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Humanismo: liberdade filosófica: ensaios
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Humanismo: liberdade filosófica: ensaios
E-book203 páginas2 horas

Humanismo: liberdade filosófica: ensaios

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Sobre este e-book

As crônicas-ensaios provocam reflexões sobre a ética e a moral como base das sociedades sólidas em contraposição aos desvios da liberdade decorrentes da corrupção dos valores éticos-morais. A obra reúne o pensamento de grandes filósofos e teólogos, mas o autor – como recomenda todo ensaio – também deixa expresso seu pensar filosófico sobre a liberdade. A título de exemplo, vejam-se as crônicas-ensaios, denominadas "Diálogo das três liberdades no jardim das ideias", "A liberdade em três cenas", "O tempo e a liberdade", "A gaiola da liberdade", "Sobre a liberdade ética" e "A ideologia e a Liberdade".
IdiomaPortuguês
Data de lançamento12 de abr. de 2023
ISBN9786525276625
Humanismo: liberdade filosófica: ensaios

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    Humanismo - Océlio de Jesús C. Morais

    1 – SÓCRATES E A LIBERDADE

    A vida e o pensamento dos filósofos clássicos gregos, a partir de Sócrates, sempre me fascinaram. Então decidi me impor um desafio: escrever uma série de breves ensaios sobre a liberdade nos pensamentos de Sócrates, Platão, Aristóteles, Sêneca, Jesus Cristo e Santo Tomás de Aquino, dentre outros filósofos. O desafio é identificar sementes éticas que atravessaram os tempos e hoje emolduram o sentido da liberdade humana.

    Outro propósito ou objetivo é provocar reflexões livres (não indutivas) sobre como, na atualidade, falamos e vivemos o sentido da liberdade.

    Nesse desafio, de início, estive pensando como falar sobre a liberdade no pensamento de Sócrates, um homem que foi general de guerra e ao mesmo tempo um filósofo da justiça e da moral. Um homem que, conforme a literatura sobre a sua vida, tinha por hábito andar descalço, tomar pouco banho, contemplar a natureza, descobrir a verdade pela argumentação e um gosto especial por estudos de sexologia.

    Confesso a dificuldade inicial, porque – embora eu tenha uma predileção pela filosofia socrática e pós-socrática – o filósofo grego nada escreveu durante todas as suas 7 (sete) décadas de vida. As reflexões e exemplos de vida ética do ateniense (469 a C. – 399 a C.) o tornaram merecidamente o pai da filosofia ocidental. Então é uma árdua tarefa escrever sobre a liberdade no pensamento de Sócrates.

    Mas vou me socorrer com os relatos dos seus discípulos, por exemplo, Platão e Xenofonte, este, em Discursos sobre Sócrates. Aquele, em Apologia (sobre a autodefesa de Sócrates no tribunal antes de ser preso e condenado à morte), e em Fédon (sobre a alma e a morte de Sócrates), obras de Platão, tidas como as mais abrangentes do pensamento de Sócrates.

    Para Sócrates, a liberdade é, na essência, um bem moral inerente para aquele que cultiva e vive a verdade. E o filósofo incorporou esse princípio até a sua morte: morreu (depois de sua prisão e condenação), defendendo a verdade. A partir dessas obras, é perceptível que o tema da liberdade no pensamento de Sócrates está intrinsecamente ligado à justiça e à moral, que eram atributos dos sábios que expressavam e viviam conforme a verdade.

    O sentido da liberdade, em Apologia de Sócrates, está intrinsecamente ligado à verdade, porque Sócrates considerava que a verdade era um bem moral. O livre-arbítrio estava atrelado às escolhas ético-morais. Aliás, a esse propósito, em defesa própria, no tribunal, Sócrates prometeu aos juízes pronunciar exclusivamente a verdade, sua preocupação como filósofo.

    Sócrates acreditava que manteria sua liberdade, porque também apregoava que ao juiz cabia, como conduta ética, ouvir atentamente; considerar sobriamente e decidir imparcialmente". Por isso, os juízes deviam ser virtuosos, eis que incluídos nas categorias dos homens livres, probos, corajosos e sábios. Homens não virtuosos não seriam livres, por isso, não teriam liberdade para julgar.

    O maior sábio dentre os sábios da filosofia grega considerava que o Sábio é aquele que conhece os limites da própria ignorância; portanto, a sabedoria era uma virtude inerente aos homens livres e honestos que cultivavam a verdade: A verdade não está com os homens, mas entre os homens, deixando a entender que é um valor perfectível aos homens.

    Embora virtuoso e hábil na argumentação, a escolha de Sócrates como um dos generais atenienses na guerra do Peloponeso contra a Esparta não lhe rendera honrarias como era de costume aos generais de guerra, mas uma acusação de covardia e uma prisão.

    A acusação de ato de covardia: abandonar no campo de guerra os corpos dos soldados mortos, mesmo sabendo que era dever legal e moral do general enterrar os seus soldados ou morrer lutando. Sócrates ordenou que os sobreviventes retornassem à cidade de Atenas, sem enterrar os mortos.

