Os Supremos
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Os Supremos - Fernando Silva
¹, chefe da tribo Tupinambá. Nossa curandeira Eçauna
² teve uma visão de sua chegada e nos disse o que você pediria.
- A Grande Mãe é muito sábia e fala com todos os moradores da floresta. Essa fêmea sabe para que quero a canoa?
- Sim eu sei! – respondeu uma velha fêmea de bicho-homem saindo de dentro de uma toca a alguns metros da fogueira.
Curupira olhou em sua direção e ela o olhava diretamente nos olhos, mantendo a cabeça erguida. Ele não sentiu medo nela, apenas uma serenidade e sabedoria que apenas as criaturas velhas possuem.
Ela caminhou com dificuldade até onde Baquara estava parado e com um gesto o mandou sentar.
- Sei que a floresta e tudo que vive nela correm perigo de deixar de existir, sei também que a Grande Mãe deu a você a tarefa de ir a uma terra distante impedir que isso aconteça. – falou a velha com dificuldade.
Curupira já havia visto muitas criaturas mortais velhas antes, mas nunca uma como aquela. Quantos anos ela teria?
- Então sabe que não tenho tempo a perder. Onde esta minha canoa?
- Está a sua espera na beira do rio.
- Ótimo! Vou partir agora mesmo.
- Perdoe-me grande Senhor da Caça, mas você já andou em uma dessas antes?
- Nunca, mas já vi os de sua espécie fazerem varias vezes.
- Sim, então sabe que é preciso pelo menos dois Tupinambás fortes para conduzir a canoa com segurança pelo rio.
- Posso conduzir a canoa sozinho sem problemas!
- Acredito nisso meu Senhor, mas o rio é perigoso e traiçoeiro e ninguém nunca foi tão longe com uma canoa antes. Até mesmo uma criatura poderosa como você precisa de descanso e duvido que Iara o ajudará a conduzir a canoa, e os outros são muito pequenos para fazê-lo.
- O que está me dizendo fêmea?
- Esses Tupinambás ao seu redor esperam pelo seu chamado para ajudá-lo em sua viagem.
Curupira olho ao seu redor e viu que apenas os mais fortes estavam ali, eram cerca de trinta bichos-homens, todos prontos para morrer pela segurança de sua tribo. Apesar de reconhecer a capacidade deles, Curupira não confiava naquela espécie, afinal ele fora criado para proteger os animais da floresta exatamente deles.
Ele refletiu por um momento e considerou o tempo e a distância que teria que percorrer, lembrou que Iara só iria até os limites da floresta e que os pequenos Fertilizadores eram inúteis para ele, além do mais ele prometera protegê-los com sua vida.
- Está bem, levarei em minha canoa apenas dois machos de sua espécie.
- Como quiser, Grande senhor.
Curupira examinou os bichos-homens ao seu redor, eles eram os melhores caçadores e pescadores que a tribo tinha e Curupira já os havia visto muitas vezes em suas tarefas. Entre eles se destacavam Piqueroby
³, um pescador forte e jovem e Ubirajara
⁴ um caçador experiente e bravo.
- Esses dois irão comigo. Onde está minha canoa? – perguntou Curupira apontando para eles.
- Na margem do rio, por aqui. – indicou o pajé levantando-se e seguindo para uma trilha que dava no riacho que ficava atrás da aldeia.
Curupira seguiu o bicho-homem e imediatamente todos os outros seguiram atrás dele. Os dois escolhidos pegaram suas armas feitas de madeira e seguiram orgulhosos para seu destino.
Levaram alguns minutos até o rio e lá chegando, o pajé apontou uma imensa canoa construída com um tronco de jacarandá. Dentro dela havia vários cestos feitos de palha de bananeira com frutas e raízes destinadas aos viajantes.
Curupira olhou a canoa procurando por algo que pudesse ser uma armadilha ou coisa parecida. Como não encontrou nada, entrou dentro dela e fez um sinal para que os dois também entrassem.
A velha fêmea proferiu algumas palavras aos dois que haviam se ajoelhado a seus pés. Curupira lembrou-se do beijo dado pela Senhora da Arvore em Pólen e viu o mesmo carinho e preocupação nos olhos da fêmea velha.
Quando os dois entraram na canoa Curupira acenou para o pajé e a velha sábia e agradeceu com um aceno de cabeça.
Os dois empurraram a canoa rio adentro e começaram a remar.
Conforme a canoa avançava Curupira avistou nas margens do rio várias fêmeas e filhotes que acenavam e gritavam palavras que ele não podia compreender.
- O que eles dizem? – perguntou aos dois.
- Eles nos abençoam e pedem aos bons espíritos para nos protegerem e termos sucesso na jornada.
Curupira sentou-se e ficou observando como eles remavam, teria que aprender caso precisasse livrar-se deles.
O pequeno afluente encontrou o grande rio e a canoa ficou mais rápida. Curupira avistou os outros três que o aguardavam na margem do rio e ordenou que os bichos-homens os apanhassem.
A jornada ia começar.
IARA
Iara estava sentada em uma pedra na margem do rio observando os pequenos Fertilizadores que testavam suas novas asas e poderes.
