Quando A Porta Se Abrir
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Quando A Porta Se Abrir - Delânia Maria Almeida Rodrigues
Quando a Porta se Abrir
Delânia Maria Almeida Rodrigues
Copyright by: Delânia Maria Almeida Rodrigues
Edição e Capa: Francisco B. Freire Filho
Revisão: Luanna Lago
Contatos da Autora:
E-mail: delaniamaria@caema-ma.com.br
Telefone: (98) 99904-3886 / (98) 3238-4553
Permitida a reprodução total ou parcial, desde que citada à fonte.
Prefácio
O que esperar de uma obra que tem um título como esse, já que vivemos numa sociedade em que, a todo o momento, queremos que uma porta se abra? Queremos ver aberta a porta da solidariedade; dos valores humanos; da amizade; do respeito; do carisma; do amor; da realização dos sonhos...
E, se temos (ou não) a esperança de que, algum dia, essas portas, e tantas outras se abram, nada melhor que a leitura desta obra magnífica para nos impulsionar a buscar, cada vez mais, a realização dos nossos objetivos.
Se sou branco ou preto; rico ou pobre; intelectual ou analfabeto, nada disso importa... O que realmente interessa é a vontade de ver a porta se abrir para mim!!!
Eis a lição que aprendi com a leitura deste livro, ao ter sido contemplada com a oportunidade de fazer a revisão ortográfica. Confesso que foi a tarefa mais emocionante que já executei, ao longo de 11 anos em que venho tendo contato com o mundo das Letras
.
Parabéns, Delânia! E que novas portas se abram!
Luanna Lago
Apresentação
Há muito tempo eu tenho em mãos o projeto desse livro, esperando apenas o momento certo para acontecer. Quando a Porta se Abrir
é uma história simples, de amor, fé e superação. Através dela, tento mostrar para as pessoas que a vida é, de fato, uma caixinha de surpresas e dependendo da forma como você vai abri-la, poderá ser mágica, ou não. Através desta história, desejo retratar alguns enigmas sociais e, com isso, provocar reflexões: será que temos algum poder de decisão sobre o nosso destino? Ou somos apenas os escolhidos? Será verdade que as palavras, quando ditas, são capazes de atrair o bem ou o mal, como se fossem ímãs? E a sorte? Quem a tem é porque é merecedor ou uma coisa nada tem a ver com a outra?
Descobri, ao longo dos anos, que existe em cada ser humano, várias Fases e Faces, e isso nos faz múltiplos de nós mesmos. Acredito que entre o nascer e o morrer somam-se milhões de possibilidades. Não há vida estática; nem tempo perdido. Afinal, tudo tem um propósito e uma razão de ser.
O tema abordado neste livro retrata exatamente esse pensamento, e não foi por acaso que o escolhi. Não estava só nas minhas fantasias a história de uma menina que nasceu na mais extrema pobreza; que foi analfabeta até a sua adolescência; que perdeu tudo ao mesmo tempo, inclusive os próprios sonhos. Assim como não estava só nas minhas fantasias, o desfecho emocionante e surpreendente desta história, porque eu resgatei tudo isso das ruas, do mundo real.
Este livro é dedicado a minha maior e melhor amiga, minha mãe, Maria do Socorro Almeida Rodrigues.
Se não for hoje, um dia será. Algumas coisas, por mais impossíveis e malucas que pareçam, a gente sabe, bem no fundo, que foram feitas para um dia dar certo.
Caio Fernando Loureiro de Abreu
(1948-1996), escritor brasileiro.
Agradecimentos Especiais
Sempre e primeiramente a Deus, por ter me concedido inspiração e determinação para a realização desse trabalho;
Ao meu filho Giovanni Júnior, por ter sido o primeiro leitor dessa obra; por me incentivar e também apontar duramente meus erros; por ter feito com que eu reescrevesse por diversas vezes esse trabalho e, em cada recomeço, ter aprendido muito mais;
Às amigas, Luanna Lago e Cleudilene Rezende, meu agradecimento comovido, pelo apoio, pelas palavras de incentivo, e pelo segundo olhar que, brilhantemente, deu a minha obra um toque todo especial.
