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Aurora Rubra
Aurora Rubra
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E-book332 páginas4 horas

Aurora Rubra

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Sobre este e-book

A trama conta as aventuras de um grupo de caça-fantasmas brasileiros que ganha um subsídio de um grande canal a cabo para produzir um documentário sobre o assunto. Eles escolhem investigar a aparição de um fantasma itinerante que vaga anualmente por mosteiros europeus. Sem saber eles entraram numa viagem ao passado para descobrir segredos ocultos e conspirações que podem terminar com a vida de seus componentes. O grupo passa por lugares significativos da história internacional sem saber que estão prestes a entrar num mundo sombrio, datado da época da Inquisição, onde um grupo que atuava embaixo dos olhos da instituição, uma sociedade secreta conhecida como Aurora Rubra (o despertar do conhecimento obtido pelo sangue dos condenados à fogueira) os colocará em contato com um mundo de riquezas e poder sem limites, resultado do conhecimento extraído das antigas seitas suprimidas. E justamente quando um dos membros se recusa a levar adiante o plano, é morto e se torna o fantasma itinerante, condenado a vagar pelos cenários onde tudo aconteceu até que alguém descubra seu segredo. A equipe, composta exclusivamente de brasileiros, é uma das primeiras a receber a missão de produzir um documentário que, se der certo em termos de audiência, abrirá as portas para novos projetos em nível internacional. Porém os envolvimentos pessoais de cada membro, principalmente de Ricardo “Ric” Almeida, o líder do grupo, abrirá uma porta pela qual as entidades do Aurora Rubra revelarão seus segredos mais íntimos e farão com que as relações entre eles sejam testadas até o limite. Em jogo estão as vidas dos caça-fantasmas e a eternidade para o espírito itinerante poder quebrar sua maldição.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento2 de dez. de 2018
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    Aurora Rubra - Sérgio Pereira Couto

    AURORA RUBRA

    Sérgio Pereira Couto

    Capítulo 1

    Nasce uma Expedição

    - A diferença do campo de energia aqui é muito alta, mas antes de sair por aí falando que a casa possui fantasmas mesmo é necessária uma análise mais detalhada. Os aparelhos revelam os fatos que serão divulgados posteriormente.

    Ricardo Almeida estava entretido em ensinar à equipe de televisão de um canal a cabo que o acompanhava os truques que o levaram a ser um dos caça-fantasmas mais requisitados de São Paulo. Ric, como era conhecido pelos mais íntimos, estava com seus 32 anos e era até pouco tempo um vendedor de livros numa grande livraria da cidade. Até que foi transferido para a seção dos importados. Cuidava das encomendas dos clientes, que muitas vezes pediam para trazerem livros que só eram encontrados no exterior.

    Ric, com seu vozeirão à lá James Brown, era alto, 1,88 m, moreno, tinha uns 80 quilos, um filho legítimo de imigrantes portugueses. Tinha um corpo largo e uma postura que mais parecia a de um leão de chácara. Ele próprio desconfiara que havia sido transferido para aquela seção para que os engraçadinhos que roubavam livros de encomenda (e que eram muitos) ficassem com receio. Não gostava do emprego, mas era formado em Relações Públicas e tinha sérias dificuldades em trabalhar na área, que achava extremamente chata. Por isso se virava na livraria mesmo.

    Até o dia em que se deparou com um livro de um caça-fantasma austríaco chamado

    Hans Holzer. Embora nascido em Viena, Holzer tornou-se muito popular no mundo todo ao realizar pesquisas paranormais em vários lugares do mundo, incluindo Estados Unidos. É o autor de mais de 138 livros sobre paranormalidade, obras que se tornaram quase best-sellers onde foram lançadas por sua maneira simples e direta de explicar como as chamadas assombrações funcionam.

