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Temas de Responsabilidade Civil: novas epistemologias
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Temas de Responsabilidade Civil: novas epistemologias
E-book661 páginas8 horas

Temas de Responsabilidade Civil: novas epistemologias

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Sobre este e-book

Este livro reúne temas sobre o que há de mais relevante e atual na responsabilidade civil. Renomados autores, nacionais e estrangeiro, professores, advogados e pesquisadores foram cuidadosamente selecionados para explorar as intricadas dimensões da responsabilidade civil por meio de um prisma inovador: as novas epistemologias. Em um mundo em constante evolução, onde a complexidade das relações sociais e jurídicas desafia as estruturas tradicionais, esta obra oferece uma abordagem prático-teórica que mergulha profundamente nas questões jurídicas contemporâneas, permitindo ao profissional de direito uma excelente fonte de consulta e aprendizado. As novas epistemologias apresentadas permitem uma análise mais abrangente e multidisciplinar dos desafios enfrentados. Assim, foram consideradas não apenas as tradicionais bases legais da RC, mas também sua interseção com disciplinas do direito do consumidor, famílias, direito médico, processo civil, direito desportivo e de vizinhança, o que conduz o leitor a uma necessária exploração das mudanças na paisagem da RC, encontrando questões cruciais em contextos contemporâneos. "Temas de Responsabilidade Civil: Novas Epistemologias" é uma leitura essencial para estudantes e profissionais do direito interessados na vanguarda do pensamento jurídico. Com uma abordagem técnica e interdisciplinar, o livro oferece uma visão única sobre como a RC está se adaptando e evoluindo em um mundo em constante transformação.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento29 de nov. de 2023
ISBN9786527003496
Temas de Responsabilidade Civil: novas epistemologias

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    Temas de Responsabilidade Civil - Luciana Berlini

    Lista Bancária Negativa: A Restrição E Redução Ao Crédito Como Reação Ilícita Dos Bancos Ao Direito De Ação Do Consumidor¹

    Igor de Lucena Mascarenhas²

    Adriano Marteleto Godinho³

    A lista negra transforma-se em instrumento ilícito de retaliação, pelo simples fato de o consumidor ter ingressado com demanda judicial contra banco, desestimulando o exercício do direito de ação garantido constitucionalmente (TJ-RJ - APL: 00112421020188190037, Relator: Des(a). EDSON AGUIAR DE VASCONCELOS, Data de Julgamento: 07/07/2020, DÉCIMA SÉTIMA CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 2020-07-10).

    1 INTRODUÇÃO

    Ações contra bancos e financeiras não são incomuns. De acordo com dados consolidados no CNJ e também pelas próprias cortes Estaduais⁴, ao lado de empresas de transporte aéreo, concessionárias e telefonia celular, os bancos estão no ranking de maiores acionados por consumidores no Judiciário.

    Se o excesso de processos é, em parte, uma falha no controle regulatório, na medida em que 40% das ações decorrem de relação de consumo entre consumidores e bancos/telefonia que nem sequer precisariam chegar ao Judiciário, a litigância excessiva apenas prejudica o próprio desenvolvimento das atividades jurisdicionais. ⁵ Ocorre que este é um dado concreto: os processos chegam ao Judiciário. Consumidores que entendem que foram lesados, via de regra, buscam a via judicial para defesa dos seus interesses.

    Como bem esclarece o Ministro Salomão, as empresas transferiram seus serviços de call center para o Judiciário. Ao comentar a situação dos processos, o Ministro destacou que "todos estão acomodados. As empresas estão acomodadas. Os grandes litigantes do Judiciário estão acomodados porque transferiram o seu call center para a Justiça".

    Ocorre que, em um cenário de extrema litigiosidade, é fundamental discorrer sobre o período pós-processual. Uma vez sentenciado, executado e arquivado o processo, o que acontece?

    O presente texto se propõe a analisar as condutas de fornecedores que restringem o crédito de consumidores como penalização por terem ousado litigar contra os bancos, o que a doutrina e a jurisprudência têm chamado de lista negra bancária, mas que optaremos por denominar de lista bancária negativa.

    Por intermédio de uma revisão bibliográfica e documental, a partir do método dedutivo, desenvolver-se-á a premissa da (i)licitude da conduta dos fornecedores.

    2 DO PROBLEMA DA LITIGIOSIDADE BANCÁRIA

    O Brasil tem observado a bancarização como algo concreto e irreversível. A doutrina costuma referenciar a bancarização como o processo de inclusão da população no sistema bancário e aumento da disponibilidade de serviços financeiros. De acordo com dados do Banco Central, o Brasil alcançou o percentual de 82% da população com acesso aos serviços bancários, em especial da classe mais pobre, notadamente após a implementação do PIX.

    Se por um lado o fenômeno é favorável à inclusão e retirada de pessoas do campo da total informalidade, tem-se que, por outro, quanto maior o número de consumidores, maior a possibilidade de conflito. De acordo com as regras da Química Orgânica, quanto maior a área de contato, maior o número de interações. Transmutando essa regra de uma Ciência exata para a área da Ciência Dogmática do Direito, a evolução e inclusão bancárias expandiram a área de contato, uma vez que o número de agentes econômicos (fornecedores e consumidores) aumentou. Mais rápidas e mais amplas, as relações agora alcançam mais pessoas, crescendo, de forma exponencial, o número de possíveis ilícitos e dos danos deles decorrentes.

    É incontroverso que o Brasil vive um cenário de ampla litigiosidade, por vezes até contrário ao Direito; porém, esse não é um problema necessariamente atribuído ao consumidor. Não se desconsidera a existência de advocacia predatória⁸ e de uma possível captação ilícita de constituintes para a propositura de ações judiciais em massa⁹, mas é incontroverso que os fornecedores pouco observam o Código de Defesa do Consumidor e apresentam uma baixa resolutividade administrativa do conflito.

    Em muitas situações, apenas após a propositura da ação judicial é que o Banco se preocupa com apresentar uma proposta de restituição integral do prejuízo financeiro, por exemplo. Caso o consumidor não proponha a ação judicial, o Banco incorpora esta inação como um benefício econômico.

    Atualmente, inúmeros são os golpes sofridos pelos consumidores, porém não há um incremento técnico de segurança de dados para mitigar tais prejuízos. Inclusive, em razão do crescente número de processos, os bancos têm sido responsabilizados por enquadramento dos golpes enquanto fortuitos internos, conforme dispõe a súmula 479 do STJ:

    Nº 479 STJ

    As instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias.

