A Psicologia junguiana entra no hospital: Diálogos entre corpo e psique
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Sobre este e-book
Ao ser entendida como símbolo, a doença torna-se uma fonte rica em informações, porque em parte mostra o aspecto objetivo, concreto e consciente, ao passo que, ao mesmo tempo, exprime um significado psicológico profundo, inconsciente de um ser humano.
Quando o profissional da área da saúde e o paciente conseguem compreender que simultaneamente à manifestação orgânica há, no plano psíquico, importantes eventos desencadeadores e até mesmo mantenedores da enfermidade, pode-se corrigir o desenvolvimento unilateral que contribui na manifestação da doença e,
desta maneira, se aproximarem da cura ou, ao menos, da melhora na qualidade de vida.
De uma maneira clara, as autoras mostram a possibilidade de entender o ser humano quanto ao seu aspecto biológico, psicológico e espiritual, inserido em um ambiente social. É proposta uma visão unitária entre psique e matéria como constituintes de uma realidade maior.
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A Psicologia junguiana entra no hospital - Sandra Fernandes de Amorim
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil
A Psicologia junguiana entra no hospital : diálogos entre corpo e psique / Fernanda Aprile Bilotta, Sandra Amorim (organizadoras) . -- São Paulo : Vetor, 2012.
Bibliografia.
1. Doentes - Psicologia 2. Pacientes hospitalizados - Psicologia 3. Pessoal médico e paciente 4. Psicologia junguiana 5. Sintomatologia I. Bilotta, Fernanda Aprile. II. Amorim, Sandra.
12-01123 | CDD – 150.1954
Índices para catálogo sistemático:
1. Psicologia analítica junguiana no trabalho da psicologia hospitalar 150.1954
ISBN: 978-65-89914-42-6
CONSELHO EDITORIAL
CEO - Diretor Executivo
Ricardo Mattos
Gerente de produtos e pesquisa
Cristiano Esteves
Coordenador de Livros
Wagner Freitas
Diagramação
Adriano Oliveira dos Santos
Capa
Rodrigo Ferreira de Oliveira
Revisão
Mônica de Deus Martins e Rafael Faber
© 2012 – Vetor Editora Psico-Pedagógica Ltda.
É proibida a reprodução total ou parcial desta publicação, por qualquer
meio existente e para qualquer finalidade, sem autorização por escrito
dos editores.
Sumário
APRESENTAÇÃO
PREFÁCIO
1. VAMOS BRINCAR DE FALAR SÉRIO? O JOGO DE AREIA COMO RECURSO EXPRESSIVO NO TRABALHO DE PRONTA-ESCUTA PSICOLÓGICA EM ENFERMARIA PEDIÁTRICA
Qual lugar cabe ao psicólogo no hospital?
Vida e movimento: breve conceituação de símbolo
Um breve contar de história e conceitos sobre o Jogo de Areia
Um olhar vale mais que mil palavras: um caso para discussão
Referências
2. O SAPO QUE NÃO VIROU PRÍNCIPE
: UM ENFOQUE SIMBÓLICO DA VIOLÊNCIA SEXUAL A PARTIR DA PSICOLOGIA ANALÍTICA
Violência sexual: uma breve contextualização
A violência sexual e a sombra
O pai: herói ou vilão?
Contos de fada ou histórias (muito) reais?