    O livro que Ric encontrara chama-se Ghosts of New England e relatava vários casos investigados por Holzer, sempre em companhia de uma médium. O assunto o atraiu tanto que resolveu aprofundar-se usando a Internet. Foi lá que encontrou a página de Joshua P. Warren, também autor de livros sobre assombrações. Só que desta vez a coisa parecia ser mais técnica do que simplesmente um monte de crendices. Claro, Holzer investigara muitos casos famosos incluindo o malfadado Horror em Amityville, mas Warren foi mais a fundo e montou um verdadeiro manual de caçar fantasmas com o que há de melhor em tecnologia moderna. E essa era uma antiga paixão de Ric.

    - Você está brincando? – Perguntou seu pai, surpreso – Quer mesmo investir nesse setor? Mas por que?

    - Justamente porque ninguém leva isto a sério. – Disse Ric, de olho na recém-adquirida câmera digital que comprara – Quem nunca teve vontade de saber o que há do outro lado? O que acontece quando morremos?

    - Mas caçar fantasmas é coisa de Hollywood!

    - Por isso mesmo é necessário desmascarar essa má impressão que ficou da profissão. E depois que mal há nisso? É um passatempo como outro qualquer.

    O pai de Ric, o senhor Almeida, já tinha seus 66 anos e lamentava que as tentativas do filho de encontrar uma profissão que o agradasse tivessem dado errado. Mas no fundo só queria que ele se sentisse bem e terminou por concordar.

    Ric começou a investigar assombrações em algumas casas abandonadas na região de Higienópolis, em São Paulo. Os imóveis eram ligados a alguns conhecidos seus e estavam abandonados. Seus donos não queriam morar lá e simplesmente não conseguiam alugá-los, pois toda vez que tentavam, algo estranho acontecia. Eram três casas enormes que, por fora, eram simpáticas e atraentes, mas por dentro pareciam nervosas e lúgubres.

    Ele usou muito do equipamento recomendado por Warren em seu livro: bloco de notas, lanterna, relógio, bússola, medidor de campo eletromagnético, de infravermelho, pó, plásticos pretos, gerador eletrostático, de tons, luz estroboscópica, termômetro, câmera de vídeo e fotográfica, ampliador de áudio e até mira de visão noturna. Levou pelo menos um mês investigando em cada casa e colheu alguns dados científicos. Depois de três meses entrou numa biblioteca e começou a procurar em jornais velhos. Encontrou o que queria, recolheu os dados, preparou uma apresentação e chamou os proprietários.

    - Há pelo menos três entidades que transitam pelas três casas indiferentemente – Explicou Ric – E elas são os espíritos de um comerciante exportador muito rico e de dois criados que juraram fidelidade a ele mesmo depois de suas mortes. Eles viveram durante o final do reinado de Dom Pedro I. Morreram num incêndio misterioso que, na época, foi considerado criminoso. Porém o caso foi arquivado porque nunca descobriram quem os havia matado. Durante algum tempo nada aconteceu, mas recentemente foram construídas três casas no lugar da antiga mansão e nas três famílias há uma adolescente. Meu palpite é que a energia das três em conjunto foi suficiente para trazer de volta tanto o senhor quanto os empregados.

    Todos o olhavam com cara curiosa. Aquilo parecia mesmo uma apresentação do outro mundo, mas do universo dos lunáticos e não dos vivos ou dos mortos.

    - O que podemos fazer? – Perguntou o dono de uma das casas.

    - Pude ver que não se tratam de espíritos, pois não interagem com as pessoas nem parecem perceber que há mais alguém presente. Portanto podem ser apenas impressões, registros de energia psíquica que pode desaparecer. Farei uma limpeza geral na casa e em uma semana vocês poderão finalmente alugar as casas, desde que as adolescentes evitem por os pés na propriedade por um tempo.

    E tudo aconteceu exatamente como Ric falara. Em compensação ele conseguiu um material fotográfico incrível. As aparições se apresentavam como névoas em muitas fotos e os registros de seu material estavam impecáveis.

