Entre Deuses E Feras
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Entre Deuses E Feras - Aldair Sandes Loureiro
ENTRE
DEUSES e FERAS
Aldair Sandes Loureiro
1
ENTRE
DEUSES e FERAS
Aldair Sandes Loureiro
2
SUMÁRIO
Capítulo I - Egito – Dias atuais .................................................................. 3
Capítulo II - Bósnia-Herzegovina ............................................................ 33
Capítulo III - Escócia – Lago Ness .......................................................... 64
Capítulo IV - Peru – Caral e Lima ........................................................... 75
Capítulo V - Peru – Cusco ....................................................................... 86
Capítulo VI - Guatemala – Tikal, Petén ................................................ 109
Capítulo VII - México – Chichén Itza ................................................... 120
Capítulo VIII - Brasil – Amazonas ........................................................ 126
Capítulo IX - Brasil – Estado do Espírito Santo .................................... 155
Capítulo X - Brasil – Monte Mochuara ................................................. 162
Capítulo XI - Egito – Cairo ................................................................... 167
Interlúdio – Tahia e Anna ...................................................................... 174
Epílogo – 10 anos depois ....................................................................... 180
3
À minha esposa Valéria;
Entre Deuses e Feras
Minha filha Bianca;
Minha sobrinha Ingrid, leitora assídua
e incentivadora.
4
Capítulo I
Egito – Dias atuais
Hórus Muhamed era seu nome. Há dois meses foi contratado como
guarda noturno nas Grandes Pirâmides de Gizé, no Egito. Homem alto, de
compressão forte, o nariz longo e curvo típico de seu povo, trabalhava noi-
te sim e outra não, naquele local.
A visitação dos turistas encerrara-se há algumas horas e era dever de
Hórus verificar se havia algum turista desgarrado nos salões, bem como
apagar algumas luzes e trancar várias portas.
A noite caíra rápida e o frio invadia aquele local repleto de pedra e
areia. Um vento frio soprava entre os corredores. O vigia virou-se rápido
para o salão que acabara de deixar para trás. Pensou ter ouvido um estra-
nho ruído.
– وه يأ صخش ؟كان ه - Tem alguém aí? – Gritou Hórus com seu árabe
rústico.
O outro vigilante devia estar há quase dois quilômetros de distância,
pensou Hórus. Aproximou-se do salão, a mão direita no cabo da pistola
israelita que carregava na cintura. No ombro um walkie talkie.
O salão era um local de exposição no qual fora recém-aberto uma
mostra dos deuses antropozoomórficos do antigo Egito.
De repente o olhar do vigilante dirigiu-se para o alto. Sobre a pirâmi-
de maior uma estranha nuvem negra formou-se e começou a emitir raios
elétricos.
– Essa é nova – murmurou Hórus para si mesmo – eu nunca vi algo
assim por aqui.
Tentou acionar o rádio comunicador, mas esse fez apenas estática,
chiando muito.
– Hamahdi, está me ouvindo? – Chamou Hórus no rádio tentando
contactar o outro vigia. – Preciso de você aqui! Tem uma tempestade e
acho que vamos ter que desligar os geradores e holofotes...
O rádio chiou novamente.
– Vou me abrigar – pensou Hórus temeroso – um desses raios pode
me acertar, estou cheio de metal nesse uniforme.
Novamente um barulho chamou a atenção do vigia. Algo como uma
implosão surda. Hórus buscou abrigo sob uma marquise.
De súbito uma figura humana surgiu sobre um dos muros de pedra.
Assustado, o vigia sacou da arma, mas antes que pudesse aponta-la a figu-
5
ra, com uma rapidez assustadora saltou sobre ele. Quando deu por si, seu
braço estava sangrando e sua arma caiu longe.
Com a luz de um relâmpago, Hórus pôde enxergar o ser que estava
sobre ele, o que conseguiu ver foi a face de um felino, de uma pantera, mas
as mãos que o agarraram eram as mãos de uma mulher.
– P-por favor, não me mate – suplicou o vigia.
A criatura colocou a mão aberta com unhas longas e pretas sobre a
fronte do homem que viu um amontoado de imagens surgir em sua mente,
imagens de objetos, de pessoas, de veículos, dinheiro; era como seus pen-
samentos estivessem sendo subtraídos. Sentiu-se fraco e tonto e caiu sen-
tado.
