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Filhos de fé: Histórias da terreira da minha avó
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Filhos de fé: Histórias da terreira da minha avó
E-book128 páginas1 hora

Filhos de fé: Histórias da terreira da minha avó

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Sobre este e-book

Filhos de Fé remonta cenas da vida de Fernanda Gabriela, criada em meio aos costumes do Culto Africano Oxalá e Iemanjá em Esteio (RS). Além de preocupar-se em orientar quem não conhece as religiões de matriz africana, Fernanda apresenta vivências bastante específicas do espaço sincrético em que atua, como podemos ver no trecho a seguir:

"Neta de uma querida e respeitada Mãe de Santo, filha de uma cambona dedicada que eu vi tornar-se uma médium exemplar, nasci sentindo o cheiro do defumador, ouvindo o bater das sinetas, observando o movimentos dos búzios. Nasci entre os costumes da Umbanda Cruzada e do Batuque Gaúcho, aprendendo de ambas as vertentes. Aos nove anos de idade, substituí minha mãe como cambona e ela passou a ser médium de incorporação. Desde então, são dezesseis anos como cambona, e vinte e cinco anos observando uma terreira que, logo, completará os cinquenta. Quantas pessoas necessitadas, quantas velas, quantas flores, quantas Sessões… Quantas noites ao som dos pontos e das rezas, embaladas pelo amor das Entidades e dos Orixás."

(trecho do primeiro capítulo de Filhos de Fé – histórias da terreira de minha avó).

Segundo o professor Alexander Magnus, Mestre em História pela UFBA, Filhos de Fé trabalha os conceitos de etnia, religião, história, memória e depoimento sem recorrer à linguagem acadêmica, pois "narrar a vivência familiar, muitas vezes, não cabe no mundo cartesiano – não há régua ou fórmula para mensurar um universo cheio de nuances."
IdiomaPortuguês
Data de lançamento25 de ago. de 2019
ISBN9788554034092
Filhos de fé: Histórias da terreira da minha avó

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    Pré-visualização do livro

    Filhos de fé - Fernanda Gabriela

    mistura.

    Apresentação

    Peço licença aos mais antigos e aos mais novos; a meus ancestrais e antepassados, que vieram de longe; licença de Bará a Oxalá e, especialmente, de meu Grande Pai Xangô e de meu Grande Pai Ogum da Aruanda. Que orgulho ver uma ex-aluna tornar-se minha colega na missão de compartilhar, por meio da pesquisa e da escrita, a leitura de mundo do povo de santo! Uma leitura de mundo carregada de emoção!

    As emoções, segundo Maturana (2002)iii , Maturana e Rezepka (2003)iv, Maturana e Verden-Zoller (2011)v e Chagas (2017)vi, são disposições corporais que especificam domínios de ação. E o amor é a emoção social fundadora, pois é através dele que legitimamos os outros, ampliando e mantendo o princípio da convivência. O que encontramos no decorrer deste livro é uma narrativa cheia desse amor, que entrelaça o terreno e o sagrado.

    Logo no primeiro capítulo, Abrindo os olhos: Um mundo diferente, Fernanda relata a experiência de crescer envolta pela religiosidade afro-brasileira. Sua produção – como neta de mãe de santo, filha de médium e cambona - é exemplo de que a memória é um processo coletivo. Como uma Filha de Dois Mundos, Fernanda Gabriela caracteriza os elementos constitutivos da Umbanda e do Batuque, contextualizando, de maneira muito poética, o que é estar imersa nesse espaço.

    No Rio Grande do Sul, muitos iniciados da Umbanda também são iniciados no Batuque. Mesmo sendo duas práticas distintas, a influência das nações do Batuque (Jêje, Ijexá, Jêje-Ijexá, etc.) estão presentes também na Umbanda. Por isso, não podemos falar de Umbanda como uma prática homogênea. Além dos elementos religiosos de povos africanos, com grande destaque aos povos Bantu, a Umbanda acumula influências das religiosidades indígenas, católica e kardecista.

    No capítulo Filha de Fé, cambona, descendente, a autora descreve as descobertas oferecidas a uma criança pelo cotidiano afrorreligioso da comunidade-terreiro. Seu encantamento pelos elementos simbólicos, ritualísticos, e pelas experiências inexplicáveis convida o leitor a uma narrativa poética e delicada.

    Já no capítulo A Terreira e suas vozes, Fernanda aborda a trajetória de sua avó como mãe de santo e de sua mãe como cambona e médium da corrente. Mostra, assim, o protagonismo das mulheres no cotidiano da comunidade-terreiro – uma reelaboração de papéis, ocorrida em religiões de matriz afro no Brasil. O Batuque riograndense, assim como o Candomblé na Bahia, sofrem grande influência da organização familiar iorubá, patriarcal e poligâmica.