Referências
3. O CÂNCER DE MAMA: UMA COMPREENSÃO ARQUETÍPICA A PARTIR DE MITOS FEMININOS
Introdução
Aspectos gerais sobre o câncer
A importância do mito
O poder das deusas
A mulher Atena: a guerreira intelectual
A mulher Afrodite: a áura da beleza e da paixão
A mulher Deméter: o acalento materno
A mulher Hera: a esposa dedicada
Deusas adoecidas: o câncer de mama e suas repercussões na psique feminina
Considerações finais
Referências
4. A ATUAÇÃO DO PSICÓLOGO EM UM CENTRO DE REABILITAÇÃO FÍSICA: CONTRIBUIÇÕES DA PSICOLOGIA ANALÍTICA
Introdução
Breve apresentação dos pressupostos interdisciplinares em reabilitação física
Especificidades da atuação da Psicologia na reabilitação
A compreensão analítica em Psicologia da Reabilitação
O manejo do enquadre e os simbolismos da atuação profissional
Considerações finais
Referências
5. O DOENTE RENAL CRÔNICO SOB A ÓTICA DE SENEX: UMA COMPREENSÃO ARQUETÍPICA DA INSUFICIÊNCIA RENAL CRÔNICA
Insuficiência renal crônica e suas implicações na vida do portador
Cronicidade psíquica do doente crônico
Psicologia Arquetípica e suas contribuições à Psicologia Analítica
A importância do mito enquanto recurso de conhecimento da psique humana
O mito de Cronos
Cronos e o arquétipo do senex
Correlações do mito com a experiência da cronicidade
Referências
6. IDENTIDADE FEMININA EM MULHERES HISTERECTOMIZADAS: O ENFOQUE DA PSICOLOGIA ANALÍTICA NO TRABALHO DA PSICOLOGIA HOSPITALAR
Introdução
Considerações a respeito da histerectomia
A respeito da identidade feminina
O feminino, a identidade feminina e a relação com o corpo na visão da Psicologia Analítica
A anima e o relacionamento com o outro interno e externo
A importância do símbolo
Conclusão
Referências
7. DA MORTE SIMBÓLICA À MORTE REAL: O PROCESSO DE INDIVIDUAÇÃO EM PACIENTES TERMINAIS
A vivência da morte e seus desdobramentos
Processo de individuação
Caso clínico: o percurso de A. diante da morte
Referências
SOBRE OS AUTORES
APRESENTAÇÃO
A sintomatologia de uma doença é ao mesmo tempo uma tentativa natural de cura.
(Jung, 1947, p. 86)
Instigadas a demostrar como a psicologia analítica, também conhecida como junguiana, poderia ser aplicada tanto no entendimento quanto no tratamento de pacientes portadores de doenças orgânicas, nos reunimo-nos para apresentar e discorrer sobre nossa experiência dentro de instituições da área da saúde.
Para que se tenha a real dimensão do que representa a concepção analítica sobre uma doença, é importante ressaltar que desde o final do século XIX vigora fortemente o modelo biomédico. Este pressupõe o corpo como um conjunto de órgãos e vísceras cujo funcionamento deve se dar de modo impecável, quase infalível, para ser considerado saudável. Perde-se, portanto, a dimensão simbólica, a qual engloba os sonhos, fantasias, emoções, lembranças e medos relacionados ao processo de adoecimento.
Ao tratar apenas dos processos orgânicos, a medicina encerra o indivíduo em uma condição exclusivamente objetiva, negligenciando o fato de que a doença não é apenas um corpo a reparar. Dentro dessa concepção biomédica, a saúde deve ser mantida ou conquistada pelo controle das reações orgânicas.
Entretanto, com o desenvolvimento de estudos ligados à psicossomática (Heiroth, Dunbar), histeria e mecanismos de conversão (Freud) e doenças de adaptação (Seyle), o significado de ser saudável vem ganhando uma nova dimensão. Não basta mais saber sobre como tratar o que ocorre no organismo. Busca-se tentar compreender o indivíduo de forma integrada, levando em conta sua história de vida e sua relação com o meio que lhe cerca.
Nessa perspectiva, o entendimento simbólico da doença nos leva a correlacionar os aspectos somáticos com as associações psicológicas que a pessoa (neste caso, o paciente) possa fazer entre ambos. Assim, sentimentos, imagens e fantasias que emergem possuem uma ligação íntima com a manifestação biológica do indivíduo.
Ao ser entendida como um símbolo, a doença torna-se uma fonte rica em informações, porque, em parte, mostra o aspecto objetivo, concreto e consciente, ao passo que, ao mesmo tempo, exprime um significado psicológico mais profundo, inconsciente de um ser humano.
Simbolicamente, a doença está a serviço do self, ou seja, da totalidade da psique, no sentido de corrigir ou compensar uma atitude unilateral da consciência, revelando, pela sua presença, aquilo que deve ser conscientizado e elaborado ao se compreender seu significado.
O que tentamos neste livro foi ampliar a visão do leitor quanto a sua própria dimensão corporal. Cada autora, à sua maneira, procurou mostrar a possibilidade de entender o ser humano quanto ao seu aspecto biológico, psicológico, espiritual (lembrando que este último se faz presente no discurso da maioria dos pacientes), inserido em um ambiente social. Propomos uma visão unitária entre psique e matéria como constituintes de uma realidade maior.
