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Peregrinos de Shambala
Peregrinos de Shambala
Peregrinos de Shambala
E-book445 páginas6 horas

Peregrinos de Shambala

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Sobre este e-book

Tomás, um jovem que perdeu tudo, inicia uma viagem à Índia para tentar redirecionar o curso de sua vida. Logo ele encontra companheiros interessantes com quem irá partilhar momentos inesquecíveis, vai se deparar com escolas de sabedoria e aprender ensinamentos básicos. Tudo em uma viagem de mochileiro em que o acaso e o carma parecem desempenhar um jogo épico de xadrez, ou de futebol, como preferir, com um tabuleiro bem exotico e um placar impar e exemplar, com um gol que emplaca, percorrendo diversos lugares sagrados e emblemáticos para o buscador espiritual. Uma viagem cheia de experiências, cheia de encontros com acadêmicos e personagens pitorescos que vão descascar pequenas contas e outras grandes "pérolas de sabedoria" para ajudar o protagonista a encontrar o seu caminho.
O protagonista e o leitor podem, assim, encontrar as chaves espirituais que lhes permitam avançar. Por outro lado, o viajante vai viver outros encontros mais mundanos, com espaço para o amor, o desgosto e a tristeza. Encontros que, gradualment, vão se juntando em um "romance mandala" que vai nos deixar com um gostinho de "quero mais" na boca. 

IdiomaPortuguês
EditoraBadPress
Data de lançamento2 de dez. de 2015
ISBN9781507125526
Peregrinos de Shambala

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    Pré-visualização do livro

    Peregrinos de Shambala - Rafael Téllez Romero

    DEDICAToria

    Às três mulheres na minha vida:

    Reyes, que me deu à luz;

    Beatriz, que caminha comigo através do labirinto

    e Ariadne, que puxa o fio.

    Prólogo

    A origem deste romance foi uma viagem que fiz pela Índia por quase quatro meses. Uma jornada que comecei sozinho, com a intenção de fazer uma peregrinação e conhecer a espiritualidade desse país maravilhoso, logo encontrei outros viajantes e compartilhei muitas experiências, e estava escrevendo em um caderno de viagem. Estas notas foram apenas o começo, na minha volta, comecei a trabalhar para transformá-las em um romance, em seguida, foram misturadas a realidade e a ficção, resultando em uma obra de ficção com toques autobiográficos.

    Agora a pergunta é: o que é autobiográfico e o que não é, se nem mesmo eu posso dizer com certeza, porque, na realidade, eu conto tudo que aconteceu, embora muito do que contei acabei fazendo apenas na minha mente? Assim, essas experiências subjetivas são parte da vida e acho que vale a pena aproveitar a vida completamente.

    ÍNDICE

    agradecimentos

    Quero mostrar a minha gratidão aos grupos de pessoas que ajudaram a desenvolver o meu senso de espiritualidade. Em geral, todos os irmãos e irmãs que se voltam os olhos para a luz do Leste e, mais particularmente, para a humilde Sangha budista que encontrei em Sevilha, onde Goyo ensinou a meditar sorrindo para mim, Lola a dar valor à palavra, Marcos por acreditar nos meus sonhos, Ana a enxergar com o olhar de bondade, e Isabel por perseverar.

    *

    *        *

    A escrita criativa está revelando para mim como um caminho espiritual e autoconhecimento. Agradeço calorosamente os esforços de todos os que me ajudaram a traduzir esse romance:

    RB Paul, que me apresentou à arte da escrita criativa.

    Os membros da classe de Escritores Guadaltintero: Maria, Julio Reyes, Santi e Inma, com quem eu compartilho horas de debate e aprendizagem, sempre recebendo uma crítica amigável, o que reforça e motiva os meus escritos.

    Jose Fernando, Noelia e Carlos com correções ortotipográficas.

