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Corações Protetores
Corações Protetores
Corações Protetores
E-book589 páginas8 horas

Corações Protetores

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Sobre este e-book

Depois de ser sequestrada pelo Estripador de Corações de Chicago, Finn O'Flaherty é a única vítima que sobreviveu. Resgatada por seu irmão, Finn tem problemas para descobriu o que aconteceu, já que a amnésia a impede de identificar o assassino em série.


Caleb Sheppard está determinado a proteger Finn e suspeita que exista algo a mais no assassino. E uma questão o assombra: Por que ele a manteve viva? Com o Estripador em sua cola, eles correm contra o tempo, para recuperar as memórias de Finn, mantê-la longe do assassino e descobrir sua identidade.


O que Finn não desconfia é que Caleb e sua família escondem seus próprios segredos... Alguns que ela pode não aceitar.


Corações Protetores é um romance policial único, detalhado e recheado de tensão sexual.

IdiomaPortuguês
Data de lançamento5 de jun. de 2023
Corações Protetores

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    Corações Protetores - D.S. Williams

    UM

    Ela estava ali.

    Em algum lugar.

    Ele sabia disso.

    Embora a conexão não estivesse completa,

    ele tinha certeza absoluta de que a encontraria.

    E em tempo.

    Recostada no carro, eu observava a casa com indiferença, meus braços estavam cruzados firmemente em frente ao peito, em uma atitude de autodefesa. Não havia notado minha própria postura, mas Ash notara, envolvendo seus braços em meus ombros em um gesto reconfortante.

    – Eu sei que não é muita coisa... – Começou timidamente a falar.

    – Ficarei bem. – Lhe assegurei calmamente.

    A estreita fachada de dois andares se encontrava em um triste estado de abandono, o revestimento azul estava desbotado e precisava desesperadamente de uma demão de tinta, enquanto algumas telhas precisavam ser substituídas. Apesar de sua aparência desmantelada, a estrutura aparentava ser firme. Na porta da frente, a fechadura era reforçada.

    Como se estivesse lendo meus pensamentos, Ash seguiu em direção às janelas.

    – Elas são seguras, Finn. Pregos em todas as janelas, fechaduras em todas as portas. Tem um sistema de alarme instalado, que se conecta diretamente com o escritório do delegado na cidade.

    Por alguns minutos estudei a casa, enquanto Ash me observava discretamente. A tensão que se exalava de mim era quase palpável, meu stress e apreensão eram tangíveis e eu não podia esconder isso de um dos meus amigos mais queridos.

    – Venha, vou lhe mostrar o lugar. – Ele se ofereceu.

    Segui Ash pelas escadas e mantive-me atrás, enquanto ele abria a maciça porta de entrada, para então ser conduzida para dentro. Surpreendi-me ao ver o interior da casa. A sala de estar estava impecável, com uma mobília contemporânea, sofá de couro de cervo e duas poltronas combinando. Estantes de carvalho se encontravam recostadas, ladeando uma janela, que mostrava uma vista espetacular do Atlântico. Novas cortinas haviam sido perduras na janela e as paredes recentemente pintadas, deixando um leve cheiro de tinta, ainda perceptível no ar. À direita do corredor, havia uma sala de jantar, com móveis de faia, que levava a uma cozinha em péssimo estado. Embora os bancos estivessem gastos e os armários lascados, a cozinha era funcional. Em seguida, havia um solário, que levava a um terraço, que estava em péssimas condições, mas que Ash me assegurou ser sólida, mesmo com sua aparência deplorável.

    Ele me guiou para o andar de cima, até o quarto principal, que se encontrava confortavelmente mobiliado e o banheiro que fora recentemente reformado, com pintura, acabamento e azulejos novos. Os outros dois quartos estavam repletos de latas de tintas, pilhas de piso de madeira e destroços da reforma da casa.

    – O lugar estava se deteriorando quando herdei dos meus avós. – Ash passou o polegar pelo queixo pensativo, enquanto examinava o quarto principal.

    – Contratei empreiteiros para refazer o banheiro e alguns reparos estruturais e o resto arrumarei com o tempo. Assim que arranjar um fim de semana tranquilo, venho para cá.

    Olhei para ele e logo vi a incerteza em seus olhos. Rapidamente tranquilizei-o.

    – Está ótimo Ash. É perfeito.

    Ash passou os dedos pelo cabelo, olhando–me com desconfiança.

    – Fique o tempo que quiser Finn. Não venho muitas vezes, então a casa fica vazia, a maior parte do tempo. Você ficará segura aqui. – Seus olhos castanhos mostravam-se aflitos, com finas linhas que cruzavam suas sobrancelhas.

    – O sistema de segurança garantirá que ninguém entre.

    Ele percebeu a ansiedade em meus olhos, antes que eu pudesse disfarçá-la.

    – Eu agradeço. – Disse baixinho.

    Ash disse um palavrão quase inaudível, eu sabia que ele odiava me ver assim. Crescemos juntos e nos tornamos mais irmãos, do que apenas amigos. Ash, meu irmão Bryan e eu, morávamos na mesma rua quando crianças, crescendo nos subúrbios de Chicago. No começo Ash e Bryan se detestavam. Mas houve um pequeno desentendimento que resultou em uma troca de socos, em uma briga juvenil e eu acabei intervendo. Uma criança de 4 anos observando dois garotos de 14 anos. Foi um momento decisivo para Ash e Bryan. Transformar o ódio, em uma grande amizade, ligação que durou duas décadas.