    Julgado, conseguiu a liberdade por esse crime de guerra porque, com arte retórica incomparável, conseguiu convencer os juízes de que era mais vantajoso salvar os vivos do que guerrear até a morte. Deixou claro que salvar vidas dos soldados sobreviventes era um dever moral do general, o qual também tinha o dever de preservar as vidas dos comandados.

    No livro The Death of Socrates (2007), Emily Wilson (doutora em literatura clássica e comparada na Universidade de Yale e professora de Humanidades da Pensilvânia) analisa a condenação e morte de Sócrates: as acusações de profanação aos deuses (não acreditar nos costumes e nos deuses gregos; unir-se a deuses malignos que gostam de destruir as cidades); e conspirador (corromper jovens com suas ideias).

    A autora interpreta que Sócrates era um homem que soube viver a liberdade virtuosa, ensinando pelo exemplo de vida até mesmo na hora de decidir sobre a fuga da prisão (fuga facilitada por amigos) ou se tomaria a cicuta, uma substância mortal extraída de plantas venenosas.

    Apologia, de Platão, narra que Sócrates teve 280 votos a favor e 230 contra a sua condenação e que o ateniense disse que seus acusadores (Ânito, representante dos políticos, e mentor do processo contra Sócrates; Licon, representante dos oradores e Meleto, representante dos poetas) nada disseram de verdade.

    Decepcionado, mas convicto de suas ideias e de seu ensinamento sobre a sabedoria, declarou com ironia que lhe caracterizava: a verdade era mais inteligente do que os sábios.

    E preferiu beber a cicuta, ainda questionando os seus acusadores: Como posso não acreditar nos deuses e ao mesmo tempo me unir a eles?. E acrescentou, conforme Platão, em Fédon: Vocês me deixam escolher entre duas coisas: uma que eu sei ser horrível, que é viver sem poder passar meus conhecimentos adiante. A outra, que eu não conheço, que é a morte... escolho pois o desconhecido!".

    Vejam o extremo valor que o filósofo grego dava à liberdade de pensamento, ali corporificado como a própria essência da sua alma ou essência do seu ser: é horrível viver sem poder passar seus conhecimentos adiante. Por outras palavras: para Sócrates, viver sem a liberdade de ensinar a sua filosofia de vida significava mortificar seus pensamentos e suas ideias. Significava anular a sua existência.

    A liberdade de pensar e de transmitir os ensinamentos era a própria razão de existir de Sócrates. Fora disso, não haveria vida livre. Ao revés, haveria prisão e mortificação do livre pensar.

    Sócrates levou às últimas consequências a liberdade de escolha ou o livre-arbítrio, vinculado às duas regras que considerava inerentes à alma humana ou essência humana: a justiça e a moral, fora das quais não existirá a liberdade verdadeira.

    Por tudo isso que, certamente, Sócrates foi considerado o mais sábio dos sábios entre os homens de seu tempo: viveu a plenitude da liberdade de pensamento, dela não abdicando nem na hora da morte.

    2 – PLATÃO E A LIBERDADE

    Quem e quantos de nós, em algum momento, já reproduziu essa frase: Às vezes na vida, nós nos sentimos acorrentados. Sem sequer sabermos que temos a chave. Ou esta: A palavra precisa concordar com o fato. São de Aristócles, um nome familiar, mesmo para quem não tem conhecimentos sobre filosofia.

    Mas as ideias desse homem foram estudadas com muita curiosidade e zelo pelos filósofos de ontem (por exemplo, Descartes, Hobbes, Nietzsche, Hannah Arendt, Bertrand Russell) e ainda são na atualidade pelos jus-humanistas e, aqui e ali, pessoas do povo reproduzem as suas célebres lições atemporais que adquiriram a imortalidade.

    Um dos precursores da filosofia da natureza – aquela que estuda causas e princípios do mundo material – o que melhor define Platão é a denominada utopia política, a qual indica a ideia de uma sociedade imune a erros, quanto à sua concepção teórica. É nessa utopia platônica que vamos apresentar, neste ensaio filosófico, algumas ideias de Platão sobre a liberdade.

    As ideias estão aí, bem vivas, atravessando milênios, e cheias de significações acerca da liberdade no pensamento de Platão – Aristócles era o seu nome – codinome que ganhou dos amigos na Academia de Sócrates (de quem se tornou aluno por 10 anos, a partir dos 20 anos de idade), porque tinha ombros largos.

    Platão não se dedicou a escrever topicamente sobre a liberdade, em si. Porém, o conjunto de seu pensamento sobre a justiça (a justiça é sabedoria e virtude), sobre a política (necessidade de uma constituição política que convenha ao temperamento filosófico) e sobre a liberdade na democracia (extrema liberdade) oferece elementos para entender, na atualidade, como aquele mais ilustre propagador da filosofia socrática concebia a liberdade na democracia grega antiga – modelo adotado pelas sociedades ocidentais subsequentes e ainda hoje acreditam ser a melhor forma de garantir concretamente o exercício das liberdades.

