Encontre milhões de e-books, audiobooks e muito mais com um período de teste gratuito

Apenas $11.99/mês após o término do seu período de teste gratuito. Cancele a qualquer momento.

O Grande Arcano: ou o ocultismo revelado
O Grande Arcano: ou o ocultismo revelado
O Grande Arcano: ou o ocultismo revelado
E-book284 páginas4 horas

O Grande Arcano: ou o ocultismo revelado

Nota: 0 de 5 estrelas

()

Ler a amostra

Sobre este e-book

Escrito no final da vida, O Grande Arcano, também chamado de O Ocultismo Revelado, é o livro mais profundo de Éliphas Lévi. Poderíamos trazer aqui uma longa exposição sobre essa pérola memorável, e infelizmente relativamente desconhecida, mas optamos por deixar o próprio autor falar sobre ela:

'Esta obra é o testamento do autor; trata-se do mais importante e o último de seus livros sobre a ciência oculta.
É dividida em duas partes. A primeira é intitulada “O mistério real ou a arte de governar as forças e subjugar poderes” e a segunda “O mistério sacerdotal ou a arte de fazer-se servir pelos espíritos”.
Este livro não necessita de introdução ou prefácio; obras precedentes do autor cumprem amplamente tais funções.
Nele se encontra a última palavra do ocultismo; foi, portanto, escrito com a maior clareza que nos foi possível empregar.
Este livro pode e deve ser publicado? Ignoramos isso ao escrevê-lo.
Se ainda existem verdadeiros iniciados no mundo, é para eles que escrevemos, e somente eles podem nos julgar.'

Éliphas Lévi

***

Número de páginas
Equivalente a aproximadamente 225 págs. de um livro impresso (tamanho A5).

Sumário (com índice ativo)
- Prefácio de Robson Bélli
- Uma nota sobre a tradução
- Introdução
- Parte 1: O mistério real (com 12 capítulos)
- Parte 2: O mistério sacerdotal (com 17 capítulos)
- Epílogo: A vida de Éliphas Lévi (por Arthur Edward Waite)
- Apêndice: O que é ocultismo?

***

[ uma edição Textos para Reflexão distribuída em parceria com a Bibliomundi - saiba mais em raph.com.br/tpr ]

IdiomaPortuguês
Data de lançamento8 de dez. de 2022
ISBN9781526060068
O Grande Arcano: ou o ocultismo revelado

Leia mais títulos de Eliphas Lévi

Relacionado a O Grande Arcano

Ebooks relacionados

Ocultismo e Paranormal para você

Visualizar mais

Artigos relacionados

Avaliações de O Grande Arcano

Nota: 0 de 5 estrelas
0 notas

0 avaliação0 avaliação

O que você achou?

Toque para dar uma nota

A avaliação deve ter pelo menos 10 palavras

    Pré-visualização do livro

    O Grande Arcano - Eliphas Lévi

    Prefácio

    Esta obra é sem dúvida uma das mais importantes que já li. Ela me ajudou a elucidar e a confirmar para mim mesmo o que de fato é o ocultismo, e o seu papel em minhas práticas da arte e da ciência que outrora se conhecia por magia; pois tal obra elucida com clareza, de maneira muito prática e eficaz, a diferença entre o que eu chamo de magia (Magnetização) e o que eu chamo de feitiçaria (Fascinação). Assim, eu percebo que por falta de instrução ou caráter muitos de nossos irmãos ocultistas infelizmente caem pelas veredas da charlatanice e nas práticas de feitiçaria; contudo o estudo deste livro pode ajudar aqueles que abraçam o ocultismo de coração aberto e sincero a compreender tais perigos, e saber o que deve ser feito para converter a si mesmo – de um vil feiticeiro, em um sublime hierofante.

