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Para uma primeira história da Harmonía: das Musas à Música
Para uma primeira história da Harmonía: das Musas à Música
Para uma primeira história da Harmonía: das Musas à Música
E-book516 páginas6 horas

Para uma primeira história da Harmonía: das Musas à Música

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Sobre este e-book

A harmonía tem uma grande relevância para a história da música ocidental. Contudo, percebe-se que havia uma lacuna nos estudos que se preocupam com a elaboração de uma genealogia desse termo. Sendo assim, a obra, tornada agora pública, na forma de livro, propõe uma leitura que visa ao rastreamento dos usos mais arcaicos da harmonía até o seu sentido propriamente musical. O intuito do estudo foi fazer uma varredura dos usos do vocábulo harmonía, buscando interpretar, caso a caso, os problemas que apareceram em seu percurso. Seguindo esse caminho, foi possível observar seu uso predominantemente verbal na Ilíada e na Odisseia de Homero; sua inauguração como nome de uma deusa na Teogonia de Hesíodo; sua presença contínua e necessária na descrição fragmentária de Heráclito e de Empédocles; sua apropriação pela matemática que a conduziu para uma explicação exata das escalas musicais nos fragmentos de Filolau e Arquitas; seus usos nos diálogos compostos por Platão, nos tratados de Aristóteles; e suas ocorrências presentes no material que nos restou de Aristóxeno. Logo, o objetivo de garimpar e de reconhecer as semânticas da harmonía por diferentes meios de expressão foi percorrido através de um recorte específico e da análise filosófica de suas ocorrências, levando em consideração seus mais variados modos e tempos verbais e percebendo seus diferentes traços no processo de declinação nominal.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento26 de jun. de 2023
ISBN9786525284385
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    Para uma primeira história da Harmonía - Jonathan Almeida de Souza

    1. A ORIGEM DA HARMONÍA NA ANTIGUIDADE GREGA: ENTRE HOMERO E HESÍODO

    Desde os primeiros momentos em que o pensamento foi disposto em forma de texto/poesia no Ocidente, a palavra harmonía foi apresentada por diversos modos e múltiplos significados. A Grécia dos tempos homéricos e hesiódicos foi um terreno fértil para o desenvolvimento e múltiplos enraizamentos deste termo, cujos frutos e flores colhemos até os dias de hoje, tanto na forma mítico-poética, como na forma desencadeada dela, isto é, na filosofia. Perdendo em precisão para ganhar em didática, poderíamos, grosso modo, dividir as formas de literatura grega que aparecerão neste trabalho em dois grandes eixos: por uma via, a literatura religiosa ² (mito-poética), por outra, a literatura filosófica. Estas duas formas, a nosso ver, se entrelaçam em um diálogo polêmico, isto é, conflituoso. A filosofia estabelece uma relação de crise com a poesia e esta, em um certo momento, queima ³ a figura do filósofo no teatro. ⁴ Nessa mesma senda, o termo harmonía participa destes dois campos de pensamento. Nas palavras de Radovan Rybář (2011, p. 19, tradução nossa, grifos do autor) que, ao estudar a origem da medicina europeia na Antiguidade, afirma que "a ideia de harmonia teve um papel significativo no pensamento grego antigo (harmonia significa conexão, acordo, consonância, concordância). Essa ideia testemunhou a regularidade e a integridade de todas as coisas e todos os seres, junto com seu conteúdo e importância" ⁵. Sendo assim, o objetivo deste capítulo é observar a presença do termo na literatura mito-poética grega, especialmente nas obras de Homero e Hesíodo.

    No imenso espaço que cobre a religião grega no interior da cultura helênica antiga, este termo caminha tanto sobre as trilhas do laico como do religioso. Na Ilíada e na Odisseia de Homero, no mais das vezes, a semântica da harmonía é coberta ideia de justaposição, encaixe. Nestes usos, comuns à confecção de artefatos de guerra e de apetrechos utilizados no interior da comunidade, podemos observar que há uma compreensão deste termo, em suma, na vida prática e cotidiana. Como, por exemplo, neste trecho da Ilíada (III, v. 300-333, grifo nosso):

    Páris, senhor de Helena — cabelos-lindíssimos,

    reveste-se da esplêndida armadura. As cnêmides,

    primeiro, ajusta em torno às pernas com fivelas

    de prata.