Tão rápido como saltou sobre o vigia, a criatura saltou para cima das
antigas construções de pedra e desapareceu nas sombras.
Novos relâmpagos, ventania e tempestade de areia, uma nova e gran-
de figura humanoide surgiu da escuridão e aproximou-se. A luz do raio re-
velou uma cabeça de leão em um musculoso corpo de homem, vestido
com uma túnica avermelhada com detalhes metálicos dourados.
– Anhur... – balbuciou Héros pensando no deus egípcio da guerra que
vira na exposição do salão arqueológico.
6
O ser aproximou-se. O vigia estava sem forças para escapar, tentou
arrastar-se pelo chão arenoso, mas foi impedido pela grande mão que mais
pareciam garras.
O Homem-Leão segurou o braço ferido do vigia, passou o dedo na
ferida. Hórus fez uma expressão de dor. O ser cuspiu na mão e passou a
saliva na ferida.
O vigia pôde ver o machucado fervendo como se houvesse passado
água oxigenada e a ferida se fechou, restando apenas uma fina cicatriz.
O Homem-Leão também colocou a mão espalmada na fronte do vigia
que sentiu novamente a sensação de que seus pensamentos estavam sendo
subtraídos.
O vigia cerrou os olhos e quando os abriu novamente estava sozinho.
A tempestade elétrica se desvaneceu tão rápida como se iniciou. Hórus ou-
viu o barulho de um veículo aproximando-se, tentou gritar por socorro,
mas sua voz não saiu.
O veículo era um jipe antigo, o outro vigia Hamahdi correu ao en-
contro do colega caído.
– Muhamed, você está bem?
– Bastet... Bastet... – repetiu Hórus sussurrando.
– Bastet? Bastet é a deusa com cabeça de gato – observou Hamahdi
estranhando – não estou entendendo. Alguém tentou roubar a imagem de-
la?
– Bastet...
– Algum raio deve ter acertado você, amigo – observou o outro vigia
levantando o colega e ajudando-o a prosseguir ao jipe – eu vou chamar o
inspetor chefe e te encaminhar ao hospital.
Hamahdi voltou e pegou a arma do amigo que estava caída e viu
sangue no chão. Intrigou-se, pois não viu ferimento no amigo. Entrou no
jipe e saiu rapidamente em direção ao prédio da administração do local.
De longe o Homem-Leão observou tudo
com sua visão apurada. Concentrou-se e suas
feições foram mudando. Em poucos segundos
aparentava ser um homem com aspectos egíp-
cios, alto e musculoso.
O ser com aspecto humano caminhou por
entre as construções. Bem a frente encontrava-
se um estábulo com alguns camelos que eram
alugados para os turistas.
Ao vê-lo o camelo ajoelhou-se com as pa-
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tas da frente, abaixando-se para que o homem o montasse. Rapidamente o
homem selou o animal e o montou. Partiu a madeira que servia como por-
teira do estábulo como se fosse um graveto e avançou em direção à cidade.
Está no ar o Jornal do Cairo - vinheta - a câmera fecha no repórter
de terno.
– Bom dia! Essa noite no complexo das Pirâmides de Gizé, um vigi-
lante foi atacado por uma pessoa mascarada durante uma pequena e sur-
preendente tempestade elétrica. O vigilante, aparentemente desorientado,
foi atendido no posto médico do complexo e liberado. Acredita-se que um
dos raios o teria atingido também. Segundo informações, o vigilante não
teve ferimentos físicos e nada foi roubado do local. A força policial acre-
dita tratar-se de um trote promovido por jovens.
– Pela manhã, um policial foi encontrado desacordado junto às ga-
lerias do centro do Cairo. Após acordar, mostrou-se desorientado, mas
depois se recobrou e passa bem...
O homem alto e forte viu o noticiário da calçada da loja de eletrôni-
cos, no centro da grande cidade do Cairo. Andou por entre a multidão e
dirigiu-se a uma galeria escondida por entre os prédios antigos.
Bem ao fundo, havia uma pequena placa em árabe: Ourives. O ho-
mem entrou e viu no interior um senhor calvo de baixa estatura e grandes
óculos que imediatamente levantou-se para atendê-lo.
– Bom dia senhor, sou Al Khalid, em que posso ajudá-lo?
