Tosquias Elétricas: 30 Anos
De Paulo Ludmer
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Tosquias Elétricas - Paulo Ludmer
Copyright© 2020 by Artliber Editora Ltda.
Capa e editoração:
Editorando Birô
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
(Câmara Brasileira do Livro)
Ludmer, Paulo
L65t
Tosquias elétricas: 30 anos / Paulo Ludmer. – 1.ed. – São Paulo: Artliber Editora, 2020.
132 p.; 16 x 23 cm.
ISBN: 978-85-88098-56-5
1. Energia elétrica. 2. Crônicas. 3. Energia no Brasil. I. Título.
CDD 343.0929
Índice para catálogo sistemático:
1. Energia elétrica
2. Energia no Brasil
3. Crônicas
2020
Todos os direitos desta edição são reservados à
Artliber Editora Ltda.
Av. Diógenes Ribeiro de Lima, 3294
05083-010 – São Paulo – SP – Brasil
Tel.: (11) 3832-5489 – 3641-3893
info@artliber.com.br
www.artliber.com.br
PARa LUIZ LUSTIG
NOTA DO AUTOR
Na segunda metade do século passado, fiquei embasbacado quando meninos jornalistas, José Alves, José Gonçalves e Edgard Laureano da Cunha, compraram da Editora Abril a revista Eletricidade Moderna, concorrente do Mundo Elétrico, da família Gruenwald.
No Mundo Elétrico, a pedido do jornalista Alberto Tammer, assumi a coluna da última página que comentava o cenário político energético brasileiro. Passaram-se anos depressa demais. O Mundo Elétrico não suportou tantas crises que o empreendedor enfrenta no Brasil há séculos.
Coincidentemente, em 1989, Alves (que partiu e nos deixou há pouco tempo) me convidou para tocar a coluna Momento na sua Revista, ativa até hoje graças à resiliência, coragem e decisões acertadas de José Gonçalves (Publisher) e Edgard Laureano.
Fez 30 anos em 2019. A coluna Momento prossegue e me abençoa sendo eu o seu escriba, ainda aqui redigindo esta Nota para o leitor. Desde 1989, a cada três ou quatro anos, a Aranda Editora e depois a Artliber reúnem esses textos em livro, compondo para todo o futuro um farto material auxiliar à historiografia do setor elétrico brasileiro. Suas capas e sinopses podem ser vistos em www.pauloludmer.com.br em ordem de publicação.
Choca, na leitura por três décadas, a onipresente inércia dos problemas, dos desafios e da falta de soluções, que correspondem, em ampla escala, às diatribes que impedem in totum o nosso Brasil de romper a barreira do desenvolvimento.
Espanta que assim mesmo la nave va. O Brasil é maior do que seus problemas
, repetia Dona Ana Ludmer, minha mãe.
Estarrece a falta de ideólogos, de estadistas, de lideranças e de partidos efetivamente compromissados com os mais elevados objetivos de bem-estar da Nação brasileira.
Impressiona a ineficácia do grito, do protesto, da denúncia, que mal e mal envolvem as pessoas, os agentes influentes em todos os processos desta esfera onipresente na economia, na vida e no meio ambiente do país.
A caneta envolve, mas não compromete.
Vê-se que o Estado investidor não debela o nepotismo, o patrimonialismo, o populismo, a corrupção, a ineficiência da economia e da sociedade. Ao mesmo tempo, a iniciativa privada não faz políticas públicas, inteiramente focada em margens e lucros, custos de oportunidade, incentivos e vantagens competitivas diversas.
In extremis, o Estado interventor e o liberalismo abutre não se diferenciam mesmo quando se alternam.
Tosquias elétricas: 30 anos avança sobre os meus compêndios anteriores (Hemorragias Elétricas, 2015; Sertão Elétrico, 2013; Derriça Elétrica, 2010... e outros, da Artliber) porque descasca camadas cada vez menos aparentes, menos óbvias, desses processos pouco civilizados e humanos que se verificam lá e cá, nos cinco continentes, num mundo de tanto faz.