    0 BARRO

    Ele estava suando, sua respiração acelerou e se transformou em vapor em contato com o ar. Um ar frio, como a lama e as pedras que removia. Jogava pedras e telhas de ardósia preta de volta, frenético, sem olhar. Nunca pensei que poderia ferir Maurício, que como ele, estava ajoelhado sobre o túmulo onde ele tinha enterrado a casa. As pontas dos dedos ardiam e o sangue se misturava com a lama. Os olhos fora das órbitas com nada para ver exceto a desolação e o barro escuro que tinha destruído tudo. Tomás olhou para suas mãos afundadas na lama, e não as sentia mais, ensaguentadas, dormentes com o frio, e assim a consciência o deixou. Tinha acontecido de novo, ele tinha perdido Shambala. Tudo começou um ano antes, no vôo para Nova Deli.

    1.0 aterriSSaGeM eM delhi

    Ele olhou para a esquerda pela janela do avião, para a miríade de luzes que definiram a cidade lá embaixo. A luz irradiada a partir da escuridão circundante lembrava a um neurônio com milhares de ramos brilhantes por sinapses. O avião se inclinou alguns graus acima do seu plano pela esquerda, ampliando o ângulo de visão e revelando ramificações anteriormente ocultas de nova luz. Longas filas como filamentos brancos juntaram pedaços amarelos dourados luminescentes. Logo sentiu que Maurício saltava sobre ele desde o assento ao lado.

    —Veja, deixe-me ver! E já estamos chegando?

    Tinha conhecido Maurício no avião. Coincidência ou destino? Ele também era de Sevilha, e parecia ser um rapaz legal, mas falador. Nas doze horas de viagem, incluindo a escala em Milão, não foi capaz de parar de falar com uma voz considerável e de grande intensidade, sim, ocasionalmente, buscando a aprovação de Tomás às suas palavras. Mesmo comendo ele nunca havia parado de falar, eles tinham sido capazes de escolher o menu ao estilo indiano e Maurício tinha sentido, falando com a boca cheia, que era a mesma comida de avião sem graça mas picante. Tomás assentiu, engolindo em seco os legumes frios e fortemente aromatizados, e as especiarias frias não se expressavam em toda a sua magnitude.

    Teria preferido um passeio mais quieto, preparando-se para a experiência que ele procurava: a imersão na Índia dos sonhos, para procurar respostas e a paz, acabar com o tormento e a frustração que sentia. Talvez fosse um sinal: o destino lhe tinha enviado nesse voo um companheiro espirituoso, que pelo menos seu palavreado e por ser tão verborrágico não permitiria que ele se chafurdasse na tristeza.

    —Sai para lá, cara, que está me sufocando — Ele sacudiu seu companheiro de viagem de um empurrãozinho.

    Maurício voltou para seu assento e prendeu-se nele pelo cinto de segurança.

    Ele era alto, medindo quase dois metros de altura e era magro, de cabelo preto e um pouco oleoso, vestido em calças jeans desbotadas e uma camisa de esportes vermelho descolorida, e como cinto usava uma pochete vermelha com propaganda de Marlboro.

    Tomás olhou para fora da janela, ele foi descendo para a rede neural, infundindo mais e mais em sua luz, podia começar a adivinhar como qualquer desses elementos luminosos tinham um movimento relativo em relação ao resto da grade de luz. Seus olhos refletiam uma alegria momentânea, o corpo curvado instantaneamente. Logo ele baixou a cabeça, sua juba de cachos castanhos cobriram o rosto. Ele colocou as mãos na cabeça, e por um momento ficou cabisbaixo.

    —Ai meu Deus... meu Deus!—. A agitação do seu ombro direito o tirou do seu lamento. Era Maurício que o puxava de sua camisa verde como um garrafão de cinco litros de água.

    —Olha para frente, cara! E para fora as teias de aranha!...

    Tomás levantou-se e jogou o cabelo para trás, os olhos dele tinham se avermelhado.

    — Sim, você tem razão: eram teias de aranha! — Ele fez um gesto com as mãos, como para limpar sua cabeça da malha tristeza pegajosa que o prendia.