    Em razão dos ilícitos, golpes e fraudes, notadamente por fortuitos internos e/ou pela imposição de uma virtualização das relações, na medida em que muitos dos atuais usuários dos serviços bancários não são nativos digitais e as relações bancos-consumidores são pouco transparentes, os Bancos têm sido recorrentemente condenados por suas condutas ilícitas. Falha de segurança e falha na prestação do serviço são temas comuns no Judiciário. De acordo com o TJSP, o tema tratado com maior recorrência no 2º grau do Judiciário Bandeirante é relativo à ação de consumidor contra Bancos.¹⁰

    Desta forma, consumidores prejudicados por práticas bancárias têm o direito de, a partir de uma reflexão individual e personalíssima, decidir pela propositura ou não de uma ação judicial. Uma vez procedentes os pedidos formulados na ação judicial, caso o consumidor opte pela sua propositura, há dois elementos que devem ser considerados: o consumidor exerceu o seu direito constitucional de ação e o Judiciário, enquanto órgão de resolução de conflitos, compreendeu que assistia razão ao consumidor postulante. Como os Bancos não conseguem punir o Judiciário pelas suas decisões, notadamente por serem acertadas, o Banco penaliza o consumidor em uma fase administrativa pós-processual, ao adotar medidas punitivas e abusivas em decorrência do legítimo exercício do direito de ação.

    3 DA PENALIZAÇÃO DO CONSUMIDOR POR EXERCÍCIO LEGÍTIMO DE UM DIREITO

    Consideremos o seguinte caso hipotético: João litiga judicialmente em face de Banco X e os pedidos formulados na ação são julgados procedentes, com o reconhecimento de que a conduta do Banco foi ilícita. Dois meses após o pagamento da indenização arbitrada, João é cientificado pelo Banco que seu limite do cartão de crédito será reduzido em 40%, no prazo de 60 dias, em decorrência de análise interna. Inconformado com a redução de limite, o consumidor questiona a razão da redução, porém não recebe nenhuma resposta esclarecedora. A propósito do direito à informação e do dever de transparência, dispõe Françoise Peelaert:

    Pelo dever de esclarecimento ou de informação estabelece-se uma imposição moral e jurídica de comunicar a outra parte todas as características e circunstâncias pendentes do negócio jurídico e, assim, do bem jurídico que é seu objeto, por ser imperativo de lealdade entre os contraentes.¹¹

    De acordo com Andreas Krell, o dever de motivação decorre justamente da necessidade de se afastar decisões arbitrárias, imorais, irracionais, não razoáveis, desproporcionais, discriminatórias ou violadoras da confiança legítima.¹²

    Em não raras situações, os bancos têm promovido autênticas retaliações, sob o argumento de exercício regular de direito, em prejuízo daqueles que acionam o Judiciário. Nesse sentido, consumidores que já possuem um histórico de litigância contra bancos são notificados de uma redução de limites no cartão de crédito ou de restrições para acesso ao crédito, por exemplo.

    Em um cenário de redução de crédito, mostra-se fundamental verificar os elementos objetivos e subjetivos do caso. São exemplos recorrentes as situações de redução de crédito em desfavor de consumidores com alta pontuação no Serasa Score, sem variação de renda e adimplentes com suas obrigações. Se, por um lado, é direito subjetivo dos bancos promover uma análise do crédito e, eventualmente, reduzir ou majorar os limites disponíveis, tem-se que as empresas precisam motivar essa redução de crédito, justamente para afastar eventual revanchismo pelo exercício do direito de ação dos consumidores.

    A dificuldade probatória da existência da lista negativa pode ser afastada a partir da apresentação da motivação idônea da redução de crédito. Sobre o assunto de listas negativas no campo trabalhista, dispõe Walküre Lopes Ribeiro da Silva:

    Tal prática é condenada na maioria das legislações nacionais, porém é difícil provar sua existência para efeito de condenação judicial, uma vez que a lista negra não é divulgada, circulando apenas entre os promotores do boicote.¹³

    O fato de a redução de crédito ser unilateral não afasta o dever de motivação e transparência, notadamente por representar uma consolidação do dever de informação e também por potencialmente afetar o controle financeiro por parte do consumidor. A inversão do ônus da prova e a distribuição dinâmica do ônus da prova exigem que o Banco prove, administrativa ou judicialmente, a razão da redução do limite de crédito, sob pena de presunção de que se trata de uma retaliação em decorrência do ajuizamento, pelo consumidor, de uma ação judicial.

    Desta forma, não se mostram adequadas determinadas decisões judiciais que exigem ao autor/consumidor prova da existência da lista bancária, pois ele não tem como provar algo que ele diretamente não controla ou tem ingerência. Seria solicitar um atestado de incompetência por parte do Banco a publicização de uma lista ilícita. Apesar de discordar do entendimento, é fundamental apontar para a existência de considerável número de decisões que exigem a prova da existência da lista. Nesse sentido:

    APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. NEGATIVA DE CRÉDITO. RESTRIÇÃO EM LISTA NEGRA. 1. A negativa de crédito é liberalidade do credor não acarretando, ausente prova de excesso por parte deste, a ocorrência de danos morais. Os critérios para concessão do crédito são livres e não há obrigatoriedade na realização da contratação se não é do interesse de ambas as partes. 2. Caso em que a parte autora não prova o fato constitutivo de seu direito, no sentido de que exista restrição de seu nome em lista negra de molde a obstar a realização de negócio e que tal tenha lhe causado pecha moral ou prejuízo material. RECURSO DESPROVIDO. Apelação Cível Nº 70060729498, Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Isabel Dias Almeida, Julgado em 29/07/2015.

    Assim, surge a existência de uma lista proibida bancária, uma espécie de relação de personae non gratae. O consumidor não consegue provar a existência da lista, mas a falta de motivação e uma atuação direcionada em prejuízo, curiosamente, daqueles que já litigaram em face da Instituição bancária apenas reforça a hipótese de que ela existe.