Nos próximos dez, cinquenta ou cem anos, estudiosos dentro e fora da Academia terão, nesta coleção, uma visão autoral de um longo período da vida nacional, que fortuitamente assinei ao longo da minha vida profissional.
Sim, são fragmentos. Porém, nacos de uma contemporaneidade fragmentada regida pelas incertezas da cosmogonia, pelas imprevisibilidades da física; pelo desconhecimento do que surgirá de uma supersônica transformação tecnológica a redefinir os homens e as máquinas; as profissões e o ócio; os afetos e a nova ética.
O otimismo realista transfiro para as palavras da sobrevivente da primeira guerra mundial, Dona Ana Ludmer: não se desgaste, a vida continua, nada com um dia depois do outro
.
PREFÁCIO
UMA LUTA DE DÉCADAS CONTRA O ATRASO
Toda grande história tem seus cronistas, e dentre estes, os expoentes. John Reed foi o mais cultuado repórter da revolução russa de 1917. Seu relato apaixonado no livro Dez Dias que Abalaram o Mundo
fez mais pela ideia da revolução do que toda a propaganda oficial do regime nas décadas seguintes. Na apuração para a obra, e também para México Insurgente
(sobre a revolução mexicana) e todos as outras que escreveu sobre os conflitos sindicais-trabalhistas nos EUA, a Primeira Guerra Mundial, etc., envolveu-se emocionalmente e in loco com os acontecimentos e seus protagonistas (Lênin, Trotsky e Pancho Villa entre eles). Morto em 1920, aos 32 anos de idade (e por isso poupado de testemunhar os descaminhos de sua
revolução das décadas seguintes), ainda hoje é uma das principais referências para escritores e historiadores sobre os principais movimentos que mudaram a face do mundo na segunda década do século 20.
Jornalistas brilhantes e que são também apaixonados e privilegiados observadores experimentam uma espécie de simbiose com seu objeto, influenciando e sofrendo de volta a influência deste, numa troca constante e salutar. Dos expoentes brasileiros dessa estirpe, sobressai Euclides da Cunha e seu essencial Os Sertões: campanha de Canudos
de 1902, resultado de sua posição de testemunha, como jornalista enviado do jornal A Província de S. Paulo
(mais tarde O Estado de S. Paulo
). Canudos abalou profundamente as convicções de Euclides sobre os sertanejos e o sertão, e seu livro impulsionou fortemente a revisão de certa concepção até então reinante da primazia do progresso sobre outros valores.
Do trabalho de jornalistas que se dedicaram ao exame perene e ininterrupto da realidade, talvez o mais prestigiado exemplo seja o de Carlos Castello Branco. Tendo visto e ouvido de tudo durante suas muitas décadas de proximidade à política e ao poder, a tudo e todos influenciou com sua respeitadíssima Coluna do Castello
, publicada diariamente no Jornal do Brasil de 1962 a 1993. Uma produção impressionante em quantidade, riqueza de informação e capacidade de análise e síntese, da qual historiadores se valem e continuarão a valer-se por muito tempo no futuro, para entender e explicar política e economicamente a transição democracia-ditadura-redemocratização no País nesse longo período.
Observadores privilegiados não necessariamente dão em grandes cronistas. Mas esse resultado é certo quando ao exame acurado da realidade aliam-se o talento, a inquietação e, ingrediente fino que a poucos se oferece, o tempo. É com o concurso valoroso dos anos de observação e análise de seu objeto que o cronista de vocação se torna insuperável, como atesta a produção de Castellinho. E como facilmente também constata o leitor que acompanha a coluna Momento
de Paulo Ludmer, publicada na revista EM - Eletricidade Moderna também há mais de 30 anos. Um dos mais incisivos e constantes analistas do setor energético brasileiro, sobretudo no segmento da energia elétrica, Ludmer atuou em grandes órgãos da imprensa diária (foi editor de Energia do prestigioso jornal Gazeta Mercantil
) e ainda hoje é colaborador frequente em diversos veículos especializados. Atuou também como dirigente de entidades setoriais, principalmente como executivo da Abrace - Associação Brasileira de Grandes Consumidores e Consumidores Livres de Energias.
