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Relações Teoria-Prática Na Formação De Professores De Ciências e Biologia
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Relações Teoria-Prática Na Formação De Professores De Ciências e Biologia
E-book351 páginas4 horas

Relações Teoria-Prática Na Formação De Professores De Ciências e Biologia

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Sobre este e-book

O livro Relações teoria-prática na formação de professores de Ciências e Biologia aborda, como o título menciona, a questão das relações teoria-prática, buscando integrar discussões sobre políticas de formação de professores no Brasil e sobre processos de aprendizagem para a docência que ocorrem no contexto do cotidiano da sala de aula de disciplinas de cursos de licenciatura.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento3 de fev. de 2021
ISBN9786558204749
Relações Teoria-Prática Na Formação De Professores De Ciências e Biologia

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    Relações Teoria-Prática Na Formação De Professores De Ciências e Biologia - Gabriel Menezes Viana

    COMITÊ CIENTÍFICO DA COLEÇÃO FORMAÇÃO DE PROFESSORES

    Às mulheres da minha vida,

    Malu, minha mãe,

    e Mariana, meu amor.

    (Gabriel Menezes Viana)

    À Carla e Patricia, por me iniciarem na formação de professores-formadoras, e a todas as colegas formadoras que se dedicam à educação de profissionais tão pouco valorizados em nosso país.

    (Danusa Munford)

    Agradecimentos

    Agradecemos aos estudantes de graduação e à formadora que participaram da presente pesquisa e tornaram nossa investigação possível. Ao Programa de Pós-Graduação em Educação: Conhecimento e Inclusão Social, da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), pelas oportunidades de formação e recursos. À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) pelos recursos para bolsa de estudo durante o desenvolvimento do curso de doutorado. Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) que, por meio de projeto de pesquisa em parceria UFMG-UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), concedeu recursos para a participação em um evento internacional e que por meio de projeto de pesquisa da UFMG possibilitou a aquisição de equipamentos utilizados para o desenvolvimento do estudo. À Universidade Federal de São João del-Rei pela verba concedida para o financiamento parcial do livro.

    The most exciting phrase to

    hear in science, the one that

    heralds the most discoveries,

    is not Eureka!, but

    That’s funny...

    (Isaac Asimov

    by Michael Brooks, 2009)

    APRESENTAÇÃO

    As relações entre teoria e prática representam uma questão extremamente desafiante e, consequentemente, intrigante. É um dilema que, de certa forma, permeia nossa sociedade como um todo. Muito se fala sobre vivermos em uma sociedade de conhecimento, com muitas informações, mas a maioria das pessoas não tem acesso a essas informações ou ao acessá-las não sabe o que fazer com elas. A Ciência produz uma quantidade enorme de conhecimento, mas, em vários países, muitos desses conhecimentos são frequentemente ignorados ou considerados inadequados para orientar políticas públicas, que tampouco são consideradas por cidadãos comuns para orientar ações em seu cotidiano. Para estudiosos de várias áreas, as relações entre teoria e prática tornam-se por si sós objeto de estudo. No Ocidente, a reflexão sobre tais relações remete-se aos debates entre Platão e Aristóteles a respeito das diferentes formas de conhecimento e de racionalidade, episteme e phronesis. No campo da formação de professores, o ensaio de John Dewey, The relation of theory to practice in the education of teachers, de 1904, é seminal ao trazer a preocupação em associar tais dimensões na formação desses profissionais. No Brasil, no começo dos anos 2000, o Conselho Nacional de Educação lançou as Diretrizes Curriculares Nacionais para a formação de professores e, dentre várias mudanças e propostas para os currículos dos cursos de graduação, instituía a prática como componente curricular que diversificou o sentido de prática nesses currículos. Essa iniciativa é particularmente interessante, pois busca incorporar a políticas de formação de professores discussões do campo científico-acadêmico. Evidentemente, uma das consequências da implementação dessas Diretrizes é justamente que questões e inquietações, antes mais circunscritas ao campo acadêmico, passam a fazer sentido em outros contextos. O que seria teoria e prática? O que entendemos por relacionar teoria e prática? O que é construir relações entre teoria e prática na formação de professores? Intrigados com questões como essas é que neste livro apresentamos as reflexões, as análises e os resultados de uma pesquisa voltada para como esses aspectos das relações teoria-prática são vivenciados no cotidiano de uma sala de aula de formação de professores de Ciências e Biologia, em atividades regulares de ensino e aprendizagem de uma turma de estudantes e sua professora. O estudo foi desenvolvido durante o doutoramento do primeiro autor, sob orientação da segunda autora. Em uma disciplina de Laboratório de Ensino de Patologia – que, do ponto de vista das políticas educativas, enquadrava-se na categoria de prática como componente curricular –, futuros professores deveriam elaborar planos de aula para ensinar temas relacionados à saúde na educação básica. Ao socializarem seus planejamentos com os colegas e a professora-formadora, esses sujeitos nos permitiram compreender como coletivamente construíam o que conta como prática e teoria, e como se relacionam. Nesses movimentos, conseguimos caracterizar com quais conceitos, ideias e contextos (imaginados e experienciados) relacionavam-se e que visões sobre ensino de Ciências emergiam. Nessa empreitada, apoiamo-nos em referenciais do campo dos Estudos da Etnografia em Educação, da Educação em Ciências e da Formação de Professores para interpretar as relações teoria-prática como modos de orquestração de princípios pedagógicos e referências aos contextos de prática no contexto da atuação docente.