    Mas este livro vai ainda muito além, trata de questões problemáticas relativas ao mal, dos quais muitos de nós ocultistas buscamos respostas de maneira pouco produtiva nas religiões mortas, dentre inúmeros outros temas. O livro pode ser dividido em duas partes: a primeira, que trata da arte de fazer servir-se pelas forças, e a segunda parte, que trata de como fazer-se servir pelos espíritos. Mas essa visão é apenas uma abreviação grosseira de seu conteúdo, que é de grande serventia a toda comunidade ocultista como um belo guia de referência de como obter autoridade espiritual através do ato de sintonizar-se com sua verdadeira vontade, que está em sintonia com a vontade do Todo Poderoso.

    Pois para que se possa magnetizar sem maiores riscos se faz necessário ter em si mesmo a luz astral, ou seja, ser uma pessoa que preza pela sabedoria e a virtude. O homem que é por demasiado escravo das suas paixões, contudo, não magnetiza, somente fascina; porém, a propagação da sua fascinação (luz morta) amplia em seu redor o raio da sua cegueira, pluraliza os seus encantos e termina por minar cada vez mais a sua vontade.

    Neste livro encontramos frases poderosas que nos fazem pensar a respeito da verdadeira força invencível, que é a força sem violência, pois os homens violentos são homens fracos e pouco prudentes, cujos vãos esforços sempre acabam por se voltar contra eles mesmos. A raiva faz com que as pessoas se entreguem, muitas vezes cegamente, aos seus instintos e inimigos.

     Uma das mais belas ideias ensinadas nesta obra é que se tu desejas a Luz, assim ela se fará, e que nós não devemos buscar a vitória pela espada, pois o assassino provoca o assassinato, e é pela paciência e pela doçura que nós nos faremos senhores de nós mesmos e de todo o universo.

     Assim foi com aquele que tomou Troia: o prudente e paciente Ulisses, que sempre sabe se conter e só desfere ataques seguros. Aquiles representa a paixão humana, e Ulisses as nossas virtudes. Sem dúvida o autor destes antigos poemas gregos conhecia profundamente o Grande Arcano da Alta Magia, o qual é único, e tem por objetivo colocar o Poder Divino a serviço da nossa verdadeira vontade. E para chegarmos a realização deste Arcano não devemos nos esquecer jamais da palavra quádrupla do enigma eterno proposto pela Esfinge:

    "Saber, na sua cabeça de mulher de olhar penetrante; querer, no perfil do laborioso touro; ousar, nas suas garras de leão; e calar, nas suas asas dobradas."

    Este livro nos confere as chaves para entender que todas as substâncias podem ser modificadas pela ação dos homens: toda ação humana é sobretudo dirigida pelo espírito; todo espírito é por sua vez dirigido conforme a vontade; e toda a verdadeira vontade é determinada por uma razão. Dessa forma, é a paixão dos homens que os tornam escravos de seus prazeres mundanos, e estar acima disso lhe dá o verdadeiro poder. Ler este livro lhe proporciona a oportunidade de refletir sobre estas questões maravilhosas, pois a nossa verdadeira natureza coloca o prazer e o dever juntos – se, contudo, de maneira antinatural quisermos separar nosso dever e nosso prazer, vamos nos corromper e envenenar.

    Se compreendermos o que o autor deste livro diz, ao afirmar que se juntamos o dever e o prazer, os mesmos não hão mais de se separar, e o que se seguirá será a nossa maravilhosa recompensa, então teremos entendido por fim a que se destina esta obra.

    A última consideração que posso dizer que obtive da sua leitura foi de que todo poder mágico está em um ponto de equilíbrio universal. A sabedoria se equilibra nestas quatro afirmações:

    Saber a verdade;

    Querer o bem;

    Amar o belo;

    e Fazer o que é justo.

    Pois a verdade, o bem, o belo e o justo são uma unidade inseparável, de tal forma que aquele que sabe a verdade não há de deixar de querer o bem, de amá-lo porque é belo e de fazê-lo porque é justo.

    Creio que todo homem está destinado a atingir este ponto, porque o verdadeiro Deus deu a todos os seres humanos uma inteligência para saber, uma vontade para querer, um coração para amar e um poder para operar.