    Nesse sentido, a jurisprudência já se manifestou sobre a existência da lista proibitiva¹⁴:

    Lista Negra interna de banco, informando que o consumidor já ajuizou ação contra banco. Indícios de que o consumidor não conseguiu financiamento por causa disso. Ordem para eliminar o nome do autor da famigerada lista, pena de multa diária de R$ 500,00, até o limite de R$ 10.000,00. Sentença mantida por seus próprios fundamentos: dispensa acórdão (art. 46, da Lei 9.099/95). Recurso não provido. Sucumbência pelo recorrente vencido: custas do processo e verba honorária de R$ 500,00, por apreciação equitativa. (TJ-SP - RI: 10009171220198260430 SP 1000917-12.2019.8.26.0430, Relator: Paulo Sérgio Romero Vicente Rodrigues, Data de Julgamento: 06/08/2020, 5ª Turma Cível, Data de Publicação: 06/08/2020)

    RELAÇÃO DE CONSUMO - INDENIZATÓRIA - INGRESSO EM LISTA NEGRA COMO REPRESÁLIA - APONTAMENTO INDEVIDO DO NOME DO CONSUMIDOR NO SERASA - ÔNUS DA PROVA - INVERSÃO OPE LEGIS - INÉRCIA DA INSTITUIÇÃO RÉ - FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO - OCORRÊNCIA - LISTA NEGRA QUE TERIA SIDO CRIADA A PARTIR DE PROPOSITURA DE AÇÃO JUDICIAL ANTERIOR CONTRA A INSTITUIÇÃO - CONDUTA ILEGAL, ABUSIVA E DISCRIMINATÓRIA - SITUAÇÃO VIVENCIADA PELA AUTORA QUE ULTRAPASSA A SEARA DO MERO DISSABOR - PECULIARIDADES DO CASO CONCRETO - DANOS MORAIS CONFIGURADOS. Alegação de negativa de crédito decorrente de inserção do nome da correntista em lista negra dos bancos, além do apontamento do nome da autora em cadastros de inadimplentes. A lista negra configura instrumento ilícito de retaliação, pelo simples fato de o consumidor ter ingressado com demanda judicial contra instituição financeira, desestimulando o exercício do direito de ação garantido constitucionalmente. Dever de indenizar com base na responsabilidade objetiva atrelada à teoria do risco do empreendimento. A inclusão do nome da parte em cadastro de inadimplentes, por si só, gera, independentemente de prova, o dano moral in re ipsa. Verbete Sumular 89 do TJ/RJ. Negado provimento ao apelo principal, restando improvido o recurso adesivo. (TJ-RJ - APL: 00112421020188190037, Relator: Des(a). EDSON AGUIAR DE VASCONCELOS, Data de Julgamento: 07/07/2020, DÉCIMA SÉTIMA CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 2020-07-10)

    APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. NEGATIVA DE CONCESSÃO DE FINANCIAMENTO BANCÁRIO EM RAZÃO DO AJUIZAMENTO DE AÇÃO JUDICIAL CONTRA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. DESCABIMENTO. DEVER DE INDENIZAR CONFIGURADO. QUANTUM MANTIDO. Trata-se de recurso de apelação interposto contra sentença de procedência exarada na ação de indenização por dano moral decorrente da não concessão de crédito em razão do ajuizamento de ação judicial contra instituição bancária. A prática de elaboração e consulta de lista com nomes de consumidores que buscaram tutela judicial em face de abusividades que entendiam presentes em contratos bancários são atos flagrantemente ilegais e abusivos. As instituições financeiras negam sua existência, pois cientes da impossibilidade de registro de tais fatos, que atenta, inclusive, contra o direito constitucionalmente assegurado de acesso ao Judiciário, na forma do artigo 5º, XXXV, da CF. Nenhuma lista negativa pode ser criada, fomentada ou consultada se o seu conteúdo for a restrição de crédito a quem ingressou com ação judicial contra empresa integrante do sistema financeiro, por seu caráter limitador de direitos e discriminatório. In casu, logrou a parte autora produzir prova dos fatos constitutivos do seu direito, demonstrando suficientemente os fatos narrados na exordial. As testemunhas ouvidas no feito apontaram que a lista existe e a demandante teve o crédito negado por conta de sua inclusão. Em razão... disso, responde o segundo requerido por ter alimentado o sistema com a informação, que no caso concreto ainda encontrava-se equivocada, já que não ajuizou a parte autora ação revisional, mas demanda declaratória de inexistência de débito. Por sua vez, a responsabilidade do segundo requerido decorre do fato de ter acessado o cadastro e negado crédito à parte demandante. Outrossim, não há que se falar em descabimento de aplicação de pena de multa para fins de dar efetividade ao provimento cominatório dirigido à exclusão do cadastro, que encontra previsão legal no art. 461 do CPC. Sentença de procedência mantida. APELAÇÕES DESPROVIDAS. (Apelação Cível Nº 70050395730, Sexta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Sylvio José Costa da Silva Tavares, Julgado em 01/10/2015).

    DANO MORAL Responsabilidade Civil Restrição Interna do banco contra o autor, em razão de débitos em uma conta bancária que não contratou. Informação que, apesar de não acessível a terceiros, limita o acesso do correntista à plenitude dos serviços oferecidos pela Instituição Financeira aos consumidores nas mesmas condições - A existência de restrições internas ou outras espécies de listas negras, consiste em prática ilegal, uma vez que, pelo art. 43 e seu § 1º da Lei n. 8.078/90, o consumidor tem direito a ter acesso às informações existentes em cadastros, fichas, registros e dados pessoais e de consumo arquivados sobre ele, bem como sobre as suas respectivas fontes, e os cadastros e dados de consumidores devem ser objetivos, claros, verdadeiros e em linguagem de fácil compreensão - Clandestinidade e abusividade O conhecimento da existência de informações depreciativas, ainda que inverídicas e reservadas, traz ao negativado mais que mero aborrecimento ou dissabor, mas verdadeiro constrangimento e ofensa à honra, por ser considerado mau pagador, sendo desnecessárias maiores provas disso, o que se presume. Fixação. Razoabilidade - Recurso do réu e apelo adesivo desprovidos. (TJ-SP - APL: 03195829820098260000 SP 0319582-98.2009.8.26.0000, Relator: Alcides Leopoldo e Silva Júnior, Data de Julgamento: 18/06/2013, 1ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 20/06/2013)

