Doroteia
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Doroteia - Nelson Rodrigues
NELSON RODRIGUES
DOROTEIA
Farsa em três atos
1950
4ª edição
Posfácio: Sergio Fonta
Logotipo Editora Nova FronteiraCopyright © 1950 by Espólio de Nelson Rodrigues
Direitos de edição da obra em língua portuguesa no Brasil adquiridos pela Editora Nova Fronteira Participações S.A. Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser apropriada e estocada em sistema de banco de dados ou processo similar, em qualquer forma ou meio, seja eletrônico, de fotocópia, gravação etc., sem a permissão do detentor do copirraite.
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Rio de Janeiro — RJ — Brasil
Tel.: (21) 3882-8200
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
R696d
Rodrigues , Nelson
Dorotéia Nelson Rodrigues . 4.ed Rio de Janeiro : Nova Fronteira ,2021.
112 p.
Formato: e book com 2,7 m b
ISBN 9788520934388
1 Literatura brasileira I Título
CDD: 869.2
CDU: 82-2(81)(
André Queiroz – CRB-4/2242
SUMÁRIO
Capa
Folha de rosto
Créditos
Programa de estreia da peça
Personagens
Primeiro ato
Segundo ato
Terceiro ato
Posfácio
Sobre o autor
Créditos das imagens
Colofão
Programa de estreia de Doroteia,
apresentada no Teatro Fênix, Rio de Janeiro,
em 7 de março de 1950
Paschoal Bruno
apresenta
Doroteia
Farsa em três atos de Nelson Rodrigues
Distribuição por ordem de aparecimento:
flávia
Luiza Barreto Leite
maura
Nieta Junqueira
carmelita
Rosita Gay
das dores
Dulce Falcão Rodrigues
doroteia
Eleonor Bruno
d. assunta
da abadia
Maria Fernanda
Encenação, direção e iluminação de Ziembinski
Cenários e figurinos de Santa Rosa
PERSONAGENS
D. Flávia
Doroteia
Carmelita
Maura
D. Assunta da Abadia
Das Dores
PRIMEIRO ATO
(Casa das três viúvas — d. Flávia, Carmelita e Maura. Todas de luto, num vestido longo e castíssimo, que esconde qualquer curva feminina. De rosto erguido, hieráticas, conservam-se em obstinada vigília, através dos anos. Cada uma das três jamais dormiu, para jamais sonhar. Sabem que, no sonho, rompem volúpias secretas e abomináveis. Ao fundo, também de pé, a adolescente Maria das Dores, a quem chamam, por costume, de abreviação, Das Dores. D. Flávia, Carmelita e Maura são primas. Batem na porta. Sobressalto das viúvas. D. Flávia vai atender; as três mulheres e Das Dores usam máscaras.)
D. FLÁVIA
— Quem é?
DOROTEIA
— Parente.
D. FLÁVIA
— Mas parente tem nome!
DOROTEIA
— Doroteia!
(Cochicham Maura e Carmelita.)
CARMELITA
— Doroteia não é uma que morreu?
MAURA
(num sopro) — Morreu…
CARMELITA
— E afogada, não foi?
MAURA
— Afogada. (lenta, espantada)
Matou-se…
DOROTEIA
(em pânico) — Abram! Pelo amor de Deus, abram!
D. FLÁVIA
(rápida) — Teve a náusea?
DOROTEIA
— Não ouvi…
D. FLÁVIA
(calcando bem as sílabas) — Teve a náusea?
(Silêncio de Doroteia.)
MAURA
(para Carmelita) — Não responde!
CARMELITA
— Ih!
D. FLÁVIA
— Se é da família…
DOROTEIA
(sôfrega) — Sou!…
D. FLÁVIA
— …deve saber, tem que saber!
DOROTEIA
— Tive sim, tive!
(Rápida, d. Flávia escancara a porta. Maura e Carmelita abrem, a título de vergonha, um leque de papel multicor. Doroteia entra, com expressão de medo. É a única das mulheres em cena que não usa máscara. Rosto belo e nu. Veste-se de vermelho, como as profissionais do amor, no princípio do século.)
DOROTEIA
(ofegante) — Oh! Graças, graças!
MAURA
(com o rosto protegido pelo leque)
— Será mesmo Doroteia?
CARMELITA
(protegida pelo leque) — Que o quê!
MAURA
— Claro… Doroteia morreu…
D. FLÁVIA
(para Doroteia) — Mentirosa! Sua mentirosa! Não é Doroteia!
DOROTEIA
— Sou!
D. FLÁVIA
— Doroteia morreu!
DOROTEIA
(em pânico) — Não! Juro que não!
MAURA
(a Carmelita) — Vamos espiar!
(As duas sobem numa cadeira, estiram o pescoço e olham por cima do leque. Agora d. Flávia e as primas, unidas em grupo, recuam para a outra extremidade do palco, como se a recém-chegada fosse um fantasma hediondo; agacham-se, sob a proteção dos leques. E segredam, de rosto voltado para a plateia.)
MAURA
— Não é, não!
CARMELITA
— Nunca foi!
(Doroteia aproxima-se do grupo. Fica de pé, de frente para a plateia.)
D. FLÁVIA
— Já sei… Nossa família tinha duas mulheres com esse nome… uma que morreu e a outra que largou tudo, deixou a casa…
MAURA
(em desespero) — Desviou-se!
DOROTEIA
— Não… Não…
(D. Flávia ergue-se. Fala a Doroteia por cima do leque.)
D. FLÁVIA
— Você é a Doroteia ruim… a que se desviou…
DOROTEIA
— Eu não!… Sempre tive bom proceder… Nunca fiz vergonha… E garanto que só um homem tocou em mim…
D. FLÁVIA
— Só um?
CARMELITA
(a Maura, rápido e baixo) — Mentira!
DOROTEIA
— Só um… o senhor meu marido…
MAURA
(baixo e rápido para Carmelita) — É falsa…
D. FLÁVIA
— Pensas que eu não soube?
(Doroteia recua, assustada)
DOROTEIA
— De quê?
D. FLÁVIA
(num grito) — De tudo!… Soube de tudo… (baixo) Uma pessoa me contou…
DOROTEIA
— Que pessoa?
D. FLÁVIA
— Não me lembro, nem precisa… Sabemos de tudo que acontece com parente… Quando alguém na família morre ou dá um