    Desde este primeiro aparecimento, é observável a relação de contrários. Mesmo que pareça estranho à nossa audição e sensibilidade, no que diz respeito à nossa percepção de mundo, todo movimento no cosmo requer, como necessidade primeira, uma contradição, quer dizer, um ponto fixo e um ponto móvel que geram, nessa conjugação, uma tração que coloca o todo harmônico em movimento. Afirmar isso significa dizer que a coerência do cosmo se desvela nesses movimentos contrários, por contradição. Quando esta condição ocorre de modo coeso, a harmonía, ou o ajuste, é factível. Mesmo parecendo óbvio e irrelevante tal questão, podemos pensar ainda nas peças do brinquedo de encaixar peças, onde crianças (e adultos) podem construir microcosmos e, com isso, realidades, mesmo que imaginárias. Algo parecido com essa imagem, pode ser vista no Canto V da Odisseia de Homero (v. 162-164, grifo nosso)⁷:

    Vamos, corta grandes troncos e com bronze constrói (harmózeo)

    larga balsa; e o deque prende (pē̂xai) sobre ela,

    ereto, para que te leve pelo mar embaçado.

    Ao ler atentamente os versos da Odisseia, supracitados, vemos que Homero usa duas palavras com campos semânticos que têm pontos de tangência, a saber, harmózeo e pē̂xai⁹. Ambas as palavras podem significar união, encaixe. A saída encontrada por Trajano Vieira foi usar um único termo (fixar) para resolver este problema semântico. De modo diferente, Christian Werner (HOMERO, 2014b) escolhe para harmózeo a ideia de construção, e para pē̂xai, o verbo prender. Entretanto, haveria, para além da fácil resposta justificada na métrica, algo na percepção de um grego que diferenciaria os usos semânticos nesses dois verbos (harmózeo e pē̂xai)? Que efeitos empíricos seus usos poderiam efetivamente causar? Na tentativa de esboçar uma resposta para estas questões e lançando mão das interpretações presentes nas traduções, pensamos que diferenciar os dois termos seja fundamental para a compreensão do termo harmonía. Por conseguinte, levando em consideração que as duas palavras possuem um semelhante tronco semântico, podemos, mesmo que de modo especulativo, afirmar que pē̂xai, tal como harmonía, significa pregar, prender, fixar. Mas a harmonía tem como necessidade construir algo a partir de partes, não só diferentes, mas contrárias. A harmonía prega, prende e fixa com a finalidade de fazer tornar alguma coisa existente, enquanto pē̂xai prega, prende e fixa sem uma necessidade de formar algo, embora possa carregar o sentido de fazer uma manutenção em um objeto já harmonizado e não necessariamente construir algo. Os encaixes, isto é, as harmonizações de cada peça, fazem-se, necessariamente, de modo contraditório para a construção de um todo. Isto, a nosso ver, simboliza-se com a seguinte sentença: a contradição é a condição primeira para o movimento da vida.¹⁰

    Em nosso método de garimpo das palavras, ainda na Ilíada e na Odisseia, encontramos, além do que foi até aqui apresentado, a harmonía como radical de um nome próprio. Entretanto, isso aparece como um problema em nosso estudo. Ao analisarmos o original grego desta ocorrência, temos a seguinte estrutura:

    Μηριόνης δὲ Φέρεκλον ἐνήρατο, τέκτονος υἱὸν

    Ἁρμονίδεω, ὃς χερσὶν ἐπίστατο δαίδαλα πάντα

    τεύχειν: ἔξοχα γάρ μιν ἐφίλατο Παλλὰς Ἀθήνη:¹¹

    O problema, como observado, ocorre entre os versos 59-60. Melhor dizendo, entre os termos téktonos hyiòn Harmonídeō. Como interpretá-los? Seria um único nome? A escolha de Haroldo de Campos (HOMERO, Ilíada, 2002, grifos nossos) parece indicar seguir por esse caminho:

    Meríone mata Féreclo, filho de Técton

    Harmônide¹², artesão de lavores dedálicos,

    a quem Palas Atena muito amava.

    Para Haroldo de Campos, na tradução acima, téktonos hyiòn Harmonídeō traduz um único nome, a saber, Técton Harmônide. Por outra via, na tradução de Frederico Lourenço (HOMERO, Ilíada, 2013, grifos nossos), temos, para este mesmo excerto, as seguintes palavras:

    E Meríones matou Féreclo, filho de Técton, filho de Hármon,

    cujas mãos sabiam fabricar toda espécie de espantoso

    artefato; é que muito o tinha estimado Palas Atena.