    RECURSO INOMINADO. PEDIDO INDENIZATÓRIO CUMULADO COM EXTINÇÃO DE DÍVIDA. NEGATIVA DE FORNECIMENTO DE SERVIÇO BANCÁRIO EM RAZÃO DA EXISTÊNCIA DE RESTRIÇÃO CREDITÓRIA INTERNA, EM LISTA NEGRA MANTIDA PELAS INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS ENVOLVIDAS. SENTENÇA QUE AFASTOU A PRETENSÃO DO CONSUMIDOR. PROVIMENTO DO RECURSO PARA RECONHECER A ILICITUDE DAS RESTRIÇÕES CREDITÓRIAS, COM ARBITRAMENTO DE INDENIZAÇÃO PELOS DANOS MORAIS CONFIGURADOS, CANCELANDO AINDA A DÍVIDA IMPUTADA AO CONSUMIDOR SEM PROVA DA ORIGEM. (TJ-BA 103898220081 BA, Relator: WALTER AMÉRICO CALDAS, 5ª TURMA RECURSAL DOS JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS E CRIMINAIS, Data de Publicação: 16/07/2010)

    RELAÇÃO DE CONSUMO - INDENIZATÓRIA - INGRESSO EM LISTA NEGRA COMO REPRESÁLIA - APONTAMENTO INDEVIDO DO NOME DO CONSUMIDOR NO SERASA - ÔNUS DA PROVA - INVERSÃO OPE LEGIS - INÉRCIA DA INSTITUIÇÃO RÉ - FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO - OCORRÊNCIA - LISTA NEGRA QUE TERIA SIDO CRIADA A PARTIR DE PROPOSITURA DE AÇÃO JUDICIAL ANTERIOR CONTRA A INSTITUIÇÃO - CONDUTA ILEGAL, ABUSIVA E DISCRIMINATÓRIA - SITUAÇÃO VIVENCIADA PELA AUTORA QUE ULTRAPASSA A SEARA DO MERO DISSABOR - PECULIARIDADES DO CASO CONCRETO - DANOS MORAIS CONFIGURADOS. Alegação de negativa de crédito decorrente de inserção do nome da correntista em lista negra dos bancos, além do apontamento do nome da autora em cadastros de inadimplentes. A lista negra configura instrumento ilícito de retaliação, pelo simples fato de o consumidor ter ingressado com demanda judicial contra instituição financeira, desestimulando o exercício do direito de ação garantido constitucionalmente. Dever de indenizar com base na responsabilidade objetiva atrelada à teoria do risco do empreendimento. A inclusão do nome da parte em cadastro de inadimplentes, por si só, gera, independentemente de prova, o dano moral in re ipsa. Verbete Sumular 89 do TJ/RJ. Negado provimento ao apelo principal, restando improvido o recurso adesivo. (TJ-RJ - APL: 00112421020188190037, Relator: Des(a). EDSON AGUIAR DE VASCONCELOS, Data de Julgamento: 07/07/2020, DÉCIMA SÉTIMA CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 2020-07-10)

    É sabido, contudo, da existência de decisões em sentido contrário, que apontam para a descaracterização do dever de indenizar em virtude da existência de listas de restrição não públicas, porém o cerne de debate não se trata da publicidade ou não da lista, mas sim da impossibilidade do banco de reduzir o limite de crédito por razão revanchista.

    O debate do tema no campo bancário ainda é incipiente, porém, no campo do Direito do Trabalho possui avanço significativo. Nesse sentido dispõe Nelson Mannrich:

    Não há dispositivo legal no ordenamento jurídico brasileiro que proíba diretamente a criação das chamadas listas negras. Entretanto, essa lacuna não afasta as consequências legais, podendo os empregadores responsáveis por essa prática serem punidos. Independentemente disso, tal prática não é tolerada por quem aplica a Lei do Trabalho ou pelo ordenamento jurídico do país.

    Por esse motivo, a inclusão do ex-funcionário na lista negra pode causar dificuldades e/ou impedir sua reintegração no mercado de trabalho. Consequentemente, você pode ingressar com uma ação na Justiça do Trabalho pelo direito à indenização por danos imateriais (individuais ou coletivos), mas não contratando ou recontratando.

    O uso de listas negras ocorre no Brasil em determinados setores e regiões. Sua prática inibe a contratação de trabalhadores sindicalizados ou sindicalizados, ferindo os interesses da comunidade representada.

    Em geral, a lista negra resulta de vários motivos, seja o exercício de uma suposta atividade sindical, ou o simples fato de ter ajuizado uma ação judicial para reivindicar um direito legítimo negado.¹⁵

    É cristalino que, a partir de critérios técnicos, o banco tem o direito subjetivo de reduzir limites de cartão de crédito ou negar acesso ao crédito. O problema jurídico reside no uso dessa redução / limitação como uma punição pelo direito de ação, o que deturpa o propósito essencial do instituto.

    O art. 187 do Código Civil dispõe que:

    Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.

    A teoria do abuso do direito é considerada um mecanismo de controle sobre a autonomia da vontade. Ao analisarmos o artigo 187 do Código Civil, é evidente que o sistema civilista adotou a teoria do abuso de direito, ao estabelecer que também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, ultrapassa manifestamente os limites impostos pelo seu propósito econômico ou social, pela boa-fé ou pelos costumes.

    O abuso de Direito está caracterizado como o exercício de um direito em contrariedade aos limites da prerrogativa individual¹⁶. Isto posto, é preciso perceber que a redução/limitação de acesso ao crédito, quando não baseada em critérios técnicos, viola a eticidade e a própria finalidade econômica do negócio jurídico, violando-se, portanto, a função social do contrato. Os bancos simplesmente não podem dizer que adotarão determinadas condutas baseadas em critérios unilaterais e arbitrários. Discricionariedade não se confunde com arbitrariedade. A instituição bancária tem a discricionariedade de analisar se deve manter, reduzir ou majorar o acesso ao crédito, porém essa decisão é técnica, não podendo jamais ostentar um critério punitivo.

    Reduções e limitações ao crédito enquanto resposta punitiva ao legítimo exercício do direito de ação não podem existir em um ordenamento em que o acesso ao Judiciário deve ser garantido. Penalizar o consumidor com a redução/limitação ao crédito em decorrência de ter provocado o Judiciário não se mostra compatível com os valores que regem o Direito do Consumidor, o Direito Civil e, sobretudo, o Direito Constitucional.

    O exercício legítimo do direito de ação não pode ser obstaculizado ou penalizado por restrições ao crédito, de modo que a redução ao crédito, enquanto direito subjetivo dos bancos, não pode ser deturpado ou transformado em instrumento de vingança, retaliação ou mesmo de ameaça. Essa conduta das instituições financeiras é um claro exemplo de abuso de direito e, pior, violador não apenas do Código Civil, mas também uma espécie de penalização do exercício do direito constitucional de ação.

