Estradas & Canções
De Ac De Paula
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Estradas & Canções - Ac De Paula
Copyrigth © Antonio Carlos de Paula
Projeto gráfico:
Editora Ixtlan
Diagramação:
Márcia Todeschini
Revisão:
Bruna Longobucco
Capa:
Marcos Ferreira
de Paula, Antonio Carlos
Estradas e Canções – São Paulo/SP Ed. Ixtlan, 2015.
ISBN: 978-85-8197-382-1
1. Literatura brasileira. 2.Música
CDD 869
Contato com o autor:
acdepaula09@gmail.com
www.antoniocarlosdepaula.com
Proibida a reprodução total ou parcial dos textos para
qualquer fim, sem autorização prévia e por escrito do autor.
Os infratores serão punidos na forma da lei.
2
APRESENTAÇÃO
Por mais paradoxal que seja, artista
independente é exatamente aquele que
depende de uma serie de fatores e
circunstâncias para colocar o seu talento na
vitrine do mundo. Há muito tempo a música
que se ouve no rádio e na TV não representa
de forma unânime o que se produz de
qualidade no panorama musical do Brasil.
Além, muito além do glamour das badalações e
holofotes, distante das graças da grande mídia sobrevive o universo do cenário musical independente. Nada contra os artistas taxados de ostentadores
, assíduos frequentadores das capas de revistas, até porque uma grande parte deles já cuspiu tijolo depois de engolir tanto pó na estrada árdua que leva ao sucesso, e na verdade todos nós buscamos um lugar
ao sol, mas infelizmente o mundo não é justo!
Sou mais velho do que a maioria dos estradeiros, e
muito menos jovem do que a garotada sangue novo no palco dos festivais, e venho aprendendo a admirar cada vez mais a
qualidade diversificada desses talentosos festivaleiros.
É muita poesia e musicalidade à flor da pele, não sei
ao certo, mas creio que poucos são os artistas festivaleiros que se tenham dado conta de quanto cada um é privilegiado por fazer parte desta constelação de diversificados talentos.
Não vou citar nomes para não cometer injustiça e o pecado de
esquecer qualquer um deles. A integração é total. É comum ver um artista cantando a sua música, e outro que também já
se apresentou ou ainda vai se apresentar auxiliando e tocando
algum instrumento ou fazendo vocal. Todos se integram e se entregam aos desígnios da arte.
A constelação da MPB é privilegiada por poder contar
com essas estrelas de primeira grandeza, que na grande
maioria das vezes não conseguem fazer com que o brilho do 3
seu talento seja admirado com a magnitude merecida. Mas isso não os impede de botarem o pé na estrada, arcando com
o ônus de fazer acontecer, mesmo sabendo que a qualidade de seu trabalho, o brilho da sua apresentação, a qualidade de
seus poemas e canções não são garantia de sucesso e nem blindagem contra o chumbo a que todos nós estamos sujeitos.
A disputa deve se limitar apenas ao momento da
apresentação no palco. Lá em cima cada um defende a sua verdade, a sua utopia, o seu sonho, a sua canção e poesia!
É evidente que o mundo dos festivais não é uma Ilha da
Fantasia onde não existem senões e contratempos, afinal o ser humano não é perfeito, os festivaleiros há mais tempo na estrada, inclusive os grandes vencedores por mais incrível que
possa parecer, não têm o rei na barriga, ao contrário são simples, cordiais e prestativos, mas existem neste cenário figuras talentosas ainda em ascensão, que se julgam a ultima
Coca Cola no deserto. É louvável a postura de alguns secretários de cultura, organizadores, e patrocinadores que se
empenham em difundir e divulgar a arte musical através dos festivais, muito embora em alguns desses eventos, ainda hajam alguns questionáveis critérios de triagem, seleção, classificação, e distribuição de premiação.
Antes e após o término da apresentação, todos afogam a
tensão e a ansiedade da espera do resultado nos mares da amizade e da confraria. A interação prevalece à competição e
existe um profundo respeito entre os concorrentes – tenham eles décadas ou apenas poucos anos no mundo mágico das estradas e canções!
Salve os artistas independentes! Salve a velha e a jovem
guarda de festivaleiros fazedores de encantos, magia e sonhos
que cumprem a sua sina por entre estradas & canções!