    Nesta última interpretação, vimos que Hármon (escolha do referido tradutor para a palavra Harmonídeō) é pai do pai, ou seja, é avô de Féreclo. Sendo assim, Harmonídeō e téktonos seriam dois personagens distintos. Ao se deparar com este problema, Liović (2012, p. 74-75, tradução nossa) expõe sua compreensão da seguinte maneira:

    Mesmo que Harmônides seja entendido como nome¹³ de seu pai, a sentença que segue, ‘que sabia como criar todas as coisas com suas mãos’, descreve claramente o significado de harmózō (unir), um verbo que expressa uma função de téknon. Nenhuma similaridade fonética é apresentada; contudo, a interpretação poética é demonstrada pela relação semântica e posição sintática das palavras-chave incluídas.¹⁴

    Apesar de todas as complexidades na compreensão dos termos em questão, vemos que há no Harmonídeo a capacidade técnica da harmonía, isto é, a criação. É desse modo que não podemos perder de vista a ideia presente no ideário arcaico da harmonía, a saber: a composição de um todo por partes que se contrapõem/contradizem. Esse é um forte caráter empregado no conceito de harmonía, e podemos, deste modo, concordar que estão incorporadas nas relações construtivas a partir de partes opostas. Se assim for, o termo téktonos cumpriria um papel interessante, uma vez que um de seus significados, carpinteiro,¹⁵ é justamente uma profissão que usa de habilidades humanas para fazer harmonizações em objetos que, em alguma medida, se contrapõem. No verbete apresentado por Chantraine (1977, p. 1100, tradução nossa, grifo nosso), ao analisar este termo, vemos que "o grego moderno manteve ‘carpinteiro’ para tékton"¹⁶. Portanto, uma tradução que não encontramos, mas que pode ser também uma possibilidade que, a nosso ver, não afetaria o sentido resguardado pela sentença e no todo do texto homérico, é por nós aqui proposto como: filho do carpinteiro Harmônides.¹⁷ Contudo, Chantraine continua afirmando, ao citar como exemplo este mesmo trecho da Ilíada que ora analisamos, que o termo Tékton é "nomes de homens (…): a partir do qual o sobrenome Tektonídes¹⁸ (Od. 8, 114)"¹⁹ é originado. Portanto, são aceitáveis as múltiplas possibilidades de traduções para estes versos.

    Mais um exemplo de tradução desse trecho da Ilíada pode ser encontrado no modo como Carlos Alberto Nunes (HOMERO, 2011, v. 59-61, grifos nossos) os interpretou. Para este tradutor, também se trata de um único personagem, como podemos ler:

    Foi por Meríones morto o nascido de Téctone Harmônida,

    Féreclo, em todas as artes manuais mui notável artífice.

    A de olhos glaucos, Atena, especial atenção lhe dicava.

    Podemos concluir, nesta mesma senda, que, independentemente da forma com que os intérpretes traduzem estes versos, há uma forte relação entre os dois termos. Como já exposto, aquele que é capaz de criar coisas materiais só é capaz de fazê-lo até o fim, isto é, sem destruir o material que está trabalhando, se tiver a habilidade (ou a técnica) de harmonizar. Logo, estas duas palavras são úteis para mostrar que não soaria estranho para um grego antigo a ocorrência de um nome — uma vez que os nomes eram significativos para aquela cultura²⁰ — que unisse harmonía e carpintaria, dado que esta exemplifica aquela e aquela é condição fundamental para esta.²¹

    Há um outro uso deste vocábulo, em sua forma verbal, na Ilíada. No Canto XVII, verso 210, Homero (2002) mostra a seguinte imagem:

    o Croníade, ajustando o arnês ao corpo de Héctor.

    Bélico, Ares Eniálio infunde-se em seus membros;

    dá-lhe ardor e vigor.²²

    Nestas linhas, são expostos os detalhes que nos versos anteriores não haviam sido discriminados. Talvez, se parássemos nos excertos até aqui mencionados, poderíamos incorrer em uma compreensão fissurada sobre o fenômeno da harmonía e, por extensão, numa limitada visão acerca do que este termo imprime tanto à realidade, como aos possíveis humores que ela pode proporcionar a partir de sua fenomenalização. Como vimos nos exemplos coletados até aqui, Homero apresenta, no mais das vezes, a ação humana como capaz de ter como resultante uma harmonía, ou seja, a técnica²³ humana tem em potência a forma harmônica; sendo que neste último excerto, a harmonía está na ação dos deuses, ou seja, a presença da harmonía como resultado das atitudes dos deuses.

    A harmonía, portanto, não estaria limitada apenas às ações humanas, como dissemos, mas em tudo o quanto resulta em uma tensão de contrários, cuja resultante é a formação seja do próprio cosmo, pelos deuses; seja a produção de artefatos no mundo, por humanos. Tanto a ação do humano quanto a dos deuses, cada um a seu modo e com a sua potência específica, tem como possibilidade uma resultante harmônica. A diferença estaria na certeza de que, no modo como os gregos experenciavam a sua religiosidade, os deuses não falham jamais. As potências do divino resultam sempre na harmonização do fenômeno provocado pelos seus poderes. O homem, por sua vez, pode ver em sua técnica as suas tentativas de executar algo a fim de que se tornem harmonizadas. Enquanto os deuses não tentam fazer, pois apenas e simplesmente fazem; o humano tenta fazer e este fazer pode ou não harmonizar.²⁴ Outro detalhe que podemos conjecturar, a partir deste exemplo, é que a visão de mundo se transforma partindo daquilo que é a ciclicidade conhecida da natureza para aquilo que tange o campo dos fenômenos, marcados pela total independência e impossibilidade da ação do humano. Ou seja, são nestes tipos de fenômenos, tal como a aquisição de coragem, ou a agitação manifesta no devir daquele que está apaixonado, que se estabelece o harmonizar dos deuses, isto é, no intercurso da impotência do humano.

