Flor do Deserto
De Paula Trigo
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Sobre este e-book
A sua vida virou um autêntico inferno.
Sarion é um criador e vendedor de cavalos. É um homem íntegro e rico, sempre disposto a ajudar quem precisa. Os dois vão encontrar-se de uma forma estranha.
Será que Nicole voltará a ser feliz? Ela não podia acabar assim...
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Flor do Deserto - Paula Trigo
I
O dia estava quente, mas dentro daquela casa estava até fresco.
Havia vários homens sentados no chão, todos eles de turbante na cabeça, vestes compridas, olhos pequenos escuros e cínicos, todos de barbas e bigode, rindo, mostrando falta de dentes, caras escurecidas pelo sol escaldante do deserto, frias, de uma vivência infeliz e triste, mas um dos homens estava sério e tinha o olhar ausente. Aparentava ser bem mais jovem que os demais e o seu semblante era pesado, mas muito diferente dos outros.
Sarion tinha visto, ao entrar naquela casa, algo que o deixara transtornado.
O homem que estava sentado do lado direito dele, também ele jovem e de olhar diferenciado, deu-lhe um toque no braço.
– Estás bem, pá?
Apesar de ser visível pela cor da pele e do olhar escuro que todos eles eram árabes, os dois homens falavam em francês.
– Não. Viste a mulher que estava acorrentada nas cavalariças?
– Cuidado onde te metes, Sarion. Sabes bem que estes tipos não brincam nessas coisas. Viemos aqui apenas para negociar os cavalos. Não temos nada a ver com o resto. As mulheres aqui são coisas, não gente.
– Não consigo ignorar...
Um dos homens apercebeu-se da conversa entre os dois e perguntou em árabe se estava tudo bem ou se precisavam de alguma coisa.
– Sarion está com medo que esteja calor demais para os cavalos que trouxemos. – Sali sorriu.
– Ele que vá lá ver se está tudo bem. A nossa casa é a vossa casa.
O homem riu, de um modo cínico, mas Sarion levantou-se e foi mesmo ver os cavalos. Quando entrara naquela casa rica, tinha reparado numa mulher acorrentada nas cavalariças junto dos cavalos e, embora soubesse que ali as mulheres, eram apenas mercadoria de troca, era incapaz de se sentir à vontade com aquelas desumanidades.
Devagar, verificou os cavalos um a um, mas sempre com o intuito de se aproximar da mulher que tinha visto.
– Tenho sede. – A mulher estava completamente ensanguentada e tinha sido visivelmente maltratada.
Um árabe de vestes escuras aproximou-se dela com um trapo velho e sujo e levou-o aos lábios...
A mulher cuspiu ao perceber que o trapo tinha vinagre e não água e ele riu. Sarion fez um esforço para não se aproximar da mulher e foi juntar-se aos outros homens dentro de casa.
– Tenho de a tirar dali. – Sarion falou em voz baixa. – Aquela mulher vai acabar sendo morta.
– Não tens nada com isso.
– Parece que não me conheces. Não vou deixar aquela mulher ali para morrer.
– Estão a falar de mulheres? – um outro árabe sorriu. – Posso mandar trazer algumas, se isso vos agradar.
– Estava a dizer que troco uma das minhas éguas pela mulher que vocês têm acorrentada no estábulo.
– É uma mulher reles. Parece uma víbora, sempre pronta a atacar. Arranjo-te algo melhor.
– Sarion é um homem teimoso. – Sali falou calmo e sorridente. – Se é aquela coisa que está nas cavalariças que ele quer, é aquilo que ele vai negociar.
– Tudo bem. Se gostas de cabras reles, podes ficar com ela, por troca de uma das tuas éguas. Já tentámos de tudo para a amansar, mas nada resultou. E quando falo de tudo, é tudo mesmo. – ele voltou a rir. – Vou pedir a alguém que lhe dê um banho.
O homem afastou-se e foi falar com um outro árabe que, depois de rir, enquanto olhavam para Sarion, o encaminhou para fora dali.
– Obrigado pela ajuda, Sali. Vamos fazer logo o negócio e sair daqui. Não gosto destes tipos. – Sarion bebeu um copo de água e levantou-se.
Era criador e negociante de cavalos há alguns anos, juntamente com Sali, embora vivesse em França a maior parte do tempo... Sali era quem vivia ali todo o ano, embora fizesse algumas visitas à terra natal também. Eles eram inseparáveis e realmente amigos.
– Eles pagam bem. – Sali sorriu e levantou-se também.
II
– Não é muçulmana? – Sarion voltou a perguntar, enquanto olhava aquela mulher a beber água sem parar. – Mas entende o que eu falo, não é mesmo?
Sarion continuava a tentar que ela falasse com ele. Tinha conseguido trazer a mulher que estava acorrentada com eles, mas ela recusava-se a falar. Sabia que ela falava. Quando tentara deixá-la solta, ela tentara fugir e quando ele a conseguiu agarrar, ela chamara-lhe um monte de nomes grosseiros. Sali tinha regressado de cavalo para as terras deles, dizendo que o amigo era doido, já que fora avisado pelo árabe que aquela mulher não era boa. Sarion, no entanto, continuava a insistir, cheio de paciência. Vinham de jipe, trazendo a mulher presa com uma corda à porta do carro.