    Quando os familiares agradecidos vieram falar com Ric e agradecer por sua ajuda, fizeram questão de pagá-lo. E bem. Isso significava que uma nova atividade estava se apresentando à sua frente e finalmente lhe agradava.

    Quando muito trabalho começou a aparecer em sua frente, ele montou um site na Internet e aguardou. Começou a chover propostas para investigações em todos os pontos do país. Dois anos depois Ric era o caça-fantasma mais conhecido e comentado de todos os tempos. Suas descobertas eram publicadas em revistas americanas e européias de prestígio e logo era entrevistado por todo tipo de veículo. Ele saiu de seu emprego na livraria e tornou-se membro da LEMUR (The League Of Energy Materialization And Unexplained Phenomena Research), um dos grupos de pesquisa paranormal mais respeitados dos Estados Unidos do qual faz parte Joshua P. Warren.

    A equipe de um canal a cabo nacional estava com ele há mais de duas horas acompanhando todas as etapas da investigação numa casa na cidade de Campinas, em São Paulo. O programa era transmitido ao vivo e foi assistido por todos os conhecidos de Ric, que adoravam o trabalho maluco e excêntrico que ele arrumara.

    - E agora? – Perguntou a repórter.

    Ric pegou um gravador, checou as baterias e colocou uma fita nova. Posicionou-o e ao redor espalhou um pouco de pó branco.

    - Agora espalhamos um pouco de talco. – Explicou enquanto trabalhava – Temos que verificar se realmente é uma aparição. Enquanto o gravador registrará qualquer ruído, o pó mostrará um rastro que provará que o fantasma esteve aqui.

    - Mas fantasmas não deixam pegadas!

    - Não pegadas como as conhecemos. Mas a maioria dos caça-fantasmas acredita que são campos de energia que podem provocar o deslocamento do pó. Assim não veremos marcas de pés, mas sim algumas linhas que mostrarão a passagem da entidade.

    Ric terminou seu serviço e então falou para a repórter.

    - Pronto. Se houver algo por aqui, registraremos. Venha, temos que sair daqui.

    A equipe começava a ir embora quando o câmera tremeu por completo.

    - João, o que houve? – Perguntou a repórter sem querer. De repente sentiu também um arrepio. Estavam bem ao pé de uma escada.

    Ric percebeu na hora o que estava acontecendo e abriu sua sacola. Retirou uma máquina fotográfica Polaroid e tirou pelo menos cinco fotos dos degraus da casa. Conforme as fotos saíam, passava-as para a repórter que, junto com o Câmera, olhavam para ela admiradas.

    - Oh meu Deus! – Disse a repórter para a câmera – Há alguma coisa que não podemos ver com nossos olhos na escada. A câmera está captando formas nebulosas!

    E então ela mostrou para os telespectadores as fotos com uma massa disforme branca que pairava no quinto degrau.

    - Vocês sentiram em primeira mão o efeito gelado – Explicou Ric – A presença de um espírito causa uma queda de temperatura grande, pois eles necessitam do calor do ambiente para conseguirem se mover. E minha experiência no assunto me diz que ele se encontra no quinto degrau olhando para nós.

    O caso todo parecia um filme de terror. A casa vazia era uma pequena mansão em estilo anos 1960 cujo proprietário contactou Ric para uma investigação. O canal a cabo, quando soube, pagou bem pelo privilégio de acompanhá-lo em seu trabalho. Com a condição de que fossem apenas duas pessoas, a repórter e o câmera.

    E mesmo assim a repórter parecia não acreditar no que via ou sentia.

    - Agora que você sabe que o espírito está por perto, o que fará? – Perguntou ela quase num sussurro, como se tivesse medo do fantasma, mas não quisesse admitir.

    - Se for mesmo uma entidade inteligente, que me diga o que fazer para que vá embora. Deixemos que ela mesma se manifeste no gravador. Enquanto isso podemos ir embora.