    Um outro uso da harmonía, como verbo, na Ilíada, ocorre na forma epharmózō (ἐφαρμόζω), oriundo da forma substantiva epharmogḗ (ἐφαρμογή), que significa ajuste.²⁵ Neste caso, quando observamos o uso do verbo peiráō (πειράω), que quer dizer tentar, esforçar-se, a nossa interpretação acerca da harmonía nos homens e nos deuses é reforçada, pois, no contexto apresentado por Homero, Aquiles tentará uma adaptação do presente de Hefesto. Deve ser levado em consideração que mesmo que um deus produza algo para um fim determinado, a relação do humano com a dádiva só pode ocorrer em parte. O divino em tudo que produz só pode fazer por inteiro e por completo; o humano tenta adaptar-se a isso. O verbo acaba por ter um sentido de experiência, entretanto, não no sentido caro à filosofia no que se compreende com o termo empeiría (ἐμπειρία), mas no sentido de traquejo, manuseio. Em suma, o sentido atribuído a este uso, localizado neste recorte da Ilíada, é de que o humano manipula o presente dos deuses para fins próprios, para ver se se harmoniza sobre si mesmo (αὐτοῦ — autoû) algo que não foi manufaturado por esse mesmo si. Vejamos como isso se evidencia no interior da própria Ilíada (XIX, v. 375-385):

    Quando aos nautas, no oceano, alumbra um resplendor

    de fogueira a queimar no píncaro do monte,

    em sítio solitário, a procela os impele

    a contragosto ao mar piscoso, para longe

    dos amigos; assim no éter raiava o escudo

    dedáleo-belo do Aquileu. Ele ergue e põe

    sobre a cabeça o sólido elmo tetracórnio;

    lampeja como estrela o casco, cauda-eqüina,

    e as crinas de ouro ondulam ao redor do topo,

    áureo tufo que Hefesto lhe apusera. Aquiles

    prova se o arnês se adapta aos seus membros, flexível.²⁶

    Podemos observar um outro uso, desta vez na forma nominal do termo, diferentemente das formas apresentadas até aqui, que carrega um sentido diferente para o termo harmonía. Homero coloca na boca de Héctor a palavra harmonía (ἁρμονιάων) com o intuito de construir uma semântica que se correlaciona com a ideia de juramento. Segue, portanto, uma conversa de Héctor e Aquiles:

    Elmo-coruscante, Héctor disse ao Peleide, indo-se-lhe

    de encontro, e se acercando: "Já não mais, Aquiles,

    como até agora, hei de temer-te. Por três vezes

    fugi em torno a megalópolis de Príamo,

    para não enfrentar-te: faltava coragem.

    O coração, agora, incita-me a arrostar-te,

    sendo morto, ou matando-te. Mas invoquemos

    os deuses, testemunhas, fiadores do pacto (harmonía)

    que ora faremos: ‘Caso Zeus Pai me dê forças

    e eu, da psiquê te prive, não ultrajarei

    teu corpo; teu cadáver, despojado de armas,

    aos teus entregarei. Faze o mesmo comigo.’"

    O Pés-velozes de través o mira e fala:

    ‘Deletério Héctor! Não me arengues sobre pactos (synemosýne).

    Não há juras (hórkia) de paz fiéis entre homem e leão,

    nem o lobo e o cordeiro são concordes de ânimo;

    coisas más, pensam uns dos outros, todo o tempo.

    Assim, não é possível nos amarmos nem

    trocar juras fiéis, antes que um de nós tombe, Ares,

    porta-adarga aguerrido, saciando de sangue.

    Lembra teu valor. Deves ser um lança-dardos

    e também um guerreiro de talhe leonino.