    Até hoje, não consigo me recordar do motivo de não se gostarem, em primeiro lugar. Existiam diferenças culturais entre os dois, como por exemplo: Ash sendo de origem japonesa e Bryan e eu descendendo dos irlandeses. Eram amigos fisicamente desconexos, desde o início. Ash tinha a pele escura, cabelos negros como a noite e olhos castanhos com tom de chocolate. Bryan por outro lado, possuía pintas e olhos tão azuis quanto o céu e cabelos vermelhos flamejantes, feições típicas dos irlandeses. Para minha sorte, não possuo essa particularidade.

    Quando crianças, Ash e Bryan tinham porte e altura similares, mas ao completaram 15 anos essas semelhanças desapareceram. Bryan chegou a medir 1.92 metros, deixando Ash decepcionado com alguns centímetros acima de 1,55 metros. Apesar de suas diferenças físicas, ambos possuíam a mesma capacidade de atrair mulheres, já que tinham feições bonitas e corpos musculosos – conquistados com muitas horas de exercícios físicos.

    Essa amizade continuou através do ensino médio e faculdade, antes de se inscreverem juntos na academia de polícia. Solidificaram essa ligação conforme subiam de posição, até simultaneamente conseguirem promoções para se tornarem detetives. Seus caminhos se dividiram, quando Ash seguiu para a Divisão de Homicídios, enquanto Bryan se emaranhou no trabalho infiltrado, com a Divisão de Narcotráfico. Durante meses, ele desaparecia nas áreas mais áridas de Chicago, imergindo no submundo d´A Cidade dos Ventos.

    Senti uma dor familiar se contorcer em meu corpo, quando Bryan preencheu meus pensamentos. Quando olhei discretamente para Ash, vi minha dor refletida em seu semblante. Ele sentia uma agonia profunda, a dor de perder um amigo, que era quase um irmão. Comecei a tremer, apertando ainda mais meus braços, em frente ao peito. Era um ato comum ultimamente, uma forma de manter meu frágil estado psicológico inteiro.

    O som de uma buzina quebrou o silêncio, me fazendo pular de susto, a respiração ficando entrecortada. Ultimamente, eu odiava ruídos fora do comum, acontecimentos inesperados, que combinados deixaram meus nervos em um frágil estado. Ash sorriu puxando minha mão e a envolvendo entre as suas.

    – Não se preocupe, eu sei quem é. – Ele guiou-me para baixo e saímos para a varanda, onde dois carros pararam na entrada, atrás do Chevy Equinox de Ash.

    – Oi gente.

    Shep esticou–se ao sair do carro, os músculos de seu braço estavam tensos. Seus cabelos ondulados e escuros caíam em sua face, graças à brisa do mar que passava, realçando suas características marcantes.

    – Meu Deus, Ash! Você não poderia ter escolhido algum lugar mais longe de Chicago? – Shep me envolveu em um abraço amigável, beijando minha bochecha e passando a mão pelo meu cabelo.

    – Como você está docinho? – Ele questionou.

    – Estou bem. – Murmurei.

    – Não está não! – Shep respondeu suavemente. – Mas vai ficar Finn.

    Ele me deu um sorriso carinhoso, passando novamente a mão pelo meu cabelo. Mais parecia estar lidando com uma criança.

    – Você ficará.

    Lutei contra as lágrimas, para não chorar de alívio, quando vi minha melhor amiga Shelby, descer do segundo carro com seu namorado, Taylor Deveraux. Shelby correu ao meu encontro, incrivelmente graciosa com seu salto alto e me puxou para um abraço apertado, segurando–me por um longo tempo. Eu ainda tentava segurar as lágrimas, que ameaçavam correr pelo rosto. Assim que me recompus, olhei para ela incrédula.

    – O que está fazendo aqui?

    Shelby observou a velha casa e nem se preocupou a esconder o desdém, em seus olhos azuis claros.

    – Quando Ash insistiu em lhe trazer aqui, tive que vir, para ter certeza de que estava tudo bem. Voamos com Shep para Boston e de lá alugamos carros. – Ela enrugou delicadamente seu nariz, ao observar o exterior em ruínas.

    – Não é nenhum Hilton, com certeza.

    Mesmo a repreendendo, não pude deixar de sorrir.

    – Shelby, não seja indelicada. Está tudo bem!

    Shelby ergueu as sobrancelhas.

    – Esse é o fim do mundo. Não é?

    Ela olhou para Ash, que a observava com um sorriso malicioso. Eles se conheciam há anos, já que Shelby e eu nos conhecemos na escola. Ash já estava acostumado com sua personalidade ácida e comportamento mordaz.

    – Quanto tempo você vai fazê–la ficar em Caipirolândia, EUA?

    Não pude deixar de notar a troca de olhares entre Ash e Shep, ou a linha de preocupação que cruzou a testa de Shep, antes que pudesse disfarçar.

    – Até ter certeza de que ela está segura. – Ash disse com firmeza. – Agora pare de reclamar, Shelby. Em Massachusetts não se vive em uma bolha.

    Shelby segurou meu braço com firmeza, guiando–me para dentro da casa, enquanto passávamos pelos homens estupefatos a nos observar.

    – Eu decidirei isso.

    Shelby estudou a casa de cima a baixo, enquanto Ash e Taylor carregavam caixas para dentro, retiradas do porta–malas do carro de Shelby.

    – Trouxe tudo que achei que você fosse precisar, enquanto ficar aqui. – Disse ela, ao descer as escadas. – Livros, roupas e alguns dos seus DVDs favoritos.

    Ela chegou ao corredor, mostrando para Ash e Taylor aonde colocar as caixas.

    – Tudo para fazer você, se sentir em casa.

    Colocando suas mãos na cintura, ela olhou para Ash.

    – Sinceramente Ash, você não poderia ter colocado–a em um desses... Como se chama? Esconderijos?

    Ash jogou uma caixa no chão e se aprumou.

