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Racionalidade do Discurso Legislativo: análise de debates parlamentares à luz do pensamento de Robert Alexy
Racionalidade do Discurso Legislativo: análise de debates parlamentares à luz do pensamento de Robert Alexy
Racionalidade do Discurso Legislativo: análise de debates parlamentares à luz do pensamento de Robert Alexy
E-book308 páginas3 horas

Racionalidade do Discurso Legislativo: análise de debates parlamentares à luz do pensamento de Robert Alexy

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Sobre este e-book

"Nesse sentido, esta obra seguramente se apresenta como uma das mais ricas abordagens no cenário pátrio ao discurso jurídico desenvolvido no processo legislativo na forma do discurso legislativo, tema cujo tratamento não recebe, da Ciência do Direito, peso correspondente à sua relevância social." - Prof.ª Dr.ª Cláudia Toledo

"O título do trabalho – Racionalidade do discurso legislativo: Análise de debates parlamentares à luz do pensamento de Robert Alexy – já adianta grande parte do que Ian Fernandes de Castilhos fez em seus estudos, muito embora não acabe por refletir inteiramente a riqueza da pesquisa agora publicada, a começar pelos recortes e procedimentos metodológicos, cuja criatividade, minuciosa justificação e rigor foram objeto de elogios por ocasião da banca de defesa." - Prof.ª Dr.ª Roberta Simões Nascimento.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento29 de fev. de 2024
ISBN9786527013884
Racionalidade do Discurso Legislativo: análise de debates parlamentares à luz do pensamento de Robert Alexy

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    Racionalidade do Discurso Legislativo - Ian Fernandes de Castilhos

    capaExpedienteRostoCréditos

    AGRADECIMENTOS

    Gostaria de expressar minha profunda gratidão à minha orientadora, Profª Drª Cláudia Toledo, pela sua orientação, apoio e encorajamento ao longo deste trabalho. As contribuições e conselhos dados foram essenciais para tornar esta dissertação possível. Também gostaria de agradecer à Universidade Federal de Juiz de Fora pela bolsa concedida que possibilitou a realização desta pesquisa. Sem esse suporte financeiro, não seria possível dedicar todo o meu tempo e recursos necessários para a elaboração desta dissertação. Por fim, gostaria de agradecer aos meus familiares e amigos por todo o apoio e encorajamento durante este processo. Seus incentivos foram essenciais para manter minha motivação e determinação em busca deste objetivo acadêmico.

    APRESENTAÇÃO

    Este livro parte do questionamento: Há racionalidade no discurso legislativo? Em caso afirmativo, qual o seu grau?. Em busca da resposta a essa(s) questão(ões), Ian Fernandes de Castilhos elaborou séria pesquisa em nível de mestrado, da qual resultou a dissertação que ora é publicada pela Editora Dialética, a qual, por sua vez, vem desempenhando relevante papel no cenário acadêmico brasileiro, com a disponibilização de trabalhos científicos de qualidade ao público nacional.

    Nesse sentido, esta obra seguramente se apresenta como uma das mais ricas abordagens no cenário pátrio ao discurso jurídico desenvolvido no processo legislativo na forma do discurso legislativo, tema cujo tratamento não recebe, da Ciência do Direito, peso correspondente à sua relevância social.

    Desde a segunda metade do século passado, a análise do discurso e especificamente do discurso jurídico vem progressivamente ganhando projeção. A trajetória dessa crescente ênfase fica clara a partir dos primeiros passos dados por Chaïm Perelman e Lucie Olbrechts-Tyteca no Tratado da Argumentação – A Nova Retórica (1958), passando por Stephen Toulmin em Os Usos do Argumento (1958), até chegar a Neil MacCormick em Argumentação Jurídica e Teoria do Direito (1978) e Robert Alexy em Teoria da Argumentação Jurídica (1978). As obras dos dois últimos autores, MacCormick e Alexy, formam a chamada "teoria standard da argumentação jurídica", segundo Manuel Atienza – que também elabora sua própria teoria em As Razões do Direito – Teorias da Argumentação Jurídica (1991).¹

    No entanto, o foco da análise discursiva do Direito dirige-se geralmente ao momento de aplicação da norma jurídica no processo judicial. O enfoque destinado por esta obra ao discurso legislativo, que tem lugar no processo legislativo, torna-a ainda mais relevante para o atual debate jurídico, porquanto no Estado Democrático de Direito o Poder Legislativo – em seus diferentes níveis (federal, estadual, municipal), conforme a organização estatal – apresenta-se como o espaço prioritário do discurso, onde se debatem demandas sociais e se elaboram leis visando à sua satisfação, aperfeiçoando-se, assim, a democracia deliberativa.

