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Ecossistema Das Iniciativas Sociais No Brasil
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Ecossistema Das Iniciativas Sociais No Brasil
E-book521 páginas5 horas

Ecossistema Das Iniciativas Sociais No Brasil

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Sobre este e-book

O ambiente das iniciativas sociais no Brasil se diversificou muito nos últimos anos . Empresas com propósito , sustentabilidade, ESG, finanças mistas, filantropia, fundos ESG, startups sociais, negócios de impacto, medição de impacto social em ONGs, retorno econômico de projetos sociais, empresas responsáveis, e por aí vai... Seria um emaranhado de ações que complicam e emperram a efetividade? Ou será que essas iniciativas podem realmente conseguir gerar impactos sociais mais abrangentes, justos e sustentáveis? A autora quer contribuir para esse segundo caminho e, por isto, decidiu organizar aqui as reflexões que ela tem feito em seu blog sobre questões polêmicas e mutantes relacionadas a impacto, terceiro setor, avaliação de resultados, filantropia e ESG. Ou seja, amadurecer esses temas para que se consiga separar o joio do trigo, fortalecendo as boas iniciativas sociais e redirecionando as pouco eficientes. A quem este livro é indicado: ·A quem atua na área social - no terceiro setor, empresas, mercado financeiro e setor público. ·Aos estudantes de pós-graduação da área social. ·Aos observadores da realidade social no Brasil que querem encontrar maneiras de poder colaborar.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento14 de jun. de 2021
Ecossistema Das Iniciativas Sociais No Brasil

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    Pré-visualização do livro

    Ecossistema Das Iniciativas Sociais No Brasil - Maria Cecília Prates Rodrigues.

    Sumário

    Epígrafe

    Prefácio

    Dedicatória

    Apresentação

    PARTE I – TERCEIRO SETOR

    Tendências

    Terceiro Setor no Brasil: é hora de enfrentar as mudanças!

    Para onde vai o Terceiro Setor?

    Gestão

    Por que uma iniciativa social não deslancha?

    Terceiro Setor: os 10 requisitos para uma organização COMEÇAR bem

    Terceiro Setor: quais os ingredientes para uma organização sólida?

    Mapa das OSCs: a organização deve entrar com os seus dados nesse Portal?

    Vamos deixar a Covid matar as OSCs?

    Sistema de gestão para OSCs pequenas: o que é melhor?

    Doações para OSCs: por confiança ou por projeto?

    PARTE II – PLANEJAMENTO E AVALIAÇÃO NO TERCEIRO SETOR

    Condição fundamental: ouvir sempre o público-alvo

    Projetos sociais: não sabemos ouvir as comunidades

    Fazer o bem, porém SEMPRE olhar a quem!

    Projetos sociais: o foco deve ser sempre nos mais vulneráveis?

    Engajamento da comunidade e medição de resultados: dinâmicas incompatíveis?

    Engajamento com a comunidade: o passo a passo

    Relação entre o avaliador e os gestores

    Na avaliação do projeto social, qual a relação entre avaliadores e gestores?

    Na avaliação do projeto social, a quem cabe a coordenação?

    Como avaliar?

    Avaliação compartilhada: uma prática que pode valer a pena

    Até que ponto a organização precisa medir os seus impactos sociais?

    Projeto social eficaz: nem branco nem preto!

    Avaliação no terceiro setor: o que a prática me ensinou?

    Avaliação do Terceiro Setor: o que organizações think-tanks dos EUA e Reino Unido me ensinaram?

    Medir apenas o que é relevante

    Teoria da mudança: quais são os 10 passos?

    Medir impacto social: com rigor, mas bom senso

    Cuidados para uma boa Avaliação

    Marco lógico: valioso, mas é preciso ser bem construído

    Avaliação de resultados na proporção correta

    Avaliação social afogada em números

    Você é capaz de perceber quando a eficiência mata a eficácia?

    Dez motivos para não MEDIR impacto – e o que fazer no lugar

    Desconstruindo 4 mitos da medição no setor social

    Como calcular o valor do investimento de impacto? Os métodos monetários são os mais adequados?

    Para que precisamos medir tanto?