    Não tens escápula. Com minha lança, Atena

    te domará. As dores todas pagarás

    que me destes, matando tantos companheiros.’" ²⁷

    Por um lado, Homero não enreda a boca de Héctor com o termo hórkia (ὅρκιον — hórkion), nem com o termo synēmosýnē (συνημοσύνη), ambos com o mesmo campo semântico de juramento, para tratar do referido pacto. O que a narrativa nos mostra é que o termo empregado se desvela, na interpretação do tradutor, como uma possibilidade de significação em vernáculo português para o termo harmonía. Por outro lado, faz a boca de Aquiles, em resposta a Héctor, rejeitar qualquer forma de juramento ou pacto com Héctor. O detalhe da poesia de Homero de dizer os termos synemosýne e hórkia faz toda a diferença para a nossa interpretação. Ora, por que Homero lançaria mão da palavra harmonía (usada pela primeira vez com a forma nominal do termo neste excerto), cuja semântica estava sendo empregada, como visto até aqui, com o sentido de encaixar, unir, para referir-se a um juramento, quando tinha como condição vocabular, já que os usa subsequencialmente, os termos synemosýne e hórkia? Que diferença haveria entre esses três vocábulos? Qual potência semântica cada um deles teria? O que eles enformam e, neste enformar, que forma produzem?

    Uma diferença que podemos decantar está no modo como Héctor e Aquiles se veem na guerra. É permitido a Héctor falar harmonía sem qualquer prejuízo da fala, pois ele se vê cheio de coragem (θυμός — thymós) para o embate, sem perder de vista que está em oposição extrema a Aquiles, mas em igual potência, na mesma hierarquia, isto é, nesta perspectiva, eles se igualariam como guerreiros. Neste contexto, o vocábulo harmonía faz todo sentido de ser dito. Esta fala salvaguarda o critério fundamental para a existência²⁸ da harmonía, tanto como fenômeno quanto como modo de se perceber no mundo. Articulando de outra maneira, o humano, diante das possibilidades do pensamento no campo da guerra (pólemos), pode ser conduzido a uma forma de olhar que configure a realidade de modo impreciso, tal qual a que Héctor experimenta, porque vê que ele e Aquiles criam uma relação harmônica. Contudo, se assim fosse, não poderia haver a possibilidade da morte para nenhum dos dois lados. A ação heroica consistiria, de acordo com a via interpretativa que aqui propomos, na capacidade de regrar o pensamento para fins de compreender que a harmonía não pode ser concebida em uma relação de contrários imperfeitos e reconhecer no pensamento e na língua critérios para dizer e qualificar o real.

    Na perspectiva heroica de Aquiles, a ideia de harmonía não se sustenta, nem encerra a relação que ele percebe ao olhar e ao ouvir Héctor. Para aquele que tem como um de seus epítetos os Pés-velozes, em uma quase justificativa, recusou a proposta que Héctor inferira. No primeiro momento da fala de Aquiles, vimos que o uso do termo synēmosýnē (συνημοσύνη) é cantado para rebater as palavras de Héctor. O termo synēmosýnē é, a nosso ver, a abertura para a distinção entre estas três palavras. Segundo Liddell & Scott (1996, p. 1715), no verbete destinado a este vocábulo, há dois significados entrelaçados. O primeiro afirma que o termo synēmosýnē significa acordos, convênios. Entretanto, o segundo campo semântico apresentado compõe o sentido de laços de amizade ou relacionamento²⁹. Isso nos ajuda a pensar que Aquiles não reconhece qualquer possibilidade de harmonía entre eles, pois ao negar qualquer chance de estabelecimento de um pacto, nega, também, ao dizer synēmosýnē, que haja laços de amizade que se subjaza fiável para fins de um juramento³⁰. Após usar este termo que apresenta ao mesmo tempo o acordo e a animosidade de Aquiles em relação à fala pronunciada por Héctor, Homero coloca, assim, o termo hórkia na boca de Aquiles para o que é inconcebível ao estabelecimento de qualquer juramento³¹. Desse modo, hórkia tem um sentido estrito e está, até onde a nossa pesquisa nos levou, circunscrita à semântica de juramento e pacto.³² Fato esse que se impõe de modo diferente ao que se comumente imprime como camada semântica na palavra harmonía, cujo sentido é acordo, encaixe, e à synemosýne, que tem como sentido um juramento entre laços de amizade, como já demonstrado.

    Nessa busca por cruzamentos semânticos, Homero usa, na Odisseia, ainda, outro termo que se relaciona, do ponto de vista do significado, com o termo harmonía. O exemplo aparece no verso 361, do Canto V:

    Farei o que a meus olhos parecer melhor:

    enquanto os lenhos não disjunjam da estrutura,

    eu permanecerei, sofrendo embora as dores;

    mas quando a onda destroçar minha jangada,

    eu nadarei, na ausência de melhor saída.³³

    Neste exemplo, vemos os termos harmonía e ararískō empregados na mesma sentença. Ambos têm um sentido muito próximo. O termo ararískō significa adaptar, ajustar.³⁴ Entretanto, este ato de ajustar tem o sentido, como proposto por Bailley (2000, p. 112), de ajustar para si ou sobre si.³⁵ Dito de outro modo, é ajustar algo já harmonizado, ajustar a estrutura.³⁶