Já se somam quase quatro centenas de crônicas desde a edição abril de 1989 de Eletricidade Moderna, quando, convidado pelo então editor José Rubens Alves de Souza, de saudosa memória, Paulo Ludmer inaugurou uma cabeça de ponte
dos assuntos econômico-político-institucionais do setor de eletricidade na última página de EM, revista que então dedicava-se quase exclusivamente aos aspectos técnicos da engenharia elétrica.
A inciativa revelou-se extremamente oportuna. A partir dos anos 1990 ocorreram intensas transformações nas feições e na dinâmica da indústria de energia elétrica no Brasil, as quais a coluna Momento
esmiuçou, clarificou e ajudou a compreender. Os ventos liberalizantes que sopravam da Europa e uma enorme crise de inadimplência financeira intrassetorial praticamente obrigavam à substituição do modelo estatal centrista construído a partir dos anos 1950 -1960. Empreendeu-se partir dali uma transição para um modelo orientado ao mercado e que incluía o fortalecimento da figura do consumidor, o qual começava então, finalmente, a ser visto como cliente
pelas empresas do setor, e a implantação de determinadas formas de competição, tanto do lado da geração quando do fornecimento.
De lá para cá, houve e continua a haver no setor de energia elétrica nacional muita turbulência, com raízes quase sempre fundadas em equívocos de política energética e com efeitos amiúde agravados pelo incômodo comportamento da natureza, que insiste em contrariar os burocratas — sendo o maior dos muitos exemplos, até aqui, a grave crise de oferta que se estabeleceu no ano 2000, provocando um brutal racionamento de eletricidade no País, em 2001-2002, o qual atrasou o desenvolvimento econômico da nação em mais alguns anos.
Nestas três décadas, a coluna Momento
comentou, analisou, criticou e combateu (e até elogiou, onde isso foi possível) as políticas, empreendimentos e ações que acabaram por transformar um parque gerador quase integralmente constituído por hidrelétricas em uma matriz mais diversificada, com presença crescente de outras modalidades como as usinas térmicas, as eólicas e, mais recentemente, as solares fotovoltaicas. O privilegiado leitor de Ludmer acompanhou e entendeu melhor os avanços e os percalços da evolução do mercado e dos consumidores de energia, desde sua condição de cativeiro absoluto, quase que reféns das distribuidoras, para o atual momento em que a faculdade de escolher seu fornecedor de eletricidade está prestes a ser estendida para clientes de médio e, oxalá, até de pequeno porte.
A história do setor elétrico brasileiro do período, acompanhada habilmente pela coluna, é recheada de episódios surpreendentes, açodamentos e equívocos, iniciativas malfadadas e bastante contrassenso. É, enfim, a história de uma luta entre modernidade e atraso, entre forças do avanço e do retrocesso, que, a despeito da evolução referida acima, ainda mantêm o consumidor de eletricidade, via tarifa, mas também via impostos e encargos os mais heterodoxos, como avalista compulsório dos erros de condução e financiador de estapafúrdias despesas. E a coluna sempre esteve pronta a apontar contradições e desmandos, a pôr o dedo na ferida, a cobrar racionalidade e retidão, e a defender o consumidor, a parte mais frágil dessa relação, o que tem as costas largas na qual toda conta se espeta. Nessa lida, certamente colheu desafetos entre as hostes do atraso, mas com certeza conquistou a simpatia dos amantes da liberdade e do progresso material e social, os quais constituem a maioria absoluta dos brasileiros, ainda bem.
