PLANISFÈRIO
De Tutan Kunley
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PLANISFÈRIO - Tutan Kunley
CAPÍTULO ÚNICO
E como tudo começa? Bem, este não é o começo – e nem mesmo há um começo, porém, em um lugar não muito distante, e nem muito perto, ainda que em local incerto e não sabido, o amanhecer começa acontecer muito pouco antes do entardecer e não como muito pouco logo após o fim do anoitecer – pois é regra, não como no anterior, nem como será no seguinte.
O lugar é visivelmente plano, porém imperceptivelmente curvo a partir da região central; relativamente alto e cercado de um lado por uma rarefeita, extensa e bela floresta que se estende ao longe pouco após um serpenteado riacho existente por entre uma área de pastagem seminatural – que em outro lugar se tornaria um deserto devido ao deslocamento das nascentes dos riachos que enriquecem todo aquele ambiente. Do outro – esta imperceptivelmente retilínea no sentido longitudinal para ambos os lados – há uma grande cadeia montanhosa pedregosa ainda não identificada, catalogada e escalada, cujo lado oculto ainda é desnecessariamente e completamente desconhecido.
Autores renomados descreveriam este local minuciosamente, enchendo páginas, páginas, páginas e mais páginas de um livro e de mais milhares de milhares de livros, o que torna a leitura um pouco – ou quase nada – fatigosa, porém muito amorosa se não fosse dolorosa. Mas este tipo de descrição vende muito, rendendo bons lucros e gerando muitos empregos (formais, informais, informacionais e ocme¹).
O objetivo aqui não é vender horrores de exemplares para obter vultosos lucros, mas sim praticar caligrafia digitada como terapia ocupacional devido à ociosidade constante. Sendo assim, que este seja um livro no mínimo afrodisíaco.
A grama existente naquele lugar é comum, como toda e qualquer grama descrita em outros livros, porém aqui há um diferencial. Ainda não é possível descrever tal diferencial, pois ele teoricamente não foi construído e nem mesmo foi visto pelos seres que supostamente habitam o local naquele exato momento, apesar de que há muito um deles encontra-se sentado sobre tal coisa. Também não é possível dizer como surgiu tal diferencial, mas pode-se adiantar que somente um físico teórico pode provar – através de cálculos e mais cálculos mentais, fórmulas e mais fórmulas também mentais, livros e livros, lidos ou não, que lotam bibliotecas e bibliotecas, pouco ou nada visitadas – que o diferencial é nada mais, ou ainda, nada mais ou menos que um regulador de velocidades.
Notícias não oficiais dão conta de que uma notável física de teoria fictícia, de notório saber jurídico e de ilibada reputação geopolítica, está elaborando a TDR² – o que tornará o mundo, seja ele qual for, um local mais nítido de se observar, entender ou compreender.
Tal teoria, em regra, tornará possível regular a velocidade de todo e qualquer tipo de onda eletromagnética oriunda de onde quer que seja – por exemplo – e dentre outras coisas ainda inexistentes, mesmo que no vácuo, sendo este existente somente em teoria, e aquela, idem.
Teoricamente, tal teoria possui um potenciômetro analógico contendo diversas engrenagens de madeiras das mais qualificadas espécies de árvores nativas – ativas ou inativas – que de forma manual e destramente correta e delicada, poderá manter, acelerar, frear e até mesmo, pasmem, parar ondas eletromagnéticas e outras coisas das mais variadas frequências, estacioná-las e/ou rebocá-las até um depósito de bens apreendidos por excesso de velocidade em vias cosmicamente pavimentadas, ou não. Neste caso, a TDR também pode calcular o valor da multa a ser compulsoriamente cobrada via LMA³.
Resumindo o local, tudo é muito parecido – senão quase idêntico - com o descrito no capítulo dois, mais precisamente na página quatorze, terceiro parágrafo, do volume três da série O mochileiro das Galáxias
, qual seja: A VIDA, O UNIVERSO E TUDO MAIS
. Um livro que por um acaso de uma fortuita e desnecessária necessidade, foi encontrado vagando livremente – porém de forma sutil, amordaçada e presa em uma caixa semirretangular fechada com enormes correntes e cadeados, sem furos para entrada de ar para respirar, bem como para chaves ou segredos tipo alfanumérico para destrancar – pelo campo-temporal sideral.
O ar é claro; a atmosfera azul e cheia de aromas suaves; a brisa – de forma arcaica – acaricia levemente a grama média que cerca a montanha que contém algumas cavernas em seu subsolo habitadas por variados casais de coelhos caolhos e seus filhotes; pássaros coloridos gorjeiam uns para os outros enquanto borboletas e mais borboletas – das mais diferentes classes e origens, algumas bonitas, outras charmosas, várias coloridas (talvez nem tanto) – borboleteiam o ambiente dando assim um toque mais especial àquele local; enfim, a natureza daquele meio ambiente parece conspirar piedosamente para ser gentil e agradável para quem descansa sentado sobre aquele diferencial delicadamente exposto sobre a grama deliciosamente resplandecida pelas fontes de energias eletromagnéticas mais próximas e ocme.