    Os três saíram da casa. Já era noite e o relógio marcava duas da manhã. O câmera desligou o equipamento portátil e respirou aliviado.

    - Não sei quanto a vocês, mas espero nunca mais ter que voltar aqui!

    - E você realmente gosta deste trabalho, Ric? – Perguntou a repórter.

    - Oh, sim, muito. É diferente de muitos pilantras por aí que querem abusar da boa fé do povo e realizar rituais que, de mágico, não tem nada. Esta é uma abordagem científica interessante e que já produziu muitos resultados.

    Esse otimismo já fizera com que o luso-brasileiro viajasse como representante da LEMUR por todo o continente europeu e desse palestras sobre o assunto para as maiores universidades de lá. Não demorou muito para que uma editora o procurasse para propor um livro. Ric, claro, recusou, pois os dados que havia recolhido eram da LEMUR e prometeu ao dono da editora que só o procuraria quando tivesse algum material que valesse mesmo a pena ser publicado.

    Ric passou a noite no hotel pago pelo dono da casa. Na manhã seguinte recolheu seu equipamento e viu que tinha obtido boas impressões que o ajudariam a identificar o fantasma. Em mais duas semanas de investigação concluiu o caso de maneira satisfatória e mais um cliente satisfeito teve sua casa livre de espíritos incômodos.

    Ric tirou dois dias para descansar antes de pegar mais algum caso. Não estava com muita vontade de viajar e resolveu passar algum tempo no velho pub irlandês que havia perto de sua casa. Na verdade conhecia tanto o proprietário, William O´Mallen, quanto seu filho, Walter. Os dois eram velhos conhecidos da família de Ric e histórias circulavam de que William e o pai de Ric vieram para o Brasil na mesma época. Assim meio que considerava Walter como um irmão mais novo, algo de que sentia falta e que não contava a ninguém, nem mesmo a sua mãe.

    Ele entrou no velho pub, todo feito a base de madeira trazida da Irlanda na década de 1960. Não faltava nada lá, das cadeiras de mogno ao telão onde acompanhavam os jogos de futebol americano e os campeonatos europeus via cabo e satélite, do alvo com dardos até as cervejas européias. Ric não gostava de bares, mas o velho O´Mallen era um dos únicos lugares onde se sentia em casa. Não tinha brigas de bar nem nada (se bem que William contratara alguns seguranças para garantir isso) e toda vez que ele aparecia por lá, todos os olhavam pensando que era um dos segurança à paisana.

    William estava atrás do balcão, enchendo vários copos de chope e abrindo garrafas e mais garrafas de fermentados irlandeses. A casa estava cheia, apesar de ser já o happy hour.

    - Salve, caça-fantasmas! – Saudou William num português carregado de sotaque – Sente-se, já pedirei a Walter para atendê-lo.

    - Obrigado, Mr. O´Mallen – Respondia Ric em voz alta para que todos ficassem sabendo que ele era conhecido do dono do bar. Isso dava um certo prazer para ele, embora nunca soubesse explicar por que.

    Sentou-se numa mesa de mogno marcada por rachaduras no topo, que demonstravam o passar dos anos. O pub já tinha pelo menos uns 30 anos de atividade e fora o ganha-pão do pai de Walter por toda sua vida. Quando a esposa faleceu há pelo menos uns dez anos, de complicações renais, Walter teve que ajudar o pai a contragosto. Formado em engenharia, também era um caso de desilusão com a carreira. Nunca gostara disso e só descobrira depois que havia começado o curso. Mas Walter era orgulhoso e teimoso, por isso seguiu em frente até que a coisa toda fosse concluída. Detestava começar algo e não acabar, por menos que se sentisse bem com o que fazia.