    O perfeito exercício da inteligência aplicado à verdade nos leva ao entendimento. O perfeito exercício da inteligência aplicado ao bem nos dá o sentimento do que é belo, o qual produz a mais sagrada e perfeita fé. O homem verdadeiramente equilibrado é aquele que pode dizer: Sei o que é, creio no que deve ser e nada nego do que pode ser. O cego (ou fascinado) diz em seu coração: Creio no que as pessoas, em quem acredito, me disseram para acreditar. Creio porque amo a certas pessoas e certas coisas. Em outros termos, o primeiro poderá dizer, Creio pela razão, e o segundo, Creio pela paixão; faço meus votos para que tu que lê este livro creia, mas creia também pela razão!

    IN LVX

    Robson Bélli (Frater Iustus)

    Fujinomiya, Shizuoka, Japão, 21 de Abril de 2022

    Sol em 2º de Touro

    Uma nota sobre a tradução

    A publicação desta obra em formato digital teria sido consideravelmente mais complexa sem a tradução original de Rosabis Camaysar, que eu tive o prazer de revisar e atualizar quando necessário, geralmente focando somente nas novas regras de ortografia de nosso tempo.

    Rosabis Camaysar era o pseudônimo utilizado pelo brasileiro Lourenço Prado de Almeida e Silva (1893 – 1945) em suas traduções de Éliphas Lévi. Escritor, tradutor e grande estudioso das ciências ocultas, Lourenço também traduziu outras obras de Lévi para o português, como Dogma e Ritual da Alta Magia e História da Magia. Ele foi igualmente bem sucedido como autor de alguns livros na temática da espiritualidade em geral, sendo Alegria e Triunfo a sua obra mais lida e celebrada.

    Rafael Arrais

    A imagem traz o selo do Grande Arcano do G.’. A.’. de A Chave dos Grandes Mistérios [outra obra de Lévi], também conhecido como o Pantáculo de Tebas, matriz raiz do alfabeto latino e algarismos arábicos. Nele podemos ler de cima para baixo e, em hebraico, da direita para a esquerda: Rei, Justiça, Esther, à capital Suze [ou cidadela de Susã] (Daniel 8), Assuero Mordecai (Neemias 1:1); no centro, e refletido na sombra: Eu Sou Aquele Que Sou (Êxodo 3:14). Frase final em maiúsculas, escrita em latim: POR ESTE SIGNO VOCÊ VENCERÁ.

    Introdução

    Esta obra é o testamento do autor; trata-se do mais importante e o último de seus livros sobre a ciência oculta.

    É dividida em duas partes. A primeira é intitulada O mistério real ou a arte de governar as forças e subjugar poderes e a segunda O mistério sacerdotal ou a arte de fazer-se servir pelos espíritos.

    Este livro não necessita de introdução ou prefácio; obras precedentes do autor cumprem amplamente tais funções.

    Nele se encontra a última palavra do ocultismo; foi, portanto, escrito com a maior clareza que nos foi possível empregar.

    Este livro pode e deve ser publicado? Ignoramos isso ao escrevê-lo.

    Se ainda existem verdadeiros iniciados no mundo, é para eles que escrevemos, e somente eles podem nos julgar.

    ÉLIPHAS LÉVI

    Setembro de 1868

    PARTE 1

    O mistério real

    ou a arte de governar as forças

    e subjugar poderes

    1. O magnetismo

    O magnetismo é uma força análoga à do ímã; está espalhado em toda a natureza.

    Suas características são: a atração, a repulsão e a polarização equilibrada.

    A ciência observa os fenômenos do ímã astral e do ímã mineral. O ímã animal se manifesta todos os dias por fatos que a ciência verifica com desconfiança; no entanto, já não pode mais negá-los.

    Porém, para admiti-los, ela espera, com razão, que sua análise seja finalizada e uma síntese incontestável seja alcançada.