    Ainda no interior da mitopoética grega e apesar das ocorrências da harmonía nos textos homéricos, é Hesíodo, na Teogonia, quem dará a carga divinal para este termo. Enquanto Homero usa essa palavra, como visto até aqui, na maioria das vezes na forma verbal, Hesíodo nos mostrará que a harmonía é uma das forças motoras do cosmo. Na mentalidade de um grego antigo, os deuses são caracterizados como a própria constituição do mundo. Consequentemente, a Harmonía, por ser uma deusa, é uma das estruturas que constituem a formação do cosmo.³⁷ Ao analisarmos o texto da Teogonia, compreenderemos que é a partir de dois poderosos deuses que o vir a ser da Harmonía se torna uma possível. Filha de Ares com Afrodite, Harmonía origina-se divinamente a partir desta relação de contradição exemplar, isto é, a guerra e o amor.

    Contudo, qual seria a marca de uma deusa que carrega em sua genética duas forças que são marcantes em suas formas individuais e, também, são antônimas perfeitas quando colocadas em relação? Para responder a esta questão, precisaremos analisar, sem a pretensão de ser a última análise possível para este excerto, o nascimento desta deidade, que aparece entre os versos 930-937 da Teogonia³⁸ de Hesíodo, onde lemos:

    De Anfitrite e do troante Treme-terra

    nasceu Tritão violento e grande que habita

    no fundo do mar com sua mãe e régio pai

    um palácio de ouro. E de Ares rompe-escudo

    Citeréia pariu Pavor e Temor terríveis

    que tumultuam os densos ranques de guerreiros

    com Ares destrói-fortes no horrendo combate,

    e Harmonia que o soberbo Cadmo desposou.³⁹

    Neste primeiro aparecimento da Harmonía como um ente divino, podemos observá-la, paralelamente, com seus irmãos, que são Phóbos e Deímos, além de seus pais. A partir disso, torna-se possível pensar com quem Harmonía divide sua genética e o que está circunscrito a esta divindade. Dito de outro modo, a sua árvore genealógica serve-nos de critério para compreender as semânticas da harmonía.

    Assim, Phóbos e Deímos, filhos de Ares, aparecem em diversos lugares na literatura grega. Na Ilíada (HOMERO, 2002, IV, v. 438-444), lemos, por exemplo, que

    A uns, Ares instigava; Atena, olhos-azuis,

    aos outros. O Terror e o Temor, a Discórdia

    acorriam (a Discórdia, sanha que não cessa,

    irmã e sócia de Ares, matador-de-gente;

    desponta diminuta e cresce e entesta com

    o céu, e calca a terra, dor e furor pelas

    tropas lançando)⁴⁰.

    Ainda nesta via interpretativa, a Ilíada nos proporciona, em seu Canto XI (HOMERO, 2013, v. 32-40, grifos nossos), uma correlação que se desdobra nesta ambientação familiar, cuja linhagem da Harmonía se revela:

    Pegou então no escudo ricamente trabalhado

    e valoroso, que protegia um homem de cada lado

    escudo belo, que tinha dez círculos de bronze,

    e por cima vinte bossas de estanho branco e luminoso,

    tendo no meio uma bossa de escuro azul.

    Coroava-o como grinalda a Górgona de horrível aspecto,

    que olhava, medonha; e junto dela estavam o Terror e o Pânico.

    Do escudo pendia um boldrié de prata; e por cima

    serpenteava uma serpente de azul, com três cabeças,

    cada uma para seu lado, saídas do mesmo pescoço.⁴¹

    A Ilíada (HOMERO, 2013, XIII, v. 298-305, grifos nossos) ostenta mais uma cena em que a presença de Phóbos e Ares é requisitada:

    Tal como Ares, flagelo dos mortais, entra na guerra,

    e com ele vai o Terror, seu filho amado, possante

    e destemido, que põe em fuga até o guerreiro mais corajoso;

    armam-se ambos para partir da Trácia em direção aos Éfiros

    ou aos Fleges magnânimos, embora não deem ouvidos

    a ambos os lados, mas dão a glória ora a uns, ora a outros —

    assim Meríones e Idomeneu, condutores de homens,

    foram para a guerra, revestidos de bronze fulgente⁴²

    Um último aparecimento na Ilíada (HOMERO, 2013, XV, v. 113-120, grifos nossos) mostra-nos a intensidade que Phóbos e Deímos emanam com os seus modos de vir a ser:

    Assim falou; e Ares bateu nas coxas musculosas com a palma

    das mãos e com um gemido de lamentação declarou:

    "Não me censureis agora vós, que no Olimpo tendes moradas,

    se eu for até as naus dos Aqueus vingar o meu filho,

    mesmo que seja meu destino pelo relâmpago de Zeus

    ser atingido e jazer na poeira no meio dos cadáveres."