    Ric aguardou alguns instantes e de repente lá vinha Walter em seu 1,75 m de altura, 29 anos, magro como um faquir indiano e com um fôlego que dava inveja a Ric. Conseguia fazer umas quatro tarefas diferentes ao mesmo tempo, pelo qual ganhou o apelido de Multimídia entre os amigos. Ele logo viu o amigo e fez um gesto para que aguardasse. O relógio do bar bateu as seis da tarde e Ric se espantou por ter praticamente perdido o dia sem ter feito nada que prestasse. Acompanhou um pouco o jogo de futebol americano que era transmitido pelo telão e aguardou até que Walter aparecesse.

    Quando ele deu o ar da graça já estava sem avental e com um ar de cansado.

    - Finalmente Roberto apareceu – Disse ele, referindo-se ao novo funcionário – Se tivesse que ficar mais um pouco no meio dessas mesas eu mataria um!

    Ric sorriu. Sabia que Walter desgostava do bar completamente, mas não tinha coragem de negar ajuda ao pai.

    - E aí, alguma novidade? – Perguntou Ric, totalmente à vontade com o amigo.

    - Nada. Pensei até que sua amada idolatrada salve salve da Bárbara aparecesse aqui hoje à sua procura, mas nem deu o ar da graça.

    - Ela não gosta daqui. Disse que é um ambiente impróprio para damas.

    - Dama? Ela? Ta brincando, né? Já a vi dar cada surra em homens que se metiam a engraçadinhos com ela que deu até pena.

    De fato, Bárbara, a namorada de Ric, tinha um corpo tão grande quanto o dele. A loira encarava qualquer um que a desafiasse com a história de que loiras são burras e ganhava em competições físicas e mentais. Era professora de latim na Universidade de São Paulo e gostava de conversar com eles sobre literatura antiga e manuscritos da Idade Média. Amava Umberto Eco e discutia O Nome da Rosa sob todos os ângulos e pontos possíveis. Também nadava, corria, fazia musculação e karatê.

    - Barbie gosta de se fazer de mocinha, mas é dura como pedra – Observou Ric, orgulhoso.

    - Bem, gosto não se discute, se lamenta! – Riu Walter, enquanto pegava dois refrigerantes da badeja do recém-chegado Roberto.

    - É bom mesmo que ela me dê algum espaço. Estou exausto depois da última investigação.

    - Eu já lhe disse que você devia procurar um auxiliar.

    - E eu já chamei você, mas não quis.

    - Posso mudar de idéia a qualquer momento. Pelo menos até começar a ganhar dinheiro longe daqui.

    - Você tem que pensar sem eu pai. Ele já está velho e precisa de você.

    Walter tomou um gole do refrigerante e olhou para o amigo.

    - Não precisa tanto assim. Outro dia mesmo ele me falou que agora que tem mais empregados que eu poderia partir para meus próprios projetos.

    - E isso não é bom?

    - Seria se eu tivesse algum. O único que tenho agora é arrumar algo para fazer que me tire daqui.

    - Vai com calma. – Respondeu Ric, colocando a mão no bolso de trás de sua calça – Quem sabe eu não tenho a solução aqui mesmo?

    Tirou um envelope amarelo com um logotipo conhecido.

    - Você recebeu uma carta da National Geographic Society? – Perguntou Walter, com cara de admiração – Virou celebridade mesmo...

    Ric abriu a carta e antes de começar a ler olhou para o amigo.

    - Há meses espero isto. Se for a resposta que penso ser, estaremos preparados para uma aventura. E precisarei de você.

    Walter olhou-o sem entender. Ric passou alguns minutos observando o pedaço de papel e,d e repente, sorriu.

    - Eu não disse? – Falou ele, batendo no papel com a parte de trás de uma das mãos – Demorou, mas chegou.

    - Caramba, pára de me deixar na expectativa e fala logo o que é.

    - A LEMUR me indicou para conseguir verba pela NatGeo para fazer um documentário baseado em minhas pesquisas paranormais.