    Você sabe identificar um BOM Monitoramento & Avaliação?

    Avaliação: há um novo padrão-ouro?

    PARTE III – FILANTROPIA

    Entendendo as nuances e os riscos da filantropia

    Será que devemos mesmo estimular a filantropia no Brasil?

    O fardo dos filantropos

    Filantropia fora dos trilhos

    Filantropia sob fogo cruzado

    Religião e Filantropia: qual a relação?

    O paradoxo das doações do Vale do Silício: como evitar no Brasil?

    Fortalecimento da Filantropia: um alerta às Universidades

    Filantropia corporativa

    Filantropia corporativa: o debate continua…

    Filantropia das famílias

    Como é difícil DOAR no Brasil!

    Fundos patrimoniais vão mudar a cultura da doação no Brasil?

    Escolher uma ONG com credibilidade é fácil no Brasil?

    Um milionário deveria se envergonhar de morrer rico

    Riqueza e filantropia, de 1889 a 2019: o que mudou?

    Boa notícia: Institutos e fundações familiares desabrochando…

    Fundos Patrimoniais Filantrópicos: questões para debate

    Filantropia Familiar: experiências inspiradoras

    PARTE IV – EMPRESAS E ATUAÇÃO SOCIAL

    As diferentes terminologias

    Empresa consciente e Empresa socialmente responsável: houve avanço?

    Investimento de impacto: apenas uma nova terminologia?

    Negócios de impacto ou Empresas responsáveis: qual é o estágio mais avançado?

    Empresa com propósito: como desanuviar a cortina de fumaça?

    Empresa Com Impacto: o discurso e a prática

    Critérios ESG – mais um modismo?

    Organizações de impacto: entendendo conceitos e práticas

    Casos e questionamentos

    Inclusão de pessoas com deficiência: o tamanho do desafio

    Dilema da ética corporativa: o caso Inhotim

    Risco de injustiças no combate à corrupção corporativa

    (Des)propósito: os casos Vale e Heineken

    Empresário filantropo ou Empresa sustentável – qual importa mais?

    A sustentabilidade corporativa irá sobreviver à Covid-19?

    JBS e Sustentabilidade: há coerência de comportamentos?

    Sustentabilidade: será que agora é pra valer?

    Quando os critérios ESG podem prejudicar

    Avaliação

    Sete dicas para mensurar um programa em Responsabilidade Social

    Avaliação nas Empresas Com Impacto: o que muda agora?

    Finanças Sociais

    Devem as Fundações e Institutos financiar (também) os negócios de impacto?

    Como financiar as iniciativas sociais?

    Blended Finance e Filantropia: boa combinação, mas com cautela

    Data de publicação de cada artigo no blog da autora

    Notas bibliográficas

    A autora

    Epígrafe

    Quando você muda a forma

    como olha para as coisas,

    as coisas mudam.

    (Max Planck)

    Prefácio

    A agenda socioambiental vem ganhando cada vez mais relevância junto aos mais diversos setores da sociedade, adquirindo maior complexidade por meio de novas ferramentas, novas abordagens e narrativas diversas. Daí a importância deste belo livro, que se apresenta como um menu de possibilidades para quem já atua ou quer se aproximar desta agenda. ‘Mudar o mundo’ nunca esteve tão ao alcance de todos, no entanto, nunca se apresentou de forma tão múltipla e complexa.

    Fábio Deboni

    Diretor de Programa no CIAT e membro do Conselho do GIFE (Grupo de Institutos, Fundações e Empresas)

    Maria Cecilia acredita que a avaliação pode desenvolver capacidades nas organizações integrantes do ecossistema de iniciativas sociais. Sugere que o foco na medição de impactos, presente entre os financiadores, deve dar lugar ao aprimoramento do desenho e da execução das iniciativas, sem o que os impactos jamais acontecerão.

    Marcia Joppert

    Fundadora e diretora da Rede Brasileira de Monitoramento e Avaliação (RBMA)

    Dedicatória

    A Alexandre, meu marido.

    A Maurício e Maria Ilka, meus pais.

    A André e Pedro, meus filhos.

    Vocês são o tesouro que Deus me deu.