AC de Paula1
1 Disponível em:
paula>.
4
Sumário
APRESENTAÇÃO ....................................................................................................3
MÚSICA TEMA: ESTRADAS & CANÇÕES ................................................................7
TUDO COMEÇOU ASSIM .......................................................................................9
O PRIMEIRO FESTIVAL......................................................................................... 14
DE VOLTA A 1966 ................................................................................................ 19
POETAS DA CALÇADA.......................................................................................... 24
CADA LOUCO COM A SUA HISTÓRIA! .................................................................. 31
NA QUADRA DA ESCOLA ..................................................................................... 33
DA CALÇADA PARA O CINEMA ............................................................................ 40
O CANTOR DE BOLEROS ...................................................................................... 50
O RETORNO ........................................................................................................ 53
PARCERIAS .......................................................................................................... 55
VERCESI – A LENDA ............................................................................................. 59
PÉ NA ESTRADA .................................................................................................. 75
MÚSICAS DE FESTIVAL ........................................................................................ 81
EU NÃO MORRI! ................................................................................................. 82
SONEKKA ............................................................................................................ 83
JOÃO CORREIA VIOLEIRO .................................................................................... 84
ROBERTHO ÁZIS .................................................................................................. 85
THADEU DE MELLO ............................................................................................. 86
MANOEL GANDRA .............................................................................................. 88
BETO SCALA ........................................................................................................ 89
KICO ZAMARIAN ................................................................................................. 90
BILORA ............................................................................................................... 91
5
D’CARLOS ........................................................................................................... 92
TAVINHO LIMMA ................................................................................................ 93
SÃO BETO FERREIRA ........................................................................................... 94
MARCELO BARUM .............................................................................................. 95
EFRAHIM MAIA ................................................................................................... 99
MARINHO SAN .................................................................................................. 100
DIORGEM JÚNIOR ............................................................................................. 102
ADOLAR MARIN ................................................................................................ 103
NANO VIANNA .................................................................................................. 105
DIMI ZUMQUÊ .................................................................................................. 106
VALÉRIA PISAURO ............................................................................................. 108
SPERANDIRES ................................................................................................... 109
ZEBETO CORRÊA ............................................................................................... 111
RUTHE GLORIA .................................................................................................. 113
RITINHA CARVALHO .......................................................................................... 115
ZÉ ALEXANDRE .................................................................................................. 116
JOSÉ CARLOS COMPANY ................................................................................... 119
ROUXINOL DOS FESTIVAIS ................................................................................ 121
AGRADECIMENTOS ........................................................................................... 124
6
Música tema: Estradas & Canções
Música: Diorgem Júnior
Letra: AC de Paula
Por entre estradas e canções
VIOLA MÃOS E VIOLÃO
Posso lhe dizer QUE LOGO EU
E meu coração MOLEQUE,
Vagando pelos QUATRO CANTOS
Tão longe de MARIANA
Na hora da DESPEDIDA,
QUANDO DISSE ADEUS às ilusões,
Vi brilhar em SEUS OLHOS
uma LOUCA PAIXÃO!
(Por entre estradas e canções)
Naveguei no BARCO BRASILEIRO
E na CASAMATA das utopias
Me abriguei sem saber que havia
OUTRO LADO DA NOITE,
Depois, já na MANHÃ SERENA,
Eu, o ELEFANTE, e o CALANGO NA CIDADE,
Tomamos UM CAFÉ PRA DESPERTAR,
Hoje, já bem perto do EPÍLOGO
7
Eu TÔ PREPARADO e posso dizer
Que sei o QUANTO VALE UMA PAIXÃO!
O SILÊNCIO me invadiu por INTEIRO
Quando alguém me disse SACODE POEIRA
Mas meu sonho EMPOEIRADO
Sorriso aberto feito GIRASSOL
Resolveu descansar
À sombra de um PÉ DE EU TE AMO.
8
TUDO COMEÇOU ASSIM
Muita água passou por debaixo da ponte desde
12/12/66 quando um amigo me apresentou a um tal de
Roberto Freire. Mostrei uma música fraquinha, era o que eu sabia fazer, pois, afinal, estava começando a rabiscar, mas ele foi gentil e autografou um recado na letra da música. Devo confessar que eu não tinha a mínima consciência da sua importância intelectual e artística, e o autógrafo eu só pedi depois de o seu Walter, o amigo que me levara até ele, me dar
um cutucão!