    Ao contribuir para a consolidação desse que é o modelo mais avançado de democracia, o livro assume destacada relevância social. Trata-se de estudo baseado em pesquisa bibliográfica e empírica, dotado de perspectiva analítica (por investigar a estrutura lógica do discurso legislativo), empírica (por examinar discursos legislativos realmente ocorridos) e normativa (por estipular critérios que devem ser seguidos para a racionalidade do processo legislativo).

    A pesquisa bibliográfica conduzida apresentou diversidade e densidade que indubitavelmente ultrapassam o nível esperado para uma dissertação de mestrado. Foram lidos e estudados desde autores brasileiros dedicados à investigação da temática, como Roberta Simões Nascimento e Ana Paula de Barcellos; a autores estrangeiros cujo papel central desempenhado no tratamento dos temas a que se dedicam, como Robert Alexy (marco teórico deste trabalho), proporciona a disponibilidade de grande parte de sua obra em português; e a autores estrangeiros cujas obras, a despeito de sua relevância, ainda não foram traduzidas para o idioma pátrio, como a produção de Alexander Peczenik ainda acessível apenas em inglês, ou Peter Noll, cujo pensamento ainda se encontra basicamente expresso em alemão.

    Por sua vez, também a pesquisa empírica realizada mostrou-se mais ampla do que o habitual, tanto no que se refere ao número de fontes documentais investigadas – não apenas uma, mas duas fontes documentais distintas (jornais de grande circulação e notas taquigráficas de sessões deliberativas do plenário das Casas Legislativas do Congresso Nacional) –, quanto no que tange ao lapso temporal estudado (duas décadas, de 2000 a 2020).

    Tais escolhas metodológicas se justificaram pela necessidade de se analisarem os discursos legislativos de maior importância e impacto social realizados, na atualidade, no Congresso Nacional brasileiro. O critério para identificação da importância e impacto do discurso legislativo foi a referência ao respectivo processo legislativo na primeira página de dois dos maiores jornais de grande circulação do país – Folha de São Paulo e O Globo. Ademais, para a obtenção de dados que se apresentassem como efetivas características do discurso legislativo brasileiro em âmbito federal – e não como meras peculiaridades eventuais de discursos legislativos isolados –, foi necessário o levantamento de número representativo de discursos, demanda que exigiu o recorte de considerável período temporal (duas décadas) para pesquisa.

    Por outro lado, para viabilizar o exame desses processos por um único pesquisador dentro do prazo do curso de mestrado, ao longo dessas duas décadas foram selecionadas as deliberações legislativas ocorridas no plenário das Casas do Congresso Nacional brasileiro em intervalos quinquenais, nos anos 2000, 2005, 2010, 2015 e 2020, os quais foram integralmente analisados.

    Dessa forma, em sua pesquisa, o autor partiu da investigação do discurso legislativo, abordou sua relação com o discurso jurídico, expôs parâmetros de análise argumentativa do discurso jurídico, distinguiu tipos e critérios de racionalidade, e, com o auxílio das regras da argumentação jurídica formuladas por Alexy, terminou por responder a pergunta da qual partiu, verificando empiricamente o grau de racionalidade dos discursos legislativos registrados nas votações em plenário dos mais relevantes processos legislativos ocorridos neste século no Poder Legislativo federal brasileiro.

    Assim, no Capítulo 2, Ian Fernandes de Castilhos investigou o discurso legislativo mediante a análise da legística (elaborada especialmente por Peter Noll e Jean-Daniel Delley) e da legisprudência (com destaque à obra de Luc Wintgens). Na doutrina pátria, utilizou como fonte de pesquisa as obras das juristas Roberta Simões do Nascimento e Ana Paula de Barcellos, que se destacam no tratamento do discurso jurídico e do processo legislativo.

    No Capítulo 3, o autor expôs o discurso legislativo como um dos tipos de discurso jurídico, o qual se mostra como caso especial do discurso prático geral (Alexy), porquanto vinculado aos argumentos institucionais expressos nas leis, precedentes e doutrina. O discurso legislativo conduzido em Estado de Direito estruturado na forma de uma democracia deliberativa representa a formação racional da vontade política, revelando-se então como a institucionalização da razão prática.

