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Dona Benta: Uma Mediadora no Mundo da Leitura
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Dona Benta: Uma Mediadora no Mundo da Leitura
E-book325 páginas4 horas

Dona Benta: Uma Mediadora no Mundo da Leitura

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Sobre este e-book

Estudar Dona Benta era paixão antiga. Sempre tive um carinho especial por tal personagem da saga lobatiana. Não fui leitora infantil de Lobato, li apenas um livro que havia em casa, Reinações de Narizinho, numa infância regada a leituras exigidas por meus professores. Leituras que sempre me trouxeram imenso prazer, apesar da exigência. Deparei-me com o conjunto da obra infantil lobatiana já adulta e professora da educação básica e superior. Mas a diversão com elas sempre esteve garantida por parte da Emília. Minha paixão, todavia, sempre foi por Dona Benta. Na verdade, penso que é mesmo uma paixão pelo domínio do conhecimento e de como ela o difunde: com clareza e bom humor, sempre. Eis aí a leitora professora, que lia as obras infantis de Lobato e aprendia se divertindo! Convido o leitor também a fazer essa viagem pelo mundo da mediação de leitura de Dona Benta.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento16 de set. de 2020
ISBN9786558202288
Dona Benta: Uma Mediadora no Mundo da Leitura

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    Dona Benta - Patrícia Aparecida Beraldo Romano

    Editora Appris Ltda.

    1.ª Edição - Copyright© 2019 dos autores

    Direitos de Edição Reservados à Editora Appris Ltda.

    Nenhuma parte desta obra poderá ser utilizada indevidamente, sem estar de acordo com a Lei nº 9.610/98.

    Se incorreções forem encontradas, serão de exclusiva responsabilidade de seus organizadores.

    Foi realizado o Depósito Legal na Fundação Biblioteca Nacional, de acordo com as Leis nos 10.994, de 14/12/2004, e 12.192, de 14/01/2010.

    COMITÊ CIENTÍFICO DA COLEÇÃO LINGUAGEM E LITERATURA

    Para o Luís, com quem tanto aprendi sobre leituras…

    Para Anna Sofia, esperança no mundo da leitura!

    AGRADECIMENTOS

    À professora Marisa Lajolo, por ter aceitado prefaciar este livro e com quem tanto aprendi sobre leitura e Monteiro Lobato.

    Ao designer e ilustrador Magno Silveira, que muito me ensinou sobre os ilustradores da obra infantil de Lobato e que tão prontamente fez o lindo trabalho de capa para meu livro.

    À Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará (Unifesspa), minha instituição de vínculo profissional, pela licença que me concedeu para realizar a pesquisa que resultou neste texto.

    À Universidade Presbiteriana Mackenzie, pela bolsa de incentivo aos estudos durante meu doutorado, cujos resultados de pesquisa agora posso publicar.

    À Capes, pela bolsa-auxílio ao pesquisador-doutor.

    À Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil, por ter aceitado minha participação na Caravana de Leitura Monteiro Lobato, em 2008, quando tudo isso começou.

    À Biblioteca Monteiro Lobato, em especial aos funcionários Nelson Somma Júnior e Oiram Antonini, que me ajudaram nas pesquisas do acervo das obras de Monteiro Lobato, nas inúmeras vezes em que lá estive.

    Ao arquivo do IEB/USP, onde pesquisei a correspondência infantil de Monteiro Lobato.

    Ao Cedae, em especial à Cleonice Moreira e à Flávia Carneiro Galvão, que me auxiliaram nas pesquisas ao acervo pessoal de Lobato.

    Ao Luís e à Anna Sofia, sempre presentes no meu mundo de leitora.

    À Martha Romano, que tanto me auxiliou com a Anna Sofia durante minhas ausências.

    À amiga Luciana Castilho, amizade tão preciosa.

    E, finalmente, mas não menos importante, a meus pais, por me proporcionarem a possibilidade de estudar em boas escolas, cujos professores fizeram seu papel de mediadores eficazes de leitura.

    Dona Benta costumava receber livros novos, de ciências, de arte, de literatura. Era o tipo de velhinha novidadeira. Bem dizia o compadre Teodorico: ‘Dona Benta parece velha, mas não é, tem o espírito mais moço que o de jovens de vinte anos’.

