Suplemento Pernambuco #198: Gloria Anzaldúa
De Jânio Santos, Hana Luzia, Luis E. Jordán e
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Suplemento Pernambuco #198 - Jânio Santos
CARTA DOS EDITORES
Não tente domar o feminismo de fronteira de Gloria Anzaldúa (1942-2004): talvez esta frase seja uma síntese possível para a matéria de capa desta edição do Pernambuco . Anzaldúa, que faria 80 anos em 2022, é tida como a primeira pessoa a usar o nome queer em contexto acadêmico. Partia de seu próprio corpo e experiências para poder elaborar conceitos e atuar no mundo. Nascida no sul dos EUA, um lugar marcado pelas violências de um conflito com o México no século XIX, ela recusava categorias eurocentradas, adotando uma perspectiva mestiza e habitando a encruzilhada. Praticou um feminismo de fronteira, em que se transita não por uma geografia estável, mas por uma espécie de fenda, de espaço que se situa no entre (e não em um aqui
ou ali
). Em seu texto, Dri Azevedo discute os passos dessa autora tão importante e pouco publicada no Brasil — em livro, conta-se apenas com um volume lançado em 2021, além de ensaios traduzidos de maneira pontual em revistas e coletâneas.
Como sempre, você encontra nesta edição a ideia de narrativa irradiando em diversas direções, especialmente as que envolvem a literatura. De poemas de Langston Hughes em uma tradução amorosa e inventiva, a entrevistas, crônica e resenhas, abordamos questões do contemporâneo em vieses diversos. Dentre esses textos, destacamos o perfil da pesquisadora Flora Süssekind, cujo trabalho agencia formas diferentes de lidar com o texto literário. O perfil de Flora apresenta uma autora que se aproxima da literatura por um viés negativo, que envolve o desconforto histórico. É isto que leitores encontrarão no novo livro dela, Coros, contrários, massa, publicado em setembro pelo Selo Pernambuco/Cepe Editora: formas de se aproximar do tempo presente por meio do desconforto e da literatura feita por autores canônicos e recentíssimos.
Você ainda encontra nesta edição um artigo sobre a PEC das Domésticas (cuja aprovação fará 10 anos em 2023) e suas reverberações sociais – uma publicação dentro de nossa parceria com a Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Ciências Sociais (Anpocs); e um conto de Antonio Geraldo Figueiredo Ferreira que lida com o presente em linguagem vertiginosa.
Uma boa leitura!
COLABORAM NESTA EDIÇÃO
Adelaide Ivánova, poeta, tradutora e fotógrafa, autora de o martelo; Alexandre Fraga, sociólogo e professor; Edma de Góis, pós-doutora em Estudos de Linguagens (UNEB); Fernanda Lobo, crítica literária, tradutora e mestra em Letras (USP); Laura Erber, poeta, editora e artista visual, autora de Esquilos de Pavlov; Leonardo Nascimento, jornalista e doutorando em Antropologia Social (UFRJ); Pedro Henrique Müller, ator, apresenta o canal literário Pedro Henrique Müller no YouTube; Renato Contente, doutorando em Sociologia (UFPE), autor de Não se assuste pessoa!; Victor da Rosa, crítico literário e professor (UFOP), organizador de Natureza: A arte de plantar
EXPEDIENTE
Governo do Estado de Pernambuco
Governador
Paulo Henrique Saraiva Câmara
Vice-governadora
Luciana Barbosa de Oliveira Santos
Secretário da Casa Civil
José Francisco Cavalcanti Neto
Companhia editora de Pernambuco – CEPE
Presidente
Ricardo Leitão
Diretor de Produção e Edição
Ricardo Melo
Diretor Administrativo e Financeiro
Bráulio Meneses
Superintendente de produção editorial
Luiz Arrais
EDITOR
Schneider Carpeggiani
EDITOR ASSISTENTE
Carol Almeida e Igor Gomes
DIAGRAMAÇÃO E ARTE
Hana Luzia e Janio Santos
ESTAGIÁRIOS
Luis E. Jordán, Rafael Olinto e Vitor Fugita
TRATAMENTO DE IMAGEM
Agelson Soares e Sebastião Corrêa
REVISÃO
Dudley Barbosa e Maria Helena Pôrto
colunistas
Diogo Guedes, Everardo Norões, Gianni Gianni (interina) e José Castello
Supervisão de mídias digitais e UI/UX design
Rodolfo Galvão
UI/UX design
Edlamar Soares e Renato Costa
Produção gráfica
Júlio Gonçalves, Eliseu Souza, Márcio Roberto, Joselma Firmino e Sóstenes Fernandes
marketing E vendas
Bárbara Lima, Giselle Melo e Rafael Chagas
E-mail: marketing@cepe.com.br
Telefone: (81) 3183.2756
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Chorrir, o jeitinho brasileiro
O país que não deucerto e o arquivo de nossos comentários: a internet
Laura Erber
hana luzia
Naquela época, meu mundo digital se resumia a jogos narrativos, tipo King’s Quest, e um uso bem-limitado do Word, que ainda levava horas e mais de 20 disquetes para ser instalado. O computador parecia uma pequena caixa de promessas, um animal ainda dependente de processos lentos e em geral falhos. Quem não se lembra do gostoso clique de quando o disquete era engolido de fato pela máquina e começava a ser lido?
