Maria das Graças: Roteiro Cinematográfico
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Sobre este e-book
Essa história começa no dia em que a empregada doméstica Maria das Graças de 18 anos, chegada a pouco de Pernambuco, se suicida. Ela pulou do 7o andar do Edifício Esperança, na rua Bolívar, em Copacabana, onde trabalhava cerca de três meses.
Ao se deparar com o corpo da moça estendido no asfalto, dentro de uma poça de sangue, a jovem Sabrina Diaz Vidal (23), moradora da mesma rua, fica chocada. Hipnotizada com a cena, Sabrina chega a se transportar para o corpo da moça, pois outrora também passara por sua cabeça, a ideia de dar cabo da própria vida. Essa superposição acontecerá outras vezes durante o desenrolar da trama.
Extremamente impressionada, Sabrina começa uma cruzada a procura de respostas: o que levou Maria das Graças ao suicídio.
Ao empreender a jornada, Sabrina, enquanto tenta desvendar o mistério envolvendo a morte da doméstica, terá que se defrontar com seus próprios fantasmas.
Sabrina se tornará obsecada, à medida em que mergulhar fundo em busca da verdade. Obseção essa, que lhe trará sérios problemas pessoais, no convívio com o namorado Daniel (25) e sua amiga mais chegada, Ivete (25). Também fará vir à tona seu relacionamento tumultuado com o pai, João Paulo (51).
No fim, mesmo não tendo um desfecho a lá Hitchcock, ficamos conhecendo um pouco da alma simples de Maria das Graças. E a trama serve de catarse para Sabrina se descobrir, exorcisar seus fantasmas e assim, pudesse seguir em frente, sem medo de enfrentar o que está por vir.
Carlos Elino Boechat
CARLOS ELINO BOECHAT é diretor, roteirista e montador (editor) de cinema e televisão. A partir de 1970 trabalhou como roteirista, diretor e montador (editor) de vários institucionais e documentários para várias produtoras. Desenvolveu durante esse período roteiros de séries, longas e curtas metragem, além de sinopses de novelas. Também trabalhou nos longa-metragem: “70 Anos de Brasil”; “O Torcedor”; “Vivência de Campeões” e “Relatório de Um Homem Casado” dirigido por Flávio Tambellini, onde recebeu o prêmio da APCA de melhor montagem em 1975. Na rede Manchete (1985/1992) escreveu, dirigiu e editou vários programas: “Acredite se Quiser”; Agricultura de Hoje”; “Você e a Informática”; “O Mundo é Maior que a Minha Casa”; “Série de Vídeos – Maurício de Souza Produções”; “Mulher de Hoje”; De Mulher Pra Mulher”; “Clô Para os Íntimos”; e outros. De 1996 a 2002 no CDT foi responsável pela realização de mais de quinhentos vídeos institucionais para a área de transporte, dramatizados com atores. Realizou em 2006 o longa-metragem independente “Lei da Vantagem”. 2010/2011 desenvolveu para FremantleMedia vários episódios do docudrama Marcas da Vida exibido pela Rede Record (2011). Atualmente escreve a novela: “O Presente de Grego”.
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Três Comédias a Quatro Mãos Nota: 0 de 5 estrelas0 notasInstinto Predador: Roteiro Cinematográfico Nota: 0 de 5 estrelas0 notas
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Maria das Graças - Carlos Elino Boechat
MARIA DAS GRAÇAS
De Carlos Elino Boechat
(2º Tratamento)
COPACABANA. APARTAMENTO (FAMÍLIA MENDONÇA). SALA. INTERIOR. MANHÃ.
Alguém – não vemos seu rosto – escreve uma carta. A caligrafia é rudimentar e apresenta erros de português: …Eu num guentava mais essa vida miseráveu, pois eu sinto muito num poder ver mais o meu pai e minha mãe e todos vocês...
Ouvimos Annina
da ópera La Traviata
de Giuseppe Verdi. Em um plano fechado uma cadeira é colocada junto a uma parede. Pés descalços sobem na mesma e em seguida saem de quadro. Plano afastado: a cadeira está junto de uma janela; a cortina balança; ouvimos barulho de queda, em seguida gritos. (Ou PAN da carta para a cortina balançando). Burburinho. A câmera se aproxima devagar da janela, enquanto entram os caracteres com o nome do filme: Maria das Graças
; elenco e parte da equipe técnica. A câmera passa pela janela e mostra a rua – nesse momento não há mais créditos. Lá embaixo o corpo de uma moça está estatelado: parte na calçada, parte no asfalto. Pessoas se aglomeram ao seu redor.