1 - Ainda ontem
Dona Célia tinha uma aparência franzina, mas era uma mulher elegante. A pele, muito clara e bem tratada, assim como os cabelos brancos, arrumados de maneira cuidadosa, deixava à mostra sua vaidade. Parecia estar sempre sorrindo. Seu olhar era vibrante e de uma bondade quase transparente. Casou-se ainda muito jovem e teve quatro filhos. Era uma senhora rica, que herdara, após a morte dos pais, parte das propriedades da região onde morava. O dinheiro, no entanto, nunca foi seu maior aliado; tentou fazer dele apenas uma grande arma para vencer muitos desafios.
Às vezes, sentia-se sozinha naquele casarão repleto de tantas lembranças. O marido usava cadeira de rodas e tinha lapsos de memória, em consequência da doença que se agravara com o passar dos anos. Sebastiana, a quem considerava mais que uma simples governanta e que havia morado com ela durante muito tempo, decidiu partir com uma de suas filhas, assim que esta se casou. Os empregados da casa eram sempre gentis, mas cada um preocupava-se apenas com seus afazeres, e sua única alegria mesmo ficava por conta dos finais de semana, quando a família se reunia para o almoço de domingo.
Começou a perceber o quanto o tempo havia passado rápido demais. Ainda ontem, os filhos eram crianças e corriam livres ao redor do jardim. Agora a sala estava constantemente vazia. Mesmo assim, não seria justo queixar-se deles nem deixar de reconhecer o quanto eram atenciosos com ela sempre que podiam. Ana Eliza muitas vezes a surpreendia com suas visitas inesperadas e, quando isso acontecia, ficavam horas jogando conversa fora, mas não era a mesma coisa de antes.
Lembrou-se dela, naquele dia, mais do que de costume, por conta das últimas notícias recebidas, tão surpreendentes quanto foi a vida daquela menina até aquele momento.
— Ela conseguiu! Meu Deus, ela conseguiu! — Repetia dona Célia para si mesma, com estranha alegria.
Passou os olhos novamente pela sala vazia, recordando-se do primeiro dia em que Ana Eliza entrou por aquela porta, e do sentimento que provocara nas crianças, sua fisionomia desengonçada e suja. Dona Célia explicou com carinho para todos eles, o significado do seu gesto e da dura pobreza na qual vivia aquela menina. João Pedro, o mais velho, foi o primeiro a lhe estender as mãos, comovido. Era o mais dócil e sensível dos quatro filhos. A única que se manteve distante foi Carolina, a caçula, por não saber disfarçar a princípio, o ciúme que sentiu.
Aos poucos, os filhos foram crescendo, tornando-se adultos e independentes. Dona Célia observava com angústia, mas com a sensação de dever cumprido, o momento em que cada um saía de casa para construir sua própria família. A ausência deles fez com que ela se apegasse ainda mais a Ana Eliza. Foi a única que ficou para lhe fazer companhia e para ouvir suas queixas; principalmente, quando o marido adoeceu e teve que ficar por alguns meses internado.
Quando a conheceu, era uma pedinte suja, maltrapilha, mas de uma beleza firme, disposta, apesar de tudo, a ser solidária quando a vida lhe cobrasse isso. O encontro das duas aconteceu de maneira inusitada e quase por acaso. Coisas do destino.
Era dezembro de 1965...
Dona Célia conseguiu parar bruscamente o seu carro, já próximo a um mísero barraco, debaixo de um viaduto. Ela perdera o controle da direção assim que, outro veículo, que vinha logo atrás e em alta velocidade, encostou-se ao seu. Nesse dia, o tempo estava fechado, ameaçando chover. Parecia que os dois cobertores velhos e empoeirados que faziam a ligeira proteção do abrigo, a qualquer momento, seriam arrastados pela forte ventania. Ana Eliza costumava ficar ali. Naquele final de tarde a menina já se recolhia para tentar descansar um pouco, quando, de repente, percebeu que algo estranho acontecia do lado de fora. Um barulho diferente fez com que ela se levantasse de vez. Seu coração disparou. Ao se aproximar, um tanto receosa, escutou a respiração ofegante de uma mulher. Era dona Célia tentando lhe dizer alguma coisa, mas quase não conseguia; estava visivelmente assustada. Isso causou em Ana Eliza certa comoção. A vontade que ela sentiu naquele momento foi de abraçá-la, como se assim pudesse ser útil a alguém, pela primeira vez na vida. Mas se envergonhou do seu estado. Cheirava mal e, ao caminhar, sentia sempre uma tontura, com a qual já havia até se acostumado. Não sabia, no entanto, que naquele momento Deus a colocava mais uma vez em prova.