    No Capítulo 4, Ian Fernandes de Castilhos explicou a taxonomia ou tipologia argumentativa elaborada com base no pensamento de Robert Alexy e Jürgen Habermas como parâmetro de análise dos discursos legislativos. A despeito de o discurso jurídico ser vinculado a argumentos institucionais – na medida em que se apresenta como caso especial do discurso prático geral –, devido à tese da integração (Alexy), ele se mostra integrado ao discurso prático geral. Por conseguinte, frequente é a presença, no discurso jurídico, de argumentos não institucionais, próprios do discurso prático geral (argumentos pragmáticos, éticos e morais, conforme Habermas) e também do discurso empírico (argumentos sobre fatos concretos da realidade e sobre dados científicos, segundo Alexy).

    No Capítulo 5, o autor dissertou sobre a racionalidade do discurso, explicitando os três tipos de sua apresentação – racionalidade lógica, substancial e discursiva – e os critérios utilizados para a avaliação de cada um dos tipos de racionalidade. Assim, demonstrou a pertinência dos critérios de correção linguística e de consistência para análise da racionalidade lógica da deliberação legislativa; do critério da coerência para a avaliação da racionalidade substancial; e a satisfação de 11 regras da argumentação jurídica como critério para mensuração da racionalidade discursiva. Explicou ainda que, da verificação da satisfação (total, parcial ou não satisfação) dos critérios mencionados, viabiliza-se a aferição do grau de racionalidade do discurso legislativo.

    Finalmente, no Capítulo 6, Ian Fernandes de Castilhos conclui seu trabalho, trazendo os resultados da pesquisa empírica realizada, na qual foram colocados em prática os subsídios extraídos da pesquisa bibliográfica, conferindo-se, assim, concretude à elaboração teórico-abstrata até então desenvolvida.

    Com base nos recortes metodológicos citados, foram levantados 36 processos legislativos, dos quais 7 foram descartados especialmente pelo fato de a proposição legislativa em análise não ter sido levada a plenário até o termo final do lapso temporal avaliado nesta pesquisa. Desse modo, foram selecionados 29 processos legislativos cujo discurso realizado na votação da proposição em plenário foi investigado.

    Para tanto, foi elaborado quadro de fichamento do discurso legislativo correspondente a cada processo legislativo selecionado. Mediante tal quadro, houve então o registro e exame individualizado dos argumentos propriamente jurídicos utilizados na justificação externa do discurso legislativo, com referência a cânones hermenêuticos voltados para o estudo das leis (de lege lata e de lege referenda); a argumentos dogmáticos; a argumentos de precedentes; a argumentos de legisprudência; e a formas de argumentos jurídicos especiais. Nesse quadro de fichamento, registraram-se também os argumentos próprios do discurso prático geral (argumentos pragmáticos, éticos e morais) e do discurso empírico (argumentos sobre fatos concretos e sobre dados científicos), bem como a satisfação (total, parcial ou não satisfação) de regras da argumentação jurídica alexyana diretamente relacionadas com a justificação externa do discurso jurídico.

    Quadro de fichamento foi também elaborado para a avaliação do grau de racionalidade das deliberações legislativas investigadas. O procedimento para determinação desse grau é certamente uma das maiores contribuições deste trabalho tanto para o avanço científico na aferição da racionalidade do discurso legislativo, quanto para o progresso democrático corolário do aperfeiçoamento da racionalidade discursiva. Para o estabelecimento do grau de racionalidade do discurso legislativo como leve, moderado ou grave (escala triádica alexyana), Ian Fernandes de Castilhos partiu da análise da satisfação de cada uma das 11 regras da argumentação jurídica aplicadas à deliberação legislativa, conferindo, neste ponto, absoluto ineditismo ao seu trabalho, ao propor fórmula para o cálculo da média ponderada do respeito às regras do discurso. A fixação do grau de racionalidade do discurso legislativo depende diretamente do valor alcançado naquela média ponderada.