COPACABANA. RUA. FRENTE – EDIFÍCIO ESPERANÇA. EXTERIOR. MANHÃ.
Embaixo as pessoas continuam se aproximando do corpo. Alguém que chega pergunta:
Mulher (1)
O que aconteceu?
Outra pessoa que já se encontrava no local:
Homem (1)
Essa moça caiu lá de cima.
Mulher (1)
(Abismada) Nossa!... E tá morta?
Homem (1)
Sei lá! Parece.
Mulher (2)
Meu Deus! Será que ela foi jogada?
Rapaz
Num sei!
Mulher (2)
Isso tá com cara de suicídio.
Mulher (1)
Mas como!? Uma moça tão jovem e... bonita! Que motivos teria pra fazer uma coisa dessas?
Mulher (3)
Quem vai saber!
Velho
Esse mundo tá de pernas pro ar.
Mulher (3)
As pessoas não tem mais respeito à vida.
Mulher (4)
Não têm é Deus no coração!
No meio dessa gente vemos Sabrina Diaz Vidal (23 anos) muito bonita. Chocada, pensativa:
Sabrina
(Off) Ou nunca foi compreendida.
Maria das Graças, a vítima, se encontra de bruços, rosto voltado para o lado da câmera, dentro de uma poça de sangue e com os olhos abertos. ZOOM IN sobre o rosto de Das Graças. Sabrina hipnotizada pelo olhar da jovem. Pontuação musical. Rosto da vítima agora é de Sabrina.
Obs.: Neste último take a fotografia, após o início do plano, vai se alterar – prevalecerá o amarelo ouro. Como flash back este take entrará outras vezes, mas então a cor estará alterada desde o início do corte.
Close – Sabrina petrificada, entre as pessoas. Um rapaz fura o bloqueio formado ao redor de Das Graças. É o zelador do prédio de onde a jovem supostamente se jogou ou foi jogada:
Zelador
Santo Cristo! Mas essa moça é a empregada dos Mendonça, do 701.
Moça que se aproximou com o zelador, completa:
Moça
Éh! E ela era nova aqui no prédio...
Alguém pergunta:
Voz (mulher)
(Off) Já chamaram uma ambulância?
Velho
Pra quê? Agora só o rabecão.
Voz (mulher)
(Off) Gente, tem que avisar a polícia!
Homem (4)
Eles já devem de tar chegando.
Zelador
Eu vou interfonar pro apartamento dos Mendonça. (Sai)
Senhora
Eu vi essa moça algumas vezes no elevador... sempre muito calada.
A polícia chega – o policial (Peninha) verifica se a moça está morta. Em seguida sai. Peninha ao cruzar com um homem que se aproximava, balança a cabeça negativamente. Depois segue em frente, enquanto o homem vai até o corpo da jovem. É o delegado adjunto Hércules (44 anos) da 12ªDP. Ele se mantém de pé enquanto examina a cena. Olha para cima, na direção do prédio em frente, depois para o cadáver. Logo, Peninha, o policial, chega com um plástico e cobre o corpo da jovem. O delegado adjunto se dirige aos presentes:
Hércules
Alguém aqui viu o que aconteceu?
As pessoas se entreolham, enquanto negam com movimentos econômicos de cabeça. O delegado adjunto continua:
Hércules
Pelo menos alguém conhecia a vítima?
O zelador, que voltava do prédio, responde:
Zelador
Eu, senhor! Quer dizer, conhecer, conhecer num conhecia, só conhecia de vista, porque ela era empregada dos Mendonça, do 701.
Hércules
E quem é você?
Zelador
Eu sou o zelador, aqui do Esperança. (Aponta)
Hércules
Então ela trabalhava aí?
Zelador
Sim senhor! Era empregada dos Mendonça, do 701.
Hércules
Você viu o que aconteceu?
Zelador
Não, senhor! Só vi quando o pessoal tava se juntando aqui. E aí vim olhar o que tava acontecendo...
Hércules
...Você sabe dizer se tem gente no apartamento, onde ela trabalhava?
Zelador
Acho que não tem, não senhor! Acabei de interfonar pra lá e ninguém atendeu. Normalmente a essa hora seu Walfrido tá trabalhando e a dona Antonieta caminhando no calçadão da praia.
Hércules
(Ríspido) Mas você estando aí na portaria, não viu se eles saíram?