    Assim disse e ordenou ao Terror e ao Pânico que atrelassem

    seus cavalos, enquanto ele próprio envergava as armas luzentes.⁴³

    Além dos textos homéricos, há, também, em Sete contra Tebas, de Ésquilo, a expressão da presença e do efeito que Phóbos causa no real. É analisável, no que segue ao ideário grego, como a sensibilidade foi capaz de sentir a presença deste deus. Lemos, assim, entre os versos 39 e 48, na tradução de JAA Torrano (Ésquilo, 2009), as seguintes palavras:

    Etéocles, soberano, à frente dos cadmeus,

    venho com esclarecimentos lá do exército,

    O olheiro destes fatos sou eu mesmo.

    Sete homens, impetuosos guias de tropas,

    degolando touro em escudo de alças negras

    e tingindo as mãos com o sangue taurino,

    por Ares, por Ênio e por sanguinário Pavor,

    juraram: ou destruir a fortaleza e devastar

    a cidade dos cadmeus com violência,

    ou mortos molhar esta terra com sangue.⁴⁴

    Diante do que foi apresentado até aqui como exemplo na literatura mítica grega, podemos entender que, no interior da conservação da vida humana, Phóbos e Deímos atuam como sentimentos: um profundo sofrimento e desespero que põe em fuga até o guerreiro mais corajoso, eliminando qualquer esperança. Entretanto, no que tange a Deímos, temos que este sempre acompanha Phóbos, ou seja, há Phóbos sem Deímos, ou seja, há Terror sem Temor, como nos mostrou Homero e Ésquilo, mas o Temor sempre vem acompanhado de Terror. Compreendemos, por extensão a estas imagens, que, na presença dos irmãos da Harmonía, devemos esperar pela catástrofe e pela dor. Tendo isso em mente, o que podemos esperar quando a Harmonía se faz presente? Seria ela diferente de seus irmãos?

    Outro detalhe que nos apresentou Hesíodo, no excerto acima, é a união da deusa com Cadmo. Essa união tem dois pontos que merecem nossa atenção. Devemos, portanto, reconhecer que esse casamento caracteriza dois impactos: um político e outro de gênero. O aspecto político é marcado pelas relações matrimoniais. Cadmo era um bárbaro e isso poderia implicar um problema na comunicação deles, uma vez que bárbaro não era, somente, aquele que não era grego, mas aquele que não compartilhava da cultura grega e, consequentemente, da língua grega. A palavra bárbaro, que é quase que uma transliteração para caracteres latinos da forma nominal grega, βάρβαρος (bárbaros), é compreendida como aquele que fala um bar bar, muito próximo da nossa expressão blá blá blá.⁴⁵ O segundo impacto diz respeito à humanidade de Cadmo. É comum, na literatura grega, deuses e homens se relacionarem sexualmente, mas já que é algo comum, por que, no caso de Harmonía, este fato estaria marcado em um texto teogônico? Ao ensaiar uma resposta sobre uma questão como essa, podemos enfatizar que, mesmo que não seja tão claro para nós, na percepção de um grego isso seria, possivelmente, de imediato reconhecimento, pois a relação de Harmonía com Cadmo configura aquilo que a compreensão da harmonía evoca por natureza, ou seja, relação de contrários. Dito de outro modo, Harmonía é fêmea, Cadmo, macho; ela, grega e deusa, ele, bárbaro e humano. Observa-se então que a marca da Harmonía se fundamenta em tudo o que ela é e faz e, por assim ser, ela deveria relacionar-se com tudo que é contrário a ela.

    Analisando o nascimento dessa deusa, temos que ela está entre aquilo que o pensamento grego conseguiu poetar de mais tenebroso, por um lado, e o que há de mais leve e cintilante, por outro. No interior dessa oposição, a Harmonía foi gerada. A Harmonía seria, portanto, o lugar da mais intensa e tensa constituição dos entes. Por alegoria, podemos pensar na Harmonía como sendo aquela presença divina instaurada em cada ente; cada ente constitui-se, claro, naquilo que é; mas, para ser o que é, é necessário que tenha harmonização entre as partes que constituem as coisas tal como elas são: a harmonía foi convertida em estrutura da realidade e esta será a fonte que alimentará a compreensão da primeiríssima filosofia. Não podemos perder do nosso campo de visão interpretativo qual é o caráter fundamental da harmonía visto até aqui, a saber: força que transcende ao humano, mas que constitui o seu modo de olhar os phainómenoi. Por exemplo, uma árvore, para se manter tal como ela é, necessita da violência da harmonía, que não é nem a força destruidora dos seus pais, nem a desestruturante de seus irmãos, mas é aquela que se revela em cada vir a ser. Esse poder, na perspectiva desta dissertação, aos nossos olhos revelar-se-ia na forma cósmica de cada ente e, também, configura os modos de o homem ver o mundo. Se os deuses para os gregos representam a carne do cosmo, a Harmonía representa a constituição presente nos entes; a potência da deusa revela-se no modo e no comportamento de cada ente.