    Apresentação

    No Brasil, até o início dos anos 2000 era atribuição quase exclusiva do setor público atuar em questões relacionadas à pobreza, exclusão e equidade social. Havia também um terceiro setor predominantemente constituído por organizações sem fins lucrativos de caráter caritativo e assistencial (uma constatação, de modo algum uma crítica!).

    Ultimamente, o ambiente das iniciativas sociais no país se tornou por demais diversificado e até confuso. A sensação é que foram brotando tantas iniciativas e conceitos, muitos deles inconcebíveis ou desconhecidos até há bem pouco tempo, como por exemplo empresas com propósito, finanças mistas, fundos filantrópicos, startups sociais, negócios de impacto, medição de impacto social em ONGs, retorno econômico de projetos sociais, ESG, empresas responsáveis, e por aí vai...

    Penso que nesse livro, por meio dos textos curtos e diretos que aqui estão, eu poderei ajudar às pessoas envolvidas (ou por se envolverem) com as iniciativas sociais no Brasil – seja como gestoras, avaliadoras, financiadoras e/ou filantropas. O meu desejo é que elas, ao lerem o livro, de forma ordenada ou não, sejam estimuladas a refletirem sobre o que vêm fazendo, como vêm fazendo, e se haveria outras estratégias mais efetivas para alcançarem impacto social. Ou seja, quero contribuir para descomplicar esse aparente imbróglio das iniciativas sociais, levar essas pessoas a um pensamento ‘fora da caixa` de modo a poderem ter clareza sobre suas atuações. Ficarei muito feliz se conseguir!

    De forma alguma, essa recente expansão e diversificação das iniciativas sociais foi uma tendência isolada no Brasil. Ao contrário, e como o livro vai apontar, ela repercute a dinâmica que também está ocorrendo em outros países, com destaque para os EUA e o Reino Unido.

    O livro está baseado no meu blog¹, que contém as reflexões e aprendizados que fui fazendo, entre 2016 e 2020, sobre as mudanças e desafios no chamado ecossistema das iniciativas sociais no Brasil, tal a diversidade de atores e arranjos que foram se configurando nesse período. Os artigos foram selecionados e agrupados segundo 4 grandes temas, que foram:

    1 - Terceiro setor: tendências e gestão

    2 - Planejamento e avaliação no terceiro setor: riscos, cuidados e boas práticas

    3 - Filantropia: dilemas, famílias e empresas. [Há 5 anos, a utilização desse termo ‘filantropia` seria aqui impensável, tal o sentido pejorativo que tinha no Brasil].

    4 - Empresas e atuação social: sustentabilidade, ESG, novos atores e finanças sociais

    Desde 2000 tenho sido uma observadora atenta da atuação social do terceiro setor no Brasil. Comecei estudando e propondo uma metodologia para avaliar a ação social das empresas privadas no Brasil (ed. FGV, 2005)². O incômodo motivador na época foi o de que não podíamos transpor, para as iniciativas sociais conduzidas pelas empresas, a mesma lógica de avaliação adotada pelo setor público até então. Anos depois, adaptei aquela metodologia para projetos sociais conduzidos por organizações do terceiro setor (FDC/POS, 2014).³

    Não poderia deixar de agradecer aos grandes incentivadores do blog: ao meu marido Alexandre Penna⁴, curador nato de informações relevantes e interlocutor imprescindível; e aos meus filhos André Prates⁵ e Pedro Prates⁶, por seus constantes relatos e questionamentos instigantes.

    Tendências

    Terceiro Setor no Brasil: é hora de enfrentar as mudanças!

    Li um trabalho interessante da New Philanthropy Capital (NPC, 2016)⁷, uma organização think-tank do Reino Unido. Analisa as várias mudanças por que vem passando o Terceiro Setor naquele país, os desafios e as oportunidades que estão surgindo. Sintetizo a seguir os principais pontos abordados na referida publicação. Vale muito pelo paralelo com o Brasil.

    Quais vem sendo os fatores provocadores da mudança?

    Redução no nível das doações e repasses do governo: no Reino Unido caíram para menos da metade nos últimos dez anos.

