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Fragmentes
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E-book148 páginas1 hora

Fragmentes

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Sobre este e-book

Escritos esparsos e insólitos.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento27 de jul. de 2016
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    Fragmentes - Miguel Vicentim

    Fragmentes

    coletânea de cenas curtas,

    contos ridículos e

    poemas vagabundos.

    Miguel Vicentim

    Fragmentes

    coletânea de cenas curtas,

    contos ridículos e

    poemas vagabundos.

    1ª edição

    São Paulo

    2016

    © Miguel Tadeu Vicentim

    Vicentim, Miguel Tadeu.

    Fragmentes: coletânea de cenas curtas, contos ridículos e poemas vagabundos.

    São Paulo: Editora do autor, 2016.

    ISBN 978-85-915842-2-2

    CDD 869.93

    e-mail: prof.miguel@yahoo.com.br

    EU FALO: EU EXISTO. [Lacan]

    MITIMEL, UM EREMITA URBANO

    Eu,

    Mitimel, um eremita urbano

    escrevi este texto débil,

    um monólogo curto,

    para falar da história,

    desta personagem

    perdida em uma selva urbana,

    com um universo

    dentro da sua cabeça

    e um coração que pulsa

    pelo corpo todo.

    Um texto que não pretende

    ser transformador,

    remover montanhas,

    promover revoluções.

    Este texto pretende apenas

    mostrar a dificuldade do ser

    e estar no meio de tudo

    com tanta gente diferente

    e corajosa.

    Eu,

    como disse Clarice Lispector,

    – não saberei que existi daqui a poucos anos –

    Clarice escreveu que sua vida escorre pelos dedos e encaminha-se para a morte, serenamente.

    Eu escrevo que minha vida escorre pelos meus dedos e encaminha-se para a palavra escrita, por mais débil que esta seja.

    Minha vida ser se resume a isto,

    e é bom.

    não o amor por alguém

    embora o tenha

    mas o amor por ser

    simplesmente

    ISTO

    TEATRO INSÓLITO

    CENA I

    (dois personagens, em vasos sanitários, diálogo sem emoção, linear. Pausa longa, silêncio)

    A: No que você está pensando?

    B: Estou pensando no que sinto por você.

    A: E o que você sente por mim?

    B: Não sei, estou pensando.

    A: E alguma vez você já soube?

    B: Nunca parei para pensar sobre isto.

    A: E por que você está pensando nisto agora?

    B: Porque você não está aqui.

    A: Mas eu estou aqui!

    B: Está?

    (pausa longa… os dois personagens limpam a bunda e cheiram o papel)

    A: Estou.

    B: Então não preciso mais pensar em você.

    A: Não. Nunca pare de pensar em mim!

    (pausa longa)

    B: No que você está pensando?

    (reinicia o texto,

    indefinidamente, em um ciclo, contínuo, talvez, alternando A e B, até mesmo mudando

    um ou outro ator, sem padrão,

    repete-se a ação)

    CENA II

    (em uma cadeira, conversa consigo mesmo)

    Tudo bem! Eu já limpei o quarto, lavei o banheiro e passei as pilhas de roupa que estavam sobre o sofá. O que mais eu quero de mim agora?

    (pausa)

    Respondi para mim mesmo, serenamente,

    depois do banho:

    – Amor!

    CENA III

    (talvez uma conversa pelo celular, um personagem no palco, o outro, com voz em off, voz FORTE, TROANTE)

    A: Me ver? Você quer me ver? Você já me teve exclusivamente para você, de graça, em tempo integral, e você ignorava a minha presença. Se você quiser me ver agora vai ter que pagar caro!

    B: Quanto?

    A: 22.

    B: Você troca cinquenta?

    A: A nota é falsa?

    B: Não.

    A: De você eu só aceito notas falsas.

