Inquisidor: Thaddeus de Veneza, #1

De Greg Alldredge

Apenas peças em um jogo.

Thaddeus trabalhou para chegar ao topo de sua profissão. Como um Inquisidor do Doge, ele gostava de todos os confortos que a vida de classe média veneziana tinha a oferecer.

Isso até ele ser selado com o escriba chorão de Pádua, Geovanni. Agora sua vida deu uma guinada para o bizarro.

Dada a tarefa impossível de descobrir a fonte de uma estranha praga, o inquisidor e o escriba foram banidos de Veneza até que uma resolução fosse descoberta.

A estranheza espreita a terra, e não são os turcos. A primeira tarefa da dupla é chegar à cidade infectada de Udine.

Eles serão capazes de encontrar a fonte e retornar? Eles irão sobreviver?

Leia o primeiro livro Inquisidor, na trilogia Thaddeus de Veneza, para descobrir.

• Idioma: Português
• Editora: BadPress
• Data de lançamento: 11 de jun. de 2021
• ISBN: 9781667403779

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Por acreditar em mim.

Capítulo 1:

A mesa aplainada estava no centro da sala escura. Os ferros e braseiros não adiantaram muito para quebrar o frio do lugar. O teto de chumbo do prédio deixava o frio penetrar para o centro das celas. Esta pequena prisão poderia estar anexada à residência do Doge, mas não é o que uma pessoa chamaria de luxuoso por qualquer linha de imaginação. Aqui era onde os casos mais especiais eram levados.

Thaddeus olhou para o escriba que forçaram a ele. Ele notou que o chapéu de quatro pontas do outro homem estava inclinado. Por reflexo, ele checou o seu para garantir que ainda era reto. O chapéu preto foi sua identidade por muitos anos. Ele se orgulhava muito de o vestir, e o fato de os identificarem como membros do judiciário não passou despercebido. Ele julgou que o homem ao seu lado não era nada como ele.

Às vezes, era pedido uma pausa na interrogação para deixar o suspeito ponderar as escolhas do seu passado e de seu futuro. Isso também dava à dor uma chance de trabalhar. A maioria dos acusados gritariam uma confissão antes do interrogatório começar. Essa suspeita se provou mais resistente.

A acusada foi pendurada diante o inquisidor, seus braços esticados atrás de suas costas em uma posição extremamente desconfortável. Lágrimas corriam de seus olhos, ainda assim ela gritou pouco. A maioria dos homens quebrariam como um bebê até agora, mas a mulher se recusava a soltar sua confissão. Não haviam muitas dúvidas que o próprio Thaddeus poderia suportar a dor, assim como a mulher o fez.

Ele sentou aqui na maior parte da manhã e noite anterior. Com um único banco duro de madeira quase não servindo para se sentar, ele tinha certeza que bolhas apareceriam na sua bunda. Ele estava pronto para um intervalo. As perguntas nunca paravam, apenas davam uma breve pausa. Seu tempo para questioná-la estava acabando. Mesmo se as leis da cidade permitissem tortura para ganhar uma confissão, havia um tempo limite de vinte e quatro horas por sessão. Se ele não conseguisse quebrá-la, lhe seria dado um dia de descanso e recuperação antes do tormento começar tudo de novo.

Um lenço macio mergulhado em perfume fez maravilhas para esconder o fedor de morte e carne queimada das narinas de Thaddeus. Madame, se você confessar o crime de bruxaria, isso seria muito mais leve para você. Ele trocou o pano sobre seu nariz depois da declaração.

Eu cometi muitos crimes, mas eu não irei carregar falsas acusações. Eu não sou uma bruxa. A mulher cuspiu sangue de seus lábios quebrados quando falou. Suas lágrimas gotejaram sobre as bochechas, mesmo ao se manter firme à sua inocência.

O carcereiro lhe deu um tapa na cabeça pelo desrespeito.

Desculpe-me, mas você foi acusada por um homem do clero. Quem você acha que o conselho irá acreditar? Um padre ou uma prostituta qualquer? Essa acusação não irá simplesmente desaparecer.

Eu não sou uma qualquer. A mulher tossiu as palavras enquanto lutava para tomar folego. Eu não sou uma bruxa.

