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Um Vírus na República da Impunidade: Retratos da Política Brasileira Durante a Pandemia
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Um Vírus na República da Impunidade: Retratos da Política Brasileira Durante a Pandemia
E-book378 páginas2 horas

Um Vírus na República da Impunidade: Retratos da Política Brasileira Durante a Pandemia

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Sobre este e-book

Este volume reúne os escritos de Catarina Rochamonte publicados em jornais entre o início de 2020 e os primeiros dias de 2022, acompanhando o desenvolvimento da pandemia da Covid-19, mas, muito mais que isso, a situação ético política do Brasil ao longo desse percurso. Com escrita clara e acessível, mas jamais se esquivando da complexidade dos temas tratados, a autora volta-se contra a polarização política e busca advertir sobre os perigos da atual separação entre ética e política. Suas análises críticas das situações concretas que tiveram espaço na mídia ao longo dos últimos dois anos demandam um retorno do pensar ao bem comum e à saúde da vida pública, da priorização da virtude e da ética na política.
IdiomaPortuguês
EditoraActual
Data de lançamento1 de ago. de 2022
ISBN9788562938986
Um Vírus na República da Impunidade: Retratos da Política Brasileira Durante a Pandemia

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    Um Vírus na República da Impunidade - Catarina Rochamonte

    O INACREDITÁVEL GOVERNO BOLSONARO

    Folha de S. Paulo, 26 de janeiro de 2020

    Os apaixonados seguidores do atual presidente não acreditam que ele seja capaz de nada ruim; já os seus adversários não acreditam que ele seja capaz de nada bom. Sendo assim, trata-se de um governo inacreditável. É inacreditável, por exemplo, a caricata peça exibida por Roberto Alvim mimetizando Joseph Goebbels, o chefe da propaganda da Alemanha nazista, assim como inacreditáveis são as desculpas do secretário e mesmo o fato de o governo ter tido um secretário de Cultura tão sem noção. Todavia, embora seus adversários não acreditem, o governo Bolsonaro tem méritos.

    Citemos, de início, algumas áreas em que o governo merece reconhecimento: na econômica, a boa equipe do ministro Paulo Guedes vai construindo o equilíbrio fiscal e recuperando empregos (recuperação lenta, mas é melhor caminhar devagar do que afundar ligeiro, como no governo de Dilma Rousseff); na segurança, o ministro Sergio Moro, com sua equipe, vai diminuindo significativamente os índices de criminalidade. Também a ministra Damares Alves tem realizado um bom trabalho, apesar de ser constantemente assediada pela imprensa desde o dia da sua nomeação.

    Vejamos algumas ações do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, sob a batuta da ministra que se adjetivou como terrivelmente cristã e que iniciou seu mandato em meio a polêmicas por usar a expressão menino veste azul e menina veste rosa, deixando os pregadores da ideologia de gênero à beira de um ataque de nervos.

    Damares Alves está desenvolvendo um trabalho de proteção a adolescentes que inclui orientação para abstinência sexual como forma de prevenir a gravidez precoce, mas os ideólogos da esquerda entendem que a atividade sexual precoce é uma conquista dos adolescentes e combatem com muito vigor qualquer orientação que vá contra a permissividade sexual. A ministra tem atuado para impedir que crianças indígenas continuem sendo assassinadas pelos pais segundo sua estranha e cruel tradição, mas os antropólogos multi-culturalistas entendem que tais costumes infanticidas devem ser preservados.

    Em campanha, o presidente prometeu acabar com o viés ideológico, e hoje são muitos os que – até mesmo fora do âmbito da esquerda – reclamam de ter ele mantido, com sinal trocado, o tal viés. Mas que Bolsonaro atue por uma determinada linha ideológica é inelutável, porquanto qualquer governo tem um componente

    ideológico.