    […]

    — Este livro não é para crianças – disse [Dona Benta] – mas se eu ler do meu modo, vocês entenderão tudo. Não tenham receio de me interromperem com perguntas, sempre que houver qualquer coisa obscura. (LOBATO, Monteiro. História das Invenções)

    PREFÁCIO

    DONA BENTA, LIVROS, LEITORES E LEITURA

    Talvez Dona Benta seja a avó que muita gente gostaria de ter ou de ter tido. Ou a avó que as leitoras mais velhas gostariam de ser, que se encantavam com a figura da velhota sentada numa cadeira baixinha, cerzindo meias ou contando histórias a netos, netas e leitores…

    Será? Talvez seja.

    É essa simpática senhora que protagoniza este belo livro de Patrícia Beraldo Romano.

    Lendo e contando histórias para os moradores do sítio, Dona Benta também mostra – e, mostrando, ensina – como encantar pessoas por livros e por leitura.

    * * *

    Este tema – formar leitores –, preocupação e desafio maiores de educadores contemporâneos, tem preocupado diferentes segmentos sociais de diversos países e se tornou objeto de pesquisa em diferentes áreas do conhecimento. Discutem-no professores, linguistas, pedagogos, psicólogos, escritores… as discussões – diagnósticos, lágrimas e propostas – derramam-se por congressos, simpósios e encontros que, de norte a sul do país (talvez não apenas do nosso), há bem mais de uma década, diagnosticam, debatem e lamentam a crise da leitura.

    Esta crise – ou talvez a percepção dela – parece aflorar mais nos dias de hoje do que no tempo de Dona Benta, personagem que surge nos livros de Monteiro Lobato nos anos 1920 e neles permanece até os anos 1940 do século passado. A crise da leitura talvez seja uma crise de nosso tempo. Ou talvez vivamos um tempo em que ela se torna mais visível, a partir da consciência da profunda e injusta segmentação da sociedade brasileira, em que livros são, praticamente, artigos de luxo.

    No sítio de Dona Benta havia estantes de livros ao alcance de todos, lá chegavam jornais que eram lidos, bilhetes e cartas que eram respondidos, personagens escreviam diários. Ou seja, não obstante rural, o Sítio do Picapau Amarelo, inaugurado nos anos 1920/1930 do século XX, revisitado e renovado pelo seu autor ao longo de mais de 10 anos, era um espaço letrado, habitado por leitores.

    E hoje, em que casas dos mais de 200 milhões de brasileiros esse cenário se faz presente? Em poucas, creio. É por isso que este Dona Benta: uma mediadora no mundo da leitura é um livro precioso.

    * * *

    Na deliciosa leitura que ele nos proporciona, Dona Benta é a figura considerada responsável pelo desenvolvimento do gosto pela leitura de seus netos.

    Será? Este livro de Patrícia convence-nos que sim.

    E de onde vem Dona Benta?

    * * *

    Em diferentes passagens de sua obra – particularmente em passagens de sua farta correspondência – Lobato confere diferentes gêneses à avó de Narizinho e Pedrinho. Todas plausíveis. Mas, para além do que nos conta o escritor, talvez valha a pena articular a importância que tem essa Dona Benta leitora na obra lobatiana ao fato de ser Lobato filho e neto de professoras e depois marido de uma.

    Sua avó materna – Dona Anacleta Augusta do Amor Divino, provavelmente mulata –, a mãe de Olympia, era professora. Sua familiaridade com o mundo letrado manifesta-se em sua caligrafia e no texto de uma carta que ela escreveu ao neto, que ele guardou por toda a vida e que hoje está cuidadosamente preservada no Cedae da Unicamp:

    FIGURA 1 – CARTA DE DONA ANACLETA DO AMOR DIVINO

    FONTE: http://www.unicamp.br/iel/monteirolobato/corre_passiva/MLb-3.2.00205.htm, acesso em: 17/02/2019.

    Mais tarde, a partir de 1908, casado com a professora Maria da Pureza (a quem, por toda a vida, chama carinhosamente de Purezinha), Lobato parece creditar a ela – e às cenas de leitura doméstica que ela protagoniza – sua atenção à importância de livros para crianças. Em setembro de 1916, ele anuncia ao amigo Godofredo Rangel seu projeto de re-escritura de fábulas tradicionais, atribuindo o projeto a uma cena doméstica protagonizada pela esposa e filhos:

    Ando com várias ideias. Uma: vestir à nacional as velhas fábulas de Esopo e La Fontaine, tudo em prosa e mexendo nas moralidades. Coisa para crianças. Veio-me diante da atenção curiosa com que meus pequenos ouvem as fábulas que Purezinha lhes conta. Guardam-nas de memória e vão recontá-las aos amigos […] (LOBATO, 2010. p. 370).

