Não Entre Lá
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Sobre este e-book
O que acontece quando você entra por aquela porta que lhe avisaram para não entrar? Este livro apresenta dez contos de terror e suspense onde são retratadas situações em que ignorar um aviso pode ser o caminho mais curto para a vida se transformar em um verdadeiro pesadelo.
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Não Entre Lá - Batuta Ribeiro
Quando os caçadores de fantasmas encontram um fantasma
Há uma floresta na cidade de Jacutinga conhecida por ser mal-assombrada. Ela se chama floresta da forca
. O nome não é à toa: consta nos registros da polícia que quatorze pessoas foram encontradas enforcadas nessa floresta. É comum em Jacutinga, quando um morador desaparece por mais de dois dias, que alguém comente: Ih, pode procurar na floresta da forca
.
Com todo esse histórico, é claro que o local inspira medo nos jacutinguenses. Ninguém ousa passar pela floresta durante a noite e, aqueles que passaram durante o dia, relataram coisas do tipo Eu senti que tinha alguém me seguindo
, Ouvi gritos de um homem
ou As árvores pareciam que se mexiam quando eu não estava olhando
.
A reputação dessa floresta chegou ao conhecimento da paulista Laura Gomes, uma garota de 22 anos que tinha um canal no Youtube. Juntamente com seu namorado, Pedrinho, ela visitava lugares ditos mal-assombrados para passar uma noite. O casal filmava o que acontecia durante a noite, editava e postava no canal.
O canal Caçando fantasmas
tinha mais de 500 mil inscritos e gerava uma receita que permitia ao casal viver apenas de caçar fantasmas
.
* * *
Laura e Pedrinho chegaram de carro em Jacutinga na tarde de uma sexta-feira e logo acharam uma pousada. Horácio, o dono da pousada, ouviu Laura falar de sua intenção de gravar um vídeo na floresta da forca durante a noite.
— Vocês são loucos? – perguntou Horácio, assustado.
Laura deu risadas.
— Não somos loucos, apenas fazemos vídeos para o Youtube sobre lugares mal assombrados. E a floresta da forca parece ser um bom lugar para o nosso próximo vídeo – disse ela.
— Querem um conselho? – disse Horácio, bem sério – fiquem longe da floresta da forca, principalmente à noite. Acredite em mim, o coisa ruim ronda aquelas bandas.
— Quem? – perguntou Pedrinho.
Lentamente, Horácio relançou para o rapaz e respondeu:
— O diabo.
Esse nome impôs alguns segundos de silêncio entre os três até que Pedrinho disse:
— Se o senhor soubesse os lugares por onde já passamos a noite, diria que nós não temos medo do diabo.
— Ele tem razão, Horácio – emendou Laura – só para o senhor saber, nós já passamos a noite dentro de uma cova aberta de um cemitério abandonado. E quer saber? Foi divertido.
Ao ouvir isso, Horácio fez o sinal da cruz.
— Vocês não deveriam brincar com essas coisas. Há lugares e coisas que devem ser deixados em paz.
— Nós não estamos brincando – respondeu Pedrinho – estamos ganhando dinheiro.
— Esqueçam essa ideia de passarem a noite na floresta da forca, aquele lugar é sinistro – insistiu Horácio.
— Por isso mesmo que nós vamos lá – disse Laura – eu agradeço sua preocupação, Horácio, só lhe peço que indique alguém para nos levar até essa floresta.
Horácio hesitou, mas, com a insistência de Laura, ele chamou Amaral, um faz tudo da pousada, para levá-los até a floresta da forca. O casal fez um bom acordo com Amaral. Ele ganharia cem reais apenas para levar o casal até a floresta e voltar na manhã seguinte para buscá-los.
* * *
O sol já se escondia no horizonte quando o Onyx preto estacionou perto do barranco da estrada de terra. Amaral desceu do carro e indicou a entrada da floresta da forca. Pedrinho ligou a filmadora, uma Panasonic W850 com visão noturna, e virou para o rosto de Amaral.
— Se quiser, pode vir com a gente.
— Obrigado, mas nem pagando eu entro aí – respondeu Amaral, convicto.
— Esse lugar tem cobras? – perguntou Laura.
