Entre Ciborgues e Coquetes: Notas Sobre a Cultura Feminina no Facebook
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Sobre este e-book
vida. Esta obra é inspirada em uma literatura metodológica contemporânea que acompanhou os estudos etnográficos mediados pelo desenvolvimento das tecnologias de comunicação. Com o ambiente on-line como campo de estudo e repertório de fontes bibliográficas, este livro apresenta as modulações da feminilidade, que historicamente fazem das mulheres representações e reproduções de um status controlado, assim como demostra as correntes contrárias e de resistência, as quais desempenham a potência da ação política emancipadora para reconstrução criativa de ser mulher, vociferadas pelas ruas e redes – que se viabilizam nos usos das tecnologias em comunicação.
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Entre Ciborgues e Coquetes - Cláudia Pereira Ferraz
Brasil.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO
CAPÍTULO I
ENTRE FEMININAS E FEMINISTAS NA INTERNET
1.1 COQUETISMOS ON-LINE E SOCIABILIDADE DIGITAL
1.2 CIBORGUES E CIBERFEMINISTAS
CAPÍTULO II
COMPREENDENDO A CONDIÇÃO FEMININA PELA ETNOGRAFIA On-line EM COMUNIDADES NO FACEBOOK
2.1 DO CINEMA À COQUETE On-line – AS POSES QUE COBREM AS DORES
2.2 SOBRE AS MULHERES PERFEITAS
2.3 SOBRE AS MULHERES QUE ORAM
CAPÍTULO III
FEMINISMO On-line E A CONDIÇÃO DA MULHER NO início do SÉCULO XXI
3.1 SOBRE FEMINISMO SEM DEMAGOGIA – FEMINISMOS NO FACEBOOK
3.2 A CONDIÇÃO FEMININA CONTEMPORÂNEA SOB O PANÓPTICO RELACIONAL On-line
CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS
INTRODUÇÃO
Antes da ascensão das redes sociais on-line fazer parte da vida cotidiana como na primeira década dos anos 2000, já havia uma sociologia que reivindicasse o estudo antropológico das tecnologias de comunicação no cotidiano das ações sociais, como a televisão ou o telefone fixo. Como desdobramentos das metodologias de análise em redes sociais, este estudo sobre as atrizes sociais em redes on-line segue o conceito de redes pensado por Latour¹, em que se expressa, na avaliação da energia, movimento e especificidade para a capacidade de incluir e relacionar os dados da pesquisa. O desempenho desse conceito, direciona esta obra etnográfica em mídias on-line e a faz capaz de preparar o texto para substituir as atuações na rede pelas mediações. Tal como Latour apontou; considera-se também as redes como a regra em que as conexões que se estabelecem são rastreáveis e, por isso, preparadas para o registro empírico.
Com referências que tratam das recentes metodologias em redes de mídias on-line, a investigação sobre a condição da mulher no século XXI, se estabelece observando os elementos de interações e conexões na rede digital. O próprio ambiente on-line como campo de pesquisa, e também como fonte, dispõe muita informação sobre as práticas de análise e métodos de investigação em novas mídias sociais. Por ser um método que acompanha os desdobramentos das tecnologias da comunicação, o extenso tempo destinado a este estudo, demostrou que só foi possível desenvolver uma pesquisa consistente, se dispondo a observar as relações de atuações das mulheres no campo digital, seguindo e coletando dados pelo período de três anos. Pois só assim foi possível comparar a movimentação dos dados e verificar as informações significantes para o diagnóstico da pesquisa.
Portanto, paciência, criatividade de elaboração da síntese entre os métodos e observação dos movimentos dos dados, foram elementares ao estudo etnográfico sobre a condição da mulher no Brasil no século XXI, retratado por sua manifestação nas recentes mídias digitais.