    Sabemos que a imantação produzida pelo magnetismo animal determina um sono extraordinário, durante o qual a alma do magnetizado cai sob o domínio do magnetizador – com esta particularidade: a pessoa adormecida parece deixar inativa sua própria vida para manifestar exclusivamente os fenômenos da vida universal. Ela reflete o pensamento dos outros, vê sem auxílio dos olhos, torna-se presente em toda parte sem ter consciência do espaço, percebe as formas mais que as cores, suprime e confunde os períodos do tempo, fala do futuro como se fosse do passado e do passado como se fosse do futuro, explica ao magnetizador seus próprios pensamentos e até as acusações secretas da sua consciência; evoca na sua recordação as pessoas em que pensa e as descreve do modo mais exato, sem que o sonâmbulo ou sonâmbula as tenha visto alguma vez; fala a linguagem da ciência com o sábio e a da imaginação com o poeta, descobre as doenças e adivinha os remédios, dá muitas vezes sábios conselhos, sofre com quem sofre e, às vezes, dá um grito doloroso ao anunciar-vos tormentos que devem surgir.

    Tais fatos estranhos, porém incontestáveis, nos levam necessariamente a concluir que existe uma vida comum para todas as almas, ou ao menos uma espécie de refletor comum de todas as imaginações e memórias no qual podemos ver-nos uns aos outros, como acontece com uma multidão que passa diante de um espelho. Tal refletor é a luz [ou força] ódica do cavalheiro Karl Ludwig Freiherr von Reichenbach, equivalente a nossa luz astral: é o grande agente da vida, chamado Od, Ob e Aur pelos hebreus.

    O magnetismo dirigido pela vontade do operador é Od, o sonambulismo passivo é Ob. As pitonisas da Antiguidade eram sonâmbulas ébrias de luz astral passiva. Nos livros sagrados, essa luz é chamada espírito de Python, porque na mitologia grega a serpente Python é a sua imagem alegórica.

    Ela é representada também na sua dupla ação pelas serpentes do caduceu; a serpente da direita é Od, a da esquerda é Ob, e no meio, no topo da verga hermética, brilha o globo de ouro que representa Aur ou a luz equilibrada. Od representa a vida livremente dirigida; Ob representa a vida fatal. É por isso que o legislador hebreu diz: Infelizes dos que adivinham por Ob, pois evocam a fatalidade, o que é um atentado contra a providência de Deus e contra a liberdade do homem.

    Há certamente uma grande diferença entre a serpente Python – que se arrasta no lodo do dilúvio e que o sol feriu com suas flechas – e a serpente que se enrosca no bastão de Esculápio, da mesma forma que a serpente tentadora do Éden difere da de bronze que curava os doentes no deserto. Estas duas serpentes opostas simbolizam efetivamente as forças contrárias que podemos associar, porém que jamais devem confundir-se. O cetro de Hermes, separando-as as reúne; e é assim que, aos olhos penetrantes da ciência, a harmonia resulta da analogia dos contrários.

    Necessidade e liberdade: tais são as duas grandes leis da vida; e essas duas leis fazem uma só, pois são indispensáveis uma à outra.

    A necessidade sem liberdade seria tão fatal quanto à liberdade que, privada do seu freio necessário, se tornaria insensata. O direito sem o dever é a loucura. O dever sem o direito é a servidão.

    Todo o segredo do magnetismo consiste nisto: governar a fatalidade do Ob pela inteligência e o poder do Od, a fim de criar o equilíbrio perfeito de Aur.

    Quando um magnetizador, desequilibrado e sujeito a fatalidade por paixões que o dominam, quer impor sua atividade à luz fatal, assemelha-se a um homem com os olhos vendados que, montando um grande cavalo cego, quisesse aguilhoá-lo às esporadas no meio de uma floresta cheia de sinuosidades e precipícios.

    Os adivinhos, tiradores de cartas e sonâmbulos são todos alucinados que adivinham por Ob.

    O copo de água de hidromancia, as cartas de Etteilla [pseudônimo de Jean-Baptiste Alliette (1738 – 1791)], as linhas da mão etc., produzem no vidente uma espécie de hipnotismo. Vê então o consultante nos reflexos dos seus desejos insensatos ou das suas imaginações cúpidas; e, como se trata de um espírito sem elevação e sem nobreza de vontade, adivinha as loucuras e sugere maiores ainda, o que é, ainda assim, uma condição de êxito para o seu trabalho.