    Queda na confiança da opinião pública: agravado com os escândalos recentes registrados no país em algumas organizações sociais conhecidas. Assim, começa a haver um sentimento crescente de que o Terceiro Setor é constituído por uma mistura complexa de organizações, e várias delas desperdiçam os recursos doados.

    O modelo de parceria setor público e Terceiro Setor para a operacionalização da política social não atendeu às expectativas: uma das razões apontadas foi o fracasso do governo em manter uma parceria forte com o setor voluntário.

    As alterações na demografia: se por um lado, o envelhecimento da população pressiona por uma demanda mais ampla e diversificada do setor social, por outro lado há que se reconhecer que tende a gerar um reforço na oferta do trabalho voluntário. Também as ondas migratórias recentes de refugiados no país representam outro fator a pressionar a demanda.

    Tecnologia digital disruptiva: o acesso às novas tecnologias digitais está ampliando sobremaneira o espaço de interação das organizações do Terceiro Setor, permitindo potencializar o compartilhamento de informações, conhecimentos, ferramentas e as redes de contatos. Assim, o modelo de negócios do setor social, baseado no esforço individual de construção de sua infraestrutura, tornou-se obsoleto.

    As fronteiras do Terceiro Setor com os setores público e privado estão se tornando cada vez mais imprecisas: sobretudo com o surgimento dos negócios (ou empresas) sociais e as contratações do governo para prestação de serviços públicos.

    Quais as estratégias para enfrentar os novos desafios e as oportunidades?

    Priorizar o modelo baseado nos ativos dos beneficiários atendidos, ao invés do modelo de entrega direta de bens e serviços a eles. A nova dinâmica envolve uma mudança de mentalidade e cultura: não mais agir em relação aos pontos fracos, mas sim atuar a partir dos pontos fortes da comunidade, de modo a empoderá-la para a busca de suas próprias soluções. Traduzido para inglês, ir do what`s wrong para what`s strong. A vantagem desse novo modelo é que a dependência de apoio externo tende a diminuir e cessar com o tempo. Mas os críticos alegam que essa estratégia vai funcionar como um véu para os cortes nos serviços sociais.

    Fortalecer o relacionamento com os apoiadores. A mudança na abordagem da Cruz Vermelha é ilustrativa: "No passado, a nossa captação de recursos era do tipo transacional, o que era um risco, mas nós tínhamos um relacionamento com centenas de milhares de pessoas� agora a nossa captação está baseada em relacionamentos, e as pessoas passaram a ter muito mais informações sobre os impactos das doações que elas fazem, e aí elas têm a intenção de continuar nos apoiando por muito mais tempo".

    Tende a prevalecer o modelo baseado em contratos públicos, ao invés do modelo das doações. Agora as organizações do Terceiro Setor estão tendo que competir entre si para conseguir contratos com os governos. Há vantagens e riscos. As vantagens estão relacionadas ao próprio sistema da concorrência, uma vez que os objetivos precisam ser claramente estabelecidos, há prestação de contas, maior transparência e, portanto, acompanhamento do impacto pretendido. Já os riscos estão ligados à capacidade de sobrevivência das organizações pequenas, que por não terem efeito-escala, podem ter custos maiores e mais dificuldades para competir. No Reino Unido, o Terceiro Setor é bastante desigual haja vista que, em 2013/2014, 50% dos ativos do setor social pertenciam a apenas 0,6% das organizações.

    Priorizar o modelo dos financiadores e mais (ou funder plus), entendido como o conjunto das práticas dos financiadores e filantropos que vai além da doação em dinheiro. Por exemplo, no caso da empresa socialmente responsável (que já valoriza o shared value), ela vai querer contribuir de diferentes maneiras para a organização social que apoia (além da doação monetária), oferendo conhecimento específico do seu campo de atuação e a sua disponibilidade em construir relacionamentos com os governos e outros atores. Por sua vez, os jovens da geração Y (nascidos nos anos 80), que trabalham nessas empresas, se mostram muito mais comprometidos com o trabalho voluntário pro-bono do que as gerações anteriores.