    Quem ler com atenção o livro VII, na obra A República, vai identificar, na teoria do mito da caverna, que Platão adota a metáfora da luz (conhecimento) e da escuridão (ignorância) para indicar que é a verdade (virtude = conhecimento) que liberta o homem da escravidão, por ele apontada como uma grave espécie de escravidão.

    Por essa perspectiva, a liberdade é sinonímia de verdade, cuja luz (libertação) ocorre pelo conhecimento.

    Como Sócrates, Platão não era simpático à democracia ateniense, sentimento que ficou mais evidente depois da condenação e morte do mestre, tanto que foi para a cidade de Magna Grécia, depois Siracusa, cidade-Estado, localizada na Sicília, e depois para o Egito.

    No contexto das viagens e a partir da sua descrença àquele modelo de democracia, Platão escreveu os livros Diálogos e A República.

    Adota-se A República como obra de referência para este breve ensaio sobre a liberdade no pensamento de Platão, ideias consonantes com o pensamento de Sócrates.

    Em A República (em que defende o governo da aristocracia, porque entendia que somente os filósofos valorizavam o conhecimento e a virtude, enquanto os políticos comuns induziram o cidadão comum à corrupção, por meio do poder e do dinheiro), o sentido da liberdade individual é tomado como a vontade de o cidadão escolher e exercer sua profissão, mas sem interferir nos assuntos do Estado. Liberdade é ser dono da própria vida, dizia.

    Sócrates e Platão consideravam que a democracia ateniense propiciava uma uma liberdade extrema, que gerava servidão, embora ambos reconheçam que, na democracia, o povo constitui a classe mais numerosa e a mais poderosa, quando está unida.

    No diálogo entre Sócrates e Adimanto, nessa obra, Sócrates critica a democracia ateniense, quando afirma que a liberdade extrema pode levar à cruel escravidão, quando o Estado é leniente. Transcreve-se um trecho significativo do diálogo:

    – "Sócrates — [...] Queres saber que mal é esse, comum à oligarquia, à democracia, que reduz a última à escravidão.

    – Sócrates — Verdadeiramente, a tirania não se originou de nenhum outro governo senão da democracia, seguindo-se aí liberdade extrema, penso eu, uma extrema e cruel servidão.

    – Adimanto — Concordo."

    Sócrates e Platão defendem a Aristocracia, porque consideram que os filósofos eram bons e justos.

    Sócrates — Analisamos anteriormente o que corresponde à aristocracia e afirmamos, com razão, que é bom e justo.

    Era um sentido de liberdade elitista, porque somente os filósofos poderiam usufruir dessa liberdade política enquanto governante:

    Sócrates — Enquanto os filósofos não forem reis nas cidades, ou aqueles que hoje denominamos reis e soberanos não forem verdadeira e seriamente filósofos, enquanto o poder político e a filosofia não convergirem num mesmo indivíduo [...] jamais a cidade que nós descrevemos será edificada.

    Platão reproduz o pensamento de Sócrates, considerando que era possível o exercício da liberdade no ambiente no governo aristocrático ou até mesmo no governo monárquico, porque, ainda que o governo fosse de homem (monarquia) ou sua autoridade fosse compartilhada por vários homens, (aristocracia), isto não altera as leis fundamentais da cidade, se estiverem vigorando os princípios de educação.

    A liberdade, nesses dois regimes, seria parametrizada pela lei.

    Diante do problema da liberdade extrema na democracia ateniense de então (qualificada como extrema servidão, portanto, antítese da liberdade dos magistrados, dos sábios e dos filósofos), Sócrates atribui a questão da liberdade extrema à raça de homens ociosos e dissipadores existentes no corpo político.

    Platão os denomina de políticos comuns que corrompem os mais jovens pelo dinheiro. E defende que o sábio legislador, no papel de médico do Estado, se acautele previamente para não deixar prevalecer esse tipo de político.

    A rigor, a liberdade política na democracia grega antiga não inclui todos os cidadãos, pois apenas eram considerados cidadãos os homens a partir dos 30 anos, desde que fossem filhos de atenienses, o que implicava na negação da liberdade política às crianças, aos jovens, às mulheres, aos escravos e aos estrangeiros.

    Como o modelo social admitia à aristocracia comprar e possuir servos, Platão não se opõe ao modelo, o que também significava não se opor à escravidão. Uma das justificativas, inclusive às críticas à democracia grega, está relacionada ao fato de Platão ser de uma família tradicional, com inserção e proeminência na política.

    No capítulo Das Leis, em A República, pode ser observado que a escravidão era natural porque o cidadão comum não era detentor do conhecimento.

    Desse modo, no pensamento de Platão, a liberdade pode ser vista como um atributo inerente aos sábios no âmbito dos regimes monárquico e aristocrático, enquanto que em um regime de liberdade extremada, haveria uma espécie de servidão política, levada a efeito por políticos comuns ou homens ociosos e dissipadores dos valores da liberdade (a justiça e a virtude), estes, típicos dos homens sábios, aqueles que tinham acesso à educação e à formação ética-filosófica.

    Em conclusão, no pensamento de Platão, a liberdade individual indicava a condição "que a cada um é dada de dispor de todos os seus bens ou de adquirir os dos outros, e,

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