Sobre essa questão, Jung (1947, p. 152) descreveu:
psique e matéria estão encerradas em um só e mesmo mundo, e acham-se permanentemente em contato entre si... e não há só a possibilidade, mas até mesmo uma certa probabilidade de que matéria e psique sejam dois aspectos aspectos diferentes de uma só e mesma coisa [...].
Quando o profissional da área da saúde e o paciente conseguem compreender que simultaneamente à manifestação orgânica há no plano psíquico importantes eventos desencadeadores e até mesmo mantenedores da enfermidade, buscando quais são esses elementos e confrontando-os de modo sincero, pode-se corrigir o desenvolvimento unilateral que contribuiu para a aparição da doença e, dessa maneira, se aproximar da cura.
PREFÁCIO
Este livro merece um acolhimento especial por parte de médicos, psicólogos e demais profissionais da área de saúde, por duas grandes razões: a primeira é por divulgar a prática da dimensão simbólica no hospital; a segunda é por tornar essa dimensão facilmente acessível a terapeutas que trabalham cotidianamente dentro da necessidade de compreensão e compaixão pelo sofrimento daqueles que buscam tratamento e alívio.
A dissociação do subjetivo e do objetivo, que criou o materialismo do século XIX data do final do século XVIII, quando a ciência venceu a Inquisição e tomou o poder na universidade. Infelizmente, porém, ao libertar a dimensão científica da intolerância, eliminou também a subjetividade e, junto com ela, a emoção, o sentimento e a fé.
Decorridos mais de dois séculos dessa dissociação, o materialismo científico continua deformado e deformando a relação terapeuta-paciente. O desenvolvimento tecnológico extraordinário distoa do atraso e da limitação da humanização do relacionamento terapêutico.
Ainda que as obras de Freud, Jung e da maioria das escolas da psicologia moderna enfatizem a importância da subjetividade nos relacionamentos humanos, a força curativa da transferência continua significativamente ignorada, sendo o efeito placebo atribuído, no mais das vezes, exclusivamente a uma reação subjetiva não planejada e indesejada.
Ao tornar a dimensão simbólica inseparável do relacionamento terapêutico, as autoras renegam corajosamente a dissociação subjetivo-objetivo e assumem a emoção, o sentimento, a esperança e a fé como inseparáveis dos procedimentos objetivos para socorrer os que sofrem.
Por isso, elas merecem admiração e incentivo, ao apresentarem aqui a ideologia de sua abordagem, junto com os métodos objetivos empregados, o que torna este livro de grande interesse.
São Paulo, dezembro de 2010.
Carlos Byington
1
VAMOS BRINCAR DE FALAR SÉRIO? O JOGO DE AREIA COMO RECURSO EXPRESSIVO NO TRABALHO DE PRONTA-ESCUTA PSICOLÓGICA EM ENFERMARIA PEDIÁTRICA
Simone Corrêa Silva
O caminho pelo qual o rio da vida tem que seguir em sua travessia está escrito nas areias.
Lenda das Areias
Qual lugar cabe ao psicólogo no hospital?
O trabalho do psicólogo no hospital implica um se deparar frequente e recorrente com o inusitado, o imprevisto e o improviso.
No contexto hospitalar, o tempo é o do aqui e agora. As emoções, muitas vezes, estão à flor da pele. Lá, a pele, de um modo geral, cobre dores d’alma e de corpos doentes. E o corpo, por sua vez, está sujeito às manipulações e decisões de outros que, geralmente, nunca se viu antes.
Para o psicólogo lidar com essa realidade, é preciso ter claro seu lugar nesse contexto, a fim de saber o que, para que e como fazer ali.
Seu lugar – que não é físico, mas se trata de espaço e tempo atitudinais – é o da escuta despretensiosa de julgamentos, disponível e debruçada ao outro que ali está em trânsito pelo hospital, que clama por atenção e cuidado e que por algo sofre e para algo solicita sentido. Trata-se de uma prontidão para o encontro com o outro, independentemente do que ele carrega; não para lhe aliviar ou lhe conceder respostas, mas para lhe acompanhar com zelo e solicitude em sua busca de sentido naquela situação do encontro (SILVA, 2011).