    Um cartomante que aconselhasse a honestidade e os bons costumes perderia logo sua clientela de concubinas e solteironas histéricas.

    As duas luzes magnéticas podiam muito bem chamar-se uma, a luz viva, e a outra, a luz morta; uma, o fluido astral, e a outra, o fósforo espectral; uma, o facho do verbo, e a outra, a fumaça do sonho.

    Para magnetizar sem perigo é preciso ter em si a luz de vida, isto é, deve-se ser um sábio e um justo. O homem escravo das paixões não magnetiza, fascina; porém a irradiação da sua fascinação aumenta ao redor dele o círculo da sua vertigem; multiplica seus encantos e enfraquece cada vez mais sua vontade. Assemelha-se a uma aranha que se cansa e, enfim, fica presa em sua própria teia.

    Os homens até agora ainda não conheceram o império supremo da razão; eles a confundem com o raciocínio particular e quase sempre errôneo de cada um. Contudo, o próprio Senhor de La Palisse [referência a Jacques de La Palisse (1470 – 1525)] lhes diria que quem se engana não tem razão, a razão é precisamente o contrário dos nossos erros.

    Os indivíduos e as massas que a razão não governa são escravos da fatalidade; é ela que faz a opinião, e a opinião é a rainha do mundo.

    Os homens querem ser dominados, atordoados, arrastados. As grandes paixões lhes parecem mais belas que as virtudes, e aqueles a quem chamam grandes homens são, às vezes, grandes insensatos. O cinismo de Diógenes lhes agrada como o charlatanismo de Empédocles. Nada admiraria tanto como Ajax e Capanea, se Polyeucto não fosse ainda mais furioso. Pyrama e Thisbeu, que se matam, são os modelos dos amantes. O autor de um paradoxo sempre tem a certeza de adquirir renome. E, por mais que condenem ao esquecimento, por despeito e inveja, o nome de Erostrato, este nome tem tanta grandeza de demência que supera a sua raiva e se impõe eternamente à sua recordação!

    Os loucos são, portanto, magnetizadores, ou antes fascinadores, e é o que torna a sua loucura contagiosa. Por falta de saber medir o que é grande, a gente se apaixona pelo que é estranho.

    As crianças que ainda não podem andar querem que a gente as carregue e leve a passeio.

    Ninguém ama tanto a turbulência quanto os impotentes. É a incapacidade do prazer que faz os Tibérios e as Messalinas. O garoto de Paris no paraíso das ruas arborizadas queria ser Cartouche, e ri de coração quando ridicularizam Telémaco.

    Nem todos gostam da embriaguez opiácea ou alcoólica, porém quase todos iam querer embriagar o espírito e comprazer-se facilmente em fazer delirar o coração. Quando o cristianismo impôs-se ao mundo pela fascinação do martírio, um grande escritor daquele tempo formulou o pensamento de todos, exclamando: Creio porque é absurdo!

    A loucura da Cruz, como o próprio São Paulo a chamava, era então invencivelmente invasora.

    Queimavam-se os livros dos sábios e São Paulo preludiava em Éfeso os feitos de Omar. Derrubavam-se templos que eram maravilhas do mundo e ídolos que eram obras-primas das artes. Tinham o gosto da morte e queriam despojar a existência presente de todos os seus ornamentos para desprender-se da vida.

    O desgosto das realidades sempre acompanha o amor dos sonhos: Quam sordet tellus dum coelum aspicio! – diz um célebre místico [provável referência a Santo Inácio de Loyola, embora a frase seja mais antiga]; literalmente: Quão suja se torna a Terra quando olho para o céu!

    Pois então, teu olhar ao perder-se no espaço, acha suja a Terra, tua nutriz? Que é, pois, a Terra, senão um astro do céu? Será que ela é suja só porque te carrega? Ora, então que te levem para o sol, e teus desgostos logo sujarão o sol!