— Precisa de ajuda senhora? — Perguntou a menina, aproximando-se dela.
Dona Célia foi até a garagem. Pediu ao motorista a chave do velho automóvel e ficou durante segundos, envolta pelas lembranças. Tocou-lhe com as mãos trêmulas e comovidas como se ali estivesse seu maior troféu. O filho mais velho sempre lhe dizia o quanto era prazeroso servir a Deus e ajudar ao próximo, mas poucas vezes ela parou para pensar sobre isso; suas ações eram sempre silenciosas. Contentava-se com as doações que fazia a asilos e orfanatos; era uma pessoa alegre e de bom coração, mas costumava lamentar de longe as dores dos outros, nunca se envolvia com elas. Até conhecer aquela menina.
— Ela conseguiu! Meu Deus! Como foi isso? — Perguntava para si mesma, com lágrimas nos olhos.
Coisas do destino. Repetia várias vezes, sozinha, acendendo e apagando o farol do carro, como se reconstruísse inconscientemente aquele momento tão marcante em sua vida.
— Precisa de ajuda senhora? — Insistiu Ana Eliza.
— Espere um pouco, deixa eu me acalmar. — Respondeu-lhe dona Célia, ainda assustada.
— O que aconteceu?
— Meu Deus! Perdi o controle da direção… Não sei bem… Não tenho a menor ideia como foi isso…
— Não sei como ajudar…
— Por favor, me consegue um copo com água.
— Senhora…
— O que foi? Tem alguma coisa estranha em mim?
— Não… É que…
— Eu morri, é isso?
— Senhora… Olhe pra mim…
— Ainda estou em estado de choque… Não enxergo um palmo diante do nariz… Meu Deus! Será que você é uma assombração e eu morri?
— Não! — Respondeu-lhe Ana Eliza, achando engraçado o seu jeito de falar.
— Por favor, ajude-me pelo menos a descer do carro, estou meio zonza.
— Ajudo sim, senhora. — Falou a menina, segurando-a pelos braços.
— Lembro-me de uma batida na lateral do meu carro e que eu perdi o controle da direção... Procurei o freio, mas não funcionava, fiquei em pânico. — Falava dona Célia, sem pausar e ainda ofegante.
— Fique calma, por favor.
— Já estou mais calma… Preciso avisar meu marido… Aqui perto, tem orelhão?
— Ali, na esquina. Mas senhora…
— Preciso avisar meu marido… — Repetia dona Célia, um tanto apreensiva.
— Desculpa não poder fazer muita coisa… É que… A senhora ainda não notou, mas não tenho casa. A gente dorme atrás daqueles dois cobertor ali, eu e a turma. — Disse Ana Eliza, apontando para o abrigo.
— Santa mãe! Você dorme na rua? E sua família onde está? Que turma é essa? Como você consegue? É tão menina ainda… — Perguntava dona Célia sem pausar e tentando observá-la melhor.
— Senhora…
Ana Eliza engoliu as lágrimas; também não sabia como havia conseguido chegar até ali. Sentia-se uma sombra no meio do deserto. Naquele momento, envergonhou-se ainda mais da sua condição subumana, afinal, estava diante de uma mulher elegante, que se vestia e falava de maneira diferente da sua. Lembrou-se da mãe. Pareceu-lhe haver certa semelhança entre elas duas. Dona Salustiana, no entanto, não teve a mesma sorte. Só conheceu a miséria. O único homem que amou durante toda a vida foi o maior culpado por todo o seu sofrimento. Os dois filhos mais velhos não suportaram conviver com a agressividade do pai e saíram de casa, muito cedo, apenas com a roupa do corpo. Nunca mais tiveram notícias deles. Antes de morrer, Salustiana ainda pediu a Ana Eliza que os procurasse e se juntasse a eles, para que estivessem sempre próximos um do outro. Partiu dessa vida cheia de amarguras por conta desse infortúnio, e a pobre menina nada pôde fazer por ela, senão rezar todas as noites ao relento, pedindo a Deus que se apiedasse de sua mãe onde quer que ela estivesse.
Enquanto ajudava dona Célia a se levantar, Ana Eliza passou os olhos, curiosamente, por todo o carro, achando interessante porque nunca tinha visto um tão de perto. Sentiu o suave perfume que exalava de dentro dele; observou o luxo dos assentos, um terço branco pendurado sobre o