    —Pode ser desonesto ocasionalmente, mas não angustiado, cara! Eu também tenho razão para me lamentar, mas tem que levar numa boa, ou se fica chorando o dia todo! E isso não vai levar a lugar algum, não é mesmo?...

    —Sim, bem, acho que não, mas eu não vou chorar... chorar... o que se diz chorar é que nunca se lamenta ou chora: Eu custo a chorar, o que eu faço constantemente é sentir tristeza e me dói muito nos meus olhos e boca, mas não choro assim. Eu sinto o mesmo que quando eu vomito e que me custa muito poder ter o meu próprio vômito passo uma vida inteira querendo vomitar com ansias e nao consigo soltar tudo para fora, mesmo que seja ruim ou que bebi para caramba, eu vou para a cama com o corpo dolorido, passando a noite bem mal e nada de vômitos... vai ver isso faz parte da minha natureza, mas é que também eu bebo todas... Eu bebo, sim, estou vivendo...

    —Ah, mas eu não faço isso! Eu sinto falta de uma bebida forte, é o melhor que existe: beber até se encher, em seguida, colocar os dedos na garrafa e meter na boca, enfiar goela abaixo, e você poder ir para a cama como um rei.

    O avião se inclinou para trás e se estabilizou descendendo na teia de luz. Entre toda a rede infinit de luzes parecia que o aparelho elegia e se enfiava em um cano de linha reta e ordenada por um caminho assinalado por marcos brancos brilhantes, alguns indicadores e certos sinais vermelhos. Logo se ordenavam as luzes ao redor, e outros tipos de iluminação com tons de pêssego, ouro, laranja intensificada, como o tecido luminoso de Delhi.

    Eles entraram na membrana de luz âmbar que cobria a cidade, para baixo um pouco mais e em um momento se deslizou sobre a terra.

    1.1 Hotel 55

    Maurício olhava a cauda que parecia soprar: centenas de turistas com suas bagagens foram se alinhando perante na alfandega e, diante do controle de passaporte, um homem de meia-idade sorriu para ele.

    Take it easy. — O homem sinalizou com um inglês comercial, e um forte sotaque indiano, mas com toques de curso formal em inglês. Tomás e Maurício entenderam melhor do que qualquer nativo em inglês. Eles continuaram a ouvir e compreender tudo, como se eles tivessem ouvido um colega nos tempos do ensino médio—. Em India sempre temos que esperar. — O homem concluiu.

    Tomás olhou para fora, evitando os obstáculos à vista, ele esticou a cabeça como se procurasse alguma coisa. Maurício se inclinou sobre seu ombro.

    —O que há de errado?

    —Nada, estou em busca do motorista que vai me levar ao hotel.

    —Taxista do hotel? O que você está fazendo? Viajando?

    — Ha ha... não é isso, sou um homem sensato e que me aconselharam que a primeira noite pelo menos eu deveria ficar em um hotel reservado a partir de Espanha e que me mandassem vir um táxi.

    —Por que? Também não vai deixar que te preguem no hotel?

    —Não é isso, é para a segurança, o guia de viagem recomenda como medida de segurança em qualquer viagem internacional. Pode ser perigoso tomar um táxi no aeroporto, não sei, se a essas horas podem levá-lo para o hotel da sua escolha e cobrar tudo o que quiseram entre outras coisas...

    —Filhos de uma égua!... E em qual hotel você vai ficar?

    — Eu vou para o Hotel 55: o guia de viagens globetrotter diz que é um bom hotel, não sei se é caro, mas vale a pena para não estragar o primeiro dia.

    — Bem, você sabe o que quero dizer: Eu estou indo com a sua carona!

    —Um momento, cara! Como aquele homem mesmo logo ali disse, take it easy. — Tomás lhe plantou a palma da sua mão na frente —. Não me diga que você vem com isso logo de cara, mas melhor me pergunte se eu quero compartilhar o táxi com você.

    — Bom, muito bem, cara, eu pensei que nós éramos colegas, e também fica mais barato e você tem um colega com quem falar em espanhol: o que, isso não parece bom e você quer me bloquear?