    Priorizar o modelo do networking, ou da atuação em rede, ao invés da atuação isolada. Assim como já vem ocorrendo nos demais setores, a revolução da tecnologia digital possibilitou um salto considerável na disponibilização de infraestrutura para o setor social. Assim, por meio do estímulo à utilização adequada das redes digitais, torna-se possível criar laços entre organizações sociais parceiras, unir os beneficiários e dar voz a eles, difundir conhecimento e compartilhar bases de dados. Ou seja, caminhar na direção do impacto social coletivo.

    Priorizar o modelo da empresa social, vis-à-vis ao da organização sem fins lucrativos. A empresa social é a organização que, ao mesmo tempo em que cumpre a sua missão social e/ou ambiental, busca também um retorno econômico. Para tal, vende serviços ou produtos no mercado a grupos de pessoas não relacionadas aos seus beneficiários, reinvestindo o seu lucro na própria empresa ou na comunidade. Essa é a definição adotada no Movimento pela Empresa Social no Reino Unido. Segundo o Relatório de 2015 dessa instituição, 49% dessas organizações tinham menos de 5 anos de existência, metade foi lucrativa, e 31% delas trabalhavam nas 20% comunidades mais pobres, demonstrando ser esse um modelo de negócio dinâmico e sustentável. Porém, o risco é o foco social nos beneficiários passar a ser preterido pelo foco econômico no mercado consumidor.

    Feita essa síntese, vemos que, de fato, há muitas semelhanças no cenário das mudanças do Terceiro Setor no Reino Unido e aqui no Brasil. Será que as estratégias que estão sendo implementadas lá, e que começam a ser aqui, são adequadas para a nossa realidade? Deixo para reflexão.

    Para onde vai o Terceiro Setor?

    Em tempo de mudança, como o que estamos vivendo atualmente no Brasil, vale muito parar e refletir sobre como anda o Terceiro Setor e como queremos que ele atue.

    Como anda o Terceiro Setor? Quais os problemas?

    A confiança no setor continua alta, mas tem diminuído. As nossas instituições sociais estão cada vez mais egoístas, preocupadas em maximizar os seus recursos e sua reputação. Elas estão muito ocupadas em se manter atualizadas com as legislações e o avanço tecnológico. A luta por recursos está cada vez mais difícil, sobretudo entre as menores.

    As organizações sociais estão espalhadas de modo desigual pelo país: as áreas mais carentes são justamente aquelas que têm proporcionalmente menos organizações filantrópicas.

    Não há uma métrica clara para orientar a tomada de decisão. Muitas vezes a paixão pelo trabalho social abafa a eficiência e a busca pelo impacto social.

    Há casos de organizações em que a busca pela inovação vem se tornando um fim em si. Porém, uma boa organização fazendo o mesmo bom trabalho de sempre é tudo o que precisamos.

    Como queremos que seja a atuação social da sociedade civil organizada?

    Que esteja espalhada pelo país, especialmente nas áreas e causas onde ela seja mais necessária;

    Que seja complementar aos setores público e privado/lucrativo;

    Que fomente o capital social, promovendo a união entre as pessoas;

    Que crie pluralismo, e amplifique as vozes especialmente daqueles que não são ouvidos;

    Que seja efetiva e eficiente;

    Que entregue bons produtos e serviços aos seus beneficiários.

    Para isto, o que precisa ser feito?

    Precisamos melhorar no nível individual da organização e também no nível do setor como um todo.

    Precisamos que haja melhores relações de trabalho com o setor público, em especial com as autoridades locais.

    Precisamos saber aprender com os outros. Para isto, é preciso estimular o levantamento dos dados (relatórios), a análise e a discussão desses resultados entre as organizações-pares.

    É preciso que haja colaboração entre as organizações maiores e as menores. Estimular o apoio e o aprendizado entre as organizações-pares.

    Cada organização deve fazer o seu melhor. Como ela faz e interage com as demais instituições vai depender do que ela é, sua escala, sua missão e capacidade.

    As instituições financiadoras devem evitar sobrecarregar as organizações sociais com a exigência de indicadores burocráticos e pouco úteis, que acaba por tornar impossível o planejamento dessas organizações no longo prazo.

    Qual a grande surpresa?

    Esse diagnóstico e as estratégias acima apresentadas se aplicariam perfeitamente à realidade atual do Terceiro Setor no Brasil. Não é mesmo?