    Para esta obra, o texto da tese foi adaptado, visando torná-lo mais fluido sem perder seu rigor teórico-analítico. Ainda assim, caso seja de interesse do leitor ter acesso a informações mais detalhadas, recomendamos consultar o texto original de Viana (2014), disponível em bancos de teses e dissertações da FaE-UFMG.

    Por ora, convidamos o leitor a acompanhar nosso percurso que apresentamos com detalhes neste livro ao longo de oito capítulos. Nossa expectativa é de contribuir para um dos debates mais clássicos da humanidade acerca do conhecimento, as relações teoria-prática, refletindo especificamente acerca de seus desdobramentos para a formação de professores de Ciências da Natureza e Biologia, sob a perspectiva do cotidiano da sala de aula.

    Os autores

    LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

    Sumário

    INTRODUÇÃO 19

    Relações teoria-prática 20

    Delimitando o objeto de pesquisa 21

    Dialogando com diversos campos para investigar as relações teoria-prática na

    formação de professores 23

    CAPÍTULO 1

    AS RELAÇÕES TEORIA-PRÁTICA NA PRODUÇÃO ACADÊMICA SOBRE FORMAÇÃO DE PROFESSORES 29

    1.1 Estudos empíricos sobre as relações teoria-prática na formação de professores 29

    1.1.1 Observações iniciais e questões gerais da literatura 31

    1.2 Relações teoria-prática (RTP) e modelos de formação de professores 33

    1.2.2 As relações teoria-prática e o professor reflexivo 38

    1.3 Diálogo com a literatura dos estudos das relações teoria-prática na formação inicial de professores 40

    1.3.1 Teoria para além do T maiúsculo (Korthagen et al. 2001) 40

    1.3.2 A relação teoria-prática como um processo múltiplo e complexo 44

    1.3.3 Olhando as relações teoria-prática como categoria não clássica: de uma

    perspectiva essencialista para uma perspectiva articulada 49

    1.3.4 As relações teoria-prática como contextualizadas 53

    CAPÍTULO 2

    UM OLHAR PARA CONTEXTOS E DISCURSOS NA PESQUISA 55

    2.1 Adotando uma perspectiva para uma análise do discurso em sala de aula, em

    diálogo com estudos de campo da Educação em Ciências e da Linguagem 59

    CAPÍTULO 3

    RELAÇÕES TEORIA-PRÁTICA NA REFORMA CURRICULAR DAS LICENCIATURAS 65

    3.1 A Prática nas Diretrizes Curriculares Nacionais para a formação de professores 66

    3.2 A prática como componente curricular (PCC) nas normatizações oficiais

    nacionais 69

    3.3 A prática como componente curricular na reforma dos cursos de formação de professores 73

    CAPÍTULO 4

    CONSTRUINDO UMA PERSPECTIVA DE PESQUISA PARA INVESTIGAR A FORMAÇÃO DE PROFESSORES DE CIÊNCIAS 77

    4.1 Métodos de investigação 78

    4.1.1 Critérios de trustworthines na pesquisa naturalista 78

    4.1.2 Um estudo de caso 82

    4.1.3 Perspectivas etnográficas em educação 84

    4.2 Critérios de seleção dos participantes 85

    4.3 Entrada no campo e saída dele 86

    4.4 Papéis dos participantes 88

    4.5 Procedimentos metodológicos 88

    4.5.1 Fontes de dados 89

    4.5.2 Construindo uma perspectiva para análise 92

    4.5.3 Selecionando eventos para análise 96

    4.6 Limitações do estudo 102

    CAPÍTULO 5

    O CONTEXTO LOCAL DE PESQUISA 103

    5.1 O Instituto de Biologia 103

    5.1.1 Breve histórico do Instituto de Biologia e do curso de Ciências Biológicas 103

    5.1.2 O Instituto de Biologia na época de realização da pesquisa 107

    5.1.2.1 O Bloco de Aulas e a sala de aula 107

    5.1.3 A reforma curricular na instituição investigada 108

    5.2 Organização do currículo escrito do curso de licenciatura em Ciências Biológicas (diurno) 111

    5.2.1 O Projeto Político-Pedagógico 112