A atitude ética do psicólogo será seu fio condutor na habitação de seu lugar no hospital. Ética, no sentido etimológico da palavra. Do latim éthos e ethicus e do grego ēthikos, que se referem a uma conduta e a um modo próprios de habitar sua morada. Assim, com um jeito particular de colocar em prática suas ações, sua prontidão e disponibilidade desenham quem esse profissional é e a quem ele serve no hospital – a saber, ao encontro do que for possível, entre paciente/família e psicólogo, em meio ao contexto da equipe multidisciplinar.
Em uma unidade de enfermaria pediátrica, sua atitude ética requer um olhar redobrado, pois além de haver uma criança como paciente, também há um familiar – geralmente, sua mãe – que o acompanha no trânsito pelo hospital, ambos em busca de cuidado.
A criança percorre no hospital um caminho atravessado por exames, manipulações, perguntas e olhares, os quais podem lhe infligir uma experiência de violência, se não houver um cuidado em relação à maneira com a qual os procedimentos multidisciplinares são realizados – incluindo-se, aqui, os do psicólogo. Essa experiência de hospitalização é contextualizada, ainda, por uma quebra de rotina e mobilização de sentimentos e fantasias diversas.
A infância não pode, de modo algum, ser descartada em uma unidade pediátrica. Aliás, muitas vezes, ela precisa ali mesmo ser resgatada, pois, inúmeras vezes, se mostra (quase) perdida. Mas, se atentarmos bem, a criança sempre a carrega consigo, mesmo nos momentos em que a presença do arquétipo do senex, ou do velho sábio, a transporta a um modo maduro de encarar sua doída realidade.
Furth (2004, p. 25) considera que o velho sábio
acompanha as crianças moribundas, as quais ele denomina jovens na idade mas velhos no espírito
, como forma de se prepararem para enfrentar a trajetória de dor e sofrimento.
O olhar atento do psicólogo às mães que acompanham as crianças na internação também deve implicar a dimensão pessoal de sofrimento destas. Elas também foram retiradas
da rotina de suas vidas e, geralmente, conciliam o mundo externo do hospital com sua presença ao lado do filho internado – o que lhes custa um jogo de cintura desgastante e atribulador.
No entanto, à demanda de quem o psicólogo vai atender no hospital?
Para esboçar uma resposta a isso, penso ser necessário trazer uma definição etimológica das palavras demanda e clínica. A palavra demanda, do latim demandare, que em sua origem significa confiança e entrega, nos remete à ideia de procurar, buscar, caminhar para algo. Clínica, por sua vez, origina-se de klinein, do grego, traduzindo-se em debruçar-se ao leito (klin), em uma prática própria de cuidado, oferecendo escuta a um sofrimento (MORATO[1], 2008).
Sendo assim, o psicólogo deverá dirigir sua atitude clínica à demanda que lhe for confiada em cada encontro possível no hospital. Ou seja, caberá a ele se prontificar a debruçar atenção e zelo à confiança que lhe for remetida para que caminhe junto com o paciente e/ou sua família na busca de cuidado e atenção, a partir do que puder surgir naquele encontro.
Muitas vezes, nesse sentido, as demandas da equipe (que solicita atendimento psicológico a um caso), da criança e de sua mãe podem ser todas diferentes umas das outras. Porém, pode haver um eixo comum a todas elas. O caminho para trabalhar cada uma é que pode ser diferente. O que permanece igual é o trabalho de sempre resgatar no paciente/familiar sua capacidade de autocuidado, acolhendo-o, mas sem excluir-lhe sua responsabilidade naquilo que lhe cabe em seu percurso no hospital. Isso vale para as demandas que a equipe apresenta, também oferecendo-lhe atenção a suas dificuldades, mas apontando-lhe e/ou questionando-lhe possibilidades reais de enfrentamento de tais demandas como o paciente/familiar, restituindo-lhe os potenciais e a responsabilidade de sua tarefa, no trabalho de fazer chegar ao outro o cuidado.
Penso que qualquer ato psicológico nessa situação deva estar pautado, primeiramente, em uma atitude de escuta e atenção para a necessidade que o outro lhe apresenta e lhe solicita, isto é, para sua demanda. Uma vez que a atitude se traduz em ações, alicerçado nessa atitude clínica, o psicólogo terá condições para oferecer um espaço de acolhida ao sofrimento, possibilitando-lhe cuidado, resgate e criação de sentido(s).