    2 O termo religião deve ser entendido aqui com uma certa percepção grega, com uma certa aproximação àquelas experiências de crenças. A relação dos homens com os deuses se dava através do próprio cosmo, isto é, no modo de ler os fenômenos (phainómenoi) que brotavam diante de cada olho. Para que sejamos mais precisos e em nome de uma maior clareza, podemos concordar com a ideia de que os deuses são todas as phýseis possíveis do cosmo e se revelam ao humano a partir da relação deste com o cosmo. Este seria, nesta interpretação, a dimensão aparente, isto é, as árvores, os ventos, a terra, entre outros. Para uma compreensão mais geral da etimologia do termo religião, indicamos o texto de François Houtart (2002) intitulado Religiones y Humanismo en el siglo XXI. Nesse texto, o referido autor apresenta duas raízes possíveis para o termo religião: a primeira com o sentido de religare e por isso que o chefe da igreja católica teria o nome de pontifex, aquele que constrói pontes. O segundo sentido baseia-se em Cícero que "propõe outra interpretação: religião vem de legere, colher, ou de relegere, pegar [propone otra interpretación: religio viene de legere, cosechar, o de religere, recoger" (Ibidem, p. 221)].

    3 Aqui há uma clara referência à comédia As Nuvens, de Aristófanes. Nela, o comediógrado finaliza a peça queimando Sócrates e seu Discípulo. A fala final resume-se assim: "Sócrates: Homem, que está fazendo? Você aí em cima do telhado?! / Esprepsíades: ‘ando pelos ares e olho o sol de cima…’ / Sócrates: Ai de mim, desgraçado, vou morrer sufocado! / Discípulo A: Desgrado de mim, vou morrer queimado!" (As Nuvens, v. 1502-1505, tradução de Gilda Maria Reale Starzynski) [Σωκράτης οὗτος τί ποιεῖς ἐτεὸν οὑπὶ τοῦ τέγους; / Στρεψιάδης ἀεροβατῶ καὶ περιφρονῶ τὸν ἥλιον. / Σωκράτης οἴμοι τάλας δείλαιος ἀποπνιγήσομαι. / Χαιρεφῶν ἐγὼ δὲ κακοδαίμων γε κατακαυθήσομαι. (Aristophanes, 1907)].

    4 Essa divisão pode ainda ser subdividida em grupos menores. Na religião, teríamos as literaturas épicas, tragédias, comédias e a lírica. Do lado da filosofia, o conteúdo se difere, mas a forma se mantém, como, por exemplo, em Parmênides e Empédocles, que escrevem poesia, apesar de o acesso ao pensamento destes autores por meio de fragmentos que nos restaram. Entretanto, outras formas de enunciar o discurso surgem, como, por exemplo, o diálogo, no caso de Platão, e o tratado, no caso de Aristóteles.

    5 "The idea of harmony had a significant role in the ancient Greek thinking (harmonia means connection, accord, consonance, agreement). This idea testified to the regularity and integrity of all things and all beings, along with their content and importance" (RYBÁŘ, 2011, p. 19, grifos do autor).

    6 ὣς φάτο, Πάτροκλος δὲ κορύσσετο νώροπι χαλκῷ. / κνημῖδας μὲν πρῶτα περὶ κνήμῃσιν ἔθηκε / καλάς, ἀργυρέοισιν ἐπισφυρίοις ἀραρυίας: / δεύτερον αὖ θώρηκα περὶ στήθεσσιν ἔδυνεν / οἷο κασιγνήτοιο Λυκάονος: ἥρμοσε δ’ αὐτῷ (HOMER, Iliad, 1920, III, v. 330-333). Optamos por colocar sempre o texto original na nota de rodapé para todos os idiomas, mesmo quando a tradução não for nossa. O termo que aparece em itálico no excerto acima é ἥρμοσε (hḗrmose). Esta é a forma aorista do verbo ἁρμόζω (harmózō) na terceira pessoa do singular. Segundo Liddel & Scott (1996, p. 243), este verbo tem o seguinte sentido: pôr junto, conectar ["join together, join"]. As traduções para o português da Ilíada de Homero aqui utilizada serão a de Haroldo de Campos (HOMERO, Ilíada, 2002). Quando usarmos outras traduções para este e outros textos clássicos, indicaremos.

    7 A tradução do excerto

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