    A verdade é que esta conduta – além de ilícita - cria uma dupla judicialização, pois todos aqueles que litigaram uma vez e foram inseridos na Lista Proibida buscarão o Judiciário novamente para serem reparados pelo novo dano causado, o que apenas aumenta o número de processos e fomenta uma litigância que seria evitável.

    Existe uma significativa falta de equilíbrio nas relações jurídicas quando o direito é utilizado com finalidades indevidas. Mesmo que não haja uma violação explícita de dispositivos legais, é possível reconhecer que o exercício abusivo de um direito não é protegido pelo sistema jurídico. Nesse caso, as pessoas prejudicadas têm o direito de recorrer ao próprio sistema jurídico para impedir essa prática deturpada.¹⁷

    Ter um direito não justifica seu exercício sem limites. A vontade de uma parte aparentemente legítima para exercer um direito não pode ser considerada absoluta, pois o exercício inapropriado, exagerado ou desmedido de um direito evidencia sua má utilização. Anderson Schreiber destaca que identificar o abuso do direito é uma forma de combater os excessos do liberal-individualismo.¹⁸

    Desta feita, será preciso garantir condenações exemplares, significativas e efetivamente punitivas com o condão de eliminar a existência da referida lista e, consequentemente, garantir o direito constitucional de ação, além da proteger o livre exercício de direitos do consumidor, sem que ele sofra restrições e/ou retaliações.

    4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

    A constante judicialização de ações em desfavor de instituições financeiras no Brasil revela, por si só, um quadro de corriqueira violação a direitos consumeristas e fundamentais de consumidores, em razão, no mais das vezes, da má prestação de serviços de natureza bancária.

    Uma vez acionadas judicialmente, muitas entidades bancárias terminam por impingir um segundo dano aos consumidores lesados, restringindo-lhes o acesso ao crédito de forma injustificada e abusiva, com o verdadeiro propósito de retaliar os correntistas pelo mero fato de estes exercerem o lídimo direito de se socorrerem do Poder Judiciário.

    Tal prática não apenas é ilícita, eis que infundada e sequer justificada perante os consumidores, como tende a agravar a constante judicialização contra os bancos, eis que os indivíduos lesados pela restrição abusiva do direito ao crédito podem se servir uma vez mais da via judicial para reclamarem a devida reparação em virtude dos danos sofridos.

    Impõe-se, portanto, reconhecer a flagrante abusividade e ilicitude das listas bancárias negativas e, como consequência, imputar às entidades financeiras que se valham deste expediente o dever de se absterem de fazê-lo e de indenizarem todos os danos experimentados pelos consumidores lesados. Tem-se, pois, que cumpre ao Poder Judiciário o dever de coibir exemplarmente condutas desta natureza e, em atenção às funções pedagógica e preventiva da responsabilidade civil, estipular indenizações em patamares que sirvam para dissuadir os bancos a persistirem com a prática de atos manifestamente contrários ao ordenamento jurídico e lesivos aos interesses de seus clientes.

    REFERÊNCIAS

    CNN. 82% da população brasileira tem conta corrente em bancos, diz BC. 2023. Disponível em https://www.cnnbrasil.com.br/economia/82-da-populacao-brasileira-tem-conta-corrente-em-bancos-diz-bc/. Disponível em 20 de jul. 2023.

    CREPALDI, Thiago. Ações contra bancos e tráfico de drogas são as maiores demandas do TJ-SP. 2022. Disponível em https://www.conjur.com.br/2022-nov-09/virus-mudanca-tj-sp-acelera-projeto-modernizacao. Acesso em 04 de ago. 2023.

    CONJUR. Conheça as 30 empresas mais acionadas na Justiça do Rio de Janeiro em 2018. 2018. Disponível em https://www.conjur.com.br/2019-jan-04/conheca-30-empresas-acionadas-justica-rio-2018. Acesso em 07 de fev. 2023

    CONJUR. Juiz extingue ação contra banco por suspeita de litigância de má-fé. 2023. Disponível em https://www.conjur.com.br/2023-jul-02/acao-banco-extinta-suspeita-litigancia-ma-fe. Acesso em 10 de jul. 2023.

    HAIDAR, Rodrigo. Empresas transferiram seu call center para o Judiciário. CONJUR. 2013. Disponível em https://www.conjur.com.br/2013-jan-06/entrevista-luis-felipe-salomao-ministro-superior-tribunal-justica. Acesso em 10 de jul. 2023.

    https://www.migalhas.com.br/coluna/migalhas-de-responsabilidade-civil/327305/litigancia-no-brasil--relacao-de-consumo-a-falta-de-eficiencia-dos-aparelhos-estatais. Acesso em 07 de fev. 2022

    KHOURI, Paulo R. Roque A. Litigância no Brasil, relação de consumo a falta de eficiência dos aparelhos estatais. 2020. Disponível em

    KRELL, Andreas J. Discricionariedade administrativa e conceitos legais indeterminados: limites do controle judicial no âmbito dos interesses difusos. 2º ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2013.

    MANNRICH, Nelson. Informe sobre protección contra la discriminación antisindical. Revista de Direito do Trabalho (São Paulo), v. 33, p. 273-298, 2007.

    MASCARENHAS, Igor de Lucena; BAHIA, Saulo José Casali. O exercício da Medicina Defensiva enquanto reação às decisões judiciais: o papel do Judiciário na construção de uma postura ética no exercício médico. Revista de Direito do Consumidor, v. 141, p. 339-355, 2022.

    MIGALHAS. Juiz do MA extingue ação e aponta litigância predatória contra bancos. 2023. Disponível em https://www.migalhas.com.br/quentes/387401/juiz-do-ma-extingue-acao-e-aponta-litigancia-predatoria-contra-bancos. Acesso em 20 de jul. 2023.

    MIGALHAS. Órgãos Federais e estaduais lideram 100 maiores litigantes da Justiça: Setor público Federal e bancos respondem por 76% dos processos em tramitação. Disponível em https://www.migalhas.com.br/quentes/166739/orgaos-federais-e-estaduais-lideram-100-maiores-litigantes-da-justica. Acesso em 07 de fev. 2023

    PEELAERT, Françoise. A boa-fé objetiva aplicada aos negócios jurídicos processuais. Disponível em http://www.bibliotecadigital.uel.br/document/?code=vtls000232527. Acesso em 10 de jul. 2023.

    ROPPO, Enzo. O contrato. Tradução de Ana Coimbra e M. Januário C. Gomes. Coimbra: Almedina, 2009.