– Quero vender essa peça – respondeu o cliente colocando um pe-
queno escaravelho brilhante sobre o balcão.
– Mas o que é isso? O senhor por acaso tem a nota de compra e ven-
da desse objeto?
– Se tivesse não teria vindo aqui.
O ourives segurou a peça, colocou uma lente no olho e analisou-a.
era um diamante puro em forma de escaravelho.
– Não é possível! Jamais vi algo assim – sussurrou o ourives.
– A peça tem um valor incalculável, mas quero apenas 300 mil em
espécie.
– Você deve estar brincando...
O homem apenas lançou um olhar sério para o vendedor. Um olhar
quase hipnótico.
8
– Eu não brinco.
– Vou ter que mandar buscar o dinheiro no banco – disse o ourives
fitando aqueles olhos brilhantes.
– Eu aguardo.
– Como chegou a mim?
– Um amigo o indicou. Disse que você não faz muitas perguntas
quando vê uma boa oportunidade.
– Seu amigo me conhece bem. Vou fazer umas ligações.
Enquanto o homem fazia as ligações ao telefone, o cliente afastou-se
um pouco e viu sobre uma mesa do canto um livro que lhe chamou sua
atenção. O título: "Deuses Egípcios, seres superiores? " por Tahia Sadat.
Apanhou o livro e o foliou rapidamente.
– Gostou do livro? – Perguntou o ourives. – Pode pegar para você.
Ela, a escritora, é uma grande estudiosa dos assuntos egípcios e estará hoje
na cidade.
O cliente guardou o livro dentro da túnica que usava. Em sua mente,
uma ideia começou a florescer.
Algum tempo depois, um homem chegou com uma maleta e o ouri-
ves chamou o cliente para uma sala à parte.
– Sabe que corro risco de estar comprando uma peça dessas sem a
documentação necessária – comentou o ourives quase sussurrando.
– Não precisa ter medo – respondeu o cliente – não é uma peça ilíci-
ta.
O ourives abriu a maleta com vários maços de notas de Libras Egíp-
cias e a entregou ao cliente.
– Vai sair com todo esse dinheiro? É perigoso – alertou Al Khalid.
– Preocupe-se com você e com seu negócio – disse o cliente seca-
mente – foi bom negociar com você.
O homem misterioso saiu. Al Khalid analisou novamente a joia que
comprara, só o diamante valeria uns 600 mil, lapidado naquela forma, po-
deria ser vendido por quase um milhão. Precisava fazer uns contatos.
Pouco depois entrou no comércio um jovem rapaz, era funcionário
do ourives.
– Você não seguiu o homem como eu pedi? – Gritou Al Khalid que
mandava seguir todos os clientes por um tempo para ter certeza que eles
não eram policiais.
– Eu tentei, mas quando saiu da galeria, parece que ele sumiu na
multidão – desculpou-se o rapaz dando de ombros.
– Isso não é bom sinal.
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– Mas não tinha policias por perto – comentou o rapaz – eu circulei
por toda a quadra e redondezas como você me orientou.
– Menos mal. Hoje foi um dia estranho.
لي ت ي فوس ور يا ك ةر يزج لا لي ن لا
Sofitel Cairo Nile El Gezirah, um extenso nome para um luxuoso ho-
tel situado às margens do Nilo. Amplo, com cassinos, área de lazer e espa-
çosos auditórios, foi o local que a escritora, historiadora e jornalista Tahia
Sadat escolhera para ministrar suas palestras.
Tahia Sadat era uma bela mulher de 38 anos de idade, alta, magra,
cabelos e olhos negros, filha de um grande historiador, geólogo e arqueó-
logo, Hathor Sharef Sadat. Trajava um bonito vestido de cores sóbrias e
um lenço cor de vinho que cobria sua cabeça na tradição árabe.
Tahia sentia-se orgulhosa de ser uma mulher com alto nível de esco-
laridade, de ter cursado universidade, mestrado e doutorado em sua tenra
idade em um país em que as mulheres nem sempre eram valorizadas. Cur-
sou História Antiga e Arqueologia na University of Oxford no Reino Uni-
do, tudo graças à grande influência de seu pai, também historiador.
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Atualmente suas palestras e aulas contavam com um bom público.
As descobertas que fizera sobre a cultura e a religião do antigo Egito cau-
savam polêmicas e calorosas discussões.