O que supostamente desafina o local ainda bucólico é a aparição repentina e inesperada de um ser totalmente ainda não personificado em qualquer outro livro até então existente, mas certamente será imortalizado em obras de litociências futuristas (aqui ainda não é passível de saber se futuristas são as obras ou as litociências).
Outros autores, por vezes, certamente descreveriam tal ser da seguinte forma, não necessariamente nesta sequência ou ordem: sexo masculino; altura mediana; cor parda; olhos castanhos escuros; cabelos grisalhos longos tipo mosaicanos; orelhas alongadas, arqueadas e levemente voltadas para o sul quando se está caminhando para o norte; nariz idêntico ao de Ùzaratruta; barba por fazer há cerca de três translações up’icanesas⁴, muito parecidas com a de um ser abraâmico; pés descalços conforme pregado por aquele que foi pregado em uma cruz ao lado de dois biltres também pregados por ter pregado a paz, o amor e ocme; calça jeans toda surrada pelas translações up’icanesas ainda não vindouras; camisa xadrez, nas cores azul marinho, preto e branco acinzentado, fabricada em ÙD’eshglaban⁵ – contudo adquirida em ÙD’onblewim⁶ durante a realização de um campeonato de lançamento de tênis sem cadarços – porém em algodão ÙO’icipíge⁷ colhido manualmente por seres ùj’udiahados⁸ foragidos de seu terrão nativo durante a penitência diluviana cujas águas ainda não se sabe de onde vieram e nem para onde foram, o que torna assunto a ser comentado posteriormente após IPC⁹ aberta pelo CNA¹⁰ para apuração póstuma e ocme.
Escrever um livro é fácil, extremamente fácil. Tudo se torna claro, pateticamente claro quando se consegue manter as palavras em seus devidos lugares. Algumas palavras são arredias; enquanto outras são insistentemente arredias, insistindo e persistindo em mudar de local e sentido e sem significado e sem sentido ou tradução, o que faz o coração disparar quando se vê um AVANI¹¹ desconhecido trespassar o campo atmosférico deixando um rastro de poeira cosmicamente transparente, o que tira a concentração compulsória do eleitor desavisado na hora do e-voto em branco ou nulo, tornando-o um inválido.
Tal ser, identificado posteriormente como um desconhecido com nome a ser nomeado em ocasião quase inoportuna, é nada mais que alguém que se tornou voluntariamente um desempregado disfarçado de andarilho – também desempregado ou coisa parecida – que passa seus momentos de lazeres terapêuticos ocupacionais caçando coisas para compostagem. Anda quase sempre com seu saco nas costas e sua PAZOGUNM¹² nas mãos, realizando viagens mundo afora montado no DAG¹³. É poliglota e se comunica inclusivamente por leitura labial. Para tradução faz uso de um casal de BF’s¹⁴ laranja-limão-cravo maduro acoplado ao sistema audiovisual, um presente do infinitamente amigo confidencial ÙaiF’ordprefect. Tem como sonho escrever um livro, porém é autodeclarado surdo, mudo e analfabeto por motivos pessoais e óbvios, o que o torna incapacitado temporariamente para realizar atividades laborais escriturárias.
Neste momento, mais precisamente aqui e agora, ele acaba de chegar de uma longa jornada pelo tumultuado interior central iluminado de um supercúmulo – cujas galáxias são não muito distantes umas das outras – que se aproxima do grande atrator devorador de superaglomerados de galáxias, não obstante não muito longe dali, pois – segundo a TDR, o campo-tempo é relativamente pequeno, seria quase inexistente se não fosse tão depreciativo. Tal jornada foi após realizar a divertida caçada à TRF¹⁵ – escrita por Àmilev’Àmarock, supostamente mãe dos filhos de Ùalber’Tàistein – para compostagem.
Em suas parcas, porém divertidas e andantes viagens literárias, chega à conclusiva conclusão de que tal teoria é como penas de pavão sem o pavão, muito coloridas, mas não sólidas o suficiente, tendo como única utilidade adornar fantasias carnavalescas usadas por ESGE¹⁶.
Afirma ele que tal teoria se comporta como macacos timbó, com aparência suprarracional, porém manchada de bobagens icônicas que a torna minimamente ridícula.
Após a caça e captura, ele coloca a TRF em seu saco e – montado no DAG – vai até o centro da Via Lactescente e lança a TRF em seu DBH¹⁷ preferido – cuja única função existencial é compostar coisas inúteis.
O mundo não é mais ou menos o mesmo desde então, pois os litocientistas contemporâneos futuristas teóricos e nada práticos passam a se sentir completamente obsoletos, depressivos e depreciativos, porém suas obras literárias de ficção científicas vendem horrores, sendo lidas por seres assumidamente analfabetos científicos.
Feliz por estar ali – naquele local único, úmido, humoso e inesperado – não percebe notadamente que um AVANI descruza o campo atmosférico no sentido oposto ao olhar para o seu lado destro, deitado ao solo, com um dos cotovelos apoiado sobre a grama média – ainda úmida de orvalho com sabor de limão ocre – e a mão semicerrada, pertencente àquele braço daquele