Conto De Farpas
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Conto De Farpas - Mariangela Maglioni
Esta é uma obra de ficção, qualquer semelhança com nomes, pessoas, fatos ou situações da vida real terá sido mera coincidência
APRESENTAÇAO
Mariangela Maglioni professora iluminada. Como colega tivemos uma convivência extraordinária na Universidade. O maior destaque era a sua capacidade de transmitir uma sensação de competência e empatia com todos mesmo nas situações mais difíceis. As sendas do destino traçaram caminhos diferentes, mas ficou a boa lembrança e o respeito.
Eis que surge a escritora. Um ato de coragem a demonstrar o seu interior e desvelar a alma para o mundo. Escrever exige uma valentia que a maioria dos estudiosos da área sequer se atrevem.
O autor e sua obra. Uma construção de palavras ideias e muita vivência. O mais importante é a sensibilidade, a emoção e o destemor.
Tempos nebulosos trazidos pela pandemia fizeram a maioria recuar por medo e por prudência. Mas a arte possui o dom de resgatar o melhor de quem já pautou seu caminho. Escrever é para os fortes.
Convido você, leitor, a percorrer as páginas com o que você tem de mais importante: sua alma. Deixe-se levar por sua sensibilidade e aproveite o calor humano da escritora em sua obra inicial. A Arte é imortal.
Rogerio Versieusx
Mestre Educação UNICAMP
Ao meu amado marido Reinaldo que sempre me apoia, incentiva e estimula, tornando meus projetos possíveis.
Sou grata a Deus. Declaro a Ele, meu amor e minha completa dependência.
Sumário
CAMINHANDO
CAMINHOS DE DORES
CRUZANDO OS CAMINHOS
NOVOS CAMINHOS
CAMINHOS DE SUCESSO
CAMINHOS CONFLITUOSOS
CAMINHOS FESTIVOS
A CAMINHO DO ALTAR
CAMINHOS REDEFINIDOS
CAMINHANDO PELO EXTERIOR
CAMINHOS DE UM DESTINO
CAMINHOS JUDICIAIS
CAMINHANDO
Era uma segunda-feira, mas, como estávamos no mês de fevereiro e muitos estavam em férias escolares, aproveitávamos para sair. Naquela noite, mesmo estando muito calor, escolhemos ir ao cinema, porque o filme chamou muito a atenção da maioria do grupo. Trabalhávamos no escritório de um banco, os dias eram uma tremenda correria, mas não nos faltava disposição. A amizade com aquele pessoal era muito especial, a maioria já trabalhava lá fazia bastante tempo e nosso convívio era divertido e sincero. Sabíamos que podíamos contar com apoio de todos para diversos assuntos, mas depois daquele dia pude perceber que podia confiar neles muitos mais do que imaginava.
Voltei para casa de carona, o Hélio normalmente me levava porque morávamos bem perto. Da esquina, pudemos ver três homens parados em frente ao portão da minha casa. A rua estava vazia, já era muito tarde. Fiquei com tanto medo. Na hora pensei na minha mãe. Como o carro do namorado da minha irmã não estava na garagem, achei que ela estaria sozinha. Tinha um carro diferente estacionado lá. Não sabia de quem era.
Vendo minha preocupação, o Hélio deu a ideia de seguirmos em frente e ligar para a polícia, do telefone público na rua de cima. Fomos até o telefone, mas chegando lá, achei melhor ligar também para um dos vizinhos, pedi para ele ligar para o guarda noturno, eu só tinha o número do telefone dele em casa e não queria pedir para minha mãe.
O vizinho disse que já ia até o portão da casa dele, assim dispersaria os homens para eu poder entrar, fizemos assim.
O Hélio se ofereceu para ficar conosco, mas achei que seria perigoso deixar o carro dele na rua e mais perigoso ainda, abrir o portão da garagem, ele concordou, mas me fez garantir que eu ligaria se tivesse problemas.
Quando eu entrei, tentei não demonstrar meu medo. Minha irmã também estava em casa. Contei dos homens e falei que devíamos confirmar se estava tudo trancado.
O guarda da rua ligou para avisar que a polícia tinha passado por lá, abordaram os homens, mas como eles não tinham chegado a abrir o portão, tiveram que liberá-los, mas tiraram uma arma que eles tinham. Fiquei um pouco mais tranquila.
Minha irmã me perguntou como era a aparência deles. Como estava escuro eu não vi detalhes, mas dei uma descrição básica.
Para minha surpresa, Mirtes disse que acreditava que fossem seus cunhados. – Como assim? Por que seus cunhados arrombariam nosso portão?
Ela nem respondeu, sabia que eu ia dar escândalo. Nunca tolerei esse tipo de situação.
Minha mãe e ela foram dormir. Fiquei na sala. Estava intrigada. Lembrei de várias coisas que o meu futuro cunhado já tinha feito e fui ficando mais irritada. Pensei em qual seria o motivo dele não estar lá naquela noite. Ele já dormia em casa fazia tempo, desde que meus pais se separaram.
Meu pai era muito mais nervoso do que eu, dava tremendas broncas nele quando fazia das suas tramoias.
Fiquei tentando me distrair, queria dormir, mas estava com a adrenalina nas alturas. Li, tomei um chá, e nada do sono chegar.