Basicamente acreditava que os deuses egípcios eram seres superiores
que trouxeram à população antiga do país um vasto conhecimento arquite-
tônico, astronômico e humanístico.
Ao final da leitura de seus livros ou de suas palestras era possível
perceber que para Tahia, os deuses deveriam ser extraterrestres, seres de
outros mundos ou dimensões, apesar de que ela evitava esses termos, não
muito aceitos nas comunidades científicas e acadêmicas.
Na palestra que acabara de ministrar, por exemplo, levantou-se da
plateia um jovem estudante espanhol para fazer um aparte.
– A doutora está dizendo que os deuses egípcios eram extraterres-
tres? – Perguntou o rapaz em inglês britânico.
– Meu caro – respondeu Tahia Sadat também respondendo em inglês
– estou demonstrando fatos e descobertas de meus estudos de documentos,
artefatos e tradições antigas, para que você chegue a alguma conclusão.
Algumas pessoas soltaram ruidosa gargalhada pelo domínio de situa-
ção da palestrante.
Uma jovem mulher aproximou-se, era Anna Muhenat, estudante e
secretária de Tahia. Bonita, de 22 anos de idade, Anna admirava muito sua
mestra que lhe ajudava nos estudos e na vida.
– Foi uma bela palestra doutora – elogiou Anna.
– Obrigado. Vou para o quarto descansar – disse a doutora Tahia –
como está minha agenda?
– Hoje está fechada – respondeu a secretária consultando um tablet –
amanhã tem um almoço com o diretor da Universidade do Cairo e mais a
tarde uma visita ao acervo do Museu que será transportado para as novas
instalações, à noite ficaram de confirmar com você uma nova palestra.
– Certo. Você vai sair?
– Sim – sorriu Anna – alguns amigos da faculdade vão ao restaurante
aqui perto em uma pequena confraternização. Vai precisar de mim?
– Não. Está liberada. Não consuma bebida forte.
– Eu não bebo.
– Volte em grupo, de preferência de carro, não fique andando sozi-
nha pelas ruas, à noite.
– Tudo bem, doutora, você está certa.
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– Ainda há casos de abuso de mulheres que andam solitárias à noite,
devemos tomar cuidado – orientou Tahia – conquistamos muitos direitos,
mas muitos homens ainda não aceitam.
– Eu entendi.
– Leve o celular e me ligue se tiver algum problema.
– Vou estar com amigos, não se preocupe.
– Desculpe o zelo, é que já passei momentos difíceis quando saí com
alguns amigos acadêmicos certa vez. Eles beberam muito vinho e se dis-
persaram e precisei ligar para meu pai para buscar-me, mas como você fa-
lou, é uma experiência minha. Boa diversão.
Anna beijou o rosto da doutora e se afastou. Tahia caminhou para os
elevadores. Estava hospedada em um quarto no vigésimo andar do hotel.
Tahia Sadat passou o cartão no painel da entrada do quarto que servia
de chave e adentrou no luxuoso apartamento. Um arrepio passou pela sua
nuca e sentiu-se estranha.
Correu os olhos pelo quarto e avistou muitos livros seus sobre a me-
sa. Tinha certeza que não os deixara ali. Institivamente abriu sua bolsa e
sacou uma pequena pistola, uma arma de fogo que fora presente de seu
pai.
Deu alguns passos com cuidado e por trás de uma coluna viu a perna
de alguém. Abrigou-se atrás da coluna e viu o belo homem, alto, musculo-
so, olhar sereno, trajando roupas caras, sentado no sofá com uma maleta ao
lado. Apontou a arma para ele.
– Fique parado – gritou a doutora em árabe – tenho uma arma e sei
usá-la!
– Olá, doutora Tahia Sadat – cumprimentou o homem com uma voz
grave, serena e bonita – não vim causar-lhe mal.
Tahia já ouvira falar de agressores que não aceitavam a ascensão de
mulheres árabes e egípcias e por isso as agredia e matava, por isso não
abaixou a guarda.
– Eu vou chamar o segurança do hotel – gritou a doutora – não sei
como você entrou aqui, mas é melhor sair.
– Acalme-se doutora – disse o homem – quero lhe fazer uma pergun-
ta: você acredita mesmo em tudo que escreveu?
– Que espécie de pergunta é essa? Quem é você? Pagaram-te para in-
vadir meu quarto e me agredir?
O homem