o fardo do jugo ao merecido. Essa reflexão se faz valer quando lidamos com um grupo, uma instituição ou, até mesmo, em casa.

    Quando a criançada apronta suas peripécias, o mais levado e o mais velho sempre tomam as punições mais severas; contudo, a figura de autoridade, aqui representada pela mãe, tem total controle sobre a situação na hora de repreender seus rebentos. Habilidade nata, aperfeiçoada no dia a dia pelo convívio, trato e suor com suas crianças.

    No extracampo, os atletas, ao vislumbrarem o universo em que estão inseridos, todo glamour e assédio oriundos do mundo do futebol ficam, de certa forma, perdidos. Pensam ter total domínio da situação, mas, na verdade, estão em uma nuvem de fumaça e, se não forem conduzidos por bons gurus ou gestores, tendem a se acidentar, começando pela perda do foco no objetivo e na carreira. As redes sociais facilitam e potencializam essa possibilidade. A demasiada exposição contribui para diversos fatores que mexem com o emocional e, consequentemente, com sua produtividade.

    Pois bem, o atleta acaba por receber elogios, mas também pesadas críticas – sem ter condições psicológicas adequadas ou maturidade para ouvi-las. O narcisismo, também muito presente nesse campo, exige, quase involuntariamente, a admiração e os elogios. Quando se negam os elogios ao inexperiente atleta e em contrapartida se oferece uma enxurrada de críticas, a cabeça do jogador muda e as emoções podem vir a colapso.

    O mesmo ocorre com o atleta que se expõe, desnecessariamente, a ambientes de badalações em horas e momentos impróprios. A crítica resultará, no mínimo, numa perseguição desnecessária, bastante presente nesse universo glamouroso que, indiretamente, fomenta muitas mídias jornalísticas esportivas, blogs e as devastadoras mídias marrons.

    Como foi dito no início do capítulo, generalizar as coisas nem sempre é o correto. Nesse campo, vale muito mais ser original e discreto. Aguarde o resultado do que plantou; não ofereça o fruto que ainda é semente e tampouco quando as flores ainda não viraram frutos. Flores realmente encantam, embelezam, alimentam o ego, mas o resultado esperado do atleta é usufruir dos frutos que sua carreira proporcionará.

    Não são poucos os casos de jovens que tiveram um início promissor. Estes tinham tudo para serem reconhecidos atletas. Porém, mergulhados na nuvem de fumaça, deixaram-se levar por vaidades em demasia, badalações e redes sociais; conheceram o lado obscuro do glamour, desgastaram-se física e monetariamente; investimento equivocado do tempo. Caíram na tentação dos corpos esculturais e iniciaram o uso voluntário e involuntário de drogas, a começar pela bebida, passando pelas quase imperceptíveis drogas sintéticas.

    Não muito fora dessa realidade, vi e ouvi casos de jovens que hoje dividem uma cela fria que só é aquecida

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