    5.2.1.1 A prática como componente curricular no currículo do curso de licenciatura em Ciências Biológicas – diurno 116

    5.2.2 Temáticas do Laboratório de Ensino de Patologia 118

    5.2.3 As atividades desenvolvidas no Laboratório de Ensino de Patologia 121

    5.2.3.1 Aprendendo pela exposição de teorias e conceitos 122

    5.2.3.2 Aprendendo com as experiências localizadas no contexto escolar 123

    5.3 Os participantes 125

    5.3.1 Os licenciandos 125

    5.3.2 Os convidados 126

    5.3.3 A professora-formadora 127

    CAPÍTULO 6

    ELEMENTOS DO CONTEXTO LOCAL E UMA PERSPECTIVA PARA A ANÁLISE DAS RELAÇÕES TEORIA-PRÁTICA NAS INTERAÇÕES EM SALA DE AULA 133

    6.1 Panorama das interações em sala de aula 133

    6.1.1 Alguns tipos de situações sociais e estruturas de participação 134

    6.1.1.1 Tempos demarcados para se fazer coisas diferentes 135

    6.1.1.2 O respeito à fala do outro e a tendência ao consenso 135

    6.1.1.3 Construção de reflexões coletivas localizadas em perfis de atuação de outros

    profissionais 136

    6.1.2 Sobre os eventos selecionados para análise 137

    6.1.2.1 Contextualização dos eventos na história da disciplina 138

    6.2 Detalhando os Eventos 142

    6.2.1 Contextualizando o Evento 1 no interior da aula 15 142

    6.2.2 Contextualizando o Evento 2 no interior da aula 14 144

    6.2.3 Contextualizando o Evento 3 no interior da aula 8 146

    6.3 Identificando princípios pedagógicos e contextos de prática: construindo visões sobre o ensino de Ciências 149

    6.3.1 Princípios pedagógicos mobilizados 149

    6.3.2 Referências aos contextos da prática 151

    6.3.3 Relações teoria-prática e visões sobre o ensino de Ciências 153

    6.3.4 Delineando um panorama das relações teoria-prática 154

    CAPÍTULO 7

    MOBILIZANDO CONTEXTOS DE PRÁTICA E DISCURSOS NAS RELAÇÕES TEORIA-PRÁTICA EM SALA DE AULA 157

    7.1 Mobilizando contextos de prática experienciados: o colégio em que Paulo e Francis desenvolveram atividades de ensino e de pesquisa 157

    7.2 Mobilizando contextos de prática experienciados: a escola em que o convidado atua e o discurso do policial 160

    7.3 Mobilizando outros contextos experienciados além da escola: o discurso da Veterinária e da Saúde Pública 162

    7.4 O contexto dos discursos do campo da Veterinária 166

    7.5 Como contextos experienciados pelos participantes foram mobilizados no Laboratório de Ensino de Patologia nos eventos analisados? 168

    7.6 Mobilizando contextos de prática hipotéticos: uma escola problemática e outro lugar diferente do colégio que os licenciandos conhecem 169

    7.7 Mobilizando contextos de prática hipotéticos: uma escola em que há problemas com alunos usuários de drogas e a polícia 172

    7.8 Mobilizando contextos de prática hipotéticos: a casa do aluno da educação básica e discursos sobre família e educação em saúde concorrentes 173

    7.9 Mobilizando contextos de prática hipotéticos: contextos não específicos 176

    7.10 Como contextos hipotéticos foram mobilizadas no Laboratório de Ensino de Patologia nos eventos analisados? 177

    7.11 O papel dos participantes na construção de relações teoria-prática no Laboratório de Ensino de Patologia 178

    7.11.1 Os licenciandos 178

    7.11.2 O convidado 179

    7.11.3 A professora-formadora 179

    7.12 Caminhos para a construção de relações teoria-prática nos eventos 181

    7.12.1 Questionando o valor da prática 181

    7.12.2 Quando a Prática fala mais alto 182

    7.12.3 Um problema da prática leva à criação de outras teorias 183

    CAPÍTULO 8

    SOBRE AS RELAÇÕES TEORIA-PRÁTICA NAS INTERAÇÕES EM SALA DE AULA DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES DE CIÊNCIAS E BIOLOGIA: O QUE É POSSÍVEL DIZER? 185