    SCHREIBER, Anderson. Direito Civil e Constituição. São Paulo: Atlas, 2013.

    SILVA, Walküre Lopes Ribeiro da. Filiação sindical: problema de liberdade sindical. Revista de Direito do Trabalho (São Paulo), v. 57, p. 14-32, 1985.

    TJAM. Mutirão dos Grandes Litigantes começa com total de 80 processos analisados pelo 3.º Juizado Especial Cível. 2022. Disponível em https://www.tjam.jus.br/index.php/menu/sala-de-imprensa/5817-mutirao-dos-grandes-litigantes-comeca-com-total-de-80-processos-analisados-pelo-3-juizado-especial-civel. Acesso em 07 de fev. 2023.


    1 Tema inicialmente abordado de forma embrionária no artigo Lista bancária proibida: o abuso de direito na restrição ao crédito como punição, publicado na coluna Migalhas de Responsabilidade civil e posteriormente expandido pelos autores para publicação no Temas Contemporâneos de Responsabilidade Civil: teoria e prática da OAB/MG. Ensaio embrionário disponível em https://www.migalhas.com.br/coluna/migalhas-de-responsabilidade-civil/381317/o-abuso-de-direito-na-restricao-ao-credito-como-punicao.

    2 Doutorando em Direito pela Universidade Federal da Bahia e Doutorando em Direito pela Universidade Federal do Paraná. Mestre pela Universidade Federal da Paraíba. Professor do UNIFIP Centro Universitário. E-mail: igor@igormascarenhas.com.br. Sócio Fundador do Dadalto & Mascarenhas Sociedade de Advogados.

    3 Pós-Doutor em Direito pela Universidade de Coimbra. Doutor em Ciências Jurídicas pela Universidade de Lisboa. Mestre em Direito Civil pela Universidade Federal de Minas Gerais. Professor adjunto do curso de graduação da Universidade Federal da Paraíba. Professor da pós-graduação stricto sensu da Universidade Federal da Paraíba. Membro Fundador do Instituto de Direito Civil Constitucional (IDCC). Membro Fundador do Instituto Brasileiro de Responsabilidade Civil (IBERC). E-mail: adrgodinho@hotmail.com.

    4 CONJUR. Conheça as 30 empresas mais acionadas na Justiça do Rio de Janeiro em 2018. 2018. Disponível em https://www.conjur.com.br/2019-jan-04/conheca-30-empresas-acionadas-justica-rio-2018. Acesso em 07 de fev. 2023; TJAM. Mutirão dos Grandes Litigantes começa com total de 80 processos analisados pelo 3.º Juizado Especial Cível. 2022. Disponível em https://www.tjam.jus.br/index.php/menu/sala-de-imprensa/5817-mutirao-dos-grandes-litigantes-comeca-com-total-de-80-processos-analisados-pelo-3-juizado-especial-civel. Acesso em 07 de fev. 2023; MIGALHAS. Órgãos Federais e estaduais lideram 100 maiores litigantes da Justiça: Setor público Federal e bancos respondem por 76% dos processos em tramitação. Disponível em https://www.migalhas.com.br/quentes/166739/orgaos-federais-e-estaduais-lideram-100-maiores-litigantes-da-justica. Acesso em 07 de fev. 2023

    https://www.migalhas.com.br/quentes/166739/orgaos-federais-e-estaduais-lideram-100-maiores-litigantes-da-justica

    5 KHOURI, Paulo R. Roque A. Litigância no Brasil, relação de consumo a falta de eficiência dos aparelhos estatais. 2020. Disponível em: https://www.migalhas.com.br/coluna/migalhas-de-responsabilidade-civil/327305/litigancia-no-brasil--relacao-de-consumo-a-falta-de-eficiencia-dos-aparelhos-estatais. Acesso em 07 de fev. 2022

    6 HAIDAR, Rodrigo. Empresas transferiram seu call center para o Judiciário. CONJUR. 2013. Disponível em https://www.conjur.com.br/2013-jan-06/entrevista-luis-felipe-salomao-ministro-superior-tribunal-justica. Acesso em 10 de jul. 2023.

    7 CNN. 82% da população brasileira tem conta corrente em bancos, diz BC. 2023. Disponível em https://www.cnnbrasil.com.br/economia/82-da-populacao-brasileira-tem-conta-corrente-em-bancos-diz-bc/. Disponível em 20 de jul. 2023.

    8 MIGALHAS. Juiz do MA extingue ação e aponta litigância predatória contra bancos. 2023. Disponível em https://www.migalhas.com.br/quentes/387401/juiz-do-ma-extingue-acao-e-aponta-litigancia-predatoria-contra-bancos. Acesso em 20 de jul. 2023.

    9 CONJUR. Juiz extingue ação contra banco por suspeita de litigância de má-fé. 2023. Disponível em https://www.conjur.com.br/2023-jul-02/acao-banco-extinta-suspeita-litigancia-ma-fe. Acesso em 10 de jul. 2023.

    10 CREPALDI, Thiago. Ações contra bancos e tráfico de drogas são as maiores demandas do TJ-SP. 2022. Disponível em https://www.conjur.com.br/2022-nov-09/virus-mudanca-tj-sp-acelera-projeto-modernizacao. Acesso em 04 de ago. 2023.

    11 PEELAERT, Françoise. A boa-fé objetiva aplicada aos negócios jurídicos processuais. Disponível em http://www.bibliotecadigital.uel.br/document/?code=vtls000232527. Acesso em 10 de jul. 2023.

    12 KRELL, Andreas J. Discricionariedade administrativa e conceitos legais indeterminados: limites do controle judicial no âmbito dos interesses difusos. 2º ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2013. p. 76

    13 SILVA, Walküre Lopes Ribeiro da. Filiação sindical: problema de liberdade sindical. Revista de Direito do Trabalho (São Paulo), v. 57, p. 14-32, 1985.

    14 Algumas decisões e autores tratam da lista proibitiva como lista negra, porém, por uma questão de respeito e atualização vocabular, entendemos que a lista proibitiva ou lista de restrição se mostra mais adequado.