Yahoo, diziam meus colegas, era um jeito sensacional de você fazer coisas na internet. Eu não entendi nada. Diziam que era preciso entrar no endereço
e para mim um endereço não era um lugar onde você entrava, como se entra numa casa ou numa caixa. Mas então alguém disse que tinha recebido poemas de Borges por e-mail. Recebi do meu tio vários poemas de Borges por e-mail
. Uau. E eu nem sabia o que era e-mail, mas Borges foi a senha do portal para o mundo dos escambos virtuais que nunca cessaram.
Uns 10 anos antes, frequentava uma loja de locação de jogos de Atari onde havia um cartaz de propaganda dos computadores nacionais Cobra: Computador é que nem petróleo: É perigoso depender dos outros
. Para a criança que eu era, a frase era misteriosa e se misturava com o cheiro de Bom Ar e ar condicionado daquela loja de subsolo.
O primeiro e-mail foi enviado em 1971 pelo engenheiro Ray Tomlinson, e era uma mensagem para ele mesmo. Tomilson constatou que o telefone não era assim tão incrível, queria criar um sistema onde a pessoa pudesse receber uma mensagem sem ter de recebê-la na hora em que a mensagem chegasse. Não havia uma maneira realmente boa de deixar mensagens para as pessoas. O telefone funcionava até certo ponto, mas alguém tinha que estar lá para receber a chamada. E se não era a pessoa que você queria, era um assistente administrativo ou um serviço de atendimento ou coisa parecida
. Assim surgiu a ideia de deixar mensagens numa caixa de correio que ficava dentro do computador. A primeira mensagem de Tomlinson não dizia nada, mas a invenção era digna de um conto de Borges.
Kafka também pensou em inventar uma máquina de mensagens instantâneas para se comunicar com Felice, isso na época em que ele ia várias vezes por dia ao correio e as cartas entre os dois deviam se cruzar nas estradas que iam de Berlim a Praga.
Durante os anos noventa eu praticamente só me correspondia com meu avô de mais de noventa anos e com poetas brasileiros e latino-americanos com quem se estabeleceu uma intensa troca de poesia, bastante importante pra mim naqueles anos. Alguma arqueóloga versada em internet terá de repassar esse material certamente relevante para entender o circuito da poesia naqueles anos. Isso tudo foi antes dos emojis, quando o Facebook apareceu tudo mudou. Também pra pior.
Em 2015, o emoji conhecido como Face with Tears of Joy
, foi escolhido pelo Dicionário Oxford como a Palavra do Ano
. Não era exatamente uma palavra – a rigor era um pictograma – mas foi escolhido por um dos dicionários mais importantes do mundo. Curiosamente a escolha não suscitou grandes queixas por parte dos guardiões do saber tradicional (acadêmicos, professores, guardiões da língua).
Os primeiros emojis foram criados em 1999 pelo artista japonês Shigetaka Kurita. Kurita trabalhou na equipe de desenvolvimento do i-mode, uma plataforma inicial de internet móvel da principal operadora de telefonia móvel do Japão, Docomo.
Antes dos emojis, existiam emoticons, que são as expressões faciais feitas apenas com sinais de pontuação. Os primeiros emoticons apareceram em 1881 na revista Puck. A revista publicou quatro carinhas
: alegria, melancolia, indiferença e espanto.
Ninguém diria que em 2022 um