Marco Lucchesi e Os olhos do deserto: a experiência poética do caminhante
De Débora Ramos
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Marco Lucchesi e Os olhos do deserto - Débora Ramos
Sumário
CAPA
AGRADECIMENTOS
DO EU AO OUTRO: FICÇÕES DE DESERTO E BIBLIOTECAS REAIS – João Cezar de Castro Rocha
LUCA BACCHINI (STANFORD UNIVERSITY)
NOTAS INICIÁTICAS
1. CAMINHOS ERRANTES
2. DESCAMINHOS ASCÉTICOS
CONCLUSÃO
A AUTORA
REFERÊNCIAS
Débora Ramos
Marco Lucchesi e Os olhos do deserto:
a experiência poética do caminhante
São Paulo | Brasil | Junho 2019 – Ebook
1ª Edição
Big Time Editora Ltda.
Rua Planta da Sorte, 68 – Itaquera
São Paulo – SP – CEP 08235-010
Fones: (11) 2286-0088 | (11) 2053-2578
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Site: bigtimeeditora.com.br
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Conselho Editorial:
Ana Maria Haddad Baptista (Doutora em Comunicação e Semiótica/PUC-SP)
Catarina Justus Fischer (Doutora em História da Ciência/PUC-SP)
Lucia Santaella (Doutora em Teoria Literária/PUC-SP)
Marcela Millana (Doutora em Educação/Universidade de Roma III/Itália)
Márcia Fusaro (Doutora em Comunicação e Semiótica/PUC-SP)
Vanessa Beatriz Bortulucce (Doutora em História Social/UNICAMP)
Ubiratan D’Ambrosio (Doutor em Matemática/USP)
Ficha Catalográfica
RAMOS, Débora. Marco Lucchesi e Os olhos do deserto: a experiência poética do caminhante. 152 pp. – São Paulo: BT Acadêmica, 2019.
ISBN 978-85-9485-092-8 | 1. Educação 2. Ensaio 3. Estudos literários I. Título
Produção Editorial
Editor: Antonio Marcos Cavalheiro
Capa: Big Time Editora Ltda.
Diagramação: Pedro Monte Cavalheiro
Revisão: Autores
Ao Inominável.
A Miguel, meu filho.
À Marinalva, mãe querida.
A Antonio Pedro (In memoriam).
À Irene (In memoriam).
AGRADECIMENTOS
A Mauro Sergio, Marco Lucchesi, Carlinda Nuñez, João Cezar de Castro Rocha, Eduardo Guerreiro, Luca Bacchini, Moafak Dib e Muna Omran.
A experiência do deserto me marcou de modo irreversível. Passei longas temporadas solitárias, parte das quais foram evocadas em Os olhos do deserto [...] não há dúvida que o deserto guarda sortilégios e desafios epistemológicos [...]. Marco Lucchesi[1]
DO EU AO OUTRO: FICÇÕES DE DESERTO E BIBLIOTECAS REAIS
João Cezar de Castro Rocha
Um livro raro
O leitor tem em mãos um livro raro: Marco Lucchesi e Os olhos do deserto: a experiência poética do caminhante.
Trata-se de estudo acadêmico, uma dissertação propriamente dedicada a um único livro de Marco Lucchesi, Os olhos do deserto; requisito para a obtenção do título de Mestre em Teoria da Literatura e Literatura Comparada. Título, aliás, obtido com louvor e indicação para publicação, que agora se realiza.
(Portanto, o leitor distraído, e cada vez menos desocupado – como Cervantes imaginava o companheiro ideal das aventuras de Alonso Quijano –, procura outra prateleira e abandona o belo exercício analítico de Débora Ramos.)
Contudo, este livro não é apenas singular – ele é singularmente delicado.
De fato, o centro do estudo é uma cuidadosa análise de Os olhos do deserto. No entanto, não se trata de leitura cerrada, imune à intertextualidade, definidora da escrita de Marco Lucchesi, tampouco se trata de hermenêutica indiferente à riqueza de múltiplos universos culturais e linguísticos, autêntica impressão digital do autor de Ficções de um gabinete ocidental.
Por isso mesmo, Débora Ramos propõe ao leitor uma viagem à roda da biblioteca de Marco Lucchesi. Mas não apenas, pois, assim como há bibliotecas de papiros, manuscritos e livros, a autora deste ensaio também se revela leitora refinada de bibliotecas de areia e de experiências acumuladas. A riqueza de seu percurso analítico supõe a colisão de extremos: da letra à voz; do livro ao mundo; do autor ao tradutor; da caligrafia à cosmovisão.
(Numa palavra: do eu ao outro. Outrar-se, verbo tão caro a Fernando Pessoa, é bem a medida da literatura de Marco Lucchesi.)
E também da vocação crítica de Débora Ramos, pois, em seu minucioso exame de Os olhos do deserto, ela assume a experiência poética do caminhante, transformando-a em princípio de composição.
Cartografia do deserto
Vejamos, então, o mapa de leitura preparado por Débora Ramos.
O primeiro capítulo oferece ao leitor um roteiro seguro do complexo texto de Lucchesi, explorando ao máximo a justaposição de gêneros e de estilos. Um ponto alto desse roteiro é a inspirada análise da orgia epigráfica
:
O roteiro de epígrafes parece cifrado, já que integra uma textualidade especial, um coro de vozes recortadas, mas integrando um continuum – o capítulo que elas instituem. Entendemos aqui que o autor pretende prefaciar a complexa relação entre o todo e as partes que desenvolve na obra.
