Encontre milhões de e-books, audiobooks e muito mais com um período de teste gratuito

Apenas $11.99/mês após o término do seu período de teste gratuito. Cancele a qualquer momento.

Desertos da Alma: A Força que Você Só Descobre ao Olhar para Dentro
Desertos da Alma: A Força que Você Só Descobre ao Olhar para Dentro
Desertos da Alma: A Força que Você Só Descobre ao Olhar para Dentro
E-book215 páginas2 horas

Desertos da Alma: A Força que Você Só Descobre ao Olhar para Dentro

Nota: 0 de 5 estrelas

()

Ler a amostra

Sobre este e-book

Morte, depressão, perdas, separações, lutos podem ser terras muito áridas. As superações, o sentido de empreender a travessia por todos esses desertos da alma e a busca pela missão pessoal são apresentados pelo olhar da Psicologia, especialmente da Psicologia
Analítica, também conhecida como Psicologia Junguiana. A teoria e a prática psicoterapêutica engendrada pelo psiquiatra suíço Carl Gustav Jung (1875-1961) são profundas, repletas de alma e cheias de sentido, trazem um olhar integral, compassivo e amoroso para a clínica.
Os textos nascem como ruminações durante os tempos mais agudos da pandemia e a metáfora do deserto, como paisagem psíquica, surgiu de um sonho. Acordei de madrugada tendo a certeza de que esta deveria ser a ideia condutora para os textos. Marie-Louise von
Franz, em entrevista ao analista e produtor Fraser Boa, disse que Jung "descobriu que os sonhos procuram regular nossas energias físicas e mentais". Era preciso voltar a atenção para alguns desertos, estudar os mapas da alma para empreender as minhas próprias travessias.
Convido você a fazê-lo também.
Resistir aos tempos de aridez, enfrentar as tempestades, fazer frente aos lugares que apequenam é uma tarefa para a vida toda, e só conseguiremos completar essa tarefa dando ouvidos à Alma. As tarefas do Ego têm a ver com a exterioridade, já a convocação da Alma é para a interioridade. Algumas coisas que faziam muito sentido deixam de ter, e outras passam a fazer sentido. Escutar os chamados da Alma é não ter medo de duvidar das próprias lealdades. A que e a quem você está sendo leal nesse momento?
Em todos os desertos, ponha-se em movimento, a caminho.
Conjugar o verbo atravessar é curativo, ainda que trabalhoso e exaustivo. E, se ninguém acompanhar você, seja a sua melhor companhia. Em todas as suas jornadas, sobreviva.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento14 de mai. de 2024
ISBN9786525059532
Desertos da Alma: A Força que Você Só Descobre ao Olhar para Dentro

Relacionado a Desertos da Alma

Ebooks relacionados

Métodos e Materiais de Ensino para você

Visualizar mais

Artigos relacionados

Avaliações de Desertos da Alma

Nota: 0 de 5 estrelas
0 notas

0 avaliação0 avaliação

O que você achou?

Toque para dar uma nota

A avaliação deve ter pelo menos 10 palavras

    Pré-visualização do livro

    Desertos da Alma - Vera Cristina Weissheimer

    INTRODUÇÃO

    Escrever sobre as paisagens psíquicas que, muitas vezes, mostram-se como terras áridas não é uma tarefa para se realizar só, da mesma forma como não se atravessa a sós um deserto. Muitas pessoas leram estes textos, deram opiniões e o livro foi criando forma. O livro é sobre os desertos em nós, as bússolas e as jornadas empreendidas para as travessias. Não é sobre pontos de chegada. É sobre idas e vindas, é sobre a jornada, é sobre o caminho e o caminhar, acima de tudo, sobre a Alma Humana.

    Não há pessoa no mundo que não tenha vivido tempos em algum deserto, até mesmo crianças chegam a experimentar tempos de profunda sequidão de vida: depressão, tristezas, ansiedades, abandonos, desamparos. A vida é real e nos expulsa dos paraísos, não aceita nossos esconderijos e fugas.