    * * *

    Este livro de Patrícia Beraldo Romano – doutora em Letras e professora de Literatura –, ao sublinhar o papel educador desempenhado por Dona Benta, sugere a seus leitores a grande importância de uma outra faceta da obra lobatiana. Trata-se de uma obra ótima, não apenas pelos elementos de fantasia e realidade, de novidade e de imaginação que tecem seus enredos, mas também pela forma como seus enredos são apresentados.

    Ao lado (na realidade, precedendo-o) do exaustivo e detalhado levantamento e comentário das atividades de Dona Benta como mediadora de leitura, a autora dedica-se a inventariar e a discutir, em fontes contemporâneas, fundamentos e modalidades das atividades de mediação na formação e aperfeiçoamento de leitores e desenvolvimento de práticas de leitura.

    Inventariando e discutindo diferentes formas de mediação encenadas por Dona Benta, este livro faz avançar a discussão do que podem – educadores e familiares – fazer relativamente à leitura na escola e em casa. Analisando as estratégias de que se vale Dona Benta para a mediação de diferentes gêneros de livros, Patrícia Beraldo Romano estabelece e discute pormenorizadamente dois procedimentos de mediação postos em prática pela avó de Narizinho e Pedrinho, particularmente em Geografia de Dona Benta (1935) e em D. Quixote das crianças (1936).

    Muito sugestiva é a observação da autora de que Lobato, como adaptador, já é também um mediador e que, no subtítulo de algumas edições de certas obras suas, o papel de mediação exercido por Dona Benta já fica consignado. No caso da obra de Cervantes, na capa do livro, seu título informa que ali se vai ler não o D. Quixote original, mas um D. Quixote das crianças e contado por Dona Benta. No caso da Geografia, a mediação exercida por Dona Benta (e por Lobato) talvez se torne um tantinho mais complexa e sofisticada, já que o livro é anunciado como sendo baseado em Hendrik Van Loon.

    A análise que este Dona Benta: uma mediadora no mundo da leitura propõe privilegia, como se disse acima, duas obras: uma, um livro que hoje seria considerado paradidático (a Geografia de Dona Benta); outra, de sólida inserção na estante das obras-primas da literatura ocidental (o D. Quixote das crianças). A partir da análise, Patrícia Beraldo Romano propõe – na esteira da respeitável bibliografia que discute – que se pense em duas classes de mediadores: mediadores institucionais & mediadores familiares.

    No desempenho de ambos os tipos de mediação, o livro ressalta estratégias pelas quais Dona Benta interage com seus ouvintes, incentivando a interação deles tanto com o conteúdo do livro, como com a situação de leitura.

    Ainda que as atividades de mediação de leitura praticadas por Dona Benta tenham sido inventadas por Lobato para soarem verossímeis há mais de meio século, Patrícia Beraldo Romano compensa o lapso de tempo sugerindo, em várias passagens do livro – originalmente sua tese de doutorado –, formas de transpor, para situações escolares e familiares contemporâneas, os modos/comportamentos pelos quais Dona Benta desempenha a função de mediadora de leitura.

    Ou seja: este livro tanto faz seus leitores reencontrarem (ou ficarem conhecendo) uma figura feminina forte da tradição literária brasileira, como se inscreve na melhor bibliografia contemporânea relativa a leitura e literatura.

    O que, convenha-se, não é pouco!

    Marisa Lajolo

    Professora da Universidade Presbiteriana Mackenzie

    Professora titular (aposentada) da UNICAMP

    Membro da Academia Paulista de Educação

    APRESENTAÇÃO

    Estudar a literatura infantojuvenil nasceu quando eu ainda trabalhava em cursos de Letras em faculdades particulares no interior de São Paulo, por volta do início dos anos 2000. De lá para cá, fiz muitas descobertas e uma das melhores foi ter enveredado pelos estudos da obra infantil de Monteiro Lobato.

    Como cheguei até os textos do autor o leitor descobrirá no início da leitura deste livro. O que me interessa nesta apresentação é anunciar que o texto que ora se apresenta nasceu de uma tese de doutorado e perdeu algumas partes para se transformar em livro. Também vale anunciar que a pesquisa que originou o livro também tem rendido outros estudos que, em breve, terão os resultados transformados em outro livro ainda sobre essa personagem leitora-mediadora que é a avó Dona Benta. Portanto, se o leitor gostar do texto que segue, poderá conhecer mais sobre essa sedutora leitora em breve.