    —Não é que não me apetece, é que eu tinha uma ideia de viagem e esta é outra coisa. Parece bom compartilhar táxi e vir para o hotel se quiser, mas a partir daí eu quero fazer minha viagem sozinho, mina ideia seria a de me misturar com as pessoas aqui e encontrar alguns ensinamentos espirituais: o que é uma jornada espiritual, e é dito que se faça isso de maneira subjetiva, pessoal, você sabe.

    —Ok, ok, o que quer que você diga, mas pense agora: nós estamos os dois prontos para tomar um táxi e sair do aeroporto juntos, certo? Pois isso está bem claro! — Meteu sua mochila nos ombros e começou a andar.

    Quando saíram do controle de passaporte acabaram por se encontrar em um grande saguão do aeroporto. Vários homens, alguns com terno e turbante, esperavam, alguns com um cartaz como um sinal na mão, com os nomes completos dos seus clientes. Tomás não encontrou o seu condutor mas de repente imaginou que um homem que portava o que parecia ser um pijama marrom segurando um pedaço de papelão em suas mãos com algo parecido com o seu nome escrito em letra irregular era o seu taxista.

    Eles chegaram ao parque acompanhado do condutor. O homem, com a pele envelhecida e escura, estava lutando para transportar as mochilas, o que ambos se recusaram a entregar. Na variedade do estacionamento de vans, carros de luxo e táxis viviam o movimento de turistas. O motorista se aproximou de um automóvel e abriu a porta, indicando com a palma para dentro do carro curvando-se com certa reverencia solene.

    Please sir.

    Tomás olhou Maurício e lhe deu uma piscadela.

    —Gostou da limusine?

    — Eu sabia que eu iria longe ao sair seguindo seu caminho. — Ele tirou a mochila e a arremessou no veículo.

    O rickshaw saiu em disparada, o homem dirigia o volante fluentemente através do emaranhado de tráfego. Maurício ficou pendurado no cubículo na parte de trás e Tomás, preso por suas mochilas, vendo a noite na estrada: longas filas de luzes em movimento foram passando por essa artéria para o coração palpitante de Delhi.

    O motorista dirigiu o carro em torno de uma rua que circundava um quadrado. Apesar da hora, ainda havia pessoas andando à luz da lâmpada fraca. O táxi parou na frente de uma porta de madeira com a pintura rachada onde nela se exibia um remascente sinal de néon de pequenas dimensões: Hotel 55.

    Maurício apertou a mão do motorista.

    — Obrigado, muito boa viagem. — Virou-se e deu de cara com Tomás—. Você está certo! Felizmente eu escutei o seu conselho e acabei vindo com você.

    Tomás com a sua mochila ficou parado de pé, suando em bicas, a noite era tão sensual como a situação.

    — Se não o que? Eu não pedi para que viesse, que era você quem insistiu, agora você sabe o que te toca... partiu de você!

    Maurício tocou a campainha:

    — Não, você vê, se é que isso é bom, eu vim para isso... isso é muito mais autêntico, eu prefiro uma pensão que um hotel de luxo. Mas que falem pelo nome!

    Um jovem magro com cabelo penteado acompanhou-os até os quartos. Tomás veio em seu próprio jeito, o rapaz continuou mostrando a televisão e colocando o aparelho para funcionar. 

    The toilette please? —Tomás perguntou com a voz trêmula e as sobrancelhas arqueadas.

    O menino, diligente, abriu uma porta.

    Off course sir: western style! — disse, apontando o vaso sanitário do w.c.

    O quarto era nada sofisticado, ele se encontrava relativamente limpo, a parede forrada com carpete verde desbotado pelo tempo e manchado com poças. A aparência era aceitável e a cama confortável.

    O jovem desapareceu pela porta levando um passaporte, o que parecia dizer que deveria ajustar as contas na manhã seguinte. Logo soou, e ele foi ver quem batia a porta: era Maurício.

    —Que forte!... Você é um crack!