    Trabalho há tempos com pessoas que me falam dos desertos nas próprias vidas, sejam eles escaldantes ou gelados. Ao saírem da sala, deixam para trás restos de areia ou pedacinhos de gelo que caem dos pés cansados, enquanto tentam se firmar para as travessias. No processo terapêutico, buscam clarear direções a seguir, os sentidos de cada caminho e o significado de estarem naquela jornada. Muitas pessoas já não lembram de onde deixaram a bússola que poderia nortear ou sulear na localização de caminhos e saídas. Ou não fazem ideia de que bússola poderia auxiliar nessa empreitada.

    Com cada história e, também, com meus próprios desertos, aprendi que pode haver uma incrível fecundidade quando nos aprofundamos, quando cavoucamos nessas terras. A tarefa de chegar às fontes de água, de nutrientes para a vida, é exaustivamente trabalhosa, mas é nossa, e isso é maravilhoso porque a vida não é algo de se terceirizar e, ainda assim ou por isso mesmo, vale muito a pena ser vivida. Afinal, não somos turistas nessa vida, não estamos a passeio.

    Desde muito tempo me sinto peregrina e migrante. Trabalhei nas regiões Sul e Norte do país, mas foi na região Sudeste que criei raízes por mais tempo. Em São Paulo, capital de tantas misturas, diferenças e indiferenças, acolhimentos e exclusões, trabalhei com pessoas em situação de rua e os trabalhos rotineiros de uma pastora luterana em uma paróquia, como as celebrações dominicais e visitas domiciliares. Os últimos quatro anos vividos na pauliceia foram dedicados à criação da Pastoral Ecumênica no Hospital Alemão Oswaldo Cruz. Foi o tempo em que mais me senti questionada pela vida. Enquanto acompanhava mulheres e homens nos limiares entre a vida e a morte, perguntas iam surgindo: o que você está fazendo com o tempo que lhe é dado? E sua vida, como anda? E sua espiritualidade, onde se enraíza? O que vai ser depois de tudo isso? Aprendi que a vida pode ter um sentido até mesmo diante da morte, quando o ego baixa a guarda e a alma passa a ser a lanterna guia. Estar ao lado de pessoas no processo de morrer tem sacralidade, é um aprendizado diferente com cada pessoa. É como se cada uma delas fosse uma página de um livro que vai narrando a importância de se viver sem deixar para mais tarde. É uma tarefa doída essa de acompanhar despedidas e desapegos, ressentimentos e culpas, medos, mas também coragens surpreendentes. Não há como não sair marcado ou marcada.

    Em tempos de travessias e de refazimentos, fui morar em Florianópolis. Refiz os traçados para minha jornada e, ao completar 50 anos, assumi outra carreira. Depois de ter transitado pela Psicanálise e pela Logoterapia, decidi dar continuidade à formação em Psicologia e, nessa jornada, encontrei a Psicologia Analítica de Carl Gustav Jung.

    Se você, neste momento, está se perguntando mas quem é Jung?, muito, mas muito resumidamente, Jung nasceu em Kesswil, na Suíça, às margens do Lago de Constança, em 26 de julho de 1875. O avô era médico e professor de Medicina da Universidade da Basiléia; o pai, um pastor protestante; e a família materna transitava pela mediunidade. Graduou-se em Medicina, em 1900, e se especializou em Psiquiatria no Hospital de Burghölzli, em Zurique, onde residiu por alguns anos. Colaborou com Sigmund Freud entre os anos de 1907 e 1913, quando romperam a amizade e a colaboração mútua. Depois de um tempo de isolamento, de atravessar o próprio deserto, assumiu publicamente que estava caminhando um outro caminho, que não o freudiano. Jung decidira seguir a própria bússola, e isso teve um preço, mas também a amplitude de um pensar próprio. Criou a teoria que foi denominada de Psicologia Analítica, também conhecida como Psicologia Junguiana.

    E eu? Atualmente, trabalho como psicóloga clínica, tendo a abordagem analítica como uma das principais guias. Mais uma vez, acompanho pessoas, não só nas travessias das terras áridas, mas sou também a mão que ajuda a revolver a terra seca, mostrando que ali também há fecundidade.

    Como ler este livro?