    Minha aposta neste livro é a de que precisamos ainda de profissionais mediadores de leitura como Dona Benta, apesar de ela ser uma personagem datada do início do século XX e, de lá para cá, muita coisa ter mudado. O que não mudou foi a importância que deve ser dada à leitura e ao conhecimento e como eles devem ser levados até o jovem leitor. Por isso, nosso objetivo é o de apresentá-la como avó-mediadora e avó-professora, ao longo de dois livros da saga infantil lobatiana: Dom Quixote das Crianças e Geografia de Dona Benta.

    Convidamos o leitor a embarcar neste passeio lúdico pelo mundo da leitura e da mediação de Dona Benta e descobrir como ela pode ser, ainda hoje, modelo eficaz no processo de mediação do texto literário ou (in)formativo para o jovem leitor.

    Boa leitura!

    A autora

    Junho de 2018.

    Sumário

    COMO TUDO COMEÇOU…

    1

    MEDIAÇÃO E MEDIADORES DE LEITURA: ONTEM E HOJE

    1.1 Leitura e mediação: aspectos gerais

    1.2 Mediação de leitura: definições

    1.3 Mediadores de leitura: ontem e hoje

    2

    MONTEIRO LOBATO: UM PROMOTOR DE LEITURA

    3

    DONA BENTA: CONHECENDO A PERSONAGEM

    3.1 A figura da avó na literatura

    3.2 Nascimento e percurso da personagem avó e o sítio de Dona Benta

    3.3 Uma avó versátil

    3.4 Dona Benta nas cartas infantis

    4

    DONA BENTA E AS TIPOLOGIAS DE MEDIAÇÃO DE LEITURA

    4.1 A avó como mediadora de leitura em Dom Quixote das crianças

    4.2 A Avó como mediadora em Geografia de Dona Benta

    4.3 O exemplo de mediação de leitura de Dona Benta e os mediadores atuais

    4.3.1 Os mediadores de leitura atuais 

    E PARA FINALIZARMOS…

    REFERÊNCIAS

    BIOGRAFIA DO CAPISTA

    Os bastidores da capa

    COMO TUDO COMEÇOU…

    Este trabalho teve início em 2008. Nessa época, eu era professora substituta na Faculdade de Estudos da Linguagem (Fael) da Universidade Federal do Pará, campus de Marabá. Em novembro, a universidade recebeu a presença do ilustrador e escritor Roger Mello e da professora especialista em Lobato e também escritora Socorro Acioli. Ambos eram convidados da Caravana de Leitura Monteiro Lobato, promovida pela Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil (FNLIJ), patrocinada pelo programa de Democratização Cultural da Votorantim, por meio da Lei Federal de Incentivo Fiscal Rouanet.

    Marabá foi uma das oito cidades escolhidas para receber a Caravana que,

    […] além de promover a leitura da obra de Monteiro Lobato junto aos educadores das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, valorizando os aspectos literário, informativo e crítico e ressaltando o seu pioneirismo quanto à formação de crianças e jovens leitores, [tinha] como grande objetivo criar núcleos de estudo, nas cidades por onde passou, sobre a importância de Lobato para a educação brasileira (FNLIJ, 2009, p. 6).

    Não havia, na universidade, nenhum especialista em Monteiro Lobato. Como eu lecionava a disciplina de Literatura Infantojuvenil, fui convidada a participar da mesa e meu nome submetido ao comitê que avaliava os especialistas. Assim, no dia 07 de novembro de 2008, juntamente a Socorro Acioli e Roger Mello, falei um pouco sobre o que eu conhecia da obra infantil do autor da saga do Sítio do Picapau Amarelo. A partir desse encontro, nasceu um enorme interesse dos meus alunos da graduação em Letras por Lobato e eu acabei por inserir mais livros dele nas referências da disciplina de Literatura Infantojuvenil.

    Em menos de um ano estava com um grupo de estudos formado para discutir as obras infantis do escritor (Grupo de Estudos em Literatura Infantojuvenil – Gelij). Desse grupo, nasceram 12 trabalhos de conclusão de curso orientados por mim sobre essas obras. E da união da experiência da Caravana de Leitura Monteiro Lobato com o grupo de estudos nasceu este trabalho. Posso dizer que, em Marabá, surgia, a partir de 2008, um núcleo de estudo, conforme texto da Caravana, sobre a importância da obra de Lobato para a formação de professores de Letras.