Pólen e Musgo descobriram que podiam voltar ao seu tamanho original e ir aumentando até o tamanho que tinham agora. Descobriram também que mesmo ao ficar bem pequenos, tornavam-se mais rápidos e que sua capacidade de germinar e fertilizar plantas havia aumentado fazendo com que o tempo de crescimento dos vegetais fosse quase instantâneo.
Eles estavam muito excitados com suas novas capacidades e voavam de um lado para outro experimentando truques novos. A luminosidade que antes saia de suas asas agora era maior e uma espécie de pó colorido saia dela espalhando pequenas centelhas que se tornavam sementes de todos os tipos ao tocar o chão.
A alegria dos dois era tão intensa que eles não perceberam a sutil diferença que havia entre eles agora, mas Iara que já havia sofrido duas transformações, observava curiosa se perguntando o porquê de as duas criaturas serem diferentes agora se eram iguais antes.
Ela olhava para Musgo que continuava a manter sua coloração esverdeada no mesmo tom que lhe dava o nome, suas asas que antes pareciam com a de uma libélula agora tinham a forma de asas de gafanhoto, dessa forma ele podia recolhê-las nas costas ficando elas ao longo de seu corpo. Elas continuavam sendo verdes e emitindo um brilho verde intenso, a poeira que elas emitiam também era verde e gerava pequenas sementes verdes ao tocar o solo. Algumas dessas sementes já começavam a brotar e delas surgiam trepadeiras, raízes como o aipim e a beterraba, plantas rasteiras e alguns tipos de heras que se enroscavam em outras plantas até sufocá-las.
Mas era Pólen que a intrigava. A princípio ele parecia muito com o outro mantendo algumas características, mas olhando com cuidado podia-se notar as sutis diferenças. Ele não mais possuía tons verdes como antes, sua pele agora era toda marrom e pequenas faixas coloridas cobriam suas pernas e braços. As faixas possuíam as cores do arco-íris e também existiam em suas asas, que também tinham a forma das asas de Musgo. Mas elas emitiam um brilho diferente, as muitas cores se misturavam e a cada momento uma nova tonalidade de luz aparecia. As novas asas também soltavam uma espécie de poeira, mas esta era colorida e tornava-se sementes de todos os tipos ao tocar o chão. Assim como as emitidas por Musgo, elas também brotavam, só que se desenvolviam mais rapidamente e se tornavam flores multicoloridas, roseiras, arvores frutíferas e arvores nobres como o cedro e a cerejeira.
Era evidente para Iara que agora eles não eram mais Fertilizadores, mas possuíam poderes que se igualavam aos da própria Flora, mas nem mesmo eles se davam contam disso.
Ela levantou-se ao sentir a aproximação da canoa e ordenou que eles se calassem.
A canoa com Curupira aproximava-se lentamente pelo meio do rio e dirigia-se em direção a eles.
Iara sentiu o cheiro exalado pelos bichos-homens e ficou nauseada. Começou a caminhar sobre as águas em direção a canoa seguida pelos dois curiosos companheiros que nunca tinham visto aquelas criaturas.
Pólen e Musgo adiantaram-se e pousaram no interior da canoa perto de Curupira. Os dois bichos-homens assustaram-se com eles, mas não emitiram nenhum som que demonstrasse isso. Mas ao ver Iara caminhando em sua direção, pararam de remar e recuaram para o fundo da canoa aterrorizados.
Era do conhecimento de todos que Iara odiava o bicho-homem e matava todo aquele que encontrasse em seu caminho. Curupira percebeu o medo deles e os alertou para serem respeitosos, uma vez que ela era uma aliada e os conduziria pelo rio.
Iara chegou até a canoa e parou em sua frente, de repente a canoa parou de se mover, apesar do rio continuar a correr.
Ela olhou para Curupira e seus olhos emitiram pequenas faíscas como o brilho de pequenos relâmpagos.
- Eu trouxe a canoa como disse que faria. – falou Curupira sorridente.
- O QUE VOCE PENSA ESTAR FAZENDO CURUPIRA! – gritou ela furiosa.
- Acalme-se irmã!
- MIRE-SE CURUPIRA E VOCE VERÁ QUE EU JAMAIS PODERIA SER SUA IRMÃ! DIGA-ME NO QUE VOCE ESTAVA A PENSAR!
- Nós precisávamos de uma canoa e consegui uma.
- ISSO PARA MIM É CLARO. MAS O QUE ESSA ESCÓRIA FAZ AQUI? – apontou ela para os bichos-homens.
- Precisamos deles para conduzir a canoa.
NÃO SEJA TOLO! EU SOU IARA, A SENHORA DAS ÁGUAS E NÃO PRECISO DE NINGUEM PARA ME CONDUZIR EM MEU RIO!
- MAS EU PRECISO IARA. Lembre-se que você só nos conduzirá até os limites da água com sal e de lá ainda teremos muito que viajar.
Iara calou-se por um momento e refletiu sobre o assunto, seus olhos voltaram a se tornar translúcidos como a água do rio e ela entrou na