    Proponho uma leitura aos bocados. Faça pausas a cada final de texto ou capítulo e rascunhe o que de seu encontrou por ali. O livro quer ser um convite para uma reflexão sobre desertos, bússolas e travessias; estas últimas tão difíceis quanto desafiadoras, mas tão necessárias de se tentar. Os desertos para os quais convido você a olhar são nossas paisagens psíquicas, ou estados internos, em que preferiríamos não ir, não estar, são os tempos em que a vida fica estranha: depressão, ansiedade, abandono, desamparo... Para atravessá-los, é preciso, antes de tudo, reconhecer e aceitar que ali estamos. A transformação e a travessia não se dão na ligeireza e na pressão do tempo cronológico. É um caminho contínuo. É estar a caminho.

    Nos textos falo da alma e sua força arrebatadora e, por vezes, até incômoda. Por isso, vou logo explicando que estou falando a partir da perspectiva da Psicologia, mais especificamente da Psicologia Analítica, ou Psicologia Junguiana. Thomas Moore, em Cuide de sua alma⁶, sinaliza: É impossível definir com precisão o que é alma. De qualquer maneira, definir é um ato intelectual; as almas preferem imaginar. Sabemos intuitivamente que a alma tem relação com o genuíno e o profundo.

    Estamos sempre em busca de coisas com alma – casa com alma, pessoas com alma. Ao empreender essa busca, descobrimos, como escreve Léon Bonaventure⁷ na introdução aos volumes da coleção Amor e Psique, que é o amor que nos revela a alma e gera a alma. Por isso, ele aconselha que, ao invés de procurar por explicações psicopatológicas para as feridas e os sofrimentos, é preciso amar a alma, isto é, nos amarmos. Assim, poderemos até descobrir que muitas das nossas feridas e sofrimentos nutrem as raízes nas nossas experiências em que nos faltou amor.

    Para a Psicologia Analítica, psique⁸ é a totalidade dos processos conscientes e inconscientes, já a alma é uma atitude diante da vida, das coisas que nos acontecem e também uma forma de nos relacionarmos com esses processos conscientes e inconscientes. Todo ser vivo é um ser com alma, portanto, dotado dessa fonte que gera vida. Para exemplificar, Jung recorda o texto judaico-cristão sobre a criação, em que o ser humano toma forma e vida com o sopro divino. Esse sopro é gerador de vida, é o lugar em nós que não adoece. Quando o sentimos adoecer é porque o negligenciamos. A alma sempre guardará em si um bocado de vida à espera de ser encontrada por nós, para nela nos reavivarmos. Em Os arquétipos e o inconsciente coletivo⁹, ele escreve: ela (a alma) convence-nos de coisas inacreditáveis para que a vida seja vivida. A alma é cheia de ciladas e armadilhas para que o ser humano tombe, caia por terra, nela se emaranhe e fique preso, para que a vida seja vivida. Se assim não fosse, estagnaríamos na vida.

    Em todas as nossas vivências, e muitas delas acontecem aos solavancos, não há como terceirizar a vida. É seguir em frente com a própria ferida em nudez escancarada, mas é a alma que será a força criativa e viva para encontrar sinais de fecundidade em terra seca, capacitando para sobreviver e para percorrer o caminho da sobrevivência para a vivência. Não basta sobreviver, é preciso dar conta de VIVER.

    O livro Noites escuras da alma, outra obra de Moore, traz o alerta: Se estiver procurando por significado, caráter e substância pessoal, talvez descubra que a noite escura tem grandes dádivas a lhe dar¹⁰. Que as noites escuras da alma não impeçam de acreditar que a vida sempre se faz possível. Se não houver sentido algum em estar nessa vida, que o sentido seja inventado! Ali, onde não houver caminhos a percorrer, ponha-se em jornada e o caminho se mostrará. É no caminho que a vida se faz.

    Que bom que você leu até aqui. Convido a seguir comigo pelos textos. Boa jornada. Boa leitura.

    A autora

    Florianópolis, ilha de Santa Catarina, tempo de advento de 2023.


    ⁶ MOORE, Thomas. Cuide de sua alma. São Paulo: Siciliano, 1993. p. 9.

    ⁷ BONAVENTURE, Léon. Amor e Psique. São Paulo: Editora Paulus, 1998.