    Finalmente, na apresentação dos resultados finais do seu trabalho, o autor teve a preocupação de associar as conclusões teóricas alcançadas na rica pesquisa bibliográfica empreendida aos dados e números obtidos na pesquisa empírica desenvolvida, buscando ainda conferir máxima clareza ao conteúdo apurado, seja mediante sua disposição em diversos gráficos e tabelas, seja mediante a exemplificação das diferentes questões avaliadas no discurso legislativo, seja ainda mediante a aplicação da fórmula elaborada para o cálculo daquela média ponderada. Nesse sentido, foram expressos em gráficos o índice de satisfação das regras de justificação externa, os índices de satisfação dos critérios de racionalidade, os índices de satisfação das regras do discurso e o grau de racionalidade das deliberações. À exposição de tais gráficos, seguiu-se a transcrição literal de argumentos de parlamentares que demonstravam a satisfação (ou não) daqueles critérios e regras, bem como o grau leve, moderado ou grave de racionalidade lógica, substancial ou discursiva dos discursos legislativos analisados.

    Dessa forma, ao buscar responder a pergunta acerca da racionalidade do discurso legislativo, esta sólida pesquisa que ora se publica em livro conjuga teoria e empiria em explícita demonstração do crucial elo entre a produção intelectiva e a realidade fática em que ela se situa e para cujo aprimoramento ela se destina, bem como entre o estudo crítico-reflexivo desenvolvido pela Filosofia do Direito e o aperfeiçoamento da prática jurídica cotidiana por ele promovido.

    Juiz de Fora, novembro de 2023.

    Cláudia Toledo

    Professora Titular da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF)

    Membro do Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Direito e Inovação (UFJF)

    Doutorado em Teoria e Filosofia do Direito - Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG)

    Estágios Pós-Doutorais - Universidade Christian-Albrecht (CAU), Kiel, Alemanha e Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC)


    1 Todas as datas referem-se à primeira publicação de cada obra em seu idioma original. Além dos autores citados, também trouxeram relevantes aportes à matéria as obras de Aulis Aarnio, The Rational as Reasonable: A Treatise on Legal Justification (1987), e de Alexander Peczenik, On Law and Reason (1989).

    PREFÁCIO

    Quando o autor de um livro convida uma pessoa para escrever o prefácio, costuma esperar que da pessoa convidada venham palavras capazes de atrair leitores para as páginas que vêm em seguida. Para isso, os prefácios costumam seguir um roteiro mais ou menos padrão: 1) apresentar o autor, contando suas credenciais e detalhes que permitam compreender mais sobre suas intenções e os motivos da escrita; 2) fazer uma breve introdução sobre o livro, apresentando algumas de suas premissas e o contexto em que a obra foi produzida; e 3) tecer considerações de ordem crítica, provocativa ou elogiosa, conforme o caso, com o objetivo de despertar curiosidade do leitor para a obra. Assim procederei para honrar o convite que me foi feito por Ian Fernandes de Castilhos.

    O livro que o leitor tem em mãos corresponde com alguns ajustes à dissertação de mestrado do autor, aprovada com a menção máxima e recomendação para publicação, no Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), por banca composta pelas professoras Cláudia Toledo (UFJF), na qualidade de orientadora, Luciana Gaspar Melquíades Duarte (UFJF) e por mim.

    O título do trabalho – Racionalidade do discurso legislativo: Análise de debates parlamentares à luz do pensamento de Robert Alexy – já adianta grande parte do que Ian Fernandes de Castilhos fez em seus estudos, muito embora não acabe por refletir inteiramente a riqueza da pesquisa agora publicada, a começar pelos recortes e procedimentos metodológicos, cujas criatividade, minuciosa justificação e rigor foram objeto de elogios por ocasião da banca de defesa. Essas escolhas metodológicas de Ian merecem o primeiro comentário neste prefácio.

    A teoria da legislação ou legisprudência,² como preferem alguns, têm sido um campo predominantemente normativo: trata de estabelecer condições ideais de justificação para garantir a racionalidade das leis. Nesse sentido, diversas teorias normativas vêm sendo produzidas para prescrever condicionamentos e requisitos que o processo legislativo deveria idealmente atender com vistas a produzir leis melhores ou mais racionais.³ No campo da teoria da legislação, legística, técnica legislativa, etc., são fornecidas pautas metodológicas com vistas a orientar os legisladores nesse mister. De modo geral, tais perspectivas buscam responder à pergunta: De que forma leis podem ser legítimas? Trata-se de um debate eminentemente normativo e por vezes excessivamente exigente.⁴

    Tenho a impressão de que muitas das teorias disponíveis vêm sendo construídas de costas para as práticas parlamentares reais. Com isso, gera-se um ciclo vicioso: como as teorias são excessivamente exigentes, seus requisitos acabam não sendo observados de forma concreta; como consequência disso, tem-se a sensação de que esse campo teórico é relativamente inútil e sem potencial para influenciar a mudança institucional necessária para corrigir os déficits da argumentação que vem sendo praticada no Congresso Nacional.