Zelador
É que hoje eu peguei um pouco mais tarde, rendi o meu colega ainda há pouco.
Hércules
E onde está o seu colega?
Zelador
Ele já foi embora.
O delegado adjunto volta a se dirigir aos presentes:
Hércules
Então ninguém viu nada?
As pessoas não respondem simplesmente se entreolham ressabiadas. O policial volta a se dirigir ao zelador:
Hércules
Vamos lá verificar se tem alguém em casa.
Zelador
Mas... como disse ao senhor, não tem ninguém lá.
Hércules
Se for preciso a gente arromba a porta.
Zelador
(Ressabiado) Bem... o senhor quem sabe.
O delegado adjunto se volta para um dos seus subalternos:
Hércules
Peninha, aguarda aí o pessoal da perícia. (T) E afasta essas pessoas daqui, desobstrua a rua. Olha esse trânsito como está ficando!
Sabrina se afasta do local.
O delegado adjunto Hércules acompanhado do zelador se dirigem para o edifício, onde a moça trabalhava.
BOTAFOGO. KITCHENETTE (DANIEL). QUARTO. INTERIOR. DIA.
Sabrina e Daniel (25 anos) transam. Enquanto o rapaz vai à loucura com a relação, Sabrina parece não compartilhar do mesmo prazer do namorado. O rosto da jovem, voltado para a câmera, que se aproxima, mostra um semblante preocupado e ausente.
FLASH BACK.[RUA. FRENTE – EDIFÍCIO ESPERANÇA. EXTERIOR].
Close – Sabrina (mesma posição da empregada de bruços, porém sobre mais sangue) com os olhos abertos para a câmera – fotografia amarelo ouro. Pontuação musical.
BOTAFOGO. KITCHENETTE (DANIEL). QUARTO. INTERIOR. DIA.
Cont. imediata da cena de Daniel transando com Sabrina. Daniel, que se encontra sobre Sabrina, agora rola para o outro lado da cama. Bastante aborrecido por ter percebido a apatia da companheira, briga com ela. Machista como é se preocupa com seu desempenho:
Daniel
Qualé, Sabrina? Qual é a sua?
Sabrina
(Sentida) Qualé o quê, Daniel?
Daniel
(Esbravejando) Ah, não se faça de boba! Eu estou transando com minha namorada ou com uma prostituta?
Sabrina
Hei, Daniel, pega leve, tá!
Daniel
(Impaciente) Pega leve o escambau! Ou você acha que fodeu legal?
Sabrina
(Arrependida) Ah, Dani, me desculpa! Hoje eu não tou bem.
Daniel
(Convencido) Daqui a pouco vai tá espalhando pras amiguinhas, que o papai aqui não é bom de cama.
Sabrina
Não é com você, amor! O problema é comigo. Eu estou...
Daniel não quer saber das explicações da namorada:
Daniel
...E não vem novamente com essas paradas de problemas existenciais
, que essa porra num cola, não! (T) Pô, problemas todo mundo tem, cara! Eu tenho os meus e nem por isso trago pra cama. Na hora do vamos ver, eu tou sempre aí, não tou? Desempenhando meu papel.
Sabrina então decide contar-lhe sobre o provável suicídio da empregada doméstica, na manhã daquele dia, que tanto a havia impressionado:
Sabrina
É que hoje de manhã, lá na minha rua, uma moça, mais ou menos da minha idade, se suicidou...
COPACABANA. RUA. FRENTE – EDIFÍCIO ESPERANÇA. EXTERIOR. DIA.
O delegado adjunto Hércules desce do prédio. Ele ainda encontra muita gente próxima ao corpo da moça – descoberto. O fotógrafo da polícia técnica tira fotos. Alguns repórteres que se encontravam por ali, assim que vêm o policial correm para ele. Todos querem sua opinião sobre a morte da jovem:
Repórteres
E aí, delegado, o quê o senhor pode dizer pra gente?
Repórter (1)
Foi crime?...
Repórter (2)
...Ou suicídio?
O delegado adjunto é cercado pelos repórteres (uns cinco). Ele para e pacientemente os atende:
Hércules
Tudo leva a crer se tratar de suicídio.
Repórter (3)
Essa é a sua opinião ou se baseia em evidências, como um... bilhete, por exemplo?
Hércules
Eu falo baseado em evidências. Mas, eu peço a vocês que tenham um pouquinho mais de paciência. Assim que tudo ficar esclarecido o próprio delegado Lionel fará questão de informá-los.
Repórter (2)
Então