Ainda assim, você convenceu um padre a lhe dar dinheiro por sexo. Você está dizendo que o homem fez isto por vontade própria? Você foi pega no ato de copulação, pela guarda noturna, em um beco. Confesse, e isto vai ser mais leve para você.

Nunca. Ela gritou.

Thaddeus acenou com sua mão. Carcereiro, gire-a de forma que eu veja seu rosto. Ela precisava de um escriba para ser seu advogado, porém nenhum foi nomeado. Esse caso era estranho, mesmo para o padrão de Veneza. Era um caso que alguém queria desaparecer rapidamente. Não haveria nenhum espetáculo de execução para esta mulher.

A mulher se pendurava pelos punhos, suspensa na viga de madeira atrás de suas costas. A dor deveria ser insuportável. Ela gritou em agonia quando o carcereiro a girou, a mão dele adicionando peso nas juntas distendidas do ombro.

Eu sei que isso deve doer. Confesse a bruxaria e nos deixe continuar nosso dia. Eu estou com fome, e tenho certeza que você está cansada deste tratamento.

Eu não sou uma bruxa!

Thaddeus balançou a cabeça. Estamos perdendo tempo aqui... Escriba, escreva a confissão dela, por favor. A mulher se recusou a cooperar. Ele sentiu que não importava o quanto isso demorasse, não haveria a confissão que o conselho buscava. Ele não se importava de interrogá-la até a morte.

Em um lampejo, a pena foi mergulhada na tinta e rascunhos foram feitos no registro.

Você admite que o padre abertamente te deu ouro por sexo? Thaddeus perguntou de novo e balançou a cabeça.

Sim, é claro. Ele fez isso por vontade própria, A mulher gritou.

E você confirma que você não fez um pacto com o demônio e atualmente não pratica, ou nunca praticou, bruxaria?

Eu juro em nome da Bíblia, eu não sou uma bruxa, ela chorou.

Muito bem... Carcereiro, adicione peso nos pés dela.

Mas eu não sou bruxa!

Thaddeus encolheu os ombros. Não, eu não acredito que seja. Mas o conselho me enviou aqui para ganhar uma confissão para o juiz, e pela sua própria confissão, você é culpada de fornicação e seduzir um padre. Você transou com um homem do clero e o convenceu a dar dinheiro destinado ao cardeal e a cidade. Dinheiro que era destinado a pagar as multas das pessoas nas prisões superlotadas. Espero que você consiga ver o problema de sua confissão. Você feriu a cidade e uma grande quantidade de pessoas com seu crime e pecado.

A mulher gritou conforme o peso era colocado nos seus pés, seus ombros deslocando no processo. O som doentio do estouro preencheu a sala pequena. Ela foi tomada por respirações espaçadas, quase incapaz de respirar sob a tensão em seu corpo.

Que Deus tenha piedade da sua alma. Thaddeus se virou para o escriba ao seu lado. Você escreveu a confissão?

Escrevi... mas ela não é uma bruxa? o jovem murmurou. Seu rosto pálido fácil de notar, mesmo em luz fraca.

Você honestamente não esperou encontrar uma bruxa nesta sala, certo? Eu tenho sido um inquisidor do Conselho dos Dez por cinco anos, e ainda estou para encontrar uma acusação verdadeira de bruxaria. A maioria são como esta mulher, estúpidas demais para saber que quebraram a lei. Ela deveria ter aceitado a acusação de bruxaria. Melhor ser queimada em uma estaca do que irá acontecer com ela agora.

O que irá acontecer com ela? o escriba perguntou.

Se ela for sortuda, ela simplesmente irá desaparecer, banida, mas é mais provável que eles a manterão até poder extrair o dinheiro de volta dela. O conselho não estava feliz que o padre caiu em seus ardis tão rapidamente. Eu duvido que uma alma sequer virá em seu auxílio. Assumo que ela terminará morta em um canal ou talvez em um túmulo não gravado no país. Não importa o fim, sua vida acabou.

Isso é pior que ser queimada viva?

Se fosse uma bruxa, ela poderia ser capaz de manter o julgamento ativo por várias semanas antes de partir em chamas gloriosas. Talvez, até jogar as peças certas e ser banida para um convento, onde pelo menos ela teria uma chance de escapar um dia. Quando foi a última vez que você viu uma bruxa queimar? Nós não somos o povo comum do país. Tentamos ao menos reabilitar nossos criminosos se tiver uma chance. Agora ela será uma ninguém e irá simplesmente desaparecer.