    – Não! É melhor Finn, ficar a quilômetros de distância de Chicago. Em um lugar que apenas nós quatro tenhamos conhecimento.

    Um longo silêncio se instaurou no grupo e eu respirei profundamente, tentando evitar o pânico que ameaçava tomar conta de mim. Era um sentimento com o qual nunca havia lidado até recentemente e que eu acho extremamente difícil de controlar. Passei a mão pelo peito, uma sensação de mal-estar passava no fundo do meu estômago.

    – Shelby, Finn estará mais segura aqui. – Ash afirmou com firmeza. – Agora, diga-me, quantas caixas você trouxe? Com certeza você deve ter pagado uma fortuna, por excesso de bagagem.

    Pelo seu tom de voz, estava claro que a discussão acabara, mas uma irritação aparecera rapidamente nas delicadas feições de Shelby, que com muito esforço ela acabou por reprimir.

    Um barulho na varanda de madeira chamou a minha atenção e Shep apareceu na porta, com o que parecia ser um enorme cachorro preto.

    – Finn, este é o Rebel.

    O animal me observava com seus olhos azuis, em sinal de alerta, erguendo uma orelha enquanto avaliava-me em silêncio.

    – Rebel. – Repeti vagamente.

    Rebel era enorme, muito maior do que qualquer cachorro, que eu já tenha visto. Tinha orelhas pontudas, pelos felpudos e negros e um par de caninos assustadores e parecia que me atacaria em um piscar de olhos.

    Shep sorriu.

    – Rebel pertence a um amigo meu e ele ficará com você, aqui na casa.

    Observei Rebel com desconfiança. Nunca tive um cachorro e esse parecia intimidador. Rebel me esquadrinhou meticulosamente, não parecendo estar impressionado de ficar ali.

    – Shep, não conversamos sobre isso e não acho uma boa ideia... – Ash disse, colocando as mãos no quadril e olhando o cão com cautela. – Isso é ao menos um cachorro?

    – Não! Ele é um lobo. E será fácil. Rebel ficará por aqui para vigiar Finn. Tudo que ela tem que fazer é alimentá-lo uma vez por dia, dar água limpa e deixá-lo sair quando precisar. É simples. – Shep afirmou. – Ficarei aqui esta noite, para ensinar a Finn os comandos, que ela precisa saber.

    – Comandos? – Questionei bruscamente.

    – Claro.

    Shep passou a mão na orelha do lobo, Rebel levantou o focinho, esfregando a cabeça em sua calça cáqui, como agradecimento.

    – Rebel irá protegê-la, Finn. Dê o comando e ele estraçalhará qualquer coisa que tentar chegar perto de você.

    Desabei no sofá, enquanto balançava minha cabeça em total descrença.

    – Shep, não posso fazer isso!

    Joguei as mãos para cima, sentindo-me impotente e olhei para Shep implorando por compreensão.

    – Mal sei o que fazer com um cachorro, imagine um lobo!

    Shep soltou a coleira e Rebel aproximou-se atravessando a sala, parando abruptamente, em frente da minha perna. Dando um forte latido, ele repousou sua cabeça em meus joelhos, olhando-me atentamente, enquanto esfregava o focinho contra minha coxa.

    Recostado contra o batente, Shep ria e o som ecoou pela sala.

    – Você pode não conhecer o Rebel, mas aparentemente, ele gosta de você.

    DOIS

    Estava sentada na beira da cama, escovando meus cabelos minuciosamente, para retirar todos os nós, que foram se enrolando ao longo do dia. Não era exatamente tarde, mas eu estava exausta e precisava escapar dos olhares preocupados e das constantes discussões, que ocorriam no andar de baixo.

    Joguei a escova no criado-mudo e com um suspiro puxei as cobertas para me deitar entre os lençóis de algodão, recostando a cabeça nos travesseiros fofos. Do quarto, o som do oceano arrebentando na praia, era perceptível. Isso era um lembrete, que me dizia o quão longe estava de casa. Em 24 anos, nunca saí de Illinois e agora aqui estou, do outro lado do país, em uma casa, uma cidade e um estado estranhos. Pela centésima vez, me perguntei se Ash realmente pensava que esta, era realmente uma ótima ideia.

    Deitada de costas, observei o teto, olhando seus desenhos no gesso, determinada a relaxar. Ash e Shep só queriam que eu ficasse bem e minha segurança, era de extrema importância para eles. No entanto, seus constantes avisos, me dizendo que eu ficaria mais protegida em Cape Washington, eram sufocantes. Era um constante lembrete, de como minha vida, virara de ponta cabeça, do por que Bryan estava morto. Fechei os olhos, o mais apertado possível, respirando profundamente para afastar as lágrimas. Derramei um milhão delas nas últimas nove semanas – o suficiente para encher um oceano. Mas elas ainda insistiam em cair, sempre que eu pensava em meu irmão. Ele fora meu protetor, meu amigo e perdê–lo, foi como perder uma parte de minha alma.

    Em algum lugar, estava a pessoa de quem estão me protegendo. O homem que assassinou meu irmão queria agora me matar. Ash pensava que seu plano era infalível: Trazer-me para cá, um lugar longe do território dos assassinatos, ideia que no momento, parecia uma proposta viável. Além das quatro pessoas lá embaixo, ninguém saberia onde me encontrar. Apesar da confiança de Ash, dúvidas insistiam a aparecer em minha mente, fazendo-me questionar, se o plano de Ash realmente teria um resultado positivo. O assassino era conhecido por sua inteligência, afinal, possuía a extraordinária habilidade de perseguir sua presa e capturá-la. Será que Ash e Shep conseguiriam ser mais espertos do que ele?