Os textos dos 25 primeiros anos de Momento
já haviam sido publicados em seis volumes anteriores, aos quais o autor deu os inventivos títulos de Perdas e Gulas
(1994), Crônicas e Correntes
(1998), Despropósitos Elétricos
(2002), Derriça Elétrica
(2007), Sertão Elétrico
(2010) e Hemorragias Elétricas
(2015). Este Tosquias Elétricas
, que reúne as colunas publicadas de maio de 2015 a dezembro de 2019, fecha o arco dos primeiros 30 anos dessa coluna que constitui um patrimônio da revista EM, de seus leitores e do País. E não apenas a bem da compreensão da realidade atual. No futuro, toda vez que um pesquisador se debruçar sobre estas conturbadas décadas do setor elétrico brasileiro, terá à disposição, tanto na coleção da Eletricidade Moderna quanto nos títulos acima enumerados, uma fonte inestimável de informação, traduzida pela visão equilibrada, abrangente e objetiva do especialista dedicado, e ao mesmo tempo temperada pela paixão e o compromisso do Ludmer para com o Brasil e os brasileiros.
– Mauro Sérgio Crestani
Editor de Eletricidade Moderna
SUMÁRIO
PCHs: PREÇOS INVIÁVEIS E 10 GW DESPREZADOS
QUAL O PAPEL DO ESTADO E DO GOVERNO?
ENERGIA EÓLICA: ENTRE ACERTOS E ERROS
SETOR ELÉTRICO: COMO SAIR DO ABISMO?
ENERGIA: PRECISA-SE DE TALENTOS
GESTÃO EFICIENTE PARA UM MUNDO DE RISCOS E INCERTEZAS
TEMO PELO AMADO NORDESTE
REDUÇÃO DE EMISSÕES: TAREFA URGENTE E DIFÍCIL
QUEM VAI PAGAR A CONTA?
PETRÓLEO: A CRISE ANUNCIADA
SETOR ELÉTRICO PRECISA DE REFORMA
O CUSTO DA ENERGIA EM XEQUE
DIFICULDADES ASSOLAM O SEGMENTO EÓLICO
REMODELAR É PRECISO. MAS É FACTÍVEL?
O ARTIFICIALISMO NO SEGMENTO DE RENOVÁVEIS
O REDESENHO DO SETOR ELÉTRICO
MME BUSCA CONSTRUIR NOVA IDENTIDADE
NO SETOR ELÉTRICO, O BAMBU ESPERA SUA VEZ
A GERAÇÃO DE ENERGIA PODE SER SUSTENTÁVEL
A NOVA VISÃO DA EPE
O DESASTROSO INTERVENCIONISMO GOVERNAMENTAL
SEM LAGOS, PAÍS FICA À MERCÊ DA PLUVIOMETRIA
TRANSMISSÃO É O MOTE DO SETOR ELÉTRICO ATUAL
A (REVIRA)VOLTA DO CARVÃO MINERAL
COMO PLANEJAR A OPERAÇÃO EM UM CENÁRIO DISRUPTIVO?
CRISE POLÍTICA TENDE A AUMENTAR DESAFIOS DO SETOR
PANORAMA DO SETOR DE GÁS NO BRASIL
COMPETITIVIDADE AMEAÇADA POR POLÍTICAS ERRÔNEAS
SETOR ELÉTRICO: TRANSFORMAÇÕES À VISTA
CONDENADOS ÀS TÉRMICAS
OS PREJUÍZOS DAS INTERVENÇÕES ESTATAIS
POLÍTICA ENERGÉTICA: GUERRA SEM FIM
O RENASCIMENTO DA PETROBRAS
INOVAÇÕES, DESAFIOS E RISCOS CERCAM O SETOR ELÉTRICO
BIOMASSA VS. CARRO ELÉTRICO
O DESAFIO DAS ÁGUAS
SETOR ELÉTRICO PRECISA DE