Encontre milhões de e-books, audiobooks e muito mais com um período de teste gratuito

Apenas $11.99/mês após o término do seu período de teste gratuito. Cancele a qualquer momento.

Os Segredos Entre Nós
Os Segredos Entre Nós
Os Segredos Entre Nós
E-book329 páginas4 horas

Os Segredos Entre Nós

Nota: 0 de 5 estrelas

()

Ler a amostra

Sobre este e-book

Nem todos os segredos devem vir à tona.
Em alguma cidadezinha italiana, uma garota desaparece sem deixar rastros. Os habitantes da cidade dizem que ela está morta e, durante a noite de Halloween, cinco adolescentes tentam entrar em contato com ela através de uma sessão espírita. Eles não esperavam resposta, mas a conseguem, forçando-os a enfrentar as consequências de seus gestos e a confessar todos os segredos que há entre eles.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento17 de dez. de 2019
ISBN9781071509876
Os Segredos Entre Nós

Relacionado a Os Segredos Entre Nós

Ebooks relacionados

LGBTQIA+ para adolescentes para você

Visualizar mais

Artigos relacionados

Avaliações de Os Segredos Entre Nós

Nota: 0 de 5 estrelas
0 notas

0 avaliação0 avaliação

O que você achou?

Toque para dar uma nota

A avaliação deve ter pelo menos 10 palavras

    Pré-visualização do livro

    Os Segredos Entre Nós - Angela Longobardi

    EPÍLOGO

    Os segredos entre nós

    Angela Longobardi

    Este livro é uma obra de ficção. Nomes, personagens, lugares, situações e eventos são produto da imaginação da autora ou são usados de maneira fictícia. Possíveis semelhanças com eventos, lugares ou pessoas reais, vivas ou falecidas, são meras coincidências.

    Todos os direitos reservados, inclusive o direito de reprodução total ou parcial em qualquer formato.

    Copyright © 2017 Angela Longobardi

    Todos os direitos reservados.

    A Donnie, que acreditou desde o início.

    A Peppe, que fingiu acreditar.

    E a mim, que ainda não acredito.

    CAPÍTULO 1

    Irene

    Na manhã do primeiro dia de escola, ao abrir a porta do seu quarto, Irene sentia um doloroso peso no coração, como se alguém estivesse tentando pressioná-lo para o lugar mais remoto do seu corpo, enfraquecendo, assim, o ritmo das suas batidas.

    Até poucos meses antes, ela pensava que não ter amigos na escola nova não seria um problema tão grande, mas a verdade era que ela não se sentia nada pronta para se cercar de novos rostos e de novas personalidades, para recomeçar tudo do início, para se apresentar e se explicar. Ela não gostava de se explicar e não havia sequer conseguido fazê-los bem. Mas não se importava que ninguém realmente a conhecesse. Os únicos que, mais cedo ou mais tarde, deveriam ter que lidar com a verdadeira Irene eram seus pais, que talvez um dia, teriam que encontrar tempo para escutá-la.

    A porta do quarto do seu irmão, em frente à sua, estava quase toda aberta, de modo que ela podia vê-lo colocar distraidamente uma caneta e um caderninho  enrolado no bolso traseiro da calça jeans.

    Levi estava calmo, nem um pouco ansioso com a volta às aulas, mas era seu último ano, ele conhecia seus colegas de classe, seus professores e as salas. Não tinha nada a temer, a não ser as provas de maturidade.

    Maturidade. Apesar de muitas vezes bancar o estúpido com ela, Irene tinha que admitir que seu irmão era muito maduro para sua idade. Tirava notas boas e não causava problemas, mesmo que seu melhor amigo ainda não tivesse ganho a confiança dos pais deles.

    Ao passar por ela, no meio do corredor, as mão cruzadas sobre a mochila, Levi tirou o olho da tela do celular, que avisara que ele havia recebido uma mensagem. O sorriso mexendo sua sobrancelha loira daquela maneira irritante, perguntando a ela apenas com o olhar: pronta para o inferno?