    8.1 Relações teoria-prática como algo complexo e contínuo no discurso 186

    8.2 Relações teoria-prática mobilizam outros contextos 187

    8.3 Relações teoria-prática como um processo múltiplo 188

    8.4 As posições sociais dos participantes nas relações teoria-prática 189

    8.5 Lacunas nas relações teoria-prática ou outras formas de relações? 189

    8.6 Teorias que permearam a formação desses professores de Ciências 191

    8.7 Problematizando o papel da escola real na construção de relações teoria-prática na formação de professores e pluralizando concepções de prática na formação de docentes 195

    8.8 Construindo relações teoria-prática nas diferentes atividades na disciplina 199

    8.9 Como as experiências em escolas reais foram significadas pelos participantes do Laboratório de Ensino de Patologia? 203

    8.10 Espaços de construção de relações teoria-prática na formação de professores no ensino superior e o papel do professor-formador 205

    8.11 Considerações finais 211

    REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 215

    ÍNDICE REMISSIVO 229

    INTRODUÇÃO

    É bem possível que qualquer um de nós já tenha se deparado, em algum momento, com expressões como: relação entre teoria e prática, relações teoria e prática, relação teórico-prática e outras tantas nessa direção. Essas expressões são usadas com frequência, especialmente em contextos educacionais – escolares, profissionalizantes ou acadêmicos −, às vezes apontando limitações e deficiências em um curso ou instituição, às vezes de forma positiva, quando se afirma que um dado curso estabelece relação entre teoria e prática de modo consistente. Assim, a qualidade de ensino-aprendizagem e, portanto, de formação.

    No campo da formação de professores, inúmeros são os estudos que sustentam a assertiva da importância de se estabelecerem relações teoria-prática na preparação desses profissionais. Há certo consenso nessa literatura em assumir que tais relações estariam vinculadas com o próprio processo de construção da reflexão e da tomada de consciência na formação dos docentes. Não por acaso, o princípio da indissociabilidade das relações teoria-prática tem substancial força no campo. Essa importância é, inclusive, assumida por órgãos oficiais, na medida em que, na legislação oficial nacional,¹ são reservados um tempo e um espaço nesses cursos para que elas ocorram, dentro do que se tem denominado prática como componente curricular (PCC).

    Mas, o que seria relacionar teoria e prática? O que entendemos como teoria e como prática nessas relações? Em que medida uma difere da outra? O que é construir relações entre teoria e prática na formação de professores?

    Neste livro, apresentamos um estudo em que investigamos os processos de construção discursiva das relações teoria-prática (RTP) no cotidiano de uma sala de aula de uma disciplina acadêmica da licenciatura em Ciências Biológicas, ofertada por uma grande universidade pública brasileira.

    Relações teoria-prática²

    Em busca de referências às relações teoria e prática na literatura, alguns autores remetem-se, até mesmo, a debates filosóficos entre Platão e Aristóteles a respeito das formas de conhecimento e de racionalidade. Uma grande discussão entre esses dois filósofos esteve vinculada ao valor entre duas formas de conhecimento, uma entendida como episteme, e outra, phronesis. A primeira, proposta por Platão, seria mais teórica, abstrata, ligada às formas de pensamento científico-acadêmicas, assumida então de maneira propositiva, a qual constituía [...] um conjunto de asserções que podem ser explicadas, investigadas, transmitidas [...] (KORTHAGEN et al., 2001, p. 23, tradução livre). Já a segunda, sugerida por Aristóteles, seria mais prática, concreta, ligada à sabedoria prática, não estando, portanto, [...] preocupada com teorias científicas, mas com a compreensão de casos concretos específicos e situações complexas ou ambíguas (KORTHAGEN et al., 2001, p. 24, tradução livre). Seguindo essa linha de pensamento, haveria diferenças axiomáticas entre tais formas de conhecimento. Assim, essas concepções de teoria e prática apresentadas pelos filósofos gregos já apontariam para uma possível falta de relação entre essas dimensões.

    Há muito, essa lacuna entre teoria e prática tornou-se uma grande preocupação entre formadores de professores e pesquisadores da Educação. Por exemplo, em 1904, em ensaio intitulado The relation of theory to practice in the education of teachers, John Dewey diz da necessidade de uma maior e melhor articulação entre a formação que se faz nos cursos de preparação profissional docente e o que denomina atividade laboratorial profissional (DEWEY, 1904). Atualmente, há um grande avanço nas discussões acerca dos sentidos de prática e teoria. Por exemplo, vários autores abordaram a questão de uma visão dicotômica ou associativa entre tais dimensões (por exemplo: VÁZQUEZ, 1986; PIMENTA, 1995; CANDAU; LELIS, 1995, 1999, entre outros).