No segundo capítulo, a autora surpreende um descaminho ascético, que afirma a conquista de um território transcendente – a experimentação da prática poética
. Desse modo, associa os dois momentos de sua análise através de um estudo inédito dos elementos fonéticos e mesmo gráficos que estruturam a poesia de Marco Lucchesi. O leitor verá que o estudo recorda uma partitura, com a distinção de vogais e consoantes assinaladas por cores diversas.
De igual modo, o exame da caligrafia e das iluminuras é outro ponto alto da análise de Débora Ramos.
Nas suas palavras:
Observado o princípio de uma ascese literária em ج, vejamos o que instrumentaliza a sua aparição na prece. (...)
O belo na prece é ornado pelas aliterações, assonâncias, anáforas, apóstrofes, personificações, antíteses, hipérboles e metáforas, visto que elas compõem ritmicamente as súplicas.
Compreende-se, assim, de forma renovada a vocação paratática da frase de Marco Lucchesi: como se a parataxe sugerisse uma inesperada metonímia do ritmo da respiração da prece, ainda melhor, dos exercícios espirituais, e, ao mesmo tempo, encenasse uma metáfora das epifanias que acompanham o processo.
Na conclusão, com a delicadeza que caracteriza sua escrita e mirada crítica, a autora cede a palavra a Marco Lucchesi.
(No fundo, não fez outra coisa nesta bela imersão em Os olhos do deserto. Débora Ramos transforma o exercício analítico num diálogo socrático: a maiêutica, bem entendido, encontra-se na leitura da obra, no texto de Marco Lucchesi.)
Coda
A árvore da teoria, para muitos, é monocromática – cinzenta, acreditam alguns.
(E não deixam de ter alguma razão, pelo menos se considerarmos o que usualmente se publica sob o seu guarda-chuva.)
Contudo, esse é um equívoco dos mais persistentes; lugar-comum que se transformou em dogma.
Pelo contrário, num primeiro momento, o gesto teórico supõe a máxima proximidade com o objeto de estudo. Então, num segundo instante, impõe-se a distância necessária à reflexão.
(Movimento aparentado ao do ofício do antropólogo, tal como descrito por Clifford Geertz.)
Nada impede, portanto, que a atividade teórica seja criativa; aliás, como a etimologia sugere. De fato, o substantivo teoria refere-se à ação de contemplar, ver – e com os olhos bem abertos paro objeto em foco.
Eis, então, a conquista maior de Marco Lucchesi e Os olhos do deserto: a experiência poética do caminhante. Assim como a literatura do autor de O dom do crime realiza um cruzamento, tenso e produtivo, entre o lírico e o cognitivo, a análise de Débora Ramos supõe o encontro, produtivo e tenso, entre crítica e criação.
Por isso, este livro é uma forma de diário; registro meditado das anotações de uma leitora sensível e original.
LUCA BACCHINI (STANFORD UNIVERSITY)
Não existe labirinto pior do que o deserto.
Com Jorge Luis Borges aprendemos que lá, onde não há escadas para subir, portas para forçar, galerias para percorrer e muros que impeçam a passagem, é impossível encontrar a saída. Abandonado no meio do deserto o rei da Babilônia morreu de fome e de sede.
O deserto de Marco Lucchesi não abre exceção. A sua prosa-poética é labiríntica, fascinantemente inacessível mas o leitor não há de temer, pois pode contar com um guia extremamente atento e competente para enfrentar as múltiplas insídias da travessia.
Com rara sensibilidade Débora Ramos acompanha os rastros dos (des)caminhos errantes e ascéticos de Lucchesi, mostrando todas as pistas interpretativas que são necessárias percorrer para não perder o rumo da obra: aponta metáforas, explora alusões, examina iluminuras, revela assonâncias, analisa caligrafias, decifra símbolos até desvendar, no silêncio atordoante que sitia o peregrino, surpreendentes ecos literários (Pasternak, Hesse, Baudelaire, Calvino, Whitman, Neruda...).
Assim, na aridez hostil e imperscrutável do deserto, o leitor consegue saciar a própria sede bebendo poesia, salvo do fatal destino do rei da Babilônia.
NOTAS INICIÁTICAS
Marco Lucchesi surge nas Letras por volta de seus vinte anos, com o lançamento de Breve introdução ao Inferno de Dante, em 1985. Após essa aparição, inúmeras produções de fôlego entre poesia, ensaios, traduções e ficção fizeram parte de seu repertório livresco. Nos anos 90, o autor publica A paixão do Infinito (1994), Saudades do Paraíso (1997), Bizâncio (1997), Sorriso do Caos (1997) e Teatro Alquímico (1999). E abre o milênio com Os olhos do deserto, exatamente, em 2000. A partir daí somam-se as obras Poemas Reunidos (2000), Sphera (2003), A Memória de Ulisses (2006), Meridiano Celeste & Bestiário (2006), Ficções de um Gabinete Ocidental (2009), O dom do crime (2010), Nove cartas sobre a divina comédia (2013), O bibliotecário do imperador (2013), Clio (2014), Hinos matemáticos (2015), Rudimentos da língua laputar (2015), Carteiro imaterial (2016), Rebis (2017), Catálogo da Biblioteca do Excelentíssimo Senhor Marquês Umbeliano Frisão (2017), Mal de amor (2018).
Os olhos do deserto, obra focalizada nesta dissertação, é um livro de viagens, e sobre esse tipo de obra Luciano Cordeiro avisa, a respeito do que nele podemos divisar: "[…] um livro de viagens é