    Irene se limitou a bufar e ir para a cozinha. Durante verão, Levi não havia feito nada além que agitá-la, assegurando a ela que a escola faria ela perder os cabelos devido ao estresse e que os mais velhos tornariam sua vida difícil desde o primeiro dia. Ela não acreditou. Pelo menos até a semana anterior, quando ela havia começado a se perguntar se ele não falava sério, se não estava realmente tentando alertá-la. Afinal, o que ela sabia sobre a escola? Não tinha ideia do que a esperava nas aulas de grego e de latim - conseguiria sozinha, ou precisaria de ajuda, como Levi, no primeiro ano? Conseguiria encontrar alguém para ajudá-la sem ter que recorrer aos seus pais? E seus colegas de sala? Falariam com ela ou ela teria que dar o primeiro passo? Ela era péssima em dar o primeiro passo, literalmente. Havia começado a andar com quase dois anos, quando sua prima de um ano já corria pela casa esfolando os joelhos. Teria que começar no aprendizado de línguas junto com ela, no ano passado. Mas não, tinha preferido o latim e o grego ao francês e ao alemão. Ela começava a acreditar que havia sido uma péssima escolha e se perguntava se ainda dava tempo de mudar de ideia. Seu pai se lamentaria pelo dinheiro gasto em livros, mas no fim a agradaria.

    Sentiu necessidade de impedir o pensamento antes mesmo de começar. Afinal, Levi havia conseguido, não? Eles não eram assim tão diferentes, como todo mundo não cansava de lembrá-la.

    - Você não pode me levar? - perguntou a sua mãe quando a viu entrar na cozinha, a camisa branca abotoada só pela metade e o sapato de salto baixo na mão. Esperava que a presença de sua mãe a acalmasse e a impedisse de matar aula no primeiro dia.

    Ela se deu tempo para alisar a calça azul antes de responder: Não consigo, me desculpe. O trânsito na rua da escola vai estar um inferno e nós duas vamos nos atrasar. Ela abotoou a camisa, pegou a bolsa do bancão da cozinha e pegou duas notas de cinco euros na carteira. Deu uma para Irene e deixou a outra na mesa para o irmão. Levi, anda! ela chamou, mas ele já estava entrando na cozinha para pegar seu dinheiro.

    - Eu levo ela? - perguntou, obviamente feliz de levá-la de moto já no primeiro dia.

    A mãe o olhou atravessado. Você também vai para lá.

    Levi deu de ombros. Preciso dar uma carona para o Marco.

    Pegou um croissant doce na dispensa, abriu e comeu em várias mordidas.

    Irene não comia nada desde o dia anterior. Estava com o estômago tão fechado que tinha medo que se tentasse comer qualquer coisa que não fosse água ficaria preso na garganta, sufocando-a de ânsia.

    - Marco mora literalmente a 200 metros da escola. Ele dá um jeito. - sua mãe o assegurou e voltou para o quarto.

    - Pode me deixar na frente da casa do Marco e pegar ele. - Irene propôs em um sussurro audível apenas para os dois. - Não quero ser tachada de a irmã do Levi antes mesmo de entrar.

    Levi a observou por um segundo. Combinado. aceitou, jogando a sacola da merenda no lixo debaixo da pia.

    Irene assentiu, mais para si do que para ele, e respirou profundamente.

    Naquele momento, seu pai saiu do banho, o rosto barbeado e a gravata pendurada no peito. Ainda estão aqui?

    - Estamos saindo. - Levi assegurou. - Nos vemos à noite.

    Irene se limitou a sorrir para o pai e seguiu Levi pela porta.

    Andar de moto com o irmão não estava na lista das preferencias de Irene. Levi parava para cumprimentar qualquer um que conhecesse mesmo que apenas de vista, expondo ela a olhares indagadores nada sutis. Odiava principalmente os olhares das garotas que tinham uma queda por ele. Elas olhavam-na da cabeça aos pés sem disfarçar, se perguntando se ela era a irmãzinha dele, devido à semelhança, ou se era a enésima garotinha com quem ele saía só porque era um ótimo garoto e não tinha coragem de recusar.

    Se não fosse vergonhoso tanto pra ela quanto para o irmão, ela teria se segurado com os braços em volta do corpo dele com um sorrisinho toda vez que encontrassem uma pretendente insolente.

    Por sorte, a escola ficava apenas a 15 minutos da casa deles. Talvez 10, se Levi não fosse tão amável.

    Pararam na frente da casa de Marco, que já estava esperando na frente do portão. Ele era um pouco mais alto que Levi e tinha cores completamente diferentes: cabelos castanho escuro, olhos verdes e pele sempre bronzeada. O sorriso fazia a pequena cicatriz sobre o lábio superior esticar.