    ⁸ Há uma diferença entre as palavras psique e psiquê. As duas costumam ser confundidas e utilizadas ora de uma forma ora de outra, mas Psiquê (com acento circunflexo) é uma personagem mitológica, uma divindade que personifica a Alma, que se apaixona por Eros, o deus do amor, formando o casal mitológico Eros e Psiquê.

    ⁹ JUNG, Carl Gustav. Os arquétipos e o inconsciente coletivo. Petrópolis: Vozes, 2014. (Obras Completas, v. 9/1). p. 35.

    ¹⁰ MOORE, Thomas. Noites escuras da alma. Campinas: Verus, 2009. p. 13.

    SOBRE AS TERRAS ÁRIDAS DA ALMA

    No deserto você aprende que o mais rico não é o que mais tem, mas o que menos necessita. Muitas vezes, algumas gotas de água são o suficiente para tornar o filho de Adão o mais feliz dos seres.

    Georges Bourdoukan, em Vozes do deserto¹¹


    ¹¹ BOURDOUKAN, Georges. Vozes do deserto. São Paulo: Casa Amarela, 2002. p. 22.

    Será possível retroceder?

    E por que é o Sol tão mau amigo do caminhante do deserto?

    E por que o Sol é tão simpático no jardim dos hospitais?

    Pablo Neruda, em Livro das perguntas¹²

    Desertu, do latim, significa desabitado, solitário, esvaziado. O deserto evoca em nós a estranheza de um lugar cheio de vazios em que pensamentos e sentimentos nascem e morrem, onde o nada é infecundo até se tornar pleno de completude fecunda. No deserto, a cada passo, habitamos o inabitável, o longe e o perto são abstrações. Ali, há algo de sagrado e de incredulidade, de liberdade e de aprisionamento, de esconderijo e de morada, de vida e de morte, de ausência e de existência, de separação e de encontro, de contemplação e de desespero. É preciso haver o vazio para que haja lugar possível de ser ocupado. Os opostos nos habitam.

    Existem desertos de todos os tipos. A maior extensão desértica do mundo não é de calor escaldante, areia e vento, mas de gelo: a Antártica. O Saara tem a maior extensão entre os desertos quentes. Há, na vida, vivências duras, traumáticas, desoladoras, tempos de absoluto desamparo, que podem nos levar a experiências extremas. São tempos inóspitos, nos quais a vida parece não conseguir resistir, e até mesmo Deus parece ter desistido de nos acompanhar.

    O deserto, como imagem de nossa vida interior – como paisagem psíquica –, remete a tempos em que nos tornamos estrangeiros e estrangeiras na própria pele. É um tempo de desorientação e de esgotamento, de redenção e de renascimento. Convido a olharmos para nossos tempos de deserto a partir de três verbos: retroceder, permanecer e atravessar.

    Há momentos em que experimentamos lugares, relações e vivências que apequenam a vida, que sufocam e machucam. É quando a impotência diante do sofrimento pode trazer desejo de querer retroceder. É quando aquele sentimento de eu era feliz e não sabia ou quero voltar ao que era antes surge com toda força, trazendo um rastro de amargura. Será mesmo possível retroceder?

    Em algumas situações há formas e caminhos pelos quais retornar, mas nem sempre é o melhor a se fazer. E, ainda assim, o lugar e as pessoas de antes terão se transformado, assim como nós: voltar atrás em uma opinião, retomar um relacionamento, voltar a morar na casa da família, reassumir um trabalho depois de algum tempo... Beto Guedes e Milton Nascimento avisam: "Eu já estou com o pé nessa estrada. Qualquer dia a gente se vê. Sei que nada será como antes amanhã"¹³.

    Retroceder será sempre um desafio inglório porque, quando nos damos conta, já estamos imersos na imensidão árida. Quando ouvimos um diagnóstico, não estamos diante da doença, estamos com a doença em nosso corpo. Quando alguém nos diz que não nos ama mais, não estamos diante de um deserto, já estávamos vivendo nele há algum – ou muito – tempo. Tomar consciência do deserto em nós é uma dor que primeiro nos desarruma por inteiro para depois nos colocar em contato com a nossa força para a arrumação. Tomar consciência

    Está gostando da amostra?
    Página 1 de 1