    Ele entrou na sala com um copo na mão e abriu a pequena geladeira do mini-bar.

    —Vamos celebrar. — Tomou outro copo de vidro do banheiro e derramou duas garrafas de uísque com latas de Coca-Cola individuais nas mesmas.

    Tomás pegou um dos copos.

    — Vir para a Índia para se embriagar em um hotel pulguento...

    Maurício aproximou seu copo.

    — Então aqui vai um brinde para a Índia e para o indiano, e para as Índias que ainda não vimos uma boa por aqui!

    Tomás pegou o controle remoto.

    — Vamos ver o que eles colocaam na TV...

    Os diferentes canais ofereciam a mesma coisa ou informação ininteligível, ou uma série de vídeos de música com cantores do lugar e coreografias coloridas.

    —Que surpresa! Eles são fortes e mais bregas do que eu pensava... — A risada de Maurício ecoou em todo o hotel.

    Tomás estava deitado na cama exausto enquanto Maurício ficou dedicado em zapear a partir de uma cadeira posta a sua frente para assistir a televisão. Tomás se incomodava com suas risadas e isso lhe impedia o sono. Quando o uísque acabou, passaram ao gin.

    —Olha que canis: eles parecem os Camelos da Índia — Maurício não parecia que iria se cansar tão cedo dos vídeos.

    Tomás sorriu:

    — Estou bêbado, eu acho que é hora de ir dormir.

    Maurício foi ao mini-bar.

    —Restam somente duas cervejas indianas! Nós continuamos a fazer o controle de qualidade e então eu vou embora.

    Tomás olhou para as manchas sobre o tapete da parede: ele se lembrou de um mapa, a área da Europa foi borrada.

    — Venha aqui, beber para esquecer!

    Maurício sentou-se ao pé da cama, olhando para a TV e foi atrás de uma cerveja.

    — Existem coisas que a gente nunca esquece, se eu te disser. Eu era um homem formal, com um trabalho, eu ia casar e tudo mais, mas... Mas eu não sou amargo! Bebamos... vamos, venha comigo, embora, bebemorar!

    Tomás virado para o teto, que destacava o branco das paredes  cobertas com um carpete verde, e que apenas alguns meses antes de ele estar ali seu mundo havia desabado, lembrou daquele outro tempo olhando para o teto e pareceu escutar novamente a doce voz de Sara:

    — Desculpe, eu não consigo ter você, mesmo se eu tentasse: Eu não posso te atingir, e você tambem nem tente me atingir! Não é o mesmo que o início, e a gente não se beija mais como antes, tudo é frio, triste, não pode continuar assim!

    Ele reviveu sua própria confusão, como se isso estivesse virando o teto branco de ponta cabeça e a devastação varria o que parecia ser uma vida estável. Seu coração disparou e sua respiração pesada parecia repetir as únicas palavras que ele disse naquela noite:

    —Não me diga isso! Você realmente não sente mais nada por mim? E realmente não me quer mais? — Tentou ver isso em seus olhos, mas ela também olhava para o teto, e evitou seu olhar e se revirou abruptamente na cama, estando em posição fetal, de costas para ele.

    —Não me toque! — E deu de ombros ainda mais — Você vê o que eu te digo! Eu não posso continuar assim! —Sua voz se aquebrantava—. Sinto muito... Eu não posso mais.

    Ele a ouviu chorando por um tempo, ele tentou acariciá-la, mas foi flagrado em se intento, ela permitirá mas nenhum toque dele, implacável, mas com uma placa de fechada para reforma estampada em seu peito, e ele ainda tentava apertar sua pele e seu corpo o rejeitou.

    A noite passou em branco, ninguém pensou em mover um fio de cabelo, nem para desligar a luz. Tomás olhou para o teto com os olhos fixos. Era como um papel em branco, não! Era uma tela em branco do Word, onde alguém tinha apagado tudo: o verdadeiro amor, espiritualidade, confiança... tudo se foi, não havia nenhuma maneira de restaurá-lo. Enquanto isso, Sara parecia congelada e enrolada sobre si mesma. E acima naquele branco, não havia um vácuo, mas um doloroso remexer de olhos brancos, cruéis e aterrorizantes.