    Seria o céu mais limpo se fosse vazio? E não é ele admirável de se contemplar justamente porque durante a noite brilha com uma multidão inumerável de terras e de sóis? Porventura a Terra esplêndida, a Terra de imensos oceanos, a Terra cheia de árvores e de flores torna-se uma imundície para ti só porque quererias lançar-te no vácuo? Acredita-me, não procures mudar-te daqui por isso: o vácuo está no teu espírito e no teu coração!

    É o amor dos sonhos que mistura tantas dores aos sonhos do amor. O amor tal como nos oferta a natureza é uma deliciosa realidade; porém o nosso orgulho doentio quereria alguma coisa melhor que a natureza. O pensamento de Carlota, na cabeça de Werther, se transforma fatalmente como devia suceder, e toma a forma brutal de uma bala de revólver. O amor absurdo tem como desfecho o suicídio.

    O amor verdadeiro, o amor natural, é o milagre do magnetismo. É o entrelaçamento das duas serpentes do caduceu; parece produzir-se fatalmente, porém é produzido pela razão suprema que lhe faz seguir as leis da natureza. A fábula refere que Tirésias, tendo separado duas serpentes que se uniam, incorreu na cólera de Vênus e tornou-se andrógino, o que anulou nele o poder sexual; depois, a deusa irritada o feriu mais ainda, tornando-o cego porque atribuía à mulher o que convém principalmente ao homem. Tirésias era um indivíduo que profetizava pela luz morta. Por isso, suas predições anunciavam e pareciam sempre determinar doenças. Essa alegoria contém e resume toda a filosofia do magnetismo que acabamos de revelar.

    2. O mal

    O mal, no que possui de realidade, é a desordem. Ora, em presença da ordem eterna, a desordem é essencialmente transitória. Em presença da ordem absoluta, que é a vontade de Deus, a desordem é apenas relativa. A afirmação absoluta da desordem e do mal é, dessa forma, essencialmente a mentira.

    A afirmação absoluta do mal é a negação de Deus, pois que Deus é a razão suprema e absoluta do bem.

    O mal, na ordem filosófica, é a negação da razão. Na ordem social, é a negação do dever. Na ordem física, é a resistência às leis invioláveis da natureza.

    O sofrimento não é um mal, é a consequência e quase sempre o remédio do mal.

    Tudo que é naturalmente inevitável não pode ser um mal. O inverno, a noite e a morte não são males. São transições naturais de um dia para outro, de um outono para uma primavera, de uma vida para outra.

    Pierre-Joseph Proudhon disse: Deus é o mal; é como se tivesse dito: Deus é o diabo, pois o diabo é tomado geralmente como gênio do mal. Voltemos à proposição e ela nos dará esta fórmula paradoxal: O diabo é Deus; ou em outros termos: O mal é Deus. Porém, temos por certo que ao falar assim o rei dos lógicos não queria, sob o nome de Deus, designar a personificação hipotética do bem.

    Proudhon pensava no deus absurdo que os homens criam e, explicando seu pensamento, diremos que tinha razão, pois o diabo é a caricatura de Deus, e o que chamamos o mal é o bem mal definido e mal compreendido.

    Não seria possível amar-se o mal pelo mal, a desordem pela desordem. A infração das leis nos agrada porque parece colocar-nos acima das leis. Os homens não são feitos para a lei, mas a lei é feita para os homens – dizia Jesus [referência a Marcos 2:27], palavra audaciosa que os padres daqueles tempos certamente consideraram subversiva e ímpia, palavra de que o orgulho humano pode abusar prodigiosamente.

    Dizem que Deus só tem direitos e não deveres, porque é o mais forte, e é isso que é uma palavra ímpia. Devemos tudo a Deus, ousam acrescentar, e Deus nada nos deve. É o contrário que é verdade. Deus, que é infinitamente maior do que nós, contrai, ao nos colocar no mundo, uma

    Está gostando da amostra?
    Página 1 de 1