    A despeito do enorme potencial de pesquisas empíricas nessa área, a postura acadêmica mais comum se associa à conclusão de que o debate parlamentar simplesmente não é deliberativo, precisamente em razão dos problemas que mesmo os não acadêmicos são capazes de observar nas sessões legislativas. Há, ainda, uma vertente pela qual os debates legislativos carecem de interesse jurídico, que seriam pura política; portanto, seriam irracionais: a tomada de decisões no parlamento seria um procedimento de mera agregação de preferências. Mas como é possível chegar a essas conclusões sem pesquisas empíricas ou indicadores concretos capazes de traduzir em números ou mais visualmente as argumentações entabuladas?

    Como se vê, as explicações teóricas para o fenômeno legislativo que deixam de lado a dimensão argumentativa têm capacidade limitada para dar conta de como a legislação é feita: com (às vezes grandes, às vezes menores) medidas de argumentação genuína sobre os méritos e deméritos das propostas legislativas colocadas para aprovação. Pode-se até discordar quanto à qualidade, mas não é possível negar que os parlamentos foram concebidos como órgãos colegiados deliberativos, entendendo-se a deliberação como a atividade de trocar argumentos com vistas à persuasão sobre a desejabilidade de uma proposta legislativa. Tal deliberação pode acabar envolvendo elementos de outras naturezas, como negociação, barganha, disputa, estratégia, acordos que não resultam necessariamente do convencimento, etc., mas são necessárias pesquisas voltadas para tentar dimensionar o peso dos argumentos apresentados nas deliberações legislativas.

    Ocorre que as pesquisas empíricas ainda são pouco frequentes⁵ e, mesmo quando realizadas, o esforço costuma ser quase sempre muito pontual, com estudos que mapeiam um aspecto limitado, uma discussão específica (a análise do debate parlamentar de um único projeto de lei; no máximo, a atuação de uma comissão das Casas Legislativas, mas com um viés mais quantitativo do que qualitativo), sem pretensões mais abrangentes voltadas para a identificação, classificação e avaliação dos argumentos suscitados pelos parlamentares nos debates para a aprovação das leis.⁶

    Desde uma perspectiva empírica, a pergunta que se quer ver respondida é: O que os legisladores argumentam, de fato, a respeito dos itens sobre os quais se espera que abordem por ocasião da aprovação de boas leis? Acredito que a pesquisa empírica das razões legislativas é o caminho adequado para compreender como os legisladores argumentam e como constroem o discurso legislativo.

    Nesse sentido, fugindo dessas características comuns dos trabalhos que se interessam pela elaboração da legislação, além da honesta revisão da literatura – que é necessária e esperada para registrar o percurso formativo do próprio autor –, a dissertação de Ian adotou uma perspectiva empírica de forma bastante inovadora, e ainda se preocupou em reunir um lastro que permitisse avaliar um período relativamente longo de deliberações legislativas, sem que isso implicasse uma sobrecarga na análise dos dados reunidos a ponto de inviabilizar a pesquisa no tempo de que o autor dispunha para executá-la.

    Para conciliar esses dois objetivos, Ian adotou um recorte temporal de 20 anos, durante o qual foram analisadas as deliberações legislativas ocorridas em intervalos quinquenais, nos anos 2000, 2005, 2010, 2015 e 2020. Com isso, ao abranger diferentes legislaturas, governos e orientações políticas predominantes, a pesquisa foi capaz de captar como as decisões legislativas são tomadas em diferentes conjunturas políticas, econômicas e sociais, o que cumpre um papel importante para essa visão mais ampla tão necessária para compreender melhor como os parlamentares justificam as leis que aprovam. No total, foram analisados os debates de 29 projetos de lei.

    Além do recorte temporal, Ian procedeu a um filtro de relevância para identificar os projetos de lei mais significativos de cada um dos cinco anos estudados. Para isso, de forma criativa e bastante engenhosa, Ian realizou o levantamento dos projetos de lei que tiveram menção simultânea nas capas de dois dos principais jornais de grande circulação no país

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