    Para enriquecer este debate, o foco de nossa investigação são os processos de construção discursiva cotidiana das relações teoria-prática no interior de um curso de formação de professores. Assim, como outros autores (KESSELS; KORTHAGEN, 1996; KORTHAGEN; KESSSELS, 1999; KORTHAGEN et al., 2001), buscamos aprender como participantes na formação de professores, ou seja, como os licenciandos dão sentido a essas relações. Em nosso caso, procuramos agregar aspectos de sua aprendizagem (para a docência) ao longo do tempo (BLOOME et al., 2009) para entender essas relações.

    Delimitando o objeto de pesquisa

    O presente estudo foi desenvolvido em aulas de uma disciplina de um curso de licenciatura em Ciências Biológica oferecida em um Instituto de Biologia. Institucionalmente, estabelecia-se que nessa disciplina tecer-se-iam relações com a escola da educação básica. O curso de licenciatura incluía também disciplinas oferecidas na Faculdade de Educação. Porém, dada a enorme diversidade entre espaços, sujeitos, atividades e saberes nessas diferentes unidades da universidade, optamos por nos aprofundar em um estudo mais detalhado das interações no espaço social específico do Instituto de Biologia. Nesse contexto institucional, interpretamos as relações teoria-prática, adotando a perspectiva de uma investigação sobre os modos de orquestração de princípios pedagógicos e referências aos contextos de prática na conjuntura da atuação docente.

    Um aspecto muito importante que merece ser destacado da perspectiva de pesquisa por nós adotada é que, ao contrário de muitos estudos que investigam as relações teoria-prática na formação de professores, nós não nos propusemos a criar um curso específico ou determinadas atividades com o objetivo de investigar as relações teoria-prática. Pelo contrário, assumimos a postura de que tais relações muito provavelmente são construídas durante tarefas cotidianas, em quaisquer salas de aula de programas de formação de professores. Com essa perspectiva, admitimos que também não foi nossa intenção ir em busca de modelos ideais para as relações teoria-prática, mas, sim, procuramos entender como ocorre esse processo cotidiano na perspectiva daqueles sujeitos investigados.

    Adotar tal posicionamento trouxe-nos uma série de desafios, pois, via de regra, as construções de relações teoria-prática não estão explícitas no discurso. É preciso um exame mais detalhado para que se possa percebê-las. Na sala de aula investigada, os participantes não discutem sobre o seu próprio processo de formação como docentes. Desse modo, investigamos as relações teoria-prática na formação de professores a partir das relações teoria-prática construídas pelos participantes no contexto da atuação docente.

    Portanto, algumas de nossas decisões sobre o modo como nos referimos a essas relações necessitam ser explicitadas logo no início deste livro. Objetivamos, com isso, que o leitor tenha uma melhor compreensão de como construímos nosso olhar para as relações teoria-prática (RTP). Nesta obra, ponderamos que frequentemente se observa um conjunto de relações teoria-prática, ao contrário de uma relação única e isolada. Essas relações são complexas e variadas, não necessariamente coerentes entre si, como destacado por outros pesquisadores (TERRERI, 2008; TERRERI; FERREIRA, 2013). Por isso, optamos pelo uso do termo no plural, relações, ao singular, relação. Além disso, concebemos que tais relações não devem ser entendidas de forma simplista e dicotômica, em que se coloca a prática de um lado e a teoria de outro, completamente distintas. Em diálogo com a perspectiva associativa (VÀZQUEZ, 1986; PIMENTA, 1995; CANDAU; LELIS, 1995, 1999) para tais relações, optamos por adotar o termo relações teoria-prática, como uma palavra que remete a tais dimensões em conjunto. Da mesma forma, também não falamos de relações entre teoria e prática, na medida em que também não queremos promover uma ideia de que há algo que se coloca entre essas dimensões, como se houvesse um ponto que não é nem da teoria, nem da prática. Desse modo, queremos reforçar também o caráter complexo dessas relações e amalgamado de tais dimensões.

    Neste livro, analisamos os processos de ordenação de teorias, entendidas como princípios que guiam as experiências de ensino dos licenciandos na sua relação com práticas assumidas como referências ao contexto da prática profissional. Esses processos são mobilizados no discurso dos participantes

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