Ouvi um barulho bem alto. Estouraram a corrente do portão! Mirtes se levantou rápido e foi para garagem. Fiquei com um misto de raiva e medo. Não sabia se era melhor ir junto, fui saindo, mas no caminho pensei que talvez minha presença deixasse os cunhados dela mais nervosos, ao mesmo tempo imaginei que deixá-la sozinha com eles, apesar de serem conhecidos, não dava para confiar, afinal, eles arrombaram nosso portão. Resolvi ficar atrás da porta que ligava o corredor a garagem, assim estava perto para tentar fazer alguma coisa se eles fossem agressivos com ela.
Eles começaram a conversar, minha irmã pedia para eles entenderem a situação dela, disse que ela precisava do carro, eles reclamavam que o irmão tinha comprado e não pagou, eles falavam ao mesmo tempo, estavam bem agitados. Mirtes sempre foi bem persuasiva. Ela disse que estava prestes a casar e que eles sabiam que como estava grávida o carro era necessário porque o trabalho dela era longe. Nada os convencia, até que ela se comprometeu em pagar, tratou um prazo e eles aceitaram.
Quando eles foram embora, comecei conversar com ela. – Eu ouvi a conversa, não sabia que você estava grávida, é por isso que você decidiu pelo casamento? Você sempre disse que não gostava dele para casar-se. Você vai se casar porque está grávida? Nós podemos te ajudar com a criança!
Minha mãe estava se aproximando, então mudei a conversa.
Tentamos de tudo para fechar o portão, mas sem corrente e com o miolo da chave estourado não dava. Eu reclamei tanto, não conseguia aceitar que dali a dois meses eles iriam morar na nossa casa, depois de casados. Pedi para minha mãe reconsiderar, disse que não aceitava dividir o teto com uma pessoa daquele tipo, mas minha mãe não me deu razão. Ela sempre me achava exagerada.
Eu tinha 20 anos, parecia muito frágil, mas me sentia forte. Tomava decisões com muita determinação e naquela situação não foi diferente. Na manhã seguinte, me aprontei para trabalhar e preparei uma pequena mala. Quando fui despedir da minha mãe, insisti, falando que se ela queria que eles fossem morar na nossa casa, que nós duas fôssemos embora, poderíamos alugar um apartamento. Ela continuou negando, olhou para minha mala com desdém.
Todos os dias, chegava no escritório empolgada, visitava a maioria dos setores para cumprimentar os colegas, sempre acabava conversando um pouquinho sobre assuntos engraçados. A maioria desses assuntos, eram episódios ocorridos nos nossos passeios do fim do expediente.
Mas, naquele dia, não foi assim. Cheguei tão angustiada. Aquela decisão não era nada simples. Diferente de todos os dias, cheguei e fechei à porta da minha sala. O primeiro que bateu na porta, foi o Hélio, ele queria confirmar se tudo tinha terminado bem depois que me deixou em casa. Tentei concentrar meus pensamentos para conseguir dar um sorriso e disse:
– Sim, ficou tudo certo na noite passada
.
Meus pensamentos agora, eram, como ficariam as coisas dali para a frente.
Liguei para a mãe do meu namorado. Éramos muito amigas. Era uma mulher muito justa, muito lúcida e eu sentia uma confiança enorme na sua opinião. Sempre que passava por problemas no relacionamento com o filho dela, seus conselhos eram totalmente imparciais.
Como a casa dela, ficava bem mais perto do meu trabalho do que a minha, por várias vezes fui convidada a mudar para lá ou pelo menos passar alguns dias da semana. Tinha uma casinha de fundos, que estava desocupada, tanto ela como meu sogro diziam que estava a minha disposição. Meu relacionamento não andava muito bem, esse era um dos motivos que me fazia achar que não seria uma boa opção, mas diante da atual situação, aquela era minha única alternativa. Combinei que no final da tarde iria para lá.
Depois de algumas horas trabalhando a portas fechadas, ouvi uma batidinha e logo em seguida por uma frestinha aberta vi o rosto da Paula com aquele lindo sotaque português: – Maysa, posso entrar?
Acenei positivamente.
Ela entrou, sentou-se vagarosamente, como se estivesse tentando perceber meus sentimentos. – Está tudo bem com você? Hoje você não foi na minha sala na entrada, senti sua falta? Você está pálida, o que está acontecendo?
Minha respiração estava curta. Tentei encher os pulmões para falar, fazendo uma força imensa para não chorar, mas a cada tentativa de soltar uma palavra o nó que eu sentia na garganta, aumentava e eu não consegui segurar, chorei copiosamente com as mãos cobrindo meu rosto. Mais do que cobrindo, eu apertava as mãos na tentativa de conseguir forças.
Ela se levantou rápido, veio até a cadeira onde eu estava sentada, delicadamente tirou minhas mãos do meu rosto, me levantou e me abraçou bem apertado. Parecia que algumas dores do corpo estavam diminuindo. Sem soltar o abraço, ela pegou o telefone, ligou para outra amiga nossa pedindo que trouxesse um copo de água com açúcar.
Eu nem percebi quando o copo chegou ali, meu choro me levava a visitar cada medo da noite anterior, cada desprezo daquela manhã, cada dúvida dos próximos dias.
Ela me sentou, colocou o copo nas minhas mãos e levou