    NA PORTARIA ou

    SORRIA, VOCÊ ESTÁ SENDO FILMADO ou

    AS IMAGENS SÃO PROTEGIDAS NOS TERMOS DA LEI

    (dez/2014)

    No dia 9 de abril de 2013, uma terça-feira, por volta das 21h, Victor Hugo Deppman de 19 anos foi morto na frente do prédio onde morava no bairro do Belém, Zona Leste de São Paulo durante um assalto. Victor Hugo voltava de um estágio, chegava ao edifício na Rua Fernandes Vieira quando foi abordado. Uma gravação feita por uma câmera de segurança do prédio mostra como o crime ocorreu. O porteiro encontrou o jovem caído no chão. O universitário morava com a família, estava no terceiro ano da faculdade Cásper Líbero e costumava passar o dia inteiro fora de casa. Além da faculdade, ele tinha um estágio em uma rádio e em uma TV. Ele entregou o celular sem reagir. O assaltante puxou também a mochila. Quando Victor fez o movimento de tirar a mochila, o ladrão atirou. Sobre a vida do criminoso nós não sabemos absolutamente nada.

    Dois personagens entram em cena por lados opostos e caminham, um na direção do outro, se olham, se cruzam e começam a se afastar, viram o rosto para trás para que se olharem novamente, vão parando lentamente e se viram, voltam ao centro do palco até estarem bem próximos um do outro, param, sempre se olhando. Ficam um tempo se olhando. As mãos dos dois personagens se tocam, um na mão do outro, como em espelho, os dois personagens ajeitam a camisa, sempre como se um fosse a imagem do outro, refletida em um espelho, viram um pouco o rosto, como se para observar o próprio rosto no outro. Brincar com a ideia do selfie, humano, não tecnológico.

    Este jogo entre os atores, teatro gestual, sem texto, deve se prolongar pelo maior tempo possível, em absoluto silêncio (apesar de sua impossibilidade). O diálogo deve ser apenas corporal. Pretende-se representar aqui a fase do espelho analisada por Lacan e outros estudiosos. É a fase em que a criança descobre o outro. É a fase de mimar a criança. Machado de Assis nos apresenta belos exemplos em seus contos O Espelho e Verba Testamentária (ambos contidos na coletânea Papéis avulsos). As telas, janelas, do mundo tecnológico ocupam o lugar do outro em nosso tempo. Assim, voltamos ao exercício de mimar a criança, imitar a criança, imitar o outro. Nas teorias psicanalíticas, mimar de menos psicotiza, mimar de mais, neurotiza. E assim o nosso caráter moderno e especularizado no ver e dar-se a ver através da produção e do consumo, da tecnologia da imagem, do suporte onisciente das nuvens que mantém nossas informações e fotografias garantindo a manutenção de um sistema de controle global ao capturar nosso cerne.

    Todo o espetáculo deve acontecer em absoluto silêncio (apesar de sua impossibilidade). Deve haver uma bexiga vermelha em destaque, iluminada, suspensa em algum lugar do palco.

    Depois deste tempo ação-espelho, um dos personagens tira uma arma do bolso e anuncia um assalto. Saímos do mundo especular para a cena:

    ASSALTANTE:                Me dá o seu celular caralho. O celular!

    GAROTO:                Pera aí, tranquilo.

    A:                Dá logo, dá logo, vai.

    G:                Está aqui, pode levar, de boa. (o garoto oferece o celular, mas o assaltante não pega)

    A:                Eu não quero apenas o celular.

    G:                E o que mais você deseja de mim?

    A:                Eu desejo tudo o que eu não tenho, nunca tive e nunca terei.

    G:                O que é que você nunca teve? Você nasceu, está vivo, pode andar por onde quiser, pode se divertir, pode ir à escola, pode ouvir qualquer música que você queira, pode mijar na rua, pode respirar, pode me assaltar. Com esta arma, o que você nunca terá?

    A:                Como você sabe que eu nasci, que estou vivo, que posso andar por onde eu queira, que posso me divertir, se quero ir à escola, se eu ouço qualquer música, se é na rua que eu quero mijar. Respirar e te assaltar, sim, talvez você

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