    Mas se trata de análise feita para o Reino Unido, e não para o Brasil. E foi feita recentemente (10/10/2018) por Dan Corry, CEO da NPC (New Philanthropy Capital), organização think-tank daquele país, por ocasião da Conferência Anual, a NPC Ignites 2018⁸. Sintetizei acima os principais pontos abordados por Dan Corry em sua fala⁹.

    E qual a proposta para o Terceiro Setor?

    Veja o que Dan Corry propôs para o terceiro setor do Reino Unido, em tom inovador e ousado:

    Em grande medida os problemas apontados acima são consequência de que, até hoje, o setor social esteve entregue às forças do mercado ou ao laissez-faire, e isso não pode continuar desse jeito sob pena de prejudicar justamente as pessoas mais necessitadas do país. Nem laissez-faire, nem dirigismo ou pai centralizador. O que Dan Corry sugere é algo nesse meio.

    Ele propõe a criação de uma Agência para o Desenvolvimento da Sociedade Civil, para corrigir os incentivos enviesados, estimular as boas práticas e eliminar as más práticas. É uma ideia controversa, mas que pode gerar muito valor.

    Para ele, o que justificaria a Agência é o fato de não termos um mundo justo e, daí, o Terceiro Setor precisa de uma mão que o impulsione ou ajude contra a força dos dois outros setores (o público e o privado lucrativo), e que vá além da negligência benigna do próprio setor social em que as grandes organizações competem com as menores em situação de força desigual.

    A reflexão para o caso brasileiro

    É sempre saudável observar o que acontece em outros países, sobretudo naqueles mais desenvolvidos, e analisar as ideias que estão sendo colocadas lá. Não com a intenção de meramente copiá-las para o Brasil, mas sim com o objetivo de refletir sobre elas e analisar a possibilidade (ou não) de adaptá-las ao contexto do nosso país.

    Embora com a função (apenas) de coordenação e correção de distorções do setor social, faz sentido propor uma Agência de Desenvolvimento para o Terceiro Setor no Brasil, nesse momento em que sopram os ventos liberais?

    Ou seria visto como aumento de burocracia? Haveria maneiras para evitar que isso ocorresse?

    Ou, muito ao contrário, em tempos de ventos fortes e desencontrados, não seria preciso ajustar as velas e o leme de modo a apontar na direção correta a ser seguida?

    Gestão

    Por que uma iniciativa social não deslancha?

    Há 15 anos, um jovem da periferia decidiu compartilhar o seu talento musical e ajudar as crianças e adolescentes de sua comunidade, oferecendo oportunidades de lazer, alegria, sociabilidade, autoconhecimento e autoestima. No quintal da casa da sua mãe, ele e a turma, que ia se juntando, improvisaram instrumentos musicais a partir de latas, que viraram tambores, chocalhos e pandeiros. Uma animação só, que parecia a de uma escola de samba infanto-juvenil! É um caso real, conduzido em um ambiente de pobreza e violência.

    O grupo foi crescendo, e o quintal se tornou pequeno para reunir tanta gente e alegria aos sábados, domingos e feriados pela manhã. Com o tempo, a turma foi ganhando visibilidade e passou a ser convidada para tocar em espaços maiores. O jovem músico virou tio da garotada, e começou a receber oferta de patrocínios de grandes empresas, escolas públicas ou igrejas, que queriam brilhar como amigas da comunidade nos eventos populares. Ele se tornara nitidamente uma liderança local.

    Alguns anos depois, esse jovem da periferia enxergou nessa dinâmica bem-sucedida uma oportunidade para si próprio, ou seja, unir o seu dom musical e capacidade de liderança para se tornar um empreendedor social. Só que agora ele já estava casado e com dois filhos. Daí, não poderia continuar atuando de forma (apenas) generosa e voluntária. Teria que encontrar maneiras para que essa sua iniciativa social da música conseguisse custear o seu próprio trabalho e também o das outras pessoas que fossem se engajando.