    Um som de porta sendo raspada deixou-me em alerta e ao perceber que o som vinha do lado de fora do meu quarto, prendi a respiração. Odiava me sentir assim nervosa. Estava ciente de todos os movimentos ao meu redor e me assustava com qualquer barulho fora do normal. Normalmente eu não era uma pessoa assustada e era confiante. Agora, me sobressalto com meras sombras, sinto medo do escuro e eu odeio isso. Durante semanas, dormi com a luz acesa e precisei me apegar a pequenas medidas de segurança, como forma de afastar as sombras. Sentia-me tola precisando de uma luz noturna, mas se eu a deixasse desligada, uma onda de pânico passava pelo corpo, fazendo-me suar frio. A escuridão era minha inimiga, um lembrete da impotência que senti, enquanto estava presa.

    Ouvi a porta sendo raspada mais uma segunda vez, seguida por um gemido baixo. Revirei os olhos com certa irritação. Rebel. O lobo insistia em me seguir para onde eu fosse fato que divertia Shep. Empurrei as cobertas para o lado e levantei-me, segui descalça até a porta, para fazer o cachorro ficar quieto. Antes que eu conseguisse calá-lo, Rebel passou pela estreita abertura da porta, entrando no quarto e seguindo para o tapete. Com um grunhido de satisfação, ele descansou a cabeça nas patas e fechou os olhos.

    – Espere um minuto... – Comecei a dizer, olhando para o lobo com certa estranheza.

    Shep com certeza estava maluco, pensando que eu manteria um lobo comigo. Era um animal selvagem, que não deveria nem estar em uma casa, imagine em um quarto.

    Rebel levantou sua cabeça observando–me por um momento, como se estivesse esperando por uma discussão. Quando nada mais foi dito, ele recostou sua cabeça nas patas e fechou os olhos novamente.

    Com um suspiro exasperado, observei o animal com certa suspeita. Ele parecia amigável, mas o fato de que ele poderia me atacar me assustava. Não tivemos nem um cachorro quando éramos crianças e nem em sonhos, pensei em ter um lobo de estimação. Especialmente um, que insistisse em dormir ao meu lado. Ele parecia gostar de mim agora, mas sua opinião poderia facilmente mudar, no meio da noite. Por um breve momento, pensei em pedir para Shep para vir buscá–lo, mas mudei de ideia. Shep só iria rir e dizer o quanto eu estava sendo ridícula.

    Passei por Rebel com cuidado, voltei para cama, observando o lobo cautelosamente. Pelo jeito, ele não parecia nem um pouco estressado, afinal ele se encontrava confortavelmente deitado e dormia profundamente. Por alguns segundos, desejei ser ele.

    O constante som de conversas fluía no andar de baixo e era perceptível, pontuada por risos. Shelby estava se divertindo, apesar de estar presa em Caipirolândia, como ela mesma batizara a cidade. Pessoalmente, gostei muito do lugar, afinal vivi em Chicago toda a minha vida e aqui era pacifico e silencioso em comparação. As ondas quebravam na praia, não havia barulho de trânsito, o que tornava o lugar é tranquilo e relaxante.

    Shelby amava ser uma garota da cidade, nascida em Chicago, certamente viverá lá toda a sua vida. Os lugares e sons do centro urbano são parte integrante de quem ela é e o que ama. Ela é muito mais cosmopolita do que eu, apesar de que acho Chicago, a cidade mais bonita do mundo. Na escola, ela era a garota popular, a melhor da classe e extremamente inteligente. Eu, era do estilo boêmio e estava mais interessada em artes, tendo o espírito livre, escolhi meu próprio caminho e não tinha interesse em seguir o mesmo caminho, que todos seguiam. Apesar de nossas diferenças, nos tornamos grandes amigas, passando a maior parte de nossa adolescência juntas. Todo fim de semana Shelby ficava na minha casa, ou eu na dela. Quando a família de Shelby saía de férias, eu era convidada a acompanhá-los e que, por sua vez, Shelby, passava horas na minha casa, aprendendo a cozinhar com a minha mãe e também costumava vir conosco, quando saíamos para acampar anualmente.

    Shelby se interessou por homens, muito antes de eu os descobrir e tinha feito de sua vida, o objetivo de encontrar um parceiro para mim. Sua frustração aumentava gradualmente, conforme eu rejeitava seus pretendentes, ao longo dos anos. Era comum me ver concordar em encontrá–los uma vez, para logo em seguida não querer vê-los mais. Aquilo que eu procurava não se encontrava na seleção de homens, que Shelby colocava em meu caminho. Não havia duvida de que eu teria um homem em minha vida, mas infelizmente nenhum dos pretendentes de Shelby, eram as pessoas certas.

    Pra Shelby, isso era tão fundamental quanto aprender o alfabeto, afinal ela adorava os homens e namorava-os, com frequência. Seu relacionamento com Taylor estava acontecendo há seis meses e esse era um novo recorde. Eles estavam extremamente felizes e de longe, era o casal mais atraente, que já vi. Shelby era alta, esguia, elegante e de beleza clássica. Com cabelos longos e uma pele de porcelana perfeita, ela poderia ter sido modelo se tivesse escolhido a carreira, porém sua obsessão era trabalhar com direito empresarial e era excelente nisso. Shelby e Taylor se conheceram em uma festa de Natal – ele era bombeiro, mas estava fazendo um bico como barman no evento. A atração foi imediata. Taylor com sua serenidade era o perfeito contraste, para a personalidade espirituosa de Shelby. Taylor era afro-americano, media 1,90 metros de altura, cabelos curtos e uma infinidade de músculos bem definidos. Eles faziam um casal chocante, já que a pele clara de Shelby contrastava com o tom chocolate de Taylor.