Thaddeus permaneceu, a cadeira fazendo um som de arranhão na pedra dura. Carcereiro, faça o trabalho que você faz tão bem. Iremos entregar nosso relatório de seu trabalho excelente aqui. Tente não deixá-la morrer antes do julgamento. Os juízes podem querer falar com ela.

O escriba rabiscou mais algumas notas antes de perguntar, Você não acredita em bruxas?

É claro que acredito. Se a igreja acredita em bruxas, então eu acredito. Eu só não acho que são tão aparentes como muitos no clero gostariam que pensássemos que são. Deixe-me perguntar... você acredita em céu e inferno?

O jovem escriba fez sinal de cruz. Sim, certamente.

Mesmo se você nunca tiver visto ambos? Thaddeus perguntou.

Suas perguntas beiram a heresia agora... Os olhos do homem estreitaram enquanto inspecionava Thaddeus.

Thaddeus abriu a porta. O corredor estreito do lado de fora era ainda mais frio que a sala de interrogação. Por quê? Eu nunca vi céu ou inferno, mas eu acredito em ambos porque a igreja me diz que eles existem. Eles também me dizem que bruxas existem. Estou apenas falando que eu nunca tive a chance de chegar em uma verdadeira bruxa. Eu duvido que irei.

Mesmo se o clero acusar uma mulher de bruxaria? O escriba fechou a porta atrás deles.

Para mim, quando se trata da culpa ou inocência de uma pessoa, precisa de mais provas que algumas acusações de um padre pomposo. Lembre-se, padres são primeiramente homens. Homens cometem erros. Thaddeus puxou sua capa mais próxima de seu pescoço. Qualquer coisa para manter o frio longe de seu corpo quente. Ele precisava de comida. A falta de refeição afrouxou sua mandíbula.

O que você acha que o Conselho dos Dez iria pensar das suas crenças não ortodoxas? Ou o Papa? O homem agarrou sua mala de couro ao peito. Por medo ou por causa do frio amargo, Thaddeus não podia dizer.

Eu esperaria que eles concordassem que todos os homens podem se corromper. Pensar o contrário é ingenuidade. Eu tenho o ouvido do Doge, enquanto eu servir à sua vontade, eu acho que estarei bem. Você pode dizer o mesmo de sua burocracia? Você acredita que eles dariam suporte às suas acusações infundadas? Irá alguém defender suas decisões?

Então me diga como você sabe que aquela mulher não era uma bruxa? o escriba perguntou.

Thaddeus balançou a cabeça. Você acredita que um sacerdote é mais... santificado que um homem normal como eu?

Sim, é claro. O jovem escriba acenou com a cabeça.

Então se a mulher era uma bruxa, por que ela não me encantou para deixá-la ir? Por que ela não lançou um feitiço em você para nos matar? Por que ela não fez seu amante demoníaco vir nos transformar em uma pilha de sal e levá-la em uma coluna de chamas?

A boca do jovem homem oscilava enquanto tentava pensar em algo para dizer.

Você possui um nome, Escriba? Thaddeus perguntou.

Eu sou Geovanni de Pádua, escriba do Conselho dos Dez.

No portão, o par recolheu suas armas, uma adaga e uma rapieira para os dois. As ruas de Veneza eram civilizadas, mas duelos continuavam a acontecer quase que todo dia, e um movimento qualquer poderia começar um ataque. Melhor carregar armas e nunca precisar do que ser atacado e não possuir nenhuma defesa disponível. Depender da guarda da cidade seria pedir para morrer. Além do mais, como oficiais da corte, ambos tinham poucas chances de saber quando um cidadão desapontado colocaria para fora sua raiva do governo.

Thaddeus fez seu caminho fora da vila do Doge e andou sob o céu apagado. A praça estava cheia de pombos e vendedores ambulantes, mas poucos clientes visitavam a área no frio. Minha nossa, este é um grande título para um homem tão jovem. Eu lhe farei uma promessa. Se eu algum dia estiver na presença de uma bruxa, me certificarei que mandem uma mensagem para Giovanni de Pádua, escriba do Conselho dos Dez. Tenho certeza que vou querer ver a expressão na sua cara... se eu algum dia encontrar uma. Thaddeus deu uns tapas nas costas do jovem. Não se preocupe, eu acredito firmemente que você será um velho antes disso acontecer.