Seu Walter havia integrado a Força Expedicionária
Brasileira:
Conhecida pela sigla FEB, foi a força
militar brasileira de 25.334
homens,
responsável pela participação brasileira ao
lado dos Aliados na Campanha da Itália,
durante
a Segunda
Guerra
Mundial.
Constituída
principalmente
por
uma
divisão de infantaria,
historicamente
é
considerada o conjunto de todas as forças
militares brasileiras que participaram daquela
campanha. Adotou como lema „A cobra está
fumando‟, em alusão ao que se dizia à época
que seria „Mais fácil uma cobra fumar
cachimbo do que o Brasil participar da guerra na Europa‟.2
Ele tinha um bar vizinho a uma loja da minha mãe na
Avenida Itaberaba, e também fazia um bico de garçom na Pizzaria Bruno na Freguesia do Ó, que ostentava a fama de ser a primeira pizzaria da cidade. Se é verdade eu não sei, só
2 Disponível em:
9
sei que o lugar era frequentado por gente importante, políticos e por muita gente ligada às artes. Meu amigo que era a pessoa
a quem eu mostrava meus versos e minhas músicas deve ter
imaginado que eu teria futuro, e um belo dia me disse que iria
me apresentar ao cara que tinha descoberto o Chico Buarque,
confesso que na época eu tinha muito mais garra e cara de pau do que talento e estava ainda na tal flor da juventude! Até algum tempo depois eu não sabia se o tal Roberto Freire do meu autógrafo era o sociólogo ou o deputado que viria a ser presidente do partidão, finalmente descobri quem era o cara que havia se disposto a dar alguns minutos de atenção para um jovem (talvez promissor) poeta em início de carreira.
Permitam-me compartilhar aqui o seu autógrafo e a sua
biografia: "Antonio, Espero que sua poesia e sua música ganhem um dia as ruas para que o povo se convença de que
não vale a pena chorar e que há muito que fazer. Um abraço
amigo do Roberto Freire." (SP 12.12.66).
Joaquim Roberto Corrêa Freire nasceu em
São Paulo no dia 18 de janeiro de 1927.
Formou-se em Medicina, na Universidade do
Brasil/RJ em 1952. Enquanto estudante, e
após a sua formatura, trabalhou como
pesquisador em eletro fisiologia e em
biofísica celular no Instituto de Biofísica da
Universidade do Brasil, sob a orientação do
professor Carlos Chagas Filho. Em 1953 foi
trabalhar no College de France, em Paris,
desenvolvendo trabalhos de endocrinologia
experimental, sob orientação do professor
Robert Courrier. Publicou vários trabalhos
nas revistas das Academias de Ciências do
Rio de Janeiro e de Paris. Após alguns anos
trabalhando como endocrinologista clínico,
Freire realiza sua formação em Psicanálise
através
da
Sociedade
Brasileira
de
Psicanálise/SP,
com
o
prof.
Henrique
Schlomann. Em 1956, realizou trabalhos de
acompanhamento
clínico
no
Centro
Psiquiátrico Franco da Rocha/ SP. A partir
10
deste período buscou novas fontes de
pesquisa, realizando estágios no exterior. Em
Bioenergética, com os discípulos de Wilhem
Reich, em Paris; e em Gestalterapia, com os
discípulos de Frederich Perls, em Bourdeaux.
Suas divergências teóricas e ideológicas se
ampliaram e Freire acabou se distanciando
da psicanálise, ao mesmo tempo em que se
aproximou cada vez mais do campo artístico,
literário e político brasileiro. Roberto Freire,
militante
clandestino
lutando
contra
a
ditadura
militar,
não
encontrava
na
Psicanálise nem na Psicologia tradicional as
ferramentas necessárias que auxiliassem nos
conflitos emocionais e psicológicos de seus
companheiros de luta que o procuravam
buscando algum tipo de ajuda. Foram
principalmente as pesquisas de um cientista
renegado
pelo
meio
acadêmico
–
considerado por muitos como o dissidente
mais radical da Psicanálise – Wilhelm Reich,
que influenciaram Freire na criação de uma
nova técnica terapêutica corporal e em