Amaral achou graça dessa pergunta e respondeu:
— Olha, moça, eu não me preocuparia com cobras dentro da floresta da forca.
Pedrinho mirou no rosto de Laura e captou suas sobrancelhas se erguendo e seu rosto de deboche.
Então o casal pegou as mochilas do porta-malas e se despediram de Amaral.
* * *
Laura foi na frente, carregando a mochila com alimentos e água. Pedrinho vinha logo atrás, trazendo a mochila da barraca, e filmando. Após andarem quatrocentos metros floresta adentro, Laura parou e apontou uma placa.
— O negócio aqui é sério – disse ela. Pedrinho filmou a placa, que dizia: Não se mate. Sua vida é muito valiosa. Ligue 188
.
— As pessoas realmente buscam essa floresta para se suicidarem – disse Laura para a câmera – mas essa placa não tem ajudado muito, mais de quarenta pessoas já cometeram suicídio nessa floresta.
Na verdade, Laura não sabia o número de pessoas que tinham se suicidado na floresta, mas falou um número alto para criar suspense e deixar os inscritos instigados.
— O último suicídio aconteceu no mês passado – continuou Laura, mentindo com dramaticidade – foi uma garota de apenas dezesseis anos. O nome dela era Patrícia. No fim de uma tarde de domingo, ela entrou nessa floresta e se deparou com essa placa. Mas ela não ligou para o 188. Não, meus amigos, ela não queria ajuda. Ela estava decidida. Por isso Patrícia continuou andando...
Laura começou a andar, dizendo:
— Quem sabe o que Patrícia tinha na cabeça? Quais eram seus pensamentos? Aflições? O certo é que ela trazia uma corda de varal.
Laura parou diante de uma árvore que tinha uma raiz grossa. Ela subiu na raiz e apontou para um galho.
— Foi ali que Patrícia amarrou a corda. Sem nenhum medo da morte, ela passou a corda no pescoço e deixou-a bem esticada. O resto vocês já sabem...
Laura pulou da raiz.
— E assim terminou a vida de...
— Deus! – disse Pedrinho, recuando com a filmadora.
— O que foi? – perguntou Laura.
Pedrinho foi para trás da árvore e olhou em volta.
— O que houve? – insistiu Laura.
Pedrinho sentou-se na raiz e parou a gravação. Mexeu nos botões do visor e mostrou para Laura o que tinha captado segundos antes. Na imagem, aparecia Laura falando E assim terminou a vida de...
, quando uma cabeça saiu detrás da árvore e desapareceu em menos de um segundo.
— Mas o que é isso? – perguntou Pedrinho.
Pedrinho pausou a imagem e deu um zoom. Mesmo assim, não dava para distinguir a fisionomia daquele rosto branco com cabelos pretos e longos.
— Isso vai ser um arraso – disse Laura, entusiasmada – nós gravamos um fantasma.
— Tem certeza que isso é um fantasma?
— E o que mais seria? Estamos sozinhos nessa floresta.
Pedrinho olhou em volta, ressabiado, e perguntou:
— Será?
— Acha que tem mais alguém aqui conosco?
Pedrinho olhou para o rosto branco no visor da filmadora.
— Isso me deu medo.
— Caraca, essa floresta é mesmo mal assombrada – disse Laura, rindo – eu quero filmar mais fantasmas desse tipo. Com essas imagens nós vamos alcançar um milhão de inscritos no canal.
Ela bateu nas costas do namorado.
— Não vamos?
O rapaz coçou a cabeça, ainda olhando para aquele rosto inumano no display da filmadora, e disse, sem muito entusiasmo:
— É, eu acho que vamos.
* * *
Pedrinho montou a barraca entre as raízes grossas de uma árvore de tronco largo. Depois juntou galhos secos e fez uma pequena fogueira. Laura abriu a mochila e pegou os lanches de presunto e queijo embrulhados em filme plástico e passou um para Pedrinho. Eles comeram os lanches, acompanhados de uma garrafa de Coca-Cola, enquanto olhavam o fogo.
— Já imaginou se a gente encontra alguém enforcado nessa floresta? – disse Laura, empolgada – ia ser bem sinistro, não ia?
— Sei não... – disse Pedrinho, olhando fixamente para o fogo.
— Vamos lá procurar? –