Thaddeus vislumbrou o céu antes de continuar. Escute, eu passei a maior parte da noite e do dia naquele buraco do inferno, trabalhando para ter aquela confissão. Eu me encontro esfomeado e sofrendo de grande sede. Se você não precisar mais de meus serviços... Eu preciso de um tempo. Você possui meu relatório em suas próprias mãos. Entregue ao conselho. Os juízes deverão fazer bom uso disso.

Mas— Geovanni tentou terminar seu pensamento.

E foi cortado por Thaddeus, Mas nada. Há uma amável taverna chamada La Scimmia não muito longe daqui, onde o vinho é quente, o mingau tem carne questionável dentro, e poucas mulheres irão me incomodar com ofertas de sexo. Vou dar um pulo lá. Acabamos por aqui. Thaddeus girou e partiu antes que o jovem escriba pudesse levantar alguma objeção.

Ele cuidou de seus deveres, e agora ele precisava cuidar de seu corpo. Após, ele precisaria cuidar de sua alma. O interrogatório o deixou maculado. Ele sabia que a mulher pagaria caro por sua confissão de roubo da igreja. Seria melhor admitir ser uma prostituta do demônio e se arrepender de seus pecados. Ela poderia ter se safado sendo enviada para um convento de freiras ao invés de queimar em uma estaca. Depois do café da manhã ele iria orar. Isso poderia diminuir o fardo de sua alma.

Thaddeus cruzou a ponte estreita onde botes preenchiam o canal abaixo e seguiu para um beco, com a pouca luz do céu nublado alcançou uma estrada pavimentada.

Nesta terra de comerciantes, uma mulher pode ser acusada de muitos crimes, e ela pode pagar para escapar da maioria, mas roubar do clero era um crime difícil de se escapar. O inquisidor não tinha muitas esperanças de que a mulher iria viver para ver o próximo amanhecer. Seu julgamento seria rápido e definitivo.

Ser uma prostituta era ruim, mas ser uma prostituta estúpida e ladra era mortal.

Ele empurrou a porta para uma de suas tocas favoritas, a taverna local conhecida como La Scimmia. Como foi nomeado O Macaco é uma história para outra hora.

Capítulo 2:

Thaddeus deslizou para o fundo da sala esfumaçada. O fogo sempre estava cintilante nesta época do ano, e a chaminé nunca era limpa até pegar fogo e a antiga graxa ser removida em uma labareda brilhante. Cinzas e fumaças pareciam preencher a maioria dos espaços públicos nesta época do ano. Não havia escapatória.

Maria, atrás do bar, deixou algumas ervas fervendo para manter longe as enfermidades. Muitos podem pensar nisto como uma forma de bruxaria, fermentando poções e essas coisas. Thaddeus não procurava por uma bruxa malvada atrás de cada atitude. Se fosse pressionada por uma explicação pela guarda noturna, ela diria que era uma sopa... um prato que ninguém pediu.

Alguns do clero iriam questionar a queima de ervas ou o uso de água quente para manter o mal afastado. Para Thaddeus, isso não era diferente dos incensários ou turíbulos que os padres queimavam através da península, ou dos médicos da peste com suas misturas herbais para se manterem a salvo.

Como poderia um ser bom e o outro ruim? Tudo se resumia àqueles com poder controlando alguns que não tinha o menor controle sobre suas vidas, ou qualquer coisa, realmente. Ele odiava o sistema, mas tinha pouca voz nele. Os influentes de cada cidade iriam fazer o que pudessem, com o poder concentrado em seus punhos, contra os impotentes.

Dada sua profissão, Thaddeus possuía o privilégio de ter uma mesa aguardando por ele neste pobre estabelecimento. Ele apreciava a solidão que comer sozinho oferecia. Mesmo na sala lotada, qualquer um que o conhecia manteria distância. Seu chapéu preto também manteria os curiosos longe. Com seu lugar perto do fogo assegurado, este era seu lugar favorito para comer e descansar.

A solidão o cabia bem. Ele não se importava de estar ao redor das pessoas, ele apenas não queria falar com elas. Ele passou sua vida com o pior tipo de indivíduos, e ele viu o pior que humanos podem fazer entre si. Um observador constante, ele sentaria nesta sala escura e observaria