    Sara levantou-se, o relógio de cabeceira mostrava as horas: Eram seis e trinta da matina:

    — Eu vou arranjar um fumo com os motoristas de táxi no quiosque, ela já deverá estar aberta, eu preciso de um cigarro.

    Ele se levantou e estendeu a mão procurando por seus olhos, mas ela lhe virou as costas enquanto vestia um de seus macacões, um violeta com listras azuis e vermelhas que Tomás lhe havia comprado de uns hippies quando fizeram juntos o Caminho de Santiago.

    — Sinto muito, realmente, eu o amei muito, mas eu acho que nem posso continuar mais com isso, não para o resto da minha vida, porque eu estou me sufocando.

    Ela se afastou bruscamente e bateu a porta da frente e logo atrás dela de um golpe. Tomás sentiu-se cortar a respiração enquanto seus ombros tremiam. Algo tinha mudado, tão sutil e tão yoguica, nunca antes tinha se dado ao luxo de tal estrondo.

    —Esta cerveja tem o seu ponto! — Maurício deu um brinde de repente fazendo com que parte da cerveja que ainda estava dentro da garrafa que Tomás erguia fosse derramada na cama.

    Os olhos de Tomás voltaram-se novamente ao teto do hotel, e Sara, de modo espiritual e ainda assim tão instável, ela desapareceu. O verdadeiro amor era uma fraude. Ele levou a garrafa ate sua boca para afrouxar o nó da garganta e riu enquanto assistia televisão.

    Terminou sua cerveja, Maurício saiu da sala, batendo a porta. Tomás seguiu um tempo de vigília, com a luz apagada, assistindo a vídeos de música. Os flashes de cor iluminavam o escuro sobre o tapete puído que envolvia o mapa do mundo que às vezes se dispersava entre as manchas borradas.

    1. 2 Rickshaws

    Tomás levantou-se e desceu as escadas estreitas, o garotode cabelo oleoso acenou diligentemente mostrando o passaporte. Ele pegou e pagou para poder permanecer no quarto, que parecia barato: sete euros pelo lugar e para se transladar eram outros mais sete de táxi. Bebidas relatadas: a inclinação da cabeça oscilava com um sorriso. Eram mais dez euros.

    A rua estava movimentada: muitas motocicletas verdes fluirampara  cima e para baixo, um motorista magro e desdentado puxava o carro para a calçada levantando poeira:

    Sir!, Sir!, rickshaw? —Tomás se recusou fazendo um gesto em negativa

    No thanks. — O automóvel seguiu-o a uma curta distância.

    Sir, Sir!  —Tomás novamente se recusou, mas seu perseguidor insistiu.

    Ele virou a esquina e entrou por um pórtico, onde pululavam diferentes negócios: agências de viagem, um restaurante, lojas, um cinema. Fora do portão, o desdentado o seguiu insistentemente—Sir!, sir!

    Ele entrou em um pequeño estabelecimento e um jovem, vestido de branco e com a cabeça coberta por um pequeno gorro da mesma cor, logo o atendeu. Tomás abriu a guia globetrotting:

    Lassi please.

    O rapaz serviu imediatamente um copo grande cheio com um iogurte caseiro cremoso. Tomás bebeu com pressa e de repente seus olhos se encheram de lágrimas. Ele olhou para o teto sujo do local e colocou o copo no balcão, dando um golpe que assustou o garçom. Sem uma palavra, ele colocou algumas rúpias no balcão e deixou o lugar.

    Ele se inclinou para a frente como com um lenço enxugando as lágrimas e soou o nariz.

    «Porcaria —pensou—, com pouco trabalho que custa me lamentar, hoje eu vou chorar meus olhos para fora pela porra de um iogurte ».