Entendo essa atitude, ainda, fortemente relacionada ao arquétipo do curador-ferido (GROESBECK, 1983), à medida que o psicólogo deve cuidar ele mesmo daquilo que a ferida do outro lhe suscita e, (só) assim, poderá lançar-se à disponibilidade de caminhar com esse outro no percurso dessa vivência de violência, podendo inclinar-se, portanto, para aquilo que houver de mais genuíno no conteúdo que o paciente carrega nesse percurso no hospital.
É essencial ter sempre claro que essa atitude implica uma ausculta da demanda no sentido de que o paciente a perceba e esta ressoe nele próprio, a fim de que ele possa reconhecê-la como sendo sua necessidade. E que também, ele a identifique e a interpele para um curso de atenção, cuidado e de criação e/ou resgate de sua significação e seu direcionamento (MORATO, 2008).
Fomentando suas ações com essa atitude, o psicólogo acompanhará o paciente/familiar de forma cuidadosa, continente e disponível no clareamento de sua necessidade naquele momento e circunstância. Isso é válido tanto para a criança quanto para o adulto que o acompanha na internação hospitalar, geralmente sua mãe. E, à medida que essa tentativa de que a demanda seja esclarecida para e a partir do próprio paciente, pode ser refletido e ressignificado junto com ele um caminho para o enfrentamento e encaminhamento dessa demanda.
A relação mãe-criança deverá sempre ser fomentada e receber atenção, quando e a partir do possível, no hospital.
A ligação da criança com a figura materna proporciona a uma criança o sentimento de um incontestável direito à existência
; além disso, lhe possibilita condições saudáveis de entrar em contato com seu próprio corpo e com a presença de uma outra pessoa, compartilhando intimidade psíquica e corporal (KAST, 1997, p. 13). Para a experiência de hospitalização, em especial, essas condições de a criança se permitir estar em contato com sua própria intimidade e com a aproximação corporal ou psicológica de outra pessoa pode lhe proporcionar uma estadia o menos angustiante e traumática possível.
O psicólogo pode dispor (ou não) de diversos recursos nessa jornada clínica em setting hospitalar. Especialmente com a criança, penso ser essencial que não se deixe de recorrer ao lúdico. O brincar, como é sabido, conecta a criança com seu mundo interno, a aproxima de seu cotidiano por meio de uma linguagem que lhe é própria e, assim, a auxilia no desenvolvimento de aspectos criativos de sua psique rumo a seu crescimento pessoal.
Encontro no Jogo de Areia um instrumento que se mostra satisfatório enquanto recurso simbólico para a expressão verbal e não verbal de conteúdos diversos que surgem nos encontros de pronta-escuta psicológica dentro do contexto hospitalar. Um recurso com características consonantes com essa postura de escuta, cuidado e atenção, em paralelo ao lúdico.
Vida e movimento: breve conceituação de símbolo
A palavra símbolo, ou symbolon, surgiu a partir do verbo grego symballo e, etimologicamente, significa amontoar, multiplicar, unir, estabelecer ligação (JACOBI, 1990).
Para Jung (1995), o símbolo sempre aponta para uma compreensão que vai além daquela que pode ser apreendida e percebida conscientemente.
De acordo com Silveira (1997, p. 71),
um símbolo não traz explicações; impulsiona para além de si mesmo na direção de um sentido ainda distante, inapreensível, obscuramente pressentido e que nenhuma palavra de língua falada poderia exprimir de maneira satisfatória.
Jung já dizia que o símbolo é algo vivo e a própria situação em si mesma, pois se refere a acontecimentos dinâmicos, e não apenas a imagens estáticas. Aliás, os símbolos não são estáticos, e estão sempre em movimento, apontando sentido(s) e percorrendo, concomitantemente, os mundos do consciente e do inconsciente. São produzidos natural e espontaneamente pela psique.
Os símbolos possuem a função de transformar energias. Sua manifestação por meio de imagens incita processos dinâmicos de atividades de aproximação e conciliação entre conteúdos conscientes e inconscientes, buscando uma ampliação e transformação da consciência.
Para Jung (1964), o símbolo possui sempre uma comunicação que não pode se dar apenas racionalmente