    Agora, estava convencida de que não havia perigo eminente de Rebel me atacar, então encostei a cabeça no travesseiro e continuei a observar o teto. Seria bom ter um homem na minha vida, alguém que gostasse de mim, alguém para partilhar a vida e amar. Não era exatamente por falta de tentativa, graças aos empurrões de Shelby, acabei saindo em encontros, excessivamente. Todos os homens com quem saí eram ótimos, mas nenhum deles tinha a fagulha mágica, que eu procurava.

    Com um suspiro, fechei os olhos, enquanto apertava minhas mãos em torno da cintura. O que eu estava fazendo? Por que estou pensando nisso, quando tenho problemas maiores para resolver? Minha honestidade forçou-me a confrontar a verdadeira razão, para isso estar grudado em meu cérebro. Ele se encontrava sentado na sala de estar.

    Caleb Sheppard.

    Conhecido como Shep entre seus amigos, Caleb tinha 39 anos, media 1,92 metros, músculos definidos, queixo forte e um excelente par de covinhas. Seus olhos eram verdes, a pele bronzeada, seus cabelos eram pretos e caíam no ombro. Ele e Bryan se tornaram amigos há seis anos e eu achei-o incrivelmente atraente, desde o momento em que o vi. E ele estava tão longe do meu alcance, que poderíamos estar vivendo em planetas diferentes.

    Virei de lado novamente, pensando no motivo de estar tão obcecada por Shep, (além da óbvia atração física), que era razão suficiente, para ficar apaixonada. Ele se contentava com qualquer aventura e tinha uma risada rouca. Ele vivia a vida ao máximo, tratava seus amigos com respeito e cuidava de sua família. Era divertido passar o tempo ao lado dele. Pelo que eu sabia, ele tinha pais que o adoravam, dois irmãos que foram abençoados com a mesma beleza estonteante e uma irmã mais nova, que ele vivia provocando impiedosamente. Administrava uma companhia de segurança privada, que estava bem estabelecida e era muito respeitada. E ele era brilhante nisso. Na verdade, ele era excelente em tudo o que fazia. Desde o início, eu o rotulei como o inalcançável e nossa relação sempre se baseou na amizade, tendo Bryan como denominador comum. Quando o conheci, eu tinha 18 anos, enquanto ele já estava 33 anos. Ele me tratava como uma irmã mais nova, fato que nunca mudou.

    Nos círculos sociais, nos víamos ocasionalmente, quando estávamos mesmos eventos, mas então, ele sempre aparecia com alguma garota, envolvida em seus braços. As mulheres sempre o rondavam, como abelhas em torno do mel. Mas ele não se interessava por relacionamentos. Os rumores ao longo dos anos, diziam que ele era um homem sexualmente apaixonante e que suas proezas no quarto atingiam proporções lendárias. Tanto Shelby, quanto Bryan faziam esse comentário de tempos em tempos e eu não duvidava de que era verdade. Ele era como Adônis e as mulheres caíam em sua cama, num piscar de olhos. Nunca disse a ninguém sobre meus sentimentos, nem mesmo para Shelby. Claramente eu não fazia o tipo de Shep.

    Não me entenda mal, não estou dizendo que não sou atraente. Descalça, meço 1,70 metros e tenho um corpo curvilíneo. Seios fartos, cintura fina e quadris curvados. Tenho mais curvas do que gostaria, mas não se pode ter tudo. Meu cabelo é longo, espesso e cai no meio das costas em suaves ondulações. Minha pele é rosada, meus olhos azuis, rodeados de cílios longos, negros e naturais. Minha mãe diz o quanto sou bonita, mas naturalmente ela é parcial. Eu jamais seria considerada bonita, não como as mulheres, com quem Shep saía. Ele claramente tinha um tipo: alta, esguia, de seios delicados, feições exóticas, longos cabelos loiros e bem cortados. Ele saíra com dezenas delas.

    A sensação de alívio era palpável, ao pensar em minha mãe. Ela estava livre de preocupações com a minha situação. Mudar-me para Cape Washington não era um problema, porque não havia ninguém, para sentir minha falta. Minha mãe estava em uma casa de repouso e não se lembraria se eu fosse visitá-la. Meu pai mora em Wisconsin com sua nova (muito mais nova) esposa e filhos e eu não o vejo há alguns anos. Papai estava muito ocupado, cuidando de sua nova família e nossa relação se reduziu a ligações intermitentes. Tenho uma variedade de tias, tios, primos, mas eles não se preocupariam, já que não têm notícias minhas há meses. A maior parte são parentes do meu pai e não se importam muito conosco, desde o divorcio dos meus pais.

    E Bryan se fora, deixando um vazio em meu coração e em minha vida. Para não pensar na morte de Bryan, voltei a pensar em Shep. Era absolutamente inútil pensar nele desta forma. Ele me via como uma irmã caçula e nada mais. Estava sendo protetor por que era amigo do Bryan e naturalmente estava preocupado com minha segurança. Nunca demonstrara qualquer interesse sexual, além dos elogios ocasionais ou as provocações inofensivas. E por que se interessaria? Shep se interessava por mulheres exóticas, sexy, mais parecidas com modelos.

    Não há nada particularmente chamativo em mim. O mais excepcional que fiz foi largar a faculdade e seguir meu próprio caminho, fazendo carreira como escultora freelancer. Criei meu próprio negócio: Finn Decorações. Vendia peças singulares, para uma loja de presentes em Chicago. Eu tinha um grupo de amigos leais, nunca viajei para muito longe de Chicago, nem tive problemas. Beber demais ocasionalmente e fumar um baseado esquisito, não eram nem de longe, considerado um estilo de vida ousado. Eu tenho alguns piercings e uma tatuagem. Minha vida poderia ser considerada banal.

    Até recentemente, afinal. Minha vida sofreu uma grande mudança no dia que fui sequestrada, pelo Estripador de Corações de Chicago.