    - Bom dia, pequena Levi. Primeiro dia de escola?

    Ele fez uma cara de preocupação, como se estivesse calculando suas chances de sobrevivência.

    Irene revirou os olhos e caminhou na direção da escola.

    - Me espere quando sair! - ela ouviu Levi dizer.

    Ela se virou para assentir e prosseguiu.

    Ela definitivamente não queria ser associada àqueles dois já no primeiro dia. Levi e Marco caminhavam deixando para trás um rastro de garotas sonhadoras ou enfurecidas pela falta de atenção. Sem contar que Marco estava um ano atrasado e isso o havia colocado em maus lençóis com os pais de Levi e de Irene, que guardavam uma garrafa de champanhe para abrir no dia em que Levi anunciar que brigou com ele. No entanto, não parecia que esse dia estivesse muito próximo. A amizade deles já durava dois anos. Além disso, os dois estavam apaixonados por duas garotas que, por sua vez, eram melhores amigas e já se viam passando a vida juntos, os quatro felizes e contentes. Ou pelo menos, foi o que Marco lhe havia dito um dia, quando tudo o que ela lhe havia pedido era se ele podia tirar os pés do sofá da sala. Levi tinha coçado a cabeça com um sorriso no rosto, evidentemente nem um pouco intimidado pelo futuro.

    Irene tentou continuar pensando naqueles dois estranhos, assim não precisava focar no mar de estudantes que lotava o estacionamento da escola. Aquele prédio de tijolos vermelhos nunca lhe havia parecido tão aterrorizante e claustrofóbico. Liceo Classico Galilei, dizia a inscrição em mármore branco na entrada.

    Lançou uma rápida olhada no entorno e entrou na fila de pessoas que começavam a cruzar a entrada.

    Uma cuidadora de camisa azul e ombros largos controlava para que a multidão não se empurrasse e que ninguém se atrapalhasse, bloqueando a entrada.

    - Todas as primeiras aulas são no corredor do primeiro andar. - Irene ouviu ela falar para uma garota.

    Irene seguiu a cabeluda de cachos ruivos pelo corredor inteiro. À direita se encontravam salas grandes, em ordem alfabética. A garota entrou sem hesitar na Primeira B, enquanto Irene prosseguiu até a D.

    Entrou furtivamente, congelando no lugar quando os olhos de cinco pessoas se posaram nela, de três garotas, que estavam sentadas num canto no fundo da sala e voltaram a conversar quando decidiram que Irene não valia a atenção delas; e de dois garotos, que estavam no canto oposto e se limitaram a examiná-la da cabeça aos pés antes de se interessar pelas outras.

    Alguém a venceu na entrada – uma outra garota – que  se sentou em uma das cadeiras na fileira da esquerda. Irene decidiu pegar um lugar na fileira à direita, em uma cadeira no centro – nem na primeira fila, nem na loucura do fundo.

    Olhou uma última vez para porta, tirou o caderno e o lápis da mochila e rabiscou as primeiras páginas.

    Foi interrompida um pouco depois por uma voz sutil, que perguntou: Posso?

    Irene levantou os olhos para uma garota de longos cabelos castanhos e olhos de um verde quase cinza. Ela teria o mesmo físico – a cintura fina e os quadris acentuados – se não fossem pelos maiores seios que já tinha visto em uma menina de 14 anos. Mas para compensar, tinha um sorriso amigável.

    Embora várias pessoas tivessem chego depois dela, a sala ainda não estava completamente cheia, mas ela não quis dizer que o lugar estava ocupado sabendo da possibilidade de conseguir um colega de carteira pior. Ela assentiu e tentou sorrir amigavelmente.

    - Unhas bonitas. - elogiou quando a garota pousou uma mão sobre a cadeira para se acomodar, dando a deixa para começar qualquer tipo de conversa.

    A recém-chegada havia feito as unhas para o primeiro dia de aula, enquanto Irene havia passado apenas um pouco de rímel.

    A garota sorriu novamente para ela, mas antes que pudesse se apresentar a professora entrou. Era uma mulher com cerca de 50 anos, baixa e com cabelos pretos curtos. Ela também estava bem maquiada e Irene prometeu a si mesma que tentaria se esforçar um pouco mais para ficar mais apresentável no dia seguinte.