    O desafio estava, pois, lançado. De imediato, viu que teria que formalizar o empreendimento, o que significou obter um CNPJ para poder começar a existir. Daí em diante, ele teria que fazer tudo da maneira legal, seguir todas as obrigações impostas pelo governo e arcar com os respectivos custos da empreitada. Foi quando ele percebeu como o mundo formal é inóspito e cheio de exigências, que parecem querer atrapalhar as boas intenções.

    Obstinado, o nosso empreendedor social comunitário não esmoreceu. Ao contrário, frente aos desafios vislumbrados, ele até se sentiu mais forte para perseguir o seu sonho: transformar vidas por meio da música. Iria começar na comunidade em que nascera, e depois expandir para outras comunidades também carentes.

    Ele decidiu ir atrás dos seus amigos e conhecidos da comunidade. Uma vez que a sua causa era do bem, ele achava que iria poder contar com a colaboração generosa deles. Na realidade, foi assim no princípio. Conseguiu orientação e apoio para criar uma OSC (Organização da Sociedade Civil), com o formato de associação e com todos os quesitos mínimos necessários para garantir a sua existência, como a especificação de quem seriam os associados e conselheiros, redação do Estatuto, definição da sede, e por aí vai… Até de um sobrado abandonado na região ele conseguiu se apossar para ser a sede.

    Mas não tardou e as dificuldades foram surgindo. Começou com o sobrado, ou melhor, com os elevados custos para a sua legalização e recuperação/adequação. Os seus olhos brilhavam só de pensar que iria poder atender a garotada e os seus familiares com um padrão de primeiro mundo.

    Ele fazia de tudo para superar as dificuldades que ia encontrando: assistia a todos os cursos e seminários gratuitos de gestão do Terceiro Setor; participava de reuniões com representantes do setor público e com políticos para tentar angariar simpatia e poder apresentar o seu pretendido trabalho; buscava aproximação com as igrejas locais; resgatava as velhas amizades; se inscrevia em todos os editais de seleção de projetos de que tinha notícia pela internet; fazia visitas a algumas empresas e instituições locais atrás de apoio. Era incansável e obstinado.

    Porém, o nosso empreendedor foi aos poucos percebendo que, uma vez com a Associação já formalizada, estava muito difícil prosseguir. Parecia que estava ficando cada vez mais distante o seu sonho de (re)conquistar a empolgação genuína e vibrante das batucadas do quintal da casa de sua mãe de muitos anos atrás. Nem da garotada local (público-alvo da iniciativa), nem muito menos de parceiros financiadores. A duras penas, o máximo que ele estava conseguindo eram doações pontuais de um ou outro material para remendar o sobrado e também apoio técnico voluntário para elaborar um projeto social e um site, ambos consistentes com o desejo dele de ajudar e o seu sucesso do passado, porém (possivelmente) com quase nenhuma sintonia com as necessidades presentes das famílias locais.

    Por que aquela iniciativa social, tão fervorosamente desejada pelo nosso empreendedor social, não estava deslanchando?

    Parecia até que ele tinha sido atingido pela maldição do sobrado, tamanha era a sua preocupação inicial com a recuperação do sobrado. Também havia o sentimento dele de estar preso dentro de um círculo fortemente perverso, sem saída: a Associação não começava a funcionar porque não tinha dinheiro nem financiadores. Mas também não tinha financiadores, porque não estava funcionando e ainda não tinha nada (resultados) para mostrar (aos financiadores). Então, como destravar esse círculo perverso?

    Por que essa iniciativa (de inclusão social baseada na música) que, há 15 anos atrás parecia fazer tanto sucesso nessa mesma comunidade, não mais comove nem atrai parcerias?

    Sem dúvida, é uma pergunta complexa. Eu não teria uma resposta pronta para dar, mas vejo que não apenas nos empreendimentos sociais, mas em geral, a fase do nascimento é etapa crucial na vida de uma organização. É preciso seguir determinados pré-requisitos básicos nessa etapa, de modo que a organização conquiste a sua razão de ser, legitimidade, apoio da comunidade e parcerias diversas; e consiga ir gradualmente desenvolvendo e moldando o seu modo de atuar.

    No caso relatado do nosso empreendedor social, pudemos ver que ele tinha muitas qualidades, mas incorreu em vários erros de gestão. Dentre as suas qualidades, destaco

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