    Eu não fui leitora das obras infantis lobatianas na infância. Lembro-me de que havia apenas uma delas em casa: Reinações de Narizinho. Na infância, nas décadas de 1970 e 1980, fui fã dos seriados de TV: não perdia nenhum episódio e grande foi a minha decepção quando li, na faculdade, alguns exemplares das obras infantis e percebi que a figura da Cuca praticamente inexistia nas histórias. Maior ainda foi minha surpresa quando, depois de ler toda a saga, descobri que ela aparecia apenas em O Saci. Eu adorava ver as crianças vencerem, com sua perspicácia e inteligência, as diabruras da bruxa-jacaré. Mas… e Dona Benta? A avó sempre foi uma das minhas personagens favoritas. Acho que o meu sonho era ter uma avó como Dona Benta: leitora, sábia e aventureira. Sonho de criança! Sonho transformado em desejo de professora de literatura…

    No fundamental II eu já gostava muito de ler, apesar de esse gosto não ter nascido em casa, mas sim na escola. Eu tive excelentes professores de língua portuguesa e de literatura. Professores muito bons no processo de mediação de leitura. Devo a eles a leitora em que hoje me tornei.

    E estudar Dona Benta no doutorado em Letras passou a ser o meu desejo como professora na universidade. Nasceu, assim, minha tese que agora se transforma em livro. Como leciono Literatura Infantojuvenil e Práticas de Ensino, a questão da mediação de leitura sempre esteve muito presente em minhas aulas e a ideia foi a de unir a figura de Dona Benta à questão da mediação.

    Para iniciar este estudo, a releitura de cada história da saga infantil foi fundamental. A partir disso, surgiu a primeira problemática deste texto: pode ser Dona Benta considerada mediadora de leitura nas obras infantis de Monteiro Lobato? A possível resposta me mostrou, entretanto, que era necessário delimitar mais o estudo em virtude do volume de leituras e, por isso, resolvi ficar apenas com duas das obras infantis: Dom Quixote das Crianças e Geografia de Dona Benta.

    A escolha dessas obras deu-se por alguns motivos, a saber: em Dom Quixote das crianças parece haver um projeto de leitura idealizado por Monteiro Lobato e realizado por Dona Benta como a avó-mediadora do clássico literário para as crianças e os bonecos. Por sua vez, Geografia de Dona Benta é uma obra que – pouco estudada – apresenta a união do prazer por aprender, por parte das crianças, com o prazer por ensinar, por parte de Dona Benta, espécie de avó-professora-mediadora. E tudo isso ocorre no interior de um navio imaginário que veleja – imaginariamente! – por países dos diversos continentes. Dessa forma, Lobato/Dona Benta faz uso da viagem para ensinar.

    As hipóteses para justificar tal discussão apoiam-se nas tipologias de mediação de leitura que, partindo de teóricos no assunto, elenquei para Dona Benta a partir das características dela na função de mediadora em toda saga infantil. Tomando como ponto de partida essas tipologias, elenco 11 competências de Dona Benta mediadora e procuro verificar como algumas delas se realizam nas duas obras estudadas.

    O livro aqui apresentado é fruto da leitura de toda a saga infantil lobatiana e da pesquisa de fontes primárias, como primeiras edições de obras e cartas infantis enviadas a Monteiro Lobato. Tudo isso foi pesquisado na Biblioteca Infantil Monteiro Lobato, no Centro de Documentação Alexandre Eulálio (Cedae), que pertence ao Instituto de Estudos da Linguagem (IEL), na Unicamp (Arquivo Monteiro Lobato) e no Arquivo Raul de Andrade e Silva, Dossiê Monteiro Lobato, no Instituto de Estudos Brasileiros (IEB), na USP.

    A releitura das obras infantis de Monteiro Lobato fez com que eu utilizasse trechos de diversas edições como a da década de 50 do século XX, cujas capas foram feitas por Augustus, e uma clássica edição de obras completas, de 1977, com ilustrações de Manuel Victor Filho, ambas já editadas pela Brasiliense, além de uma primeira edição de Geografia de Dona Benta, editada ainda pela Companhia Editora Nacional, em 1935,

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