    O sinal tocou e as três últimas carteiras vazias foram ocupadas. A professora olhou rapidamente para a classe e pegou a lista de presença.

    - Vamos nos conhecer um pouco. - ela propôs. - Fazemos a chamada e depois todos, um por vez, me contarão porque escolheram a escola secundária clássica.

    A tensão na sala ficou palpável. Ninguém gostava da ideia de explicar suas razões, principalmente porque muitos provavelmente não tinham ideia do porquê estavam ali.

    - Sou sua professora de italiano. Professora D’Aniello.

    Ela deu um sorriso afável, mas pelo olhar que lançou aos alunos, Irene percebeu que seria uma das professoras mais severas.

    A professora abaixou os olhos para a lista e chamou o primeiro nome: Acardi, Alice.

    A garota ao lado de Irene ergueu a mão e disse: Presente.

    A mulher na mesa olhou para ela, assentiu e voltou para a lista de alunos.

    Irene seguiu com os olhos todos aqueles que erguiam a mão durante a chamada, tentando dar um nome aos rostos que a circundavam.

    - Delfino, Irene. - chamou a professora.

    Irene estremeceu, pega de surpresa. Presente assegurou, erguendo a mão.

    Ela também recebeu o olhar penetrante da professora.

    Alice ainda sorria para ela, talvez mais sinceramente agora que conhecia seu nome, porque uma covinha apareceu em seu queixo e Irene sentiu os próprios lábios se levantarem em resposta.

    Pode-se dizer que não foi um começo ruim.

    ––––––––

    Levi

    - Sua irmã me odeia.

    Marco examinava a multidão que estava chegando no estacionamento, ele esperava ver Guadalupe chegar, certamente de mãos dadas com Rebecca. E certamente ela não era mais sua namorada.

    - Ela não te odeia. - Levi assegurou, deslizando o cigarro em seus dedos para dar uma tragada. - Ela odeia o apelido que deu a ela.

    Seu melhor amigo se permitiu um momento de distração e voltou a olhá-lo enquanto falava. Não tenho culpa se ela é igual a você.

    - Se bem que ela também odeia ser igual a mim. Na verdade parece que ela odeia várias coisas.

    - Inclusive você. - assegurou Marco, pegando o cigarro de volta e dando uma última tragada.

    Levi não pôde negar. Se ajeitou no banco da moto enquanto Marco se distanciava alguns passos para jogar a bituca de cigarro na lixeira mais próxima. A noção cívica dele não durava mais do que dois dias de escola – a não ser quando Guadalupe estava por perto: com ela, ele se comportava como um cidadão perfeito.

    Marco não queria aceitar o fim da histórias deles, continuava a esperar que fosse só um tempo para pensar, que Guadalupe não quisesse distrações no último ano da escola secundária; mas se realmente fosse isso, ela não teria terminado com ele em abril, não teria evitado ele durante grande parte do verão. Ela não era o tipo de garota que faz joguinhos, se ela tinha terminado com Marco, deveria ter um bom motivo – que provavelmente não tinha nada a ver com as bitucas que ele deixava para trás quando fumava. Mas Marco tinha razão em uma coisa: ela não havia sido clara sobre o motivo e se recusava a explicar porquê havia decidido terminar com ele tão de repente. A única que sabia a verdade era Rebecca.

    Talvez fosse por isso que as garotas fossem tão próximas: Rebecca era a mestra em não ser clara.

    Levi deu um tapa na própria cabeça. Não queria pensar nestas coisas a essa hora da manhã, queria tentar enfrentar o primeiro dia de aula com leveza; e ficar bravo com Rebecca pelos motivos de sempre era insensato e inútil.

    - Ali estão elas. - Marco murmurou. Ele havia endireitado as costas e enfiado as mãos nos bolsos da bermuda jeans, contraindo as costas largas em uma postura arrependida.

    Levi desviou o olhar, era uma visão lamentável. Se Guadalupe não fosse sua amiga, além de ser a ex do seu melhor amigo, ele provavelmente a odiaria; mas poucos no mundo podiam dizer que odiavam Guadalupe, com seus olhos negros, arredondados e enormes e as covinhas nos cantos da boca.