    Conseguiu se recuperar e suspirou, o riquixá desdentado se havia ido, em seguida, sentiu uma mão em seu ombro, um menino com um sorriso amplo e camisa de seda amarela mostrou-lhe um mapa:

    —É um presente, sir, eu sou da agência de viagens estatal. — O menino falava inglês que eles usavam para comunicar com todos os turistas e tão fácil de entender.

    Tomás recusou seu serviço, sem sucesso, e terminou com o mapa em suas mãos. O menino em poucos minutos acabou sabendo tudo sobre ele, era um espanhol, e que acabava de chegar, ele estava hospedado no hotel 55, que foi junto com outro espanhol...

    Tomás  retornou em seus passos, o menino com ele, o nascer do sol brilhou sobre a seda amarela de sua camisa que promovía ainda mais seu sorriso. Eles foram abordados por um automóvel conduzido por um homem baixo vestindo uma camisa do FC Barcelona e que tropeçou em seus passos, as barras catalãs acentuando a redondeza de sua enorme barriga.

    Rickshaw sir?!

    O jovem de amarelo pisou primeiro começando a discutir com o motorista, e Tomás aproveitou a oportunidade para se esgueirar em seu ritmo rumo ao hotel. Imediatamente sentiu como uma pedra tombando sobre o ombro—Sir, não dê ouvidos aos motoristas de rickshaw, eles sempre te pegam, eles querem te enganar. 

    Tomás olhou para os seus pés, levantando poeira no chão maltratado com telhas quebradas.

    O menino estaba se balançando ombro a ombro com ele:

    —E aonde vamos agora, sir? Tenho descontos para tudo, taxi, trens, deluxe bus.

    Tomás agarrou o rapaz com uma das mãos:

    —Já deu! Nós não vamos a lugar algum!

    O menino olhou para ele com os olhos e a boca muito abertos:

    —O que foi que aconteceu, sir?

    O letreiro do hotel 55 podia ser visto como o objetivo, Tomás acelerou enquanto o cara amarelo falava mais que a boca ao lado dele. Ele atravessou a entrada do hotel, sem pedir licença para o menino e sema o menos despedir dele, ele que tinha entregue um cartão de visita.

    See you later sir!

    1.3. ChaNdni Chowk

    Maurício acordou encharcado de suor: ele luzia uma leve dor de cabeça, mas um zumbido horroroso com ruídos e sussurros se misturavam com as vozes de seus sonhos: crianças guinchando! Seu coração fora do peito. Ele olhou para o teto e as paredes acarpetadas permaneciam inertes, mas ele estava com medo, pois que aquela não era a sua cama.

    «Ah bom!... Eu estou na India!».

    Alguém bateu na porta... a voz era de Tomás. Ele saiu da cama e ficou cambaleante caminhando entre suas calças de brim.

    —Estou indo... Mas que ressaca!... — A batida na porta persistiu.

    — Adeus, eu vou embora daqui, isto aqui é esmagadoramente atordoante...

    — Bom, cara, espere, eu ainda estou com sono, vamos sair para uma caminhada e depois me conta tudo.

    Eles concordaram em deixar a bagagem no hotel enquanto eles decidiam o que fazer. Eles saíram às ruas, enquanto Tomás lançava olhares fugazes para todos os lados.

    —Nós deixaremos o local em breve! E não paremos de nos mover: se eles nos detectam, estamos perdidos!

    A prioridade era a de atravessar a rua, uma motocicleta quase atropelou Maurício logo à sua frente. Tomás puxou o braço do companheiro como prevenção do abuso que certamente se sucederia caso ele fosse menos cuidadoso que o colega distraído.

    —Cuidado: Aqui parece que conduzir mal faz parte do hábito, é de lei, além do que dirigem na direção contrária! Assim como acontece na Inglaterra, e na Austrália...

    —Ao contrário... para a direita e de todas as maneiras, que manero! Mas não viu como são todos loucos e nada sãos?

    Tomás assistia ao show: carros caindo aos pedaços, motorickshaws, rickshaws puxados por bicicletas, motocicletas, caminhões modernos... tudo fluindo de maneira caótica. Cada motorista parecia buzinar continuamente como uma forma de rotina para circular.