    15 Texto original: No hay ninguna disposición legal en el orden jurídico brasileño prohibiendo directamente de hacer las llamadas listas negras. Esta laguna, entretanto no retira las consecuencias jurídicas, pudiendo los empleadores responsables por esta práctica ser penados. Independientemente de esto, tal práctica no es tolerada por los que aplican el Derecho del Trabajo ni por el sistema jurídico del país. Por este motivo la inclusión en lista negra del ex empleado puede causar dificultades y/o impedir su recolocación en el mercado de trabajo. En consecuencia, podrá pleitear frente a la Justicia del Trabajo el derecho a una indemnización por daño moral (individual o colectivo), pero no su contratación ni su recontratación. La utilización de listas negras ocurre en Brasil en determinados sectores y regiones. Su práctica inhibe la contratación de trabajadores con actuación sindical o sindicalizados, violando los intereses de la colectividad representada. En general, la lista negra resulta de motivos variados, sea el transcurso de una pretendida actividad sindical, sea por el simple hecho de haber iniciado juicio para pleitear un legítimo derecho que le fue negado. Cf. MANNRICH, Nelson. Informe sobre protección contra la discriminación antisindical. Revista de Direito do Trabalho (São Paulo), v. 33, p. 273-298, 2007.

    16 MASCARENHAS, Igor de Lucena; BAHIA, Saulo José Casali. O exercício da Medicina Defensiva enquanto reação às decisões judiciais: o papel do Judiciário na construção de uma postura ética no exercício médico. Revista de Direito do Consumidor, v. 141, p. 339-355, 2022.

    17 Importante destacar que, para aqueles que defendem a eutanásia como ato contrário à ordem pública e aos bons costumes, não seria possível a colmatação e integração contratual, uma vez que esses tipos abertos impedem que um ato privado ilícito gere efeitos, eis que em conflito com valores sociais. ROPPO, Enzo. O contrato. Tradução de Ana Coimbra e M. Januário C. Gomes. Coimbra: Almedina, 2009. p. 177

    18 SCHREIBER, Anderson. Direito Civil e Constituição. São Paulo: Atlas, 2013. p. 52-60

    Cláusula Geral Do Risco Da Atividade: Duas Décadas Do Parágrafo Único Do Artigo 927 Do Código Civil

    Carlos Edison do Rêgo Monteiro Filho¹⁹

    Nelson Rosenvald²⁰

    1. INTRODUÇÃO

    Para além dos pontos que representam o início e o fim do trajeto, há um percurso. Equívoco comum consiste em se desprezar a trajetória e se concentrar somente no início e no fim da viagem. A metáfora é inevitável. Há uma disseminada ideia quanto ao fato de que responsabilidade subjetiva e objetiva representariam paradigmas antitéticos do direito de danos. Na verdade, o que existe é um continuum, sendo certo que imputação subjetiva e objetiva consistem apenas em dois extremos de uma longa linha reta, em um perímetro que acomoda várias figuras intermediárias.²¹ Dentre esses modelos jurídicos, alguns já são bem assimilados pela doutrina brasileira. Contudo, algumas hipóteses legais que o senso comum já traduziu como incidências de responsabilidade objetiva não se acomodam verdadeiramente à exatidão que o conceito demanda; em verdade, são estações que se encontram pelo caminho.

    Responsabilidade objetiva é aquela que independe da existência de ilícito.²² Tanto faz se o agente adotou comportamento antijurídico ou não, pois esse debate é infenso ao objeto da sentença. Releva perquirir, aqui, o nexo causal entre a conduta/atividade do agente e o dano. Isto significa que a obrigação objetiva de indenizar não consiste em uma espécie de responsabilidade sem culpa. Os conceitos não se equivalem, não há relação de pertencimento. Tradicionalmente a culpa representa elemento psicológico do agente. Contemporaneamente se normatizou, admitindo-se sua demonstração mediante contraste com padrões objetivos de comportamento.²³ Mesmo assim, em jogo uma adjetivação de conduta, será possível avançar na perquirição do estado anímico do ofensor, conforme a cláusula geral do artigo 186 do Código Civil. No entanto, nas reais hipóteses de incidência da teoria objetiva, essa questão não está em jogo, pois o fator de atribuição da obrigação de compensar danos (nexo de imputação) recebe justificação diversa do fato ilícito (v.g. equidade, dever de cuidado, risco da atividade).

    Nada obstante, a precisão técnica é dardejada ao se descrever como hipóteses de responsabilidade puramente objetiva tanto a responsabilidade dos empregadores pelos danos causados por seus empregados contra terceiros,²⁴ como a responsabilidade do fornecedor por danos derivados de produtos e serviços defeituosos. Há erros de perspectiva em ambos os casos, mas por motivos diversos. A responsabilidade vicária (vicarious liability) dos patrões por fatos danosos de seus auxiliares é alheia a um ilícito do empregador (art. 933, CC). Aplica-se o princípio, let the superior answer, desde que o representante esteja agindo em nome do representado e em benefício deste. Todavia, somente será possível imputar obrigação de indenizar em face da pessoa jurídica, caso seja previamente comprovado o ilícito culposo do funcionário. Se o dano produzido pelo empregado não corresponde à violação de um dever de cuidado, fecha-se a via de acesso ao empregador.²⁵ Alguns denominariam essa obrigação de indenizar de responsabilidade objetiva impura, por demandar aferição de culpa no antecedente (empregado) e a sua dispensa no consequente (patrão). Em essência, contudo, responsabilidade objetiva requer tão somente lesão a interesse jurídico protegido e relação de causalidade, elidindo-se considerações sobre antijuridicidade.

    Também não é puramente objetiva a responsabilidade do fornecedor pelos danos causados por produtos ou serviços defeituosos (arts. 12 e 14, CDC). O defeito é um fato antijurídico, uma desconformidade entre um padrão esperado de qualidade de um bem ou de uma atividade e a insegurança a que efetivamente foi exposta a incolumidade psicofísica do consumidor. O CDC abole a discussão da culpa, mas sem que se evidencie a presença do defeito (sujeita, claro, a inversão do ônus probatório) inexiste responsabilidade, mesmo se evidenciado eventual dano patrimonial e/ou moral.²⁶ Em sentido diverso, no Código Civil, a responsabilidade objetiva pelo risco (art. 927, parágrafo único) exige apenas que a atividade danosa seja indutora de um risco anormal, excessivo no cotejo com as demais atividades, por ser apta a produzir danos quantitativamente numerosos ou qualitativamente graves, independentemente da constatação de um defeito ou perigo. Isto é, por mais que seja exercitada com absoluto zelo, desgarra-se da perquirição subjetiva: não se indaga se A exercia uma atividade de risco, pois pela própria dinâmica dos fatos, mesmo que exercida por B, C ou D, os danos decorreriam do risco intrínseco da atividade.