    Foi ela quem os viu no meio da multidão do estacionamento. Ela sorriu, as covinhas bem à mostra enquanto puxava Rebecca pela mão.

    Guadalupe era o tipo de pessoa que enfatiza o afeto com contato físico. Ela correu para encontrá-los e, largando a mão de Rebecca, jogou os braços em volta da cintura fina de Levi, arriscando derrubá-lo da moto.

    Levi a envolveu em um abraço, sentindo a suavidade de seus cabelos escuros e longos sob os dedos.

    - Oi. - ela murmurou contra o peito dele.

    - Como foi no México? - Levi perguntou.

    No mês de agosto, Guadalupe foi visitar os avós maternos e sumiu, culpando o Wi-Fi, que vivia caindo. Mas Levi suspeitava que agosto era o mês de isolamento dela, a única vez no ano em que ela se distanciava da rotina do dia-a-dia para passar um tempo com parentes que raramente via e para se esticar no sol, sem se preocupar com a escola ou com o namorado que havia largado – e que havia sobrado para Levi consolar.

    - Como sempre. - se limitou a responder enquanto o largava. - Oi. - ela cumprimentou Marco, sorrindo.

    Conhecendo-o, Levi sabia que, naquele exato momento, Marco estava ao mesmo tempo xingando e elogiando aquelas covinhas.

    Guadalupe colocou uma mão no rosto dele e beijo-o na bochecha, com a delicadeza de quem sabia que mesmo aquele breve contato poderia distrui-lo de uma hora pra outra.

    Marco se esqueceu de responder o cumprimento, mas ela provavelmente não se importou, já que estava se esforçando muito para evitar seu olhar e esconder que suas bochechas estavam coradas – que, bronzeadas como estavam, escondiam tal fato quase o tempo todo.

    Levi, porém, tinha suas próprias dores para pensar.

    - Bom dia! - ele se forçou a dizer, voltando sua atenção para Rebecca.

    Ela ergueu o queixo como cumprimento e suportou graciosamente o tapinha no ombro que Marco, sem elegância nenhuma, lhe deu.

    Rebecca apareceu durante o verão, mesmo que muito pouco, concordando em sair com ele e com Marco quando eles prometiam não deixá-la sozinha para ficar com outras garotas. Na realidade, era difícil, ficar com outras garotas com Rebecca por perto. Ela não conseguia deixar de salientar os defeitos das garotas ousavam olhar para eles, sem contar que também as punha em dúvida.

    - Ela nem se penteou para sair de sábado à noite. Sente, Marco.

    Marco não respondia, mas obedecia. Quando Rebecca mandava, não se podia deixar de obedecer, principalmente quando recebia olhares daqueles olhos azuis e frios, quase transparentes, sob uma espessa linha de delineador preto e sobrancelhas franzidas, o rosto pálido envolto por um penteado simétrico. Ela não deixava Marco beijar outra garota na frente dela, em respeito à sua melhor amiga, mas também não o deixava se distanciar, relutando em ficar sós com Levi.

    - Temos que entrar. - ela disse chamando a atenção de todos.

    Levi desceu da moto e se juntou a Marco, que já estava seguindo as garotas para dentro do prédio.

    Eles sentaram como já faziam há dois anos: Rebecca e Guadalupe na penúltima fileira e Levi e Marco atrás, com os olhos fixos nas costas delas, enquanto elas que não descobrissem o que se passava na cabeça deles.

    Guadalupe virou para a carteira deles. O último primeiro dia de escola. anunciou. Sorria, mas a sua voz estava tensa, com um quê de melancolia.

    Rebecca lançou um olhar para os garotos, depois pegou a mão da amiga, num emaranhado de dedos pálidos e bronzeados.

    Levi havia pensado na importância do seu último ano de escola durante o verão, nos vestibulares, nas inscrições das universidades; mas a melancolia de Guadalupe não tinha nada a ver com estas preocupações, ela pensava na última excursão com a classe, nas últimas partidas de vôlei, nos últimos dias passados no shopping quando não tinham vontade de ficar sentados nos bancos.

    De repente, os próximos oito meses pareceram muito pouco para eles.

    Gostaria de responder, de tranquiliza-la, garantir que eles continuariam a se falar e a se ver, mas a entrada do professor de matemática interrompeu todo e qualquer discurso. Melhor assim, Levi disse a si mesmo, não queria mentir. O final feliz que Marco sonhava havia perdido qualquer concretude quando eles começaram a mentir uns aos outros, quando ficou evidente que as garotas tinham planos diferentes para o futuro, e que tais planos não incluíam um casamento duplo.