A leitura de Horst, Hjorth, e Tacchi inspira à considerar esta obra, também como um estudo de mídia², pois as ciberfeministas nasceram quando se nascia a internet como mídia de conexão – e cultura feminina e feminista em redes digitais, só existem devido a atuação nas novas mídias sociais on-line. No texto, os autores, apresentam a importância da etnografia e dos estudos antropológicos nas análises críticas das mais recentes mídias. A partir do texto Rethinking Ethnography an Introduction (Repensando a Etnografia – uma introdução), se apresenta a etnografia on-line como uma extensão da etnografia de mídias, uma vez que, o universo digital compõe a nova mídia símbolo da contemporaneidade. Desse modo, apontam para o surgimento de um estudo etnográfico desenvolvido em torno da cultura nas mídias digitais com o papel reflexivo da Antropologia. Sugerindo então, um estudo que se embarque nas questões das práticas desenvolvidas, através das mídias, mediando o estudo cultural, na qualidade de potência da expansão dos estudos antropológicos. A Antropologia, desde os anos oitenta começa a se focar no ambiente privado da cultura de classe média ocidental, em suas mais variadas formas e contextos. O texto alega que passou a ser impossível ignorar a estrutura da vida cotidiana nas relações sociais imersas nos contextos da conexão on-line, já que isso, dinamiza um novo contexto de realidade. Atualmente a etnografia da mídia começa a se mover sob novas direções atualizadas e viabilizando o estudo da mídia digital como fruto da tecnologia, introduzindo novas plataformas e dispositivos que levaram a um alargamento das necessidades de compreensão dessas novas fontes de dados, as relações comunicacionais tecnológicas e a interação social. Estudar os feminismos e as expressões da feminilidade na rede social Facebook necessitou de mais fontes metodológicas, a fim de poder dar conta das análises sobre a questão dos estudos de gênero, nos estudos científicos sobre o feminismos. Inspirações ao olhar observador sobre as perspectivas desta presente pesquisa levaram ao uso de outros elementos, entre os sensoriais e metafóricos, para o tratamento do objeto de pesquisa que, nesse caso, se relaciona aos feminismos a às feminilidades mediados pela tecnologia de mídias on-line.
Quando Donna Haraway³ escreve sobre o privilégio da perspectiva parcial, propõe uma metáfora sensorial sobre a visão. Segundo sua colocação, se quisermos evitar as oposições binárias na objetividade, devemos praticar a incorporação de metáfora nos trabalhos científicos voltados aos estudos dos feminismos. Esse desempenho visa garantir o seu desenvolvimento de maneira crítica, em saberes localizados dos feminismos, os quais, entre si, são diferenciados. Tal localização se dá no mapeamento das páginas feministas no Facebook, referente à perspectiva que atende a proposição da autora, na ação de conhecimento potente no sentido de construir mundos mais livres das organizações formadas por eixos de dominação e hierarquia
. Ao introduzir as mediações tecnológicas simultâneas e transparentes em registros viáveis pela tecno-ciência da cultura digital (ideia estruturada pela autora, antes do fenômeno das redes sociais on-line), Haraway oferece uma intepretação visionária, a qual esta pesquisa se inspira, para, desse modo, criar as explicações científicas e políticas do corpo/máquina na ação feminista em comunicação on-line, pela difusão digital de suas manifestações políticas. A função da visão pretende aqui, seguir sua proposta na não passividade do olhar em sua função, no sistema de percepção ativo nas construções de traduções e maneiras específicas de visualizar os modos de vida, dos considerados aqui, como atuantes nos movimentos feministas clássico e recente em redes digitais. As palavras da autora indicam a necessidade de fidelidade à visão do outro, mesmo quando o outro é nossa máquina. Ela encaminha este estudo à busca da compreensão dos sistemas visuais em sua funcionalidade técnica, social e psíquica, trabalhando a imaginação e a razão, na combinação entre a visão visionária e a visão objetiva dos dados que emergem das redes digitais.
Para tratar dos feminismos na rede social digital, este livro retorna ao sentido ciborgue, propagado pelo manifesto realizado em outra obra Donna Haraway (1985), em que tal conceito absorvia, pervertia, subvertia e transcendia o feminino, alimentando-o de consistência política, mesmo com os sentidos metaforizados. O Manifesto Ciborgue⁴ se referia a si mesmo como "um argumento em favor do prazer da confusão de fronteiras", um esforço que contribui para o que chama de "cultura socialista-feminista e pós modernista" rumo à utopia de um mundo sem gênero. E foi considerado a base dos feminismos mediados pela tecnologia dos anos noventa – os ciberfeminismos.
Desse modo, o conceito ciborgue é a base do eixo que trata os movimentos nas redes digitais de resistência, contestação e crítica aos femininos construídos pelas mídias e pelas religiões cristãs.