    No rigor da precisão terminológica, nem mesmo a própria, e tão difundida, expressão responsabilidade objetiva mereceria aplausos. Responsabilizar, em sentido lato, significa atribuir a alguém uma sanção por um comportamento desviante. Definitivamente, isso é o que ocorre na teoria subjetiva. Entretanto, a teoria objetiva associa-se a uma discussão finalística, orientada pela necessidade de se assegurar a reparação de danos, que não devem ser suportados exclusivamente pela vítima.²⁷ Alguém será convocado a suportar os custos pela violação a um interesse merecedor de tutela por diversos fundamentos, sem que nenhum deles se relacione a ofensa a um dever de cuidado.²⁸ Melhor então será renomear o modelo jurídico para imputação objetiva de danos, obrigação objetiva de indenizar ou responsabilidade independente de ilícito. Enfim, da responsabilidade subjetiva à imputação objetiva, o país atravessou longa e sinuosa estrada, sem que nestes 18 anos de vigência do código Civil tenha localizado a estação derradeira. Afinal, na era das tecnologias digitais emergentes, caminha-se do risco da atividade para o alto risco da atividade.

    2. TEORIA OBJETIVA E A CONSTRUÇÃO DA CLÁUSULA GERAL NO CÓDIGO CIVIL DE 2002

    Há 18 anos – em janeiro de 2003 –, a doutrina objetiva saiu de uma posição lateral, posto que em inegável expansão, para ocupar papel de centralidade no ordenamento jurídico.²⁹ O parágrafo único do artigo 927 do Código Civil merece detalhado exame, pois a partir de seu teor pode-se compreender a real extensão da objetivação da responsabilidade civil e o significado concreto da teoria do risco no Brasil em comparação com o seu desenvolvimento no ordenamento jurídico de outras nações.³⁰

    Proclama o parágrafo único do artigo 927 do Código Civil: "Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem".

    A melhor forma de compreender as várias nuances do dispositivo é seccionando-o em três partes. A primeira parte estatui: "haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa". Acertadamente, o legislador não adotou as expressões responsabilidade objetiva, responsabilidade sem culpa ou presunção de culpa. O Código Civil precisamente inseriu a responsabilidade civil no livro dedicado ao estudo das obrigações como uma sanção a um fato jurídico danoso e fonte de prestação devida pelo autor do fato à vítima. A obrigação de reparar o dano corresponde a uma função primária da responsabilidade civil: a de recompor o patrimônio do lesado ao momento anterior ao da lesão.³¹

    Ao mencionar que essa reparação se efetiva "independentemente de culpa", faz-se um contraponto ao caput do artigo 927. O legislador se antecipa ao anúncio das situações em que a teoria objetiva prevalecerá para peremptoriamente excluir da investigação judicial qualquer relevância sobre a licitude ou ilicitude do fato jurídico danoso. Vale dizer, nas hipóteses em que prevalece a obrigação objetiva de indenizar, o processo não será palco de controvérsias quanto à antijuridicidade do evento ou à reprovabilidade do comportamento do agente, seja pela via da culpa ou do abuso do direito. Destarte, na teoria objetiva os pressupostos para a aferição da responsabilidade civil serão apenas o fato (ato ou atividade) do agente, o dano e o nexo causal entre ambos.

    Inexiste hierarquia normativa ou axiológica entre teoria subjetiva ou objetiva. O Código Civil não concedeu primazia a um ou outro regime.³² Nas hipóteses em que prevalece a teoria subjetiva (art. 927, caput), mantém-se firme o substrato moral da responsabilidade civil, sendo imperiosa a investigação da falta do agente diante do descumprimento de um dever de cuidado e a consequente reprovação do ilícito e sua censurabilidade pela imposição da sanção reparatória. A outro lado, se a pretensão do legislador for a de promover o princípio da solidariedade, mediante a repartição de riscos sociais, direcionará a norma para a teoria objetiva. O ideal, como vimos, é a convivência entre vários fatores de imputação de danos, cada qual com os seus próprios fundamentos.³³

    A restruturação do Código Civil Brasileiro em termos de relação entre o artigo 927 do Código Civil (imputação subjetiva) e o seu parágrafo único (imputação objetiva) viabilizou aquilo que na Itália gerou, nas palavras de Luigi Mengoni,³⁴ um esquema lógico diverso daquele que tradicionalmente operava na base da regra-exceção. A substituição do princípio da culpa pelo princípio do risco ocorrerá com base nas considerações das consequências de uma conduta no ambiente social, tido agora como critério hermenêutico de escolha de uma regra de decisão. Essa valoração social assumirá uma função não apenas corretiva, mas constitutiva de princípios.

    A partir das considerações sobre o impacto das atividades humanas sobre o corpo social, a aferição da culpa será valorizada sob o ponto de vista interpretativo das hipóteses concretas de responsabilidade civil. Todavia, sem o recurso tradicional ao antagonismo entre imputação objetiva ou subjetiva, como polos opostos, porém em uma linha de complementariedade. A finalidade da conjunção entre o risco da atividade e a aferição do comportamento do autor do ilícito é uma atividade de fortalecimento de um modelo jurídico fragilizado pelo câmbio das técnicas de imputação que acentuam o esvaziamento da função preventiva e punitiva da responsabilidade civil.

    Em sua segunda parte, acresce o parágrafo único do artigo 927: "nos casos especificados em lei". O primeiro local de irrupção da imputação objetiva de danos consistirá em diplomas legislativos especiais ou em dispositivos localizados no interior do próprio Código Civil que explicitamente revelem a sua opção pela responsabilidade independente de culpa.³⁵

    Se por acaso a redação do parágrafo único se resumisse às duas partes já destacadas, certamente seria legítimo concluir que o Código Civil optara por conceder protagonismo à responsabilidade subjetiva, reservando à teoria objetiva um espaço periférico em leis especiais e dispositivos que excepcionalmente dispensassem os pressupostos do ilícito e da culpa. Todavia, não foi esse o sucedido. Assim, caminha-se para a pesquisa da parte derradeira do parágrafo único do artigo 927 do Código Civil: "ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem".

    Trata-se de criação de cláusula geral do risco da atividade. As cláusulas gerais, como cediço, são normas de conteúdo vago, impreciso, que remetem o seu preenchimento a princípios e direitos fundamentais.³⁶ A abertura dessas normas de forte carga semântica

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