    Adeus às suas intenções de enfrentar o dia levemente. O relógio da parede atrás da mesa já marcava 8:30.

    CAPÍTULO 2

    Irene

    No final das contas, Irene disse para si mesma que o ensino médio não era tão diferente do fundamental. Os professores não haviam aterrorizado os alunos, a grade curricular não lhe parecia exagerada e, na sua sala, ela havia até reconhecido alguns rostos dos corredores da sua escola anterior.

    Ela não era a única a chegar sem amigos, Alice, que não parou de jogar os cabelos de um ombro para o outro, como se fosse um tique nervoso, também não tinha seus antigos companheiros para apoiá-la. Ela estava confortavelmente sentada ao lado de Irene e disse que, se Irene concordasse, ela sentaria ali novamente nos dias seguintes. Irene concordou sem hesitar. Alice parecia bem, talvez um pouco distraída, mas tinha feito amizade com as garotas que estava sentadas atrás delas, envolvendo até Irene nesta conversa, poupando-lhe o constrangimento de ouvir sem dizer uma só palavra.

    Na última aula, a professora de latim assegurou a todos que seria boazinha nas primeiras aulas e que, apesar do que se dizia a seu respeito, ela não sacrificava alunos a Satanás. Ou, pelo menos, aqueles que conseguissem ficar acima da média 5. A sala respondeu com um risinho nervoso à esta afirmação. Irene se lembrou de todas as vezes em que Levi andava pelo corredor de casa repetindo os verbos e as declinações em voz alta e, em voz baixa, xingava a professora.

    Durante a última meia hora, ela lhes deixou livres para papear e se conhecerem, e Alice estava aproveitando para descobrir tudo o que era possível sobre Irene, destrinchando os pontos cruciais da sua vida. Elas moravam em extremidades opostas da cidade, pelo que parecia, mas era cerca de 20 minutos de carro, então poderiam se ver, se quisessem. Alice tinha um irmão e uma irmã, ambos mais velhos, os dois morando no exterior a estudo ou a trabalho, e um poodle preto chamado Billie. Ela quase se inscreveu em uma escola de estética, mas, no fim, fez a vontade de sua mãe.

    A cabeça de Irene estava girando com tanta informação que Alice havia despejado sobre ela, mas ela invejava Alice pela simplicidade com que contava. Por sua vez, Irene havia conseguido dizer que tinha um irmão no último ano e que Billie parecia adorável nas fotos.

    Ela temia acabar no meio de um trio de comadres quando Paola e Alessia, sentadas atrás delas, contaram os capítulos salientes das próprias vidas, mas percebeu que era o efeito que Alice causava nas pessoas: ela perguntava e escutava as respostas com um interesse tão apaixonado que não deixava dúvidas sobre a importância das coisas que lhe contavam. Sempre tinha a coisa certa a se dizer ou a expressão perfeita a assumir.

    Quando o sinal tocou anunciando o fim da aula, Irene se forçou a sorrir para suas três novas colegas – teve que admitir que o sorriso foi um pouco mais acalorado para Alice, que havia se levantado e a esperava para que saírem juntas.

    Nos corredores, havia um ruído ensurdecedor, um monte de vozes e corpos animados pela perspectiva de liberdade que esperava por eles do outro lado da entrada.

    Zeladores e professores tentavam pôr ordem nas filas agitadas de estudantes, sem sucesso. As primeiras turmas que saíram foram as do primeiro ano e Irene recebeu aliviada os raios de sol quentes de meados de setembro. O ar não era dos mais limpos devido aos gases dos escapes dos carros e das motos que se aglomeravam no pouco espaço livre que cercava o prédio.

    Entre as intermináveis filas duplas, num carro azul, um homem mais perto dos sessenta do que dos cinquenta anos acenava na direção delas.

    - É meu pai. - Alice disse, respondendo o aceno com a mão para fazê-lo entender que ela o havia visto. - A gente se vê amanhã.

    Ela sorriu, mas não se mexeu imediatamente e Irene se perguntou se ela esperava que se despedissem

    Está gostando da amostra?
    Página 1 de 1