Sobre as coquetes em rede social on-line, este livro visualiza que atrizes sociais digitais em rede social privilegiam a sua exibição como resultado da autoconstrução de sua beleza
e a vida bem sucedida
. A mulher no Facebook se apresenta e é correspondida em números de curtir
e elogios de "amigos" ativos em conexão. Uma rotina ritualizada em se publicar autorretratos e fragmentos da vida privada está presente no ato de se promover provocando uma coletiva embriaguez, independente do gênero. Estar presente de maneira on-line é também um automarketing ativo, pela construção e contemplação da personagem de si. Isso quer dizer que a inquietação consequente pela não adequação da realidade física à imagem feminina dominante, tenta sempre ser alcançada pela incansável busca de adequação à ela, agora, mediada pela tecnologia. As recentes viabilidades tecnológicas para essa adequação são nítidas pela disposição de aplicativos e filtros de luz e imagem para os ajustes adequados às publicações em rede social. Por outro lado, a cultura da mulher em rede social on-line não se dá apenas com a feminilidade narcísica reproduzida pelos referenciais das antigas mídias. O desenvolvimento das tecnologias de comunicação ao final do século XX se deu em conjunto ao desenvolvimento dos feminismos atrelados à tecnologia e arte visual, a partir das ciberfeministas.
Desenvolvendo a pesquisa sobre as relações históricas entre a mulher e o uso da tecnologia, esta obra observa que o uso da tecnologia como aliada ao ativismo feminista não é um fenômeno recente, pois surgiu simultaneamente com o advento da internet, pela atuação dos movimentos ciberfeministas. Desse modo, pode-se afirmar que, depois da relevância do trabalho de Langdon Winner⁵ – sobre a política dos artefatos produzidos pela tecnologia, encarnada em certas formas de poder e hierarquia – as ciberfeministas trouxeram, ao final do século XX, o ressurgimento desse importante debate sobre a potência política do ciberespaço, viabilizado a partir dos artefatos da tecnologia. Mesmo que as ciberfeministas tenham formulado e pautado seus marcos teóricos em teorias bastante problemáticas e desviantes das pautas das primeiras feministas, elas formularam um debate rico sobre a atuação feminista, tecnologia e o ciberespaço. Segundo a análise de Galoway⁶, existia uma utopia sobre o ciberespaço revolucionar a condição de gênero, e, segundo ele, ao contrário das aspirações ciberfeministas, o ciberespaço tampouco seria capaz de exorcizar o corpo feminino para construir outras identidades por meio das próteses, da vida artificial e dos ciborguismos; que por Donna Haraway⁷ pressupunham uma revolução que partisse da tecnologia em hibridismo às mulheres. A crítica de Galloway gira principalmente em torno da construção teórica sobre os ciberfeminismos, desenvolvida por Sandie Plant⁸ e Sandy Stone⁹ – reconhecidas pelo autor como as construtoras das principais narrativas sobre o tema. Ele destaca que a primeira defendia que a tecnologia é essencialmente feminina e não masculina, enquanto Stone foca nos estudos sobre a potência das comunidades virtuais produzirem outros corpos, identidades e lugares. Contraponto assim, a ironia de tal utopia com o posicionamento crítico das feministas tradicionais, muitas vezes adversas ao advento da tecnologia.
Mesmo sendo duas faces do mesmo objeto, a feminilidade on-line se fez construída neste livro, contraposta aos Ciberfeminismos dos anos noventa e os feminismos nas redes sociais.
As etnografias das páginas "Mulheres que Oram¹⁰ e
Mulheres Perfeitas¹¹, apresentam as principais representações da cultura da feminilidade on-line com mensagens pautadas pelas reproduções de um feminino entregue às ordens conservadoras da igreja, ou da estética sexualizada da coquete, tão bem construída e até hoje alimentada pelas antigas mídias. Em oposição a
Feminismo sem Demagogia¹²", a qual defende posições políticas inclusivas aos feminismos, e críticas às opressões patriarcais.