    Um exemplo de viés ideológico é o alinhamento do governo atual com os Estados Unidos, uma democracia liberal, em contraposição ao alinhamento ideológico dos anteriores governos petistas com ditaduras. É bem verdade que Bolsonaro já as reverenciou; porém, o fez em relação a ditaduras pretéritas, enquanto a esquerda cultua as pretéritas e presentes, com especial predileção por Cuba e Venezuela.

    O combate à corrupção, porém, deveria estar acima de qualquer ideologia, mas, como se sabe, a esquerda petista, quando no governo, institucionalizou a corrupção no Brasil e a alargou além-fronteiras, montando o que talvez seja o maior esquema de corrupção da história. Em larga medida, foi através do discurso anticorrupção, colocando-se em sintonia com o simbolismo da Operação Lava Jato, que Bolsonaro conseguiu se eleger.

    Não obstante, o presidente faz hoje movimentos sinuosos para agir contra a atuação da Lava Jato sem parecer que o faça. Provavelmente age assim para proteger o senador e filho Flávio Bolsonaro, que está sendo investigado pelo Ministério Público do Rio Janeiro.

    De forma igualmente incoerente, Bolsonaro sancionou o indecente Fundo Eleitoral de R$ 2 bilhões com a inacreditável desculpa de que estaria atrapalhando a democracia e o cumprimento da lei eleitoral com o veto, o que obviamente não procede, visto que o presidente tem autoridade constitucional para decidir por quaisquer vetos, tanto quanto o Congresso Nacional tem para derrubá-los.

    Na minha terra isso se chama desculpa amarela.

    O governo atual é realmente inacreditável, mas a esquerda brasileira não deixa por menos.

    DIREITA, ESQUERDA E DEMOCRACIA LIBERAL

    O Povo, 1 de fevereiro de 2020

    Na introdução do livro Histoires des idées politiques aux temps modernes et contemporaines, Philippe Nemo destaca como principal característica desse período o surgimento das teorias constitucionais que fundam o estado democrático liberal, o qual, embora lance raízes em pensadores antigos e medievais, tem por originalidade o paradigma que sustenta uma ordem para o pluralismo.

    Para o autor, há três grandes famílias de teorias políticas, cada uma das quais comandada por certa visão de ordem social: a direita, comandada pelo paradigma da ordem natural; a esquerda, comandada pelo paradigma da ordem artificial; e a tradição democrática e liberal, comandada pelo paradigma da ordem espontânea (ou pluralista ou auto-organizada).

    Esses três modelos de ordem são frutos de longa evolução: nas sociedades primitivas, acreditava-se que a ordem cósmica e social era estabelecida pelos deuses, não havendo espaço para crítica ou progresso. A ruptura dessa estrutura primitiva deu-se com o advento da polis grega, no interior da qual tornou-se possível o debate, a racionalidade e a importante distinção entre phisis (ordem natural) e nomos (ordem artificial), retomada pelos estóicos, pelos juristas romanos e, posteriormente, pelos medievais, que distinguiram direito natural e positivo, sendo o primeiro uma ordem natural, permanente e universal e o segundo uma ordem construída pela razão humana.

    Poder ou não forjar livremente instituições e leis é fundamental para caracterizar as referidas ordens políticas: enquanto a direita faz remissão a uma pretensa ordem natural como única fonte do que é justo e fecundo e a esquerda constrói uma ordem social ideal e utópica, que quer impor, a tradição democrática e liberal trabalha instituições favoráveis à manutenção da ordem social espontânea.

    Nosso tempo é marcado pela consciência de que a liberdade individual e o pluralismo que dela se segue não são fatores de ruptura e desordem, mas de ordem espontânea cujo gerenciamento se dá pelas instituições do estado de direito. O direito abstrato e universal, os direitos do homem, o mercado, a liberdade de pensamento e de imprensa são os elementos inerentes ao modelo democrático e liberal que resistiu aos terríveis regimes fascistas e comunistas resultantes do paroxismo das teses de direita e de

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