    —Sim, isso aqui sim que se pode chamar uma loucura: mas que funciona...Corre! Vamos atrás deste aqui!

    Ambos ficaram imersos no fluxo, eles atravessaram o passo seguinte como um pedestre local experiente. Tomás puxou o mapa do bolso:

    —Estamos aqui!

    Maurício observava o mapa:

    —E como vamos chegar ao Old Delhi?

    Tomás havia notado antes que existía um camino por uma ampla avenida:

    —Eu acho que em linha reta e logo chegaremos a Chandni Chowk: a rua do antigo bazar.

    Eles começaram a andar tentando ignorar os motoristas de riquixás. Passaram através de um barracas centrais, em torno dos quais muitos foram espremidos por rickshaws em seus pedais, vários homens em roupas gastas e agachados de joelhos  reparando um dos veículos motorizados.

    — Olha, esse que parou nos boxes.

    Tomás disse apontando para a frente.

    —Corre! Não pare agora, que não nos vejam!

    — Relaxe, você está seguro enquanto eles permancerem enrolados com seus próprios problemas... nós vamos comer algo ou vamos ficar aqui morrendo de fome? —  disse, apontando para um velho homem de cócoras no meio da calçada que aquecia um pote de lentilhas com um fogão portátil. O velho, em shorts, deixou no ar uma das pernas magras mostrando as panturrilhas hipertróficas com os gêmeos subnutridos. 

    — Olhe para cima e logo em frente e vai ver onde o Old Delhi começa, a certeza de encontrar algo de bom para um pequeno café da manhã ou, a essa hora, poderemos considerar um almoço. — O olhar de Tomás oscilava entre o mapa e os arredores.

    Eles passaram por vielas estreitas, e poderiam tocar ambas as paredes se estendessem seus braços: nas sombras as motocicletas iam e viam sorteadas, uma mulher, que carregava uma bacia azul, levava e lavava uma criança levada na rua, exalava o cheiro da fumaça perfumada e pungente de um pequeno santuário com deuses coloridos e ornamentados de flores e óleos aromáticos. Tomás parou por um momento ao lado de um barbeiro, que exercia seu comércio em uma cadeira colocada na rua. A atmosfera permeou a escuridão com seus sentidos misturando-se com o colorido, a umidade com incenso, e mais os ensopados picantes e o odor de combustível.

    Tomás se deteve por um momento em que ele parou de girar o mapa. Maurício arrebatou o guia das mãos dele.

    —Deixe eu dar uma olhada para ver exatamente aonde estamos... e para onde vamos... Vamos logo, porra! Se nem tem nenhum letreiro por esas ruas — Ele caminhou um pouco errante, olhando para cima. As paredes, sujas e lascadas, onde haviam pendurado varais com emaranhados de cabos, e se acumulavam de forma cavalar como videiras a escalar uma parede à outra, incluindo uma inscrição em que se lia algo substantivo—. Tomás, venha ver isso! Aqui temos um cartaz, mas está em letra antiga!

    Hindi, isso pertence ao devanagari, a escritura hindi... Mas para nós isso parece mesmo chines.

    Maurício devolveu o mapa ao amigo.

    —Melhor a gente perguntar por aqui se sabem o significado.

    — Não, isso significa que logo vão nos emaranhar de novo! Como se você não soubesse o quanto eles são insistentes! O melhor que a gente pode fazer agora é continuar em frente e você verá como nós encontraremos algo.

    Depois de vagar por um tempo entre as ruas, a paisagem se abriu em uma avenida larga com pessoas heterogeneas em ambos os lados deles, nas varandas e galerias com as lojas abertas: Tomás tirou o seu guia para fora novamente.

    —Isso aqui deve ser o Chandni Chowk.

    A presença diante deles de um homem baixo e gordo com a camisa do FC Barcelona e um cartão na mão, e isso o fez confirmar que eles estavam na

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