    TRÊS

    Quando acordei, o sol nascia no horizonte, lançando sombras prateadas nas paredes do quarto. A casa estava silenciosa, apenas o barulho das ondas batendo contra as pedras, quebrava a quietude da manhã.

    Cautelosamente, observei que Rebel continuava no mesmo lugar em que se deitou, na noite anterior. Ao menos, não virei comida de lobo enquanto dormia. Quando percebeu que meus olhos estavam abertos, Rebel levantou-se, esticando suas patas dianteiras para espreguiçar–se, dando em seguida, uma remexida que se estendia até a cauda. Quando recostou sua cabeça no travesseiro ao meu lado, por uma fração de segundo, pensei em sair da cama, mas sua expressão era tão patética, que eu ri. Passei a mão em sua cabeça e para minha surpresa, descobri que seus pelos longos e negros eram incrivelmente sedosos. Rebel fechou os olhos, um ronco suave vinha de seu peito, o que me fazia remeter, a um grande gato ronronando.

    Por alguns minutos, continuei a fazer carinho em seu pelo, e divertindo–me com sua reação. Ele era mais parecido com um cachorro, do que eu esperava, já que claramente estava aproveitando, o reconfortante gesto de ser acariciado. Quando parei de acariciá-lo, ele olhou-me com reprovação e indignação.

    – Não posso passar o dia todo fazendo carinho em você. – Disse a ele.

    Joguei as cobertas para o lado, sentando-me na beirada da cama, bocejando e observando o quarto. Era indiscutivelmente um quarto masculino e exatamente o que eu esperava de Ash. Móveis de carvalho dominavam o espaço, a madeira escura contrastando com um acolchoado de estilo oriental em tons de verde e dourado. Um tapete verde pino e fofo combinava com as pesadas cortinas, em tom semelhante. Ash colocou uma grande pintura em cima da cama, uma afro-americana, com cabelos encaracolados e lábios sensuais e carnudos.

    Ash precisava de uma mulher em sua vida. Era um solteiro inveterado, desde que eu me entendo por gente, namorando constantemente, mas nunca se mantendo em um relacionamento sério. De todos os anos que eu o conheço, houve apenas uma namorada com quem manteve uma relação mais séria, o que levou a um casamento curto, há sete anos. Marianne era adorável, mas Ash era muito dedicado ao seu trabalho, preso a uma carreira que o fazia trabalhar por longas horas, a qualquer momento do dia. Era difícil para qualquer mulher, manter um papel secundário na carreira de um homem e apesar de Ash e Marianne tentarem manter o casamento, a situação ficara complicada depois de dois anos. Da ultima vez que fiquei sabendo, ela havia casado novamente e vivia no Colorado com seu marido e dois filhos. Ash não se relacionara muito desde a separação, ao invés disso, imergiu ainda mais em sua carreira. Era uma pena, porque ele era um homem maravilhoso e merecia um relacionamento amoroso, com uma mulher que o amava.

    Bryan tinha a mesma opinião sobre casamentos, insistindo que estar casada com um policial à paisana não era vida para uma mulher. Bryan namorava de tempos em tempos, desenvolvendo um terrível hábito de amar mulheres para então, terminar com elas, constantemente. Às vezes eu me perguntava se o trabalho infiltrado moldou essa personalidade em Bryan ou se era um traço, já existente dele. Ele nunca demonstrara desejo em ficar com uma única mulher e muitas das vezes fui eu, quem juntara os cacos. Agindo como o ombro amigo, para muitas das mulheres que costumavam se apaixonar por ele e se machucavam tentando obter mais de Bryan, do que ele estava disposto a oferecer.

    Pensei em Bryan, enquanto passava xampu pelo meu cabelo. Ele era mulherengo, mas não tinha intenção de machucar as mulheres, com que namorou. Na verdade, ele tinha uma extraordinária capacidade de tratar as mulheres com profundo respeito. Invariavelmente elas se culpavam pelo termino do namoro e milagrosamente nunca era a culpa de Bryan. As mulheres em sua vida estavam completamente convencidas, de que elas haviam cometido algum erro pelo caminho.

    Sentia uma falta tão intensa dele, que isso criara uma dor física, em meu peito. Ele sempre arranjara um tempo para me ver, apesar de estar muito ocupado com sua carreira e com um desfile interminável de namoradas. Aparecia pelo menos uma vez por semana, às vezes até dormia em meu sofá, por pura exaustão. A vida como um agente infiltrado era brutal, mas ele não conseguia viver sem a adrenalina. Não podia falar em que estava trabalhando, mas era claro que suas visitas eram encaixadas entre os casos, já que aparecia em horários inesperados. Por vezes, aparecia às duas da manhã, mas ele sempre viera e se importava comigo e me apoiava.

    Trabalhar infiltrado era perigoso na maior parte do tempo, mas isso não o matara. Bryan perdeu sua vida tentando me salvar e por decorrência, isso criou sentimento de culpa tão intenso, que pensei que meu coração, iria se partir. Se eu não tivesse me tornado uma vítima do Estripador, Bryan ainda estaria vivo.

    Desliguei as torneiras, sai do chuveiro e peguei uma toalha, revirando os olhos para Rebel, que se encontrava deitado no chão de ladrilhos.

    – Isso tem que parar. – O alertei, esfregando a toalha em minha pele molhada. – Shep pode pensar que preciso de resguardo... De um lobo, mas certamente não preciso de você no banheiro.

    Rebel olhou para cima e latiu uma vez, antes de deitar a cabeça sobre as patas. Vesti meus jeans, um suéter vermelho de cashmere, coloquei meias e tênis antes de descer. Meus esforços para descer silenciosamente, foram inúteis quando Rebel correu escada abaixo, fazendo barulho com suas garras pela madeira. Um rápido olhar pela sala e tive certeza de que Ash ainda dormia no sofá. Shelby e Taylor decidiram ficar em um hotel, mas não havia sinal de Shep. Talvez ele tivesse decidido ficar no hotel também.