    No decorrer da diáspora africana, essa organização foi ressignificada. Nesse contexto, as mulheres foram as responsáveis por reorganizar a religião de seus antepassados. O terreiro se consolidou como um espaço de resistência e transmissão dos valores civilizatórios africanos, como a oralidade, a circularidade, a territorialidade, a cooperatividade e a disseminação da energia vital que é o axé. As Ìyálorísa dos terreiros iorubanos eram as grandes professoras, médicas e juízas de seu tempo.

    No capítulo Ancestralidade, família e mediunidade, Fernanda apresenta sua família de santo, formada por parentes e outras pessoas que fazem parte do cotidiano da comunidade-terreiro. Chagas (2017) escreve que, para os povos de origem Bantu, a comunidade é composta por três esferas: deuses, ancestrais e antepassados; seres humanos e natureza. Nessa perspectiva, Louw (2010, p. 5)vii, a firma que uma pessoa não só é uma pessoa por meio de outras pessoas, mas também uma pessoa por meio de todos os seres do universo, incluindo a natureza e os seres não humanos. Aqui, o amor se materializa como cuidado, respeito, compreensão, partilha, colaboração e cooperação em que a diversidade e a particularidade são primordiais para a felicidade humana.

    Nos capítulos Trabalho de Fé: Elementos e Ferramentas e As Sessões, a autora narra práticas religiosas que acontecem durante as sessões, bem como a função de todos os elementos e ferramentas utilizadas. Compõe sua escrita misturando narrativa, rima e pontos cantados no correr dos trabalhos. Demonstra, assim, a riqueza cultural dos terreiros, bem como sua diversidade ritualística.

    No último capítulo, A Umbanda e o Mundo, Fernanda traz um relato muito contundente de sua experiência como estudante e pesquisadora da Umbanda e do Batuque. É um exemplo de como os iniciados das religiões de matriz afro podem constituir espaços de ação afirmativa, em todos os contextos da sociedade, por meio da produção de conhecimento.

    Na ritualística e no cotidiano dos terreiros, a produção do conhecimento parte do princípio do movimento, ou seja, o saber está em constante ressignificação. Esse processo possibilita a coexistência de múltiplas possibilidades de abordagem, leitura, interpretação e reinterpretação dos elementos religiosos. Porém, devido ao preconceito e a discriminação, esse tipo de prática é, constantemente, invisibilizado, com base na consolidação da ciência ocidental como a única forma de representação e explicação da realidade.

    Os saberes tradicionais e míticos constituem-se como uma possibilidade epistêmica potente. Fernanda o demonstra: Nossa religião é o retrato da resistência, da cultura e da fé do Povo Negro. (...) Valorização é poder. Conhecer sua própria história é conhecer sua identidade. Saber de onde viemos nos ajudará a chegar aonde queremos. Não precisamos ter vergonha do nosso sangue. Não precisamos ter vergonha da nossa fé. Cada Filho de Fé – que bate sua sineta, bate cabeça, canta ponto ou reza – honra e perpetua o culto aos Orixás. E eu espero, de todo o coração, que a nossa fé dure por muito, muito tempo.

    Para encerrar essa apresentação, recordo a emoção que senti ao ler cada palavra deste grande livro da Fernanda. Lembrei que sou um contador de histórias, realizado na ação de criar e recriar pequenos mundos por meio das palavras. Contar histórias, com nossas crianças e adolescentes, possibilita que se vejam como agentes de sua própria história. Ao ler esta pequena joia, escrita por Fernanda Gabriela, fui transportado ao ano de 2008, quando fui seu professor de História no Ensino Médio. Sinto que a semente germinou e cresceu forte. Seus frutos serão maravilhosos. Que nossa Grande Mãe Iemanjá, com seu manto sagrado, traga-lhe toda a paz, harmonia e felicidade, minha amiga e colega de luta! Minha irmã de fé!

    Kaô Kabecilê!

    Canoas, maio de 2019.

    Prof. Dr. Wagner dos Santos Chagas

    Pós-Doutorando no Programa de Pós-graduação em Memória Social e Bens Culturais do Unilasalle

    Doutor em Educação pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos

    Professor e Coordenador de Projetos, Tecnologias e Educação na Secretaria Municipal de Educação de Esteio/RS.


    iii MATURANA, Humberto. Emoções e linguagem na educação e na política. Belo Horizonte: UFMG, 2002.

    iv MATURANA, Humberto; REZEPKA, Sima Nisis. Formação Humana e Capacitação. Petrópoles: Vozes, 2003.

    v

    MATURANA, Humberto; VERDEN-ZOLLER, Gerda. Amar e brincar fundamentos esquecidos do humano. São Paulo: Palas Athenas, 2011.

    vi

    CHAGAS, Wagner dos Santos. Eu sou porque nós somos: Experiências do emocionar nas aprendizagens umbandistas. Tese (doutorado) –Universidade do Vale do Rio dos Sinos, Programa de Pós-Graduação em Educação, São Leopoldo, 2017.

    vii LOUW, Dirk. Ser por meio dos outros: o Ubuntu como cuidado e partilha. Revista IHU On-line,

    São Leopoldo: Instituto Humanitas - Unisinos, Ano X, nº 353. 2010.

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