O esforço da pesquisa que este livro traz esteve na experiência diária no domínio da coleta e interpretação dos dados na rede social Facebook sob constantes interferências de agendas pessoais
e histórias privadas, as quais foram como um desafio da pesquisa em rede social on-line sob possibilidade de desatenção constante, quando interfere a pesquisa com aspectos que fogem aos estudados. Isso, dado pelo campo on-line ativo em tempo integral com dados que misturam a vida pessoal com o contexto analisado. Quando novas e relevantes postagens presenteiam a rotina, precisa haver o esforço de um limite, pois o exercício de etnografia on-line pode ficar sem fim
, pelas inúmeras extensões analíticas que Sheppard¹³ mostrara ser possível desempenhar sob o domínio da antropologia das mídias sociais e dos dados de campo digital.
Este trabalho, é fruto de um trabalho de etnografia em rede social on-line, basicamente pautado nos estudos de Skågeby e na inspiradora obra de introdução da teoria do Ator-Rede de Latour¹⁴, principalmente por este, inspirar a pensar os hábitos do cotidiano e da rotina das mulheres estarem tomados pelas tecnologias de comunicação, trazendo os ingredientes essenciais ao estudo sobre a vida em sociedade, na era das redes sociais digitais. E as associações de elementos heterogêneos, que neste livro são demonstrados pela reprodução ou contestação dos papeis exigidos às atuações femininas, construídos ao longo do processo histórico brasileiro. Proporcionando desse modo, que o estudo pratique a busca de associações em conexões que, de forma heterogênea, permite à ciência social visualizar os elementos que fazem parte do social com a interação on-line/offline.
A pesquisa em rede digital, sempre é multimídia, então entre os dados arquivados houve livros on-line, textos em formato e-book, revistas digitais, vídeos, entrevistas de jornais em versão on-line e fotos. Dessa maneira, o computador passou a ser o campo, o arquivo e o instrumento de produção e armazenamento do conhecimento. O viés metodológico, pautado em Skågeby¹⁵ reconhece que os primeiros momentos de inserção nas comunidades on-line do Facebook já permitem o início da coleta de dados, onde há sempre uma aliança entre a linguagem e a tecnologia, e essas duas linguagens juntas oferecem um potencial bastante rico nas pesquisas etnográficas em rede social on-line. Enquanto Latour¹⁶ demostra por sua teoria Ator-Rede, que tudo são dados, atentando para necessidade em se tecer redes de atores, visando permitir o estabelecimento de uma gama de combinações e operações no exercício da reflexão.
O recurso da internet possibilita assim, um leque de diferenciadas técnicas de uso, como grupos de discussão, arquivos compartilhados, mensagens instantâneas, mensagens compartilhadas e identidade em perfis de membros em redes sociais on-line. Desse modo, a pesquisa se fez capaz de investigar a cultura feminina on-line e os ativismos feministas em rede social/digital, na combinação de diferentes fontes. Vale ressaltar, que os diagnósticos interpretativos dessas fontes serão sempre reflexões derivadas das perspectivas da atuação feminista/feminina em rede.
Para um desempenho adequado à observação na pesquisa, foi necessária a associação em comunidades ou páginas do Facebook, como observadora oculta
, pois de acordo com Skågeby, esse posicionamento situa melhor proficiência interpretativa, que o envolvimento da atuação explicitada sobre suas mensagens e imagens. Embora haja o acompanhamento em centenas de páginas femininas e feministas no Facebook, o monitoramento constante foi restrito em três paginas de comunidades on-line. Procedimento necessário, pois a larga escala de dados impediria a clareza de suas análises.
As páginas ou comunidades do Facebook seguidas e selecionadas como fonte adjacentes às quais validam e ajudam a pensar sobre análises das comunidades principais (Mulheres que Oram
, Mulheres Perfeitas
e Feminismo sem Demagogia
), partem das seguintes páginas no Facebook: Articulação das Mulheres Brasileiras
; Bitch Media
; Blogueiras Feministas
; Cátedra da Teologia Feminista
; Coletivo de Mulheres PUC-Rio
; ECOS – Comunicação em Sexualidade
; Every Day Feminism
; Feministas do Brasil
; Feministing.com
; Feminismo Poético
; Machismo Chato de Cada Dia
; MAPO Núcleo de estudo de gênero, raça e sexualidade UNESP
; Meninas Malvadas
; Moça Você é Machista!
; Não Aguento Quando...
; Não Sou Este Tipo de Garota
; No Universo Feminino
; NUMAS Núcleo de estudo sobre marcadores sociais da diferença
; PAGU Núcleo de estudos de gênero
; Rabid Feminism
; Sociological Images
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