    - E foi aprovado?

    - Sim. Terei a verba liberada em algumas semanas.

    - Meus parabéns! Tenho certeza de que fará um bom trabalho!

    Ric debruçou-se sobre a mesa e encarou-o.

    - Walter, preciso de um assistente. E você sabe manejar uma câmera como ninguém.

    - A única coisa que fiz foram filmagens de casamentos, batizados e aniversários. E isso como bico.

    - Você quer mesmo dar uma de difícil, não é? Sabe o que lhe falta? Ambição. Essa pode ser uma boa oportunidade.

    - Oportunidade para que?

    - Viajar comigo e ser meu câmera no documentário. Podemos produzir juntos. Assim seu nome será ligado ao de meu trabalho.

    Walter pareceu um pouco indeciso. Tomou mais um gole de refrigerante enquanto pensava.

    - Talvez sim, talvez não.

    - Você não gosta do assunto?

    - Claro, acho fascinante, como todo mundo.

    - Então! Venha comigo, eu lhe pagarei por seus serviços. Isto é, se você não se importar.

    Walter sabia que Ric estava sendo um bom amigo e que queria muito lhe ajudar. E de fato gostava de mexer com filmagens. Houve uma época em que pensara seriamente em abrir no fundo do bar uma produtora de vídeo, mas desistiu porque era um empreendimento que exigiria muito dele. E Walter gostava de trabalhar fazendo parcerias, não era de se meter em alguma história dessas sozinho. Não tinha um perfil empreendedor, embora fosse muito esforçado.

    - Está bem, meu velho, eu topo. O que precisaremos fazer?

    - Descobrir um caso para investigar. De preferência um no exterior. Os daqui são simplórios demais e não rendem um documentário grande.

    Walter pensou por um instante e de repente levantou-se.

    - Vou até meu quarto e já volto.

    Saiu correndo e Ric pode ver que estava entusiasmado. William aproximou-se e conversou por uns instantes com ele. Ric resumiu o que acontecera e William pareceu contente de finalmente ver o filho envolvido em algo para fazer.

    - O tempo dele aqui já acabou – Disse William – É melhor mesmo ele procurar seu próprio caminho. Estarei bem com os empregados que tenho, desde que os tenha sob controle.

    Walter voltou uns quinze minutos depois.

    - Meu Deus, que demora! – Observou Ric, já no quarto refrigerante – Desse jeito vou tomar um porre de refrigerante!

    - Desculpe, é que me lembrei de um e-mail que um colega mochileiro me mandou há umas quatro semanas. Ele está na Escócia e ouviu falar de uma lenda local no mínimo interessante. Veja só isso.

    Estendeu uma folha de papel e Ric observou-a com cuidado.

    - Sim, sim, já ouvi falar. É o caso do monge itinerante, não é?

    - Já conhecia? Então me conte, porque esse meu amigo não soube explicar direito.

    Ric teve que puxar pela lembrança.

    - Em 1975 um empresário de Glasgow comprou um mosteiro beneditino em ruínas no país para que pudesse reformá-lo e transformá-lo num buffet. Os empregados que trabalharam lá falaram que, em muitas noites, o fantasma de um monge aparecia com insistência. O tempo passou e aparentemente o espírito nada fez aos que o viam. Em 1980 começaram os casos de objetos se movendo e se transportando de um lugar para o outro por si mesmos. Em 1982, durante uma cerimônia de casamento, o monge, apelidado simplesmente de Monk, apareceu perante mais de 60 pessoas. Em 1985 uma funcionária de lá, chamada Margareth, deu entrevistas a diversas revistas dizendo que Monk falava com ela e que previa coisas que aconteceriam.

    - Vi um programa na tv a cabo que falava sobre isso – Disse Walter – A mulher ainda trabalha lá.

    - O estranho era que havia períodos de ausência do fantasma, geralmente por seis meses. Foi apenas em 1990 que começaram os boatos sobre Monk ser visto em outros países da Europa, incluindo Inglaterra, França, Alemanha e Grécia, sempre em mosteiros medievais. Comparações de relatos e fotos mostraram que se tratava de fato da mesma entidade, que parecia querer que a ajudassem em alguma tarefa que jamais descobriram o que era.

    - Então? Não acha perfeito?

    - Preciso de mais dados. Acho essa história tão estranha, parece golpe publicitário.

    Walter pareceu desanimar.

    - Não desanime, meu caro. Só precisamos de mais dados. Sabe, sem isso a caçada não rende.

    - Posso verificar com a princesa encantada se ela sabe de mais alguma coisa – Disse Walter, referindo-se à Bárbara.

    - Boa idéia. Verifique. E esse seu amigo ainda está por lá?

    - Deve estar acabando de trilhar o Caminho de Santiago. Deve voltar para cá daqui a umas três semanas.

    - Ótimo. Peça a ele para verificar se há algum livro publicado sobre o assunto. Se houver, que traga para nós. Quanto mais material tivermos, melhor.

    Walter levantou a garrafa e fez um brinde:

    - À nossa expedição NatGeo!

    Ric riu e completou:

    - Aos nossos fantasmas! Que eles nos tragam fama e fortuna!

    Capítulo 2

    Cascavéis e Banshees

    Ric foi naquele mesmo dia até a casa luxuosa de Bárbara, no bairro do Sumaré, em São Paulo, um dos mais nobres daquela cidade. Sua família era dona de uma cadeira de pelo menos dez padarias e rotisseries por toda cidade e algumas em cidades vizinhas, o que fazia de Bárbara uma mulher rica em seus 28 anos. Mas a família não via com bons olhos esse relacionamento. Consideravam Ric mimado e sem rumo na vida. Quando as atividades paranormais começaram e ele se afastava por vezes semanas até se reencontrarem, a mãe de Bárbara, uma mulher metida a ser da alta sociedade e que simplesmente o detestava, tratava logo de arranjar um novo pretendente para a filha. Bárbara, claro, acabava sempre discutindo com a mãe e ficavam sem se falar por dias. O pai dela, por sua vez, gostava de Ric e achava que os dois combinavam, se não em gostos, pelo menos na aparência física.

    Reinaldo Lopes, o pai de Bárbara, estava servindo alguns clientes na padaria que tinha na parte de baixo de seu imóvel quando Ric chegou. Engraçado como, de uma maneira ou de outra, sempre estamos ligando nossas vidas com comida, filosofou ele enquanto entrava.

    - Ora se não é nosso amigo o caça-fantasma! – Gritou o sr. Lopes, de trás do balcão. – Que bons ventos o trazem, Ric?

    - Vim ver Bárbara, sr. Lopes. Ela está?

    - Acabou de chegar do serviço. Entre lá, meu rapaz, ela não deve tardar em ver-lhe.

    O sr. Lopes adorava deixá-lo à vontade. Mas Ric detestava ter de encontrar a antipática da sra. Lopes, que também não escondia que o detestava. Mas com medo de desagradar o futuro sogro, tomou coragem e passou para a parte de trás do balcão em direção à porta dos fundos que dava passagem para a parte de cima da casa. Entre pacotes de mercadorias e sacos de comida, Ric se sentia mais num armazém do que numa padaria. Tudo era muito bem arrumado e limpo pelo sr. Lopes, que sempre recebia elogias da fiscalização sanitária.

    - Olá! – gritou Ric – Tem alguém em casa?

    A escada dava para um banheiro logo em frente e a entrada da cozinha logo à esquerda. Quando ele entrou, a sra. Lopes estava sentada examinando uns recortes de jornais.

    - Ah, boa tarde sra. Lopes. – Disse Ric, escondendo sua antipatia – Bárbara está?

    A velha

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