    – Bom dia docinho. Quer café?

    Assustei–me com a abrupta aparição de Shep, pela porta da sala de jantar. Seu peito estava nu, usava apenas uma calça azul desbotada, que ficava baixa em seus quadris. Meus hormônios ganharam vida, ao olhar para sua musculatura bronzeada, realçados por mamilos marrons escuros, que capturaram minha atenção imediatamente. Ele tinha uma tatuagem acima do mamilo esquerdo, uma tribal que se expandia no ombro e descia para o braço. Respirei fundo e me forcei a olhar para cima, encontrando seu olhar, que brilhava com divertimento.

    – Sim, obrigada.

    Shep voltou para a cozinha e eu segui atrás, tentando recuperar o controle de minhas reações. Mas observar os músculos bem definidos de suas costas, não estava exatamente ajudando. Resisti ao impulso de esticar a mão, para tocá-lo. Fechei as mãos nos punhos, sentei em um banquinho, encostado no balcão e assisti Shep, servir café em uma caneca e adicionar leite, antes de entregá–lo para mim.

    – Dormiu bem?

    Dei de ombros, tomando o café quente.

    – Dormi tão bem quanto sempre.

    Shep levou sua própria caneca aos lábios, bebendo um grande gole antes de falar.

    – Ficar longe de Chicago, pode ajudar. Não gosto do plano de Ash, mas pode te ajudar a relaxar.

    – Por que você não gosta do plano de Ash?

    – Não fico confortável com você aqui sozinha. Por isso trouxe Rebel, assim fico mais sossegado, sabendo que você tem ajuda.

    – Ninguém sabe que estou aqui. Certamente é mais seguro do que ficar em Chicago.

    Shep franziu o cenho, fazendo um músculo em seu queixo vibrar.

    – Espero que sim, docinho. Esse canalha é esperto. Gosto de pensar que estamos um passo à frente dele, mas até ele estar preso, não vou relaxar.

    – Obrigada por cuidar de mim. – Disse calmamente.

    Shep sorriu disfarçadamente.

    – Devo isso ao Bryan, Finn. Cuidar de você quero dizer. Ele era um bom homem.

    Segurei a caneca, para aquecer minha pele.

    – Ajudaria, se eu conseguisse lembrar algo útil.

    – Ainda não consegue se lembrar dos detalhes?

    Sacudi minha cabeça desanimadamente. O médico disse que eu sofria de amnésia histérica, seja lá o que isso significasse. Nunca tive amnésia histérica e agora havia enormes partes, desaparecidas da minha memória. As primeiras horas, em que fui sequestrada eram claras para mim, mas depois, não consigo lembrar nada. Flashes no máximo.

    O dia em que fui sequestrada havia começado normalmente bem. Comecei fazendo entregas, levando peças finalizadas para a lojista, que as vende. Dia de entrega era sempre agitado, mas eu preferia fazê-las em um único dia na semana, deixando o resto da semana livre para esculpir e dar aulas na faculdade da comunidade local. Depois de parar, para comer com um casal de amigos, fui para casa, com a intenção de trabalhar por uma ou duas horas, antes de me preparar para um encontro. Shelby, a super otimista, me apresentara um cara novo e ele iria me levar para jantar. Chegando ao meu prédio, entrei no estacionamento, parando tempo suficiente para juntar alguns papéis e pegar minha bolsa.

    Saindo do carro, mergulhei em um pesadelo. Alguém apareceu atrás de mim, segurando um pano em meu rosto, que exalava um cheiro doce e então em segundos, perdi minha consciência.

    Quando acordei, não conseguia enxergar nada, na escuridão absoluta. Estava convencida de que tinha sido vendada. Meus braços estavam presos acima da cabeça. Apalpei desajeitadamente com os dedos tremulo até a extremidade e descobri que meus pulsos estavam presos em algemas, que se ligava a uma argola de metal logo acima. Não era exatamente uma luz no fim do túnel, mas com o passar do tempo consegui aguçar meus sentidos e consegui ouvir o sutil cair de pingos d´água. O ar gélido e o cheiro de terra molhada davam a impressão de que poderia ser em uma caverna. Mas se fosse uma caverna, provavelmente eu estaria nas entranhas da terra, dada a ausência total de luz.

    Demorei um pouco, para perceber que não estava sozinha. Gemidos fracos e choramingo eram difíceis de distinguir no começo, mas conforme iam ficando mais fortes, eu gritei, tentando chamar sua atenção. Quando ela começou a falar, suas palavras me enregelaram até a espinha e então ficou exatamente claro, quão perigosa era nossa situação.

    Seu nome era Bonita Templewood e com a voz fraca, ela me contou que também fora sequestrada. Bonita não sabia dizer há quanto tempo estava presa, apenas sabia que fora antes de mim.

    – Ele te machucou? – Ela perguntou fracamente.

    – Meu peito dói, acima dos meus seios. – Confirmei assustada com o contexto da pergunta.

    – Nos marcar como gado, é a primeira coisa que ele faz. – Bonita disse amargamente. – Te marcar, como propriedade dele. – Houve uma longa pausa e a ouvi tossindo violentamente, antes de falar novamente. – É um coração.

    Meu sangue congelou nas minhas veias e um tremor subiu em meus membros, que lutei para controlar. Já ouvira falar no Estripador de Corações de Chicago. Era impossível, não ter ouvido sobre sua violência. Por mais de 18 meses, ele vem sequestrando prostitutas por toda a cidade. Eram encontradas exatamente sete dias depois de desaparecerem, jogadas nas ruas de Chicago, com seus corpos nus e mutilados. Cada uma delas era reconhecida como uma vítima do Estripador, pelo coração gravado no peito, acima do seio esquerdo. Era a única marca distinguível, nos corpos sadicamente dilacerados. As reportagens sugeriam que os ferimentos eram infligidos nas vitimas, enquanto vivas, sendo torturadas durante dias, até que o Estripador, cansado de seus jogos doentios, resolvesse tirá–las de seus sofrimentos.

    – Aonde ele te sequestrou? – Bonita perguntou. – Eu estava trabalhando na Rua 49, esquina com a Cromwell.

    – Ele me sequestrou no meu apartamento.

    – Ei garota, você não estava trabalhando nas ruas? – Bonita exigiu saber.

    – Não sou... Nunca fui... – Eu estava lutando contra meus pensamentos, enquanto o pânico crescia.

    – Você não é prostituta? Que droga. Isso não faz sentido. – Bonita disse incrédula, sua voz soara um pouco mais forte. – Por que você seria uma vitima dele?

    – Eu não sei. – Admiti.

    – Bem, seja lá qual for a razão, sei de uma coisa. Meu tempo está quase no fim.

    – O que? O que isso significa? – Exigi saber, testando as amarras novamente.

    – Ele sempre sequestra uma nova garota, quando está para matar, a que já tem. Tenho apenas um ou dois dias. – Bonita disse. – Todo mundo tem sete dias, é o que disseram nas reportagens.

    – Bonita... Eu sinto muito. – Era uma resposta fútil, mas estava me esforçando para compreender a enormidade da situação.

    – Não sinta garota. – Bonita respondeu calmamente. – Ficarei feliz em morrer.

    Era impossível imaginar o que Bonita sofreu. O que pode ser ruim o suficiente, para fazer a morte ser a melhor opção? Imagens horríveis invadiram a minha mente, conforme ia me recordando de fragmentos, das noticias nos jornais.

    Não era fácil para se calcular o tempo, na escuridão total. A sensação era que horas, haviam se passado (ou talvez fossem minutos), então o som de passos pesados, chegaram aos meus ouvidos. Eram passos dado com cuidado e firmeza, conforme iam se aproximando. O som ecoava assustadoramente e meu coração batia, no ritmo do tremor dos meus dentes. Os sons daqueles passos eram a coisa mais assustadora, que eu já ouvi. Bonita começou a choramingar, o som congelava na escuridão total.

    O que se seguiu não precisava de explicação e preencheu meu sono com pesadelos. Bonita gritou e repetidamente implorou por misericórdia, conforme o Estripador fazia coisas inconcebíveis em seu corpo e sua voz tinha um tom gutural. Ele começou a dizer que o que estava fazendo — como se estivesse narrando um documentário pervertido. E em seguida, descreveu o que faria comigo.

    Lágrimas escorriam pelo meu rosto e sangue por meus antebraços, conforme puxava as algemas, em uma tentativa desesperada de escapar. Os gritos de Bonita iam diminuindo progressivamente, depois sendo substituídos por gemidos de misericórdia e por fim, o silêncio. Perguntei-me se ela estava morta, se ele a assassinara. O terror encheu meu peito, eu sabia que era a próxima.

    O som de passos ritmados recomeçara e dessa vez vinha em minha direção, mas sem pressa. Tentei arrancar as algemas, com o pânico me invadindo completamente. Mãos frias acariciaram meus braços e eu gritei. Apesar de não conseguir vê-lo, pude senti-lo perto de mim e minha pela se arrepiou. Ele passara as mãos lentamente e sistematicamente sobre meus ombros e braços, antes de acariciar meus seios.

    – Você é minha princesa Finnola. – Ele murmurou, enquanto se esfregava contra meu corpo. Senti a bílis, me sufocando. – Você será minha. Para sempre!

    QUATRO

    Ele olhou para o uísque

    dourado, âmbar e brilhante

    no fundo do copo.

    Concentrou–se em

    seu coração, seu amor e sua conexão com ela.

    Finnola. Onde você está?

    – Finn! Está tudo bem. Você está segura agora. Ele não pode mais machucá–la.

    A voz ansiosa de Shep me fez voltar ao presente, em um piscar de olhos e quando dei por mim, estava firmemente enrolada em seus braços. Respirei com dificuldade, minhas bochechas estavam molhadas de lágrimas. Shep afastou-me, para colocar suas mãos carinhosamente em meu rosto.

    – Está tudo bem. Acabou, baby. – Passando a mão em meu rosto, ele enxugou minhas lágrimas, mas a fúria era evidente, em seus olhos surpreendentes verdes. – Não vou deixá-lo te machucar novamente, Finn. Nunca mais.

    Inalei tremulamente o ar, sentindo o cheiro de sua pele e imaginando qual colônia Shep usava. Independente de qual fosse, eu adorei. A mistura sutil de pinho e bergamota me acalmava e afastava o horror de tudo que ouvi e imaginei na escuridão.

    – Eu prometo. Não vou deixá-lo chegar perto de você. Juro que irei protegê-la. – Shep disse bruscamente, ainda enxugando minhas lágrimas.

    Por um longo momento, fiquei apenas observando-o me acalmar. Shep olhou-me e a fúria em seus olhos desapareceu, sendo substituída por um sentimento, que eu não compreendia. Inalei o ar tremulamente, enquanto observava Shep engolir em seco, sua atenção mudando de foco, de meus olhos, para meus lábios. De repente, Shep soltou um palavrão, virando-se abruptamente, colocando a bancada da cozinha, entre nós.

    – Péssima